Os Primos (Capítulo 13)

Um conto erótico de RafaelQS
Categoria: Homossexual
Contém 2113 palavras
Data: 10/04/2017 01:42:17

As horas se desfaziam lentamente no relógio. Não poderia fazer outra coisa além de me conformar com os fatos e aguardar a sentença. Medo e insegurança são inimigos nessas horas, e faziam-me fraquejar, e por diversas vezes andar até o telefone e ligar para Cauã. Seu celular encontrava-se em caixa postal, isso aumentava minha apreensão. Segurei o telefone fixo em minhas mãos e disquei seu número, mas antes do primeiro toque interrompi a ligação. Descobri que não tinha coragem suficiente para completar a chamada e encarar tia Eliane ou Sérgio, ou pior, descobrir como teriam punido meu namorado.

Provavelmente ele seria transferido de colégio, proibido de conversar comigo, cercado e vigiado 24 horas por dia pelos pais. No fundo eu cultivava a esperança de que nenhum obstáculo iria nos separar, encontraríamos meios de nos ver e driblar qualquer castigo. Por Cauã eu enfrentaria o mundo e esperava a mesma disposição da parte dele.

Assisti televisão com meus pais até às onze da noite. Desde o jantar mamãe, percebendo minha preocupação, me enchia de perguntas acerca do que se passava comigo. Acreditava que talvez fosse resultado do trauma com o incidente de Leandro, por isso aconselhava-me a distrair a mente e não permitir que o acontecimento me afetasse.

Por volta da meia noite, quando só restava apenas eu e a TV ligados, fui para o quarto dormir, ou ao menos tentar, sabia que aquela noite seria longa e muitos pensamentos viriam atormentar-me. Antes de descansar a cabeça no travesseiro contemplei algumas fotos que havíamos tirado no réveillon em Lagoinha. Tinha o hábito de ver e rever meus álbuns todas as noites, eles me banhavam com energia positiva e me recordavam de que a vida é e pode ser bonita.

Deitado, peguei no sono algumas horas depois, sem contar o tempo exato que estive acordado. Num intervalo que eu acreditei ser de quarenta minutos dormi mal, tive um pesadelo, aqueles que nos faz sentir dor. Ele fora interrompido pelo toque do meu celular. Pulei da cama e corri disparado até a cômoda a fim de buscar o aparelho.

- Cauã!?

- Oi. – Um sussurro.

- Como você está? O que aconteceu?

- Péssimo.

A voz de Cauã mantinha um tom quase incompreensível.

-Você pode falar mais alto?

- Não. Meus pais estão dormindo e se eles descobrem que estou falando com você, tudo vai piorar.

- Tudo bem. Mas me diz o que está acontecendo!

- Depois que você foi embora minha mãe começou a gritar feito uma descontrolada. A princípio meu pai não entendeu absolutamente nada, mas ela explicou detalhe por detalhe tudo o que Diana havia contado a ela. E claro, aquela garota desgraçada aumentou a história. Disse que estávamos nos exibindo para todo o colégio como casal de namorados. Contou que eu sustentava uma relação com ela e por trás a traia com você, depois de nos assumirmos, ela passou a ser humilhada por todo mundo.

Não conseguia imaginar até que ponto chegaria a crueldade de Diana.

- Tentei desmentir, falei sobre a calúnia do jornalzinho criado por ela para nos difamar, mas ninguém deu razão. Meu pai demorou até se convencer e em determinado momento explodiu. Eu apanhei feito um cão, sem poder revidar, enquanto mamãe me olhava gritar. Ele disse milhares de injúrias. Enfatizou que preferia me ver morto ao invés de gay. A única maneira de eu fazê-lo parar de me agredir foi jurar de joelhos minha heterossexualidade. Papai falou que iria se certificar da minha relação com você e nos afastar o quanto antes.

- O que isso significa? – Falei alto e apreensivo.

- Significa que amanhã pela manhã estarei viajando para o Rio de Janeiro. – Ele choramingava muito ao mesmo passo que tentava abafar a voz. – Terei de concluir meus estudos lá, na casa de um dos meus tios. John, por diversas vezes essa noite eu pensei em colocar todas as minhas roupas em uma mala e fugir de casa. Mas ele é determinado, nunca me deixaria viver contigo. Faria um inferno sob mim. A única saída que encontro é viajar, e lá no Rio ajeitar a minha vida e arrumar um jeito de voltar para cá de forma independente, mesmo que isso demore.

- Não, você não pode ir! Tem que resistir. Seus pais não tem o direito de fazer isso com você!

- Infelizmente não me restam escolhas.

- Por tudo o que é mais sagrado, arrume as suas coisas, eu peço para o meu pai te buscar aí, eu tenho certeza que ele vai nos ajudar.

- Não adianta Johnny, nós precisamos ser realistas. Não existe uma maneira de driblar esse infortúnio. Seus pais não tem a obrigação de me sustentar e de qualquer jeito isso terminaria em muita intriga.

- Eu não quero que você vá. Por favor, meu amor, diga a eles o quanto vai se comportar, negue qualquer envolvimento comigo, faça alguma coisa mas não deixe te levarem pra longe daqui!

- É tarde demais. Eles perderam a confiança em mim. Eu estava preparado para isso, acredito em uma reação diferente se eu tivesse contado os fatos sem a intromissão de Diana. Talvez ele não teria me obrigado a deixar Campinas.

- Eu vou me vingar daquela desgraçada! – Jurei.

- Não Johnny, não faça isso! Não entre nos jogos dela, não se rebaixe, eu me sinto muito mal por nunca ter te ouvido. Você sempre me avisou que ela era perigosa e eu não dei a atenção devida.

- Deixa isso para lá amor. Agora só você me interessa. Não há problema maior que meu amor, precisamos acreditar na resolução das coisas.

- Estou perdendo a fé. Escute, tenho de desligar agora, estou usando o telefone fixo, meu pai confiscou meu celular e quebrou meu chip. Com certeza não terei outro número tão cedo. Por hora esse será nosso último contato.

- Por hora, não para sempre. Sabe, aconteça o que acontecer, eu jamais deixarei de acreditar na nossa felicidade, ouviu?

- Eu penso o mesmo. Acho que alguém acordou, preciso desligar.

- Eu te amo.

- Eu também te amo.

Fim da ligação. Meu coração estava frágil e quebrado como objeto de vidro estilhaçado em mil pedaços. Nenhuma tragédia poderia ser pior, privado de ver e estar próximo de Cauã destruía minha vontade de viver. Desesperado, levantei da cama para ir à cozinha buscar um copo de água. Mamãe e papai escutaram tudo o que eu havia dito, me esperavam atrás da porta ambos com os braços cruzados. Desolado, tive de contar o motivo da minha crise de choro.

Eles concordaram comigo. Os pais de Cauã tiveram a pior atitude possível, além de utilizar a agressão para punir o garoto.

- A humanidade vai se arrepender por tamanha injustiça, fracamente não consigo entender. – Disse Gregório, alisando minha nuca. – É desumano, não é atitude de pai.

- Não podemos fazer nada? – Perguntei, desejando que pudessem intervir na situação.

- Infelizmente não muito. – Respondeu mamãe. – Vou ligar para Eliane pela manhã. Se não dermos jeito, seu pai te leva para a casa do Cauã antes que ele viaje.

Cai no choro, inconformado por ter de lidar com aquela realidade. Por que as coisas deveriam ser assim? Não tive a oportunidade de me despedir devidamente e em tão pouco tempo as coisas mudavam absurdamente.

...

A madrugada arrastada reforçou a ansiedade em mim. Sem um pingo de sono fui para a cozinha as seis da manhã tomar café. Logo, meus pais vieram. Pedi para apressarem nossa ida à casa de Cauã pois não sabia o horário da viagem e nunca me perdoaria se ele partisse sem ter a oportunidade de vê-lo mais uma vez.

Mamãe ligou para Eliane e não obteve sucesso, tanto o telefone residencial quanto o celular não foram atendidos. Pegamos a estrada, Gregório dirigiu o mais rápido que pôde. A tensão era enorme e aparecia no rosto de cada um naquele veículo. Mamãe roía as unhas, apreensiva.

Em pouco tempo chegamos ao destino. Tocamos a campainha inúmeras vezes, gritamos, batemos palmas. Ninguém nos atendeu. Não nos demos por vencidos, disse ao meus pais que ficaria por ali a manhã inteira se fosse necessário e eles concordaram em permanecer comigo.

Quase duas horas de espera foram necessárias. O portão elétrico abriu-se e um carro saiu, apressado. Tinha de agir logo ou eles iriam embora sem dar-me a chance de vê-lo novamente. Sem muito pensar, me joguei em frente ao carro e pedi para parar. Sérgio tocou a buzina e ameaçou acelerar. Meu pai foi até à janela e pediu para que a abrissem. Desejo concedido.

- Ele precisa ver o primo. Não estamos aqui para te impedir de levar Cauã, meu filho só quer ter a oportunidade dizer adeus.

- Escuta aqui, o teu filho perverteu o meu. Cauã andava bem até começar a se juntar com o Johnny. Toda essa palhaçada envolvendo o Leandro foi culpa do seu filho. Estava indo tudo muito bem, meu filho tinha uma namorada, planos para seguir uma vida bonita e tranquila, e do nada apareceu esse garoto para pôr tudo a perder. Saiba que Deus há de ser justo conosco, o castigo sempre vem!

Engraçado como esses machões nunca vão à igreja e muito menos se envolvem em assuntos religiosos no dia-a-dia, mas para condenar um homossexual tornam-se especialistas no assunto.

- Johnny, saia da frente ou ele vai te atropelar! – Gritou Cauã dentro do veículo, sua voz acendeu uma chama dentro de mim.

- Não, com meu filho ninguém mexe. – Interviu papai. – Anda, vamos resolver isso como homens sensatos, saia do carro!

Irritado, Sérgio tirou o cinto e abriu a porta, saindo rapidamente e ficando cara-a-cara com Gregório.

- Acho que deveria levar ele ao psicólogo.

- Meu filho não precisa de tratamento, só amor, isso é remédio para tudo e qualquer coisa. Inclusive para destruir posicionamentos ignorantes como o seu.

Cauã abriu a porta do carro e correu na minha direção. Nossos corpos chocaram-se em um abraço. Eliane também saiu e berrou algo em repreensão ao nosso comportamento. Desliguei o cérebro de tudo o que se passava ao redor. Era apenas eu, ele e nada além. Um aperto forte, cheio de lágrimas, dor, lamento.

- Volte para dentro, agora. – Interferiu Sérgio, puxando o braço de Cauã. – Já avisei, não irei tolerar esse tipo de coisa.

- Não. – Grudei no meu namorado, impedindo que o pai o carregasse para o veículo.

- Saia moleque, você já causou danos demais!

- Veja bem como fala com meu filho! – Repreendeu Gregório.

Mamãe discutia alto com tia Eliane, apontando em quantos pontos estava errada por repreender os instintos do filho. A vizinhança nos observavas, atenta, nas janelas e sacadas.

- Deixe eles se despedirem como quiserem, é a única coisa que peço.

Sérgio o largou. Abraçamo-nos novamente, e demos alguns beijos, ali, perante tudo e todos.

- Chegaaaaa! – Bradou Sérgio.

Nos separamos. Com os olhos encharcados eu disse as últimas palavras.

- Não vou desistir de lutar por você.

Cauã foi praticamente arrastado dali. O carro sumiu em poucos segundos rumo ao aeroporto. Meus pais me abraçaram e permanecemos um bom tempo assim.

...

Os dias seguintes foram dolorosos. Passava a maior parte do tempo deitado na cama, sem comer, dormir e até mesmo a ideia de levantar-me para ir ao banheiro me desanimava. Sentia saudades dele o tempo inteiro, e meu interior torturava o coração quando pensava na distância entre nós. Aguardava ansiosamente um telefonema, mensagem, notícia.... Isso não veio, nem mesmo com o tempo.

A escola se transformou em um lugar insuportável. Os outros alunos caçoavam de Mariana e eu todos os dias. Perdemos todo o respeito que tínhamos, e quando reclamamos na diretoria, ninguém levou nosso caso com seriedade. Nos intervalos, Diana debochava de minha tristeza com um sorriso no rosto de orelha a orelha, orgulhosa por seu xeque-mate.

Mergulhei em um abismo profundo. Nada animava meus dias e a única expectativa que mantinha viva em meu coração era poder vê-lo novamente ou ao menos ouvir a voz doce e melodiosa. Tinha pesadelos nas madrugas e pedia a Deus em fervorosas orações que trouxesse meu amor de volta. As preces pareciam demasiadamente complicadas pois anos se passaram e não obtive qualquer contato com Cauã.

Infelizmente nossa história tivera um fim doloroso.

...

ATENÇÃO.

O próximo capítulo marca o inicio de um novo ciclo da história. Inicialmente "Os Primos" ganharia apenas treze capítulos, porém me senti muito inspirado em estender a trama. A nova etapa será intitulada "Os Primos: O Casamento". Aguardem!

Agradeço aos leitores que vierem a dedicar um tempo para realizar a leitura, e gosto de receber críticas de toda natureza (me refiro as construtivas), então, não deixe de comentar o texto, isso é muito importante para mim.

Também disponibilizei o texto no Wattpad, que proporciona uma leitura mais confortável, não deixarei o link pois o site Casa dos Contos Eróticos pode o censurar. Busquem no GOOGLE por "Os Primos (Romance Gay)".

Obrigado a todos!

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Comentários

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A história não acabou Ar123, aguarde mais capítulos ;)

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Vem que o autor poderia contar em um capítulo especial o que aconteceu esse tempo todo em que o Cauã passou no Rio

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O Cauã não cumpriu sua palavra e conheceu alguem por lá e vai se casar!

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