Os Primos (Capítulo 09)

Um conto erótico de RafaelQS
Categoria: Homossexual
Contém 2714 palavras
Data: 02/03/2017 01:44:26

Um sonho ruim fez com que eu acordasse razoavelmente cedo pela manhã. Existia um nome pairando na minha cabeça preocupada: Leandro. O SMS enviado na noite anterior me assombrava : existia a possibilidade de surgirem conflitos e esta não era uma pretensão minha, levando em conta os momentos abençoados que aquela viagem havia me proporcionado até então. Sem fazer barulho para não acordar Cauã, o qual dormia profundamente, coloquei um par de chinelos e me dirigi à cozinha.

Duvidava que alguém estivesse acordado às oito da manhã após a comemoração de ano novo que se arrastou pela madrugada, mas para minha surpresa Isaura e tia Heloisa já estavam de pé havia algum tempo. Costumes do campo… Vovó comia pãezinhos doces enquanto titia finalizava o café. Quando percebeu minha presença convidou-me para sentar à mesa e cumprimentou-me com o famoso “Deus lhe abençoe meu filho".

Eu sentia um mal estar devido a alimentação pesada do dia anterior, a azia queimava-me o estômago. Quando me ofereceram café, recusei alegando me sentir um pouco cheio. Logo Heloisa se prontificou a preparar um chá de erva-cidreira para aliviar minha tensão estomacal. Tivemos um curto diálogo sobre meus planos para o futuro, titia gostava de escutar as minhas pretensões profissionais e Isaura acompanhava, salientando que eu deveria tornar-me um doutor renomado.

Depois de terminar o meu chá, o qual a primeiro momento imaginei ter um gosto péssimo, constatando não ser tão ruim no tímido bebericar, andei até o banheiro para escovar os meus dentes e tomar um banho.

Sentei na escada da sacada do casarão e olhei para o horizonte, aflito e atento. A qualquer momento um carro surgiria com a visita indesejada. Não daria abertura para Leandro, ainda que ele tentasse usar de sua lábia. Eu tinha uma relação a zelar, ainda que para isso eu tivesse de tirar algumas pessoas do meu caminho.

João Clemente em cima da égua Teresa tocava o gado para o pasto. Ao longe observava a boiada andando rapidamente para o capim fresco. Decidi acompanhar a cena mais de perto andando até João.

-Bom dia Sr.! -Disse, quando viu meu olhar de curiosidade, fazendo a égua parar de cavalgar.

-Bom dia! Mas já está trabalhando?

-As coisas na roça podem parecer bem vagarosas, mas a verdade é que nada nunca para. -Sorriu. -Não existe feriado para os animais.

-O pasto é muito longe?

- Logo à frente.

Acompanhei João Clemente no percurso, embora ele fosse rápido demais e eu estivesse o tempo todo ficando para trás. Meu único propósito em realizar aquele passeio matinal era poder explorar a fazenda com mais atenção. Estive por diversos momentos naquele ambiente, mas não o conhecia bem, a contar que entendia mal das atividades rurais.

As vacas comiam, aos poucos e tranquilamente, o capim fresco, enquanto eu sentei para descansar e sentir o vento bater timidamente no meu rosto compensando o efeito do sol quente.

João me levou para conhecer um pequeno riacho existente nas redondezas. Para isso tomamos a estrada de terra e pulamos duas cercas. Decidi não me molhar, mas coloquei os pés na água para senti-la gelada. Nosso passeio ficava cada vez mais agradável, entre minhas maiores surpresas da viagem estava João Clemente e sua capacidade em ser prestativo todos os momentos. Sempre que eu queria conhecer algum lugar, ele não hesitava e respondia “Vamos lá, eu posso te levar" ou se eu precisasse de algo, era como se já estivesse lendo minha mente e pronto para me ajudar. Já me sentia sem jeito por não saber retribuir tamanha hospitalidade. Minhas impressões sobre o garoto é que parecia ser simples, sem grandes vaidades ou ambições, preocupava-se muito com os outros e em suas conversas tinha a gentileza em perguntar se o assunto me agradava. Falava sobre a fazenda como seu porto seguro e a escola um centro de perturbação. Gostava de estudar mas odiava ter de conviver com alguns rapazes encrenqueiros que tomavam seu estilo sertanejo como chacota. Nunca lhe chamavam de João, mas “Vaqueiro” ou “Fazendeiro". Não entendi como alguém como ele pode ser tratado diferente em uma cidade de grande atividade rural. Mas conforme seus relatos revelavam mais de si, entendi que os outros meninos de sua idade moravam no centro e ainda eram jovens para desempenhar as atividades que ele, aos 17, executava com perfeição. Tornou-se o preferido de Miguel ao revelar sua capacidade pró ativa e desenvoltura ao lidar com animais. Entendi que espelhava-se muito em meu tio, talvez como o pai que não tinha. Percebia que cultivava alguns gestos, postura e expressões perfeitamente iguais as do patrão, o que para mim era curioso

Ao fim da caminhada, meu estômago sentia-se leve e uma pontada de fome ameaçava surgir. Outro desejo era ir até o quarto e encher Cauã de beijos até que ele despertasse com seu sorriso angelical.

Voltavamos pela estradinha de terra. João seguia com a égua ao lado, segurando-a pela correia. Conversávamos sobre nossa divergência de costumes. O som de um automóvel nos alertou que alguém estava próximo. Não era comum haver carros por ali, muito menos naquela data, portanto advinhei quem estava por vir. Um gol preto parou próximo a nós, um som de rock nacional, um rapaz de óculos escuros, cabelos que desciam pela orelha e barba por fazer.

Leandro.

No banco do lado oposto titia Helena me desejou feliz 2007 com um sorriso singelo. Tentando ser frio para não dar liberdade a Leandro, retribui os votos somente a ela.

-Entra ai. Preciso que alguém me guie. -Disse Leandro, mascando um chiclete.

- O caminho é um só. Basta seguir reto.

- Tem várias fazendas por aqui, não quero me perder.

-Desculpe, mas estou acompanhando meu amigo João.

Leandro virou para encarar João. Tirou os óculos e o fuzilou com seu olhar marrento.

-Imagina, que é isso!? Eu sigo com a égua, pode ir de carro tranquilo! -Disse João, preparando-se para montar no animal.

- Entra aí Johnny. - Insistiu tia Helena.

Jurei que estava fazendo aquilo apenas devido ao convite de Helena, e não era pretensão minha dar trela às armadilhas de Leandro.

Seguimos caminho adentro e não mais que três minutos chegamos à Fazenda Santiago. Fácil e descomplicado para quem viajou de Campinas à Lagoinha sem nenhum guia. Parando próximo ao casarão, ajudei titia a retirar uma enorme tigela de canjica. Na minha vez de sair do carro, percebi que as portas traseiras estavam travadas. Pedi que Leandro as abrisse. Ele recusou e sem mais explicações deu partida.

Inferno. O que aquele louco estava fazendo?

- Leandro, pare esse carro e me deixa sair!

- Não, nós vamos dar um giro. Depois te trago aqui de volta.

- Abre essa porra. - Eu disse, esmurrando a porta.

- Mas que merda é essa? Por que essa aversão a mim?

- Leandro, me deixa em paz. Não viu que eu não respondi nenhuma das suas mensagens? Eu não quero nada com você.

- Ah vamos lá. Uma fodinha não faz mal a ninguém.

- Eu estou falando sério, agora eu estou gostando de outro. Não quero mais nada contigo.

O carro corria pela estrada de terra novamente. Ao ouvir minha frase ele parou o Gol instantaneamente e voltou os olhos para mim.

- Quem ele é!?

- O que adianta eu dizer? Você não o conhece.

- Johnny, você não me engana. Anda, me diz o que tá pegando?

- Já falei o que tinha para falar. Não preciso dizer o nome dele.

Leandro tirou o cinto de segurança e ficou de joelhos no assento do carro.

- Poxa. Será ele é assim tão gostoso quanto eu? - Disse, alisando o peitoral cheio e descendo as mãos veiudas até o pacote, que ficava evidenciado dentro da calça jeans apertada.

Estava com medo do que ele faria nos instantes seguintes. Chutei os bancos do motorista com vontade de atingi-lo. Isso o irritou.

- Escute aqui viadinho. É melhor você fazer o que eu mandar. Você é minha puta. Só minha e de mais ninguém. Eu sou o único dono desse seu cuzinho.

- Seu louco, doente, psicopata! - Gritei, ansiando que alguém pudesse me ouvir.

- Tudo bem Johnny. Você não quer transar, tudo bem, não vou te obrigar. Mas lembre-se que ninguém nunca vai te foder como eu.

Para meu alívio Leandro fez o retorno e tomou o caminho da fazenda novamente.

- Outra coisa. Se eu pego esse teu namoradinho, ele vai ter que provar que é macho suficiente para me substituir.

Retornamos ao casarão. Tentei me recompor da sensação de pânico que havia sentido. A trava da porta traseira foi liberada. Finalmente eu estava livre daquele monstro. Porém me dei conta que outro problema me aguardava. Cauã esperava-nos de braços cruzados do lado de fora. Tinha cara de poucos amigos e logo entendi que me ver com Leandro o deixava extremamente irritado. Colocou-se ao meu lado, trocando olhares furiosos com seu desprezível primo.

-Por que saiu sem me avisar? - Disse a mim.

- Desculpe, eu fui dar uma volta com João e…

- Ah, agora saquei tudo. - interrompeu Leandro. - Bem que eu desconfiava de você, leite azedo.

-Como é? - Cauã fechou o punho, segurei seus braços para impedir que batesse de frente com Leandro.

A tragédia era iminente. Uma gota de suor escorreu da minha testa. Precisava ser uma muralha capaz de separá-los.

-Ele não tem nada haver com isso, fica na sua. -Me coloquei entre os dois.

- Sempre soube que essa mariquinha gostava da coisa.

Leandro conseguia ser contraditório a ponto de empregar alcunhas vergonhosas a Cauã, sendo tão homossexual quanto ele. Carregava consigo o discurso preconceituoso social habitual.

Eu conseguia sentir a raiva fumegar no corpo de Cauã. Segurei seus braços para que não tivesse nenhuma reação que desencadearia uma luta corporal.

-Por favor, ignora as provocações, ele só quer te tirar do sério. É a única intenção. -Implorei.

-O que o teu paizinho acha desse seu namorinho com o priminho, hein? Vai bancar casamento também? Vai ter que usar vestido de noiva?

Apliquei uma força sobre-humana para conter Cauã, ele esforçava-se em libertar seus braços fortes. Com um pouco mais de empenho ele poderia me jogar para o lado e atacar seu rival, mas entendi que me respeitava, apesar da vontade de brigar.

-O nervosinho quer brigar? Vem cá, garanto que não consegue aguentar o impacto. -Leandro cerrou a mão e forçou o bíceps deixando em evidência os músculos torneados.

-Maldito, eu vou te arrebentar. -Cauã gritou, chamando a atenção de tia Helena e Heloisa que saíram do casarão para presenciar a cena. - Porra John, me solta, eu quero arrebentar esse infeliz. -Sua voz mudava para um tom enfurecido.

-Cauã, por tudo o que é mais sagrado, não deixa ele te afetar. -Berrei.

-É o seu sonho, não é? Ter dois machinhos brigando por você. Vai me dar meu cuzinho como recompensa depois? - Ironizou. Agora eu tinha vontade de deixar de impedir o conflito para entrar nele e socar a cara daquele estúpido.

Tia Helena gritou para que Leandro parasse com as provocações. Um pouco depois disso, Cauã aplicou toda sua força a fim de se desprender de mim. Meus braços não eram fortes suficiente para conter a fúria que o nervosismo tinha desencadeado, e o que aconteceu depois foi muito rápido. Meu namorado correu até o inimigo, com os punhos prontos para combate, mas o adversário foi mais ágil, baixo, sujo e o acertou com um soco certeiro no olho. O impacto surdo seguido do desmaio de Cauã me assustou. Leandro partiu para ataca-lo no chão, desacordado. Era como se aquela pancada tivesse ferido a mim também, e não iria se repetir, ainda que custasse minha vida. Ninguém iria ferir o cara que eu amava na minha presença.

Me joguei na frente dos socos desferidos e um deles acertou meu estômago em cheio. Ao mesmo tempo Helena se envolveu na briga e João Clemente desceu da égua para ajudar a tirar aquele monstro de cima de mim.

Apesar da falta de ar combinada a vontade de vomitar, ignorei minha dor e concentrei meus esforços em tentar reanimar Cauã. Consegui ficar próximo dele por pouco tempo, até que Sérgio chegou e tomou conta de todo corpo do filho.

Ao perceber que a situação poderia o prejudicar seriamente, Leandro escapou dos braços de João e correu para o carro, fazendo manobras desajeitadas com a finalidade de se locomover mais rápido. As pessoas gritavam ao meu redor, tentei me levantar apesar da dor lancinante. Desabei de uma vez e vomitei uma mistura das minhas últimas refeições.

...

João e papai me colocaram no carro apesar de eu já estar me sentindo melhor. A única preocupação que tinha é saber o estado de Cauã. Sérgio e Eliane fizeram um escarcéu e o levaram ao hospital às pressas.

João Clemente guiou papai até o hospital público de Lagoinha. Eu já não sentia necessidade de ser atendido apesar de ter reagido com vômito após o golpe. Demos entrada no pronto socorro e um médico analisou um hematoma que surgia na minha barriga.

-O que aconteceu com seu abdômen? -Perguntou o homem, ajeitando os óculos e esforçando a visão para analisar meu estado.

- Me envolvi em uma briga e fui agredido.

-Desculpe a intromissão, mas parece ter sido uma agressão feia. - O médico arqueou a sobrancelha e observou.

- E foi. Eu não esperava esse comportamento do Leandro. Agiu como um animal.

- Desentendimento familiar? -Adivinhou o homem.

-Sim, isso mesmo. -Disse Mariza, séria e preocupada.

- Aconselho que façam um boletim de ocorrência. Às vezes os desentendimentos se prolongam. É importante registrar queixa.

-Claro que sim, pode ter certeza, nós iremos. -Ela disse, alisando meus braços.

A atitude de Leandro o fazia merecer meu desprezo, meus pais conversaram sobre denunciar a agressão depois que saí do consultório com uma receita de remédio para caso houvesse dor. Eles me perguntaram mais de uma vez qual conflito teria motivado o incidente e apenas aleguei a antipatia entre os dois, algo que não deixava de ser verdade.

Encontramos João e a família de Cauã na sala de espera do hospital, desesperado, perguntei informações sobre o seu estado mas ninguém sabia informar. Ele havia recobrado a consciência no caminho do hospital, mas o ferimento no olho era sério.

Aflito, me sentei com eles e iniciei uma oração interna pedindo a Deus que cuidasse do meu amor. João me dava apoio, dizendo que tudo ficaria bem.

Por volta de meia hora depois, Eliane retornou do pronto socorro e pediu que Sérgio fosse ver Cauã. Apenas um familiar por vez poderia ficar com ele. O irmão Renan entrou depois do pai, e quase sem aguentar mais pedi para ser o próximo a entrar. Eles consentiram.

Um aperto desconfortável comprimiu meu peito ao ver meu namorado com o olho esquerdo enfaixado. Descansava sob a maca, sonolento. Me aproximei e seu olho saudável abriu instantaneamente.

-Finalmente você veio! Pedi à minha mãe que mandasse você vir logo.

- Acho que ela não deu o recado.

Rimos.

- Aquele infeliz te machucou?

- Um pouco.

- Onde?

- No estômago

- Me mostra.

- Não precisa, já não sinto mais nada.

- Mas eu quero ver. Anda Johnny, levanta a camisa!

Mostrei meu abdômen avermelhado e achei que ele fosse chorar vendo a marca.

-Juro por Deus que vou fazer ele pagar por isso. Pode até me machucar, mas você nunca! - Prometeu, raivoso.

...

Conversamos mais uns minutos até os médicos me pedirem para chamar o responsável por Cauã, pois deveria assinar a alta.

Retornei à sala de espera e passei o recado para Eliane. Enquanto esperávamos o momento da liberação, Sérgio conversou comigo.

- Muito obrigado garoto. Eu vi o que fez e foi corajoso se jogando na frente dele.

- Não precisa agradecer, gosto muito de Cauã.

Não aguardava aquelas palavras, de qualquer jeito elas me alegraram. Talvez fosse o início de algo que eu viria a necessitar muito dali em diante: aceitação.

...

Desculpem o atraso na postagem desse capítulo. Meu computador me deixou na mão e enfrentei algumas dificuldades para escrever e postar. Pretendo não prejudicar as próximas postagens.

Agradeço aos leitores que vierem a dedicar um tempo para realizar a leitura, e gosto de receber críticas de toda natureza (me refiro as construtivas), então, não deixe de comentar o texto, isso é muito importante para mim.

Também disponibilizei o texto no Wattpad, que proporciona uma leitura mais confortável, não deixarei o link pois o site Casa dos Contos Eróticos pode o censurar. Busquem por "Os Primos (Romance Gay)".

Obrigado a todos!

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Comentários

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Essa história é verídica???Está ótima!!!Continue, plis!Não sei, esse capataz João, está bem intimo! Estou desconfiado, de que ele não será apenas 'coadjuvante'

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Esse Leandro será um grande problema, assim como Diana...

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Simplesmente fantástico... Cara continua pelo amord

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TUDO ISSO PODERIA SER EVITADO SE VC TIVESSE CABEÇA E NÃO FICASSE SEMPRE CEDENDO AOS OUTROS. TEM QUE TER VOZ ATIVA. OU VAI CAUSAR MAIS SOFRIMENTOS EM MAIS PESSOAS. VAMOS CONTE LOGO PRA TODOS QUE AMA O CAUÃ. OU VAI SER FRACO A VIDA TODA E APANHAR? VC MERECEU ESSE SOCO NO ESTÔMAGO. POBRE DO CAUÃ NÃO. APESAR DE NÃO ME SIMPATIZAR MUITO COM ELE.

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