Chega de CEO - Capítulo Sete

Da série Chega de CEO
Um conto erótico de KaMander
Categoria: Gay
Contém 6011 palavras
Data: 07/05/2023 23:46:58
Última revisão: 11/03/2024 03:10:27
Assuntos: Gay, Homossexual, jantar

CAPÍTULO SETE

“NINGUÉM AGUENTA MAIS INSEGURANÇA”

Ao entrar no saguão daquele hotel, que ficava a uns dez minutos do apartamento de Thomas, cheguei a pensar que me hospedaria num quarto comum, só para passar o tempo. Estava esquecido que, em se tratando de Thomas, nada poderia ser normal, muito menos simples. O homem era expert em elevar qualquer coisinha a uma grandiosidade irritante.

O quarto presidencial estava reservado em meu nome, com a diária completa já paga, incluindo todas as refeições. O meu queixo caiu quando uma funcionária soltou a informação, mas não falei nada, sequer fiz objeções, como tanto gostaria. Aquela agonia passaria logo e Thomas pararia, definitivamente, de gastar dinheiro comigo.

Seu Lineu conferiu se eu ficaria bem e, diante de minha confirmação, foi embora alertando que entraria em contato assim que as vias da cidade fossem liberadas. Agradeci, meio constrangido, passando um tempo parada diante do elevador depois que preenchi uma ficha na recepção.

Fiquei desnorteado quando subi até o último andar e, usando uma chave eletrônica bem moderna, adentrei o tal quarto. Era enorme, luxuoso e bem-decorado em tons claros, do jeito que gente como Thomas exigiria.

— O que ele tem com coberturas? — sussurrei para mim mesmo. Eu me tranquei e caminhei até a ampla varanda, cuja porta de vidro estava fechada porque ainda chovia pra cacete. — Merda.

O céu enegrecido pelas nuvens carregadas me trazia desconforto, bem como o fato de eu ainda estar usando roupas da noite anterior, mesmo que limpas. O cheiro dele havia se impregnado em mim de forma desastrosa.

Aspirar aquele odor me trazia recordações da noite anterior e da foda deliciosa de mais cedo. Por mais que eu estivesse meio dolorido e cansado, seria capaz de repetir a dose. O meu corpo ainda não entendia que tudo havia acabado definitivamente.

Achei um roupão grande e branco dobrado sobre a enorme cama. Decidi ficar apenas com ele e a cueca, assim esperaria confortavelmente pelo fim da tempestade. Apesar de ter uma TV enorme com vários canais disponíveis, não estava a fim de assistir ou fazer nada.

Precisava pensar.

Não me sentia bem com minhas próprias atitudes e, apesar de ter inúmeras explicações diferentes e relevantes, ainda assim sentia que estava me enganando.

Peguei o meu celular e, conectando no Wi-Fi do hotel, pesquisei o nome que não saía da minha cabeça: Deborah Orsini.

O resultado foi imediato. Logo encontrei inúmeras fotos de uma mulher linda, morena e de olhos azuis, que aparentava seus cinquenta anos. Ela possuía uma ONG em defesa de animais abandonados e vivia arrecadando fundos com festas, jantares e os mais elegantes eventos beneficentes, pois, pelo visto, também era uma socialite bem conhecida no cenário social.

Eu nunca tinha ouvido falar dela.

E, por fim, descobri que Deborah era irmã de Othon Orsini, o pai do Thomas. Se eu já o considerava o todo-poderoso era porque ainda não tinha pesquisado sobre o seu pai. O senhor de quase setenta anos era dono do Grupo Orsini, que continha uma cadeia enorme com dezenas de empresas nos mais variados ramos. Era um dos empresários mais importantes do Brasil e no último ano havia conquistado o seu décimo bilhão.

BILHÃO. DÉCIMO. DEZ BILHÕES, PORRA.

— Puta que me pariu... — resmunguei, atônito com aquele montante absurdo. Ainda consegui achar um site que listava os bens da família um a um. Aviões, jatinhos, imóveis a perder de conta, espalhados pelo mundo todo. Eles eram podres de ricos, num nível que eu sequer conseguia mensurar. Ok, sempre soube que tinha muita grana ali, porém só tive certa dimensão naquele momento. — Filhinho de papai de uma figa.

Contudo, no fim das contas, continuei sem saber por que Thomas havia me mencionado para a sua tia. Estacionei o meu olhar em uma foto em que ambos posavam juntos, numa das tantas festas beneficentes de Deborah. Eles sorriam, animados, demonstrando certa intimidade um com o outro.

Aproveitei para pesquisar também sobre quem era a tal Bia, mencionada na ligação que ele fizera no escritório. Nada achei. Busquei por “filha de Thomas Orsini”, “sobrinha de Thomas Orsini” – o que não fazia sentido, pois ele era filho único, mas pesquisei assim mesmo –, “Beatriz Orsini”, “Bianca Orsini” e todas as combinações possíveis.

Não deu em nada. Só achei mais fotografias do próprio Thomas.

Encarar o rosto sorridente dele não me fez muito bem, por isso larguei o celular sobre o colchão e me deitei, com as mãos apoiando a cabeça. Aquela gente não tinha nada a ver comigo e continuariam sendo pessoas que achei que existissem apenas em histórias fictícias.

O meu celular apitou ao lado e o coração disparou no mesmo instante. Eu devia ter ficado louco ou, sei lá, ter tomado chá de pica do Thomas, porque sinceramente pensei que era alguma mensagem dele. No entanto, era apenas a Elisa perguntando se poderíamos nos encontrar no refeitório para almoçarmos juntos. A coitada jurava que eu estava na InterOrsini, num dia comum de trabalho.

Suspirei profundamente, ciente de que eu já havia escondido a história com o chefe por muito tempo. Ela merecia saber a verdade e eu precisava, com urgência, desabafar. Quem sabe assim pudesse entender o que estava se passando comigo?

Mandei uma mensagem perguntando se podia ligar para ela. Elisa devia ter estranhado, já que sempre odiei telefonemas, porém informou que ela mesma me ligaria assim que pudesse. Esperei cerca de dez minutos, olhando para o teto e sem compreender o que eu estava fazendo ali, até que a minha amiga, enfim, ligou.

— Oi, gay, onde você está? — foi logo perguntando.

— Minha filha, esteja onde estiver, preciso que fique sentada. Vou te contar uma história de cair o queixo!

Ela soltou uma gargalhada bem animada.

— E não pode ser pessoalmente?

— Infelizmente, não. Está sentada?

— Acabei de chegar ao refeitório.

— Pois bem. Se prepare!

Comecei a narrar toda a situação desde o princípio, ou seja, desde a maldita festa da empresa e o beijo roubado na frente daquela escultura feia. Contei a respeito do cerco fechado ao meu redor, dos presentes, da promoção, enfim, cada detalhe não passou despercebido.

No começo Elisa ficou meio cética, e eu não a culpava por isso, mas depois que entendeu que era tudo verdade, veio a total empolgação. Como previsto, me fez milhões de perguntas e fui respondendo uma a uma. Até que, por fim, contei tudo o que houve naquela manhã; desde o sexo maravilhoso até a pequena briga e a constrangedora despedida.

— Meu Deus do céu, então você está no hotel agora? — questionou em um tom exasperado. Ela estava tão empolgada que precisei buscar paciência para abaixar as suas expectativas.

— Estou! — falei em tom de choramingo. — Uma diária que deve custar mais que um salário mínimo. Não tenho jeito nenhum pra ficar aqui.

— Ora, deixa disso, eu concordo com o Thomas, você merece ser mimado!

— Elisa, não começa. Ser mimado é uma coisa, ser manipulado e controlado é outra totalmente diferente! Eu ainda nem acredito que tudo isso está acontecendo na minha vida. Parece inacreditável!

— Imagino, eu custei a crer que você estava falando sério! — Elisa riu feito uma boba. Com certeza não estava no mesmo clima que eu. — Caraca, Bru, isso é... — e diminuiu a voz consideravelmente, para não ser ouvida — incrível! Você deu para Thomas Orsini. Thomas Orsini, o abridor de cuzinhos!

— Pois é... E dei foi logo tudo, amigo — entrei na onda, mas me sentindo péssimo por dentro. — Todos os buracos. E se aquele pauzão coubesse nos ouvidos eu tinha dado também.

Elisa riu alto, entrando em crise.

— É grande mesmo?

— Nível filme pornô. Com as veias sobressalentes e tudo.

— Puta merda, que delícia! E o que você está fazendo nesse hotel, afinal? Eu não entendi nada dessa parte. Na verdade o que ficou foi que o homem queria passar o dia contigo e você, chato pra caralho, não quis!

— Aí é que está, Elisa. Eu não quero mesmo. — Ignorei a ofensa ao meu respeito porque, apesar de tudo, considerava-me apenas prudente demais. No entanto, se não querer entrar numa furada daquelas era ser chato, então ok, eu era mesmo! Será possível que só eu enxergava perigo naquela história?

Depois de ter dito não várias vezes ele ainda insistia e vinha falando coisas melosas para alguém que mal conhecia? Não... Tudo bem que aproveitei a noite, que foi bom, que foi MARAVILHOSO estar com ele, mas Thomas me dava medo e ser quem ele era não lhe dava direitos sobre minhas escolhas.

— Mas por que você não quer, amigo? Ah, não, seja sincero! Você quer, não quer? O homem é lindo, rico, bem-dotado, o que mais te falta, seu Bruno?

Elisa era do time das iludidas que achavam que aqueles três fatores eram primordiais. No fundo ela se encantava por caras que a protegiam, que a dominassem e agissem como se fossem seu pai. Ela via no excesso de ciúme uma prova de amor. E via no controle algo natural, do instinto masculino. Eu revirava os olhos só de pensar naquilo e me entristecia em saber que muitas pessoas pensavam assim.

A minha visão de homem ideal era outra. Não queria ser protegido, controlado, solucionado, vigiado. Eu me amava e amava a minha vida. Se fosse para ter alguém, que a pessoa apenas me transbordasse, porque completo eu já era.

— Respeito? — falei, sem emoção. — Alguém que não me controle ou manipule? Alguém que não precise mover mundos e fundos pra fazer coisas simples? Eu sou uma pessoa humilde, Elisa.

— Mas ele te desrespeitou?

O seu questionamento me deixou mudo e reflexivo.

— Bem... Mais ou menos. Ele virou a minha vida pelo avesso ao seu bel prazer. Thomas jura que pode fazer o que quiser com as pessoas e está tudo certo. Pra mim isso é um desrespeito a outro ser humano.

— Sabe o que eu acho, Bruno, sinceramente?

Soltei um longo suspiro, virando-me de lado no colchão.

— O quê?

— Eu até entendo o que você diz, mas, cara, vocês nem se conhecem ainda! Pelo que me falou, você nem deixou que isso acontecesse.

— Não deixei mesmo, pelos motivos que enumerei. Thomas é muito inteligente e educado, mas tem umas coisas que ele fala que são bastante duvidosas. Não confio.

— Bru, podia dar supererrado, mas também podia dar supercerto. Com qualquer pessoa é assim, seja o chefe ou o peão — Elisa usou um timbre muito sério naquele instante, o que me fez permanecer atenta. — Você vive me contando as merdas que os caras com quem você sai falam e mesmo assim não os julga tanto quanto agora.

— Eu só estou com medo, Elisa — desabafei, honestamente, meio sem graça. — Não quero arriscar. — O ruim de falar as coisas para alguém é ter que ouvir de volta paradas que talvez você não esteja preparada ou não queira escutar. — Ele é de um mundo totalmente diferente do meu, além de ser o chefe. Pensa comigo, Thomas tem 29 anos e um império bilionário para administrar. Eu tenho 31 anos e dor nas costas. — Ouvi seu riso do outro lado da linha. — Não dá pra prosseguir com tantos alertas me dizendo que vai dar merda.

— Isso tudo é você se autosabotando.

— Hã? — Parei, deitando-me de frente na cama e com uma expressão desconfiada.

— Fala a verdade, amigo, você quer esse homem. Só acha que não vai dar conta dele e fica levando qualquer suspiro que ele dá de forma mais pessimista possível.

— Não é isso... — sussurrei. — Ou talvez seja exatamente isso. — As palavras da Elisa deram um estalo na minha cabeça. Ao longo da vida, sempre sabotei possíveis relacionamentos que tinham tudo para dar certo. Fiz péssimas escolhas por achar que merecia menos. E também vivia me autosabotando, com sentimentos de menos valia, autoestima baixa... Será que tudo aquilo ainda era resquício do meu passado traumatizante? — De qualquer forma, fico pensando nos contatinhos que ele tem, nas viagens que faz e na vida que leva. Só dor de cabeça! Imagina se, sei lá, a gente resolvesse namorar? Eu ia precisar andar com um guindaste pra carregar a mim e aos meus chifres. Não, não quero!

Elisa começou a rir e fiquei sem entender. Minha vontade era de chorar.

— Ah, eu finalmente estou percebendo que você é um cara normal, com todas as inseguranças que essa merda de sociedade faz a gente ter. — Acho que minha amiga se animou porque ela nunca entendeu direito como eu poderia ser tão seguro e confiante, enquanto ela, coitada, penava para fazer qualquer coisa, sempre pensando no que os outros iriam achar. — E quem disse que ele automaticamente vai te trair, Bruno? Aliás, você está colocando todos os bois na frente da carroça. A ideia não era só conhecê-lo? Porque está insistindo num futuro que talvez nem chegue a acontecer?

— Não sei. Do jeito que Thomas falou parecia até querer algo mais e simplesmente não estou pronto.

— Mas por que não?

Aquela era a pergunta de um milhão de dólares. Eu não sabia direito respondê-la, mas com certeza fazia parte dos traumas que carregava e estava cada segundo mais ciente da força que a merda do passado ainda possuía sobre mim.

— Eu quero parar de pensar nisso, sabe? — desconversei, suspirando. — Até porque não adianta mais. Já demos adeus.

Soltei mais um suspiro cansado. A minha amiga tinha razão, eu me sentia inseguro desde o começo. No fim das contas, fui embora por causa da porcaria da falta de confiança. No fundo eu achava que Thomas era demais para mim. Mais bonito, mais inteligente, mais rico, mais tudo... E me sentir pequeno era uma merda. Eu não queria estar com alguém que me fizesse sentir inferior. Mas entendia que a culpa não era dele quanto aquilo, apenas minha.

Porque eu devia me dar mais crédito. Eu tinha me prometido isso.

Por outro lado, claro que Thomas também tinha sua enorme parcela de culpa em meu discernimento ao seu respeito, já que tinha claramente tentado me manipular e falou umas merdas que ainda estavam entaladas na garganta. Mas minha agressividade, meu pé atrás, as recusas imediatas, sem qualquer pensamento sobre uma possível chance...

Havia problemas em nós dois.

— Algo me diz que essa história está longe de acabar — Elisa prosseguiu e, mesmo sem vê-la, pude notar que estava sorrindo. — Você fazendo cosplay de Elizabeth Bennet, em Orgulho e Preconceito, todo orgulhoso pra cima do homem, e ele, um Senhor Darcy que falou uma merda fora de hora, mas que na verdade é um doce... Sei não, viu?

Minha amiga às vezes achava que a vida real era um romance de época.

— Elisa, não estamos num romance versão gay de Jane Austen, que nem beijo tem. Você ouviu quando falei que dei tudo? E Thomas não é um doce, eu acho.

— Bru, o cara é padrinho direto de mais de cinquenta creches e participa de centenas de ações para salvar os animais, sem contar todo o histórico filantrópico. Claro que ele é um doce.

Suspirei, recordando-me de algumas matérias que li e sabendo que Elisa estava correta nas informações. Ao menos o todo-poderoso compartilhava de seu rico dinheiro com os necessitados.

— Não sei, e também não importa mais.

— Pra mim esse rolo de vocês terá muito pano pra manga! — ela riu, toda contente, enquanto eu apenas suspirava.

— Por mim já foi encerrado. Como ele, não volto atrás.

— Dois teimosos. Pois eu torço para que o destino não dê brecha pra tanta teimosia e orgulho.

— Não é teimosia, sei lá... Só procuro melhorar para que na próxima oportunidade, com outro alguém, eu não caia no mesmo vacilo. Preciso entender que mereço tudo. A gente merece o que e quem a gente quiser, certo?

Elisa fez um muxoxo, soltando uma voz bem fraquinha:

— É isso.

— Ei, o que foi? Problemas com o maridão? — sondei, já meio aflito. Eu queria tanto que a minha amiga entendesse algumas coisas. Ninguém é confiante e seguro o tempo inteiro, mas tudo tem limite. Aquele casamento, por exemplo, estava uma bosta e só ela não tinha compreendido.

— Não estamos nos falando direito desde o dia da festa.

— Sério? Por quê?

Ela começou a narrar que o sujeito achou ruim o fato de receber reclamação por ter chegado cedo para buscá-la. Passou a semana inteira de cara feia e a ignorando totalmente só por causa de uma besteira daquelas. Ainda tentei argumentar um pouco, com cautela, porque Elisa o amava muito e não enxergava o que estava diante de seu nariz. Ele era mais um dos machos abusivos que me davam nojo.

Era daquele tipo de homem que eu queria correr longe e que talvez, muito talvez mesmo, fosse o caso do Thomas. Ele respeitaria minhas saídas com amigos? Respeitaria a minha individualidade? Como reagiria quanto aos ciúmes? Seria fiel?

Eram tantas objeções que fiquei aliviado por ter caído fora. Diante de todo o cenário, ainda que por motivos mais complexos, foi bom ter dado um basta em tudo o que tivesse a ver com o CEO.

“NINGUÉM AGUENTA MAIS P.A.”

Confesso que esperei por uma mensagem do Thomas. Não achava que ele voltaria atrás feito um cachorrinho sem a menor opinião, mas que pelo menos fosse perguntar como eu estava ou se precisava de alguma coisa. Contudo, nada aconteceu durante as horas que passei naquele hotel chique, por isso só me restou ficar um tempão na banheira de hidromassagem, fingindo que minha vida era fácil, e depois assistindo aos filmes e programas que passaram na TV.

A tempestade se foi antes mesmo de anoitecer, mas Seu Lineu deixou uma mensagem alertando que, provavelmente, as estradas só seriam liberadas na manhã seguinte e que eu não devesse me preocupar. Eu estava de boa, mas minha mãe demorou a entender o que tinha acontecido, quando tentei explicar por telefone. A coitada estava achando que eu havia sido sequestrado ou algo assim, porém depois se acalmou, embora eu tivesse certeza de que ela só relaxaria no meu retorno.

Dormi maravilhosamente bem naquela cama imensa só para mim. Assim como o almoço e o jantar, recebi o desjejum no quarto mesmo e foi perfeito saborear um café da manhã delicioso enquanto observava os raios solares entrando pela varanda. O dia tinha nascido muito bonito, não havia nenhum sinal da chuva torrencial que caíra, e o clima se manteve fresco, um pouco friozinho, mas nada alarmante.

O motorista de Thomas Orsini estacionou em frente ao hotel pouco tempo depois de receber o meu aviso de que eu já estava pronto para ir. Fiquei ansioso, nervoso e agoniado porque jurava que o CEO estaria no carro junto comigo, mas não. Nenhum sinal dele. Seu Lineu não mencionou o chefe durante todo o percurso e eu também não teci qualquer comentário. Não valeria a pena buscar informações, sondar o paradeiro de Thomas e ficar pensando na maior variedade de besteiras depois.

Ao chegar a minha casa fui bombardeado com as perguntas de mamãe. Sabia que ela não descansaria enquanto não soubesse de tudo, por isso tratei logo de narrar o encontro com Thomas, claro, sem os detalhes quentes, mas deixei claro que eu não prosseguiria e contei também o fato de termos nos separado no dia anterior, além da conversa que tive com Elisa.

Ela ficou inconsolável.

— Como assim você abandonou o homem, Bruno? — sua voz desafinou consideravelmente. Ela me olhava com os olhos arregalados, como se não acreditasse. — Por quê?

— Mãe, eu já disse o porquê. Não vou ficar me repetindo — deitado no sofá, com as pernas apoiadas na mesa de centro, eu me mantive entediado e cansado de dizer coisas óbvias.

Por que ninguém me entendia?

— Pois eu concordo com essa sua amiga do trabalho. Você está inseguro e agiu como se fosse se casar com Thomas Orsini amanhã.

— Deus me free — balbuciei, mas mamãe ignorou:

— Custava conhecer o homem? Meu filho, você não gostou de tudo do encontro? Quer dizer, menos de voar no helicóptero.

Fiz cara feia pra ela. Não queria me lembrar daquela parte terrível e vergonhosa.

— Mãe... — levantei-me, esticando os braços. — Estou cansado do assunto. Agora já era, tenho que seguir em frente e me dedicar ao meu novo cargo.

Comecei a andar na direção do meu quarto, mas ela veio junto, com o semblante preocupado e incrédulo ao mesmo tempo.

— Você podia ligar pra ele ou mandar uma mensagem. Marque outro encontro! É a sua vez de tomar uma atitude, já que deixou o homem lá plantado.

Entrei no meu quarto e a encarei, com a maçaneta da porta em mãos. Queria ficar sozinho o mais depressa possível.

— Eu não vou tomar atitude nenhuma. E não se fala mais nisso, dona Délia.

A careta que ela fez poderia ser emoldurada e colocada na parede da sala, eu iria rir toda vez que a visualizasse. Porém, naquele instante só fechei a porta e me joguei na minha cama, no aconchego do meu quarto, um lugar que me pertencia e que eu sabia muito bem como lidar. Chega de ficar me sentindo perdido e vivendo num mundo que não era meu e onde eu sequer me encaixava.

Por mais que quisesse esquecer tudo o que houve, confesso que passei quase todo o fim de semana esperando por uma mensagem. Só eu sei quantas vezes abri a conversa entre mim e o Thomas, relendo tudo o que escrevemos um ao outro e mexendo nas redes sociais à procura de um sinal dele. O homem não fez nenhuma atualização. Mas, no domingo, quando tive a ideia de procurar por Deborah Orsini, achei o seu Instagram, que estava no modo público, e no dela havia várias fotos tiradas num evento que ocorrera na sexta à noite.

E que o Thomas havia ido.

Vê-lo ao lado dela e de outras pessoas bonitas me deixou com uma sensação ruim no peito. Eu não fazia ideia de que porra de evento tinha sido aquele, mas me pareceu divertido, a tirar pelo sorriso no rosto de todos, inclusive no dele.

Mas que merda, não é?

Eu me contive para não começar a seguir a Deborah e, de repente, Thomas ficar sabendo que andei bisbilhotando. Tentei não sentir nenhum arrependimento ou ficar pensando demais em tudo, por isso larguei o celular de lado, bem a tempo de vê-lo apitando com uma nova mensagem no Whatsapp.

O meu coração foi na boca.

Peguei o aparelho na maior pressa, mas era apenas uma mensagem do Márcio, o meu P.A. oficial, perguntando se eu estava a fim de “dar uma bem gostosa”. Nós éramos bem diretos um com o outro. Fazia mais ou menos uns oito meses que saíamos esporadicamente pra transar. Havíamos tentado um relacionamento no início, mas ele era um cara meio sem noção que, infelizmente, tinha uma pica maravilhosa.

Deixei claro que não queria nada com a criatura e passamos umas semanas afastados. Mas então a carência me bateu e acabei o chamando para resolver o meu “problema”, pois sabia que ao menos em sexo ele era bom. Márcio topou sem hesitar e, desde então, não fazíamos absolutamente nada além de transar de vez em quando, sempre que dava vontade.

Eu achava que toda pessoa precisava ter um pau amigo, tipo um consolo em escala real, que só trouxesse prazer, zero compromisso e zero complicações. Eu faria do Thomas Orsini um pau amigo se ele não tivesse aquela característica controladora e meio perigosa. Com alguém como ele não daria certo manter esse tipo de relação.

Bruna:

Hoje não vai dar.

Márcio:

Que pena, gato.

Não o respondi, apenas deixei pra lá. Nunca gostei de que me chamassem de gato, anjo, querido, príncipe ou variáveis irritantes. O problema nem eram as palavras em si, mas o contexto da coisa toda. Caras que nem conhecem a pessoa direito e já vêm chamando desse jeito é uma prova de que tratam qualquer um assim. A quem estão tentando enganar? Porque nenhuma pessoa mais cai nessa conversa chata.

Na segunda-feira a primeira coisa que fiz foi solicitar que o estagiário entregasse um pacote diretamente ao Thomas Orsini: o seu terno, que tinha ficado comigo. Eu o embrulhei como se fosse uma encomenda comum, mas ainda assim o Jamilson a pegou e me olhou de um jeito engraçado.

— Thomas Orsini? O presidente?

— Ele mesmo — assenti, meio nervoso. Custava o homem concordar e simplesmente entregar aquela merda de uma vez?

— Vou conferir com a Mariana, mas acho que o Senhor Orsini está em Los Angeles.

— Em Los Angeles? — a minha careta se intensificou. — Eu acho que não.

Como alguém poderia viajar tão depressa? Ele me contaria se fosse a Los Angeles no fim de semana, certo?

— Posso deixar com a Mariana caso ele não estiver por aqui?

— Mariana é a secretária?

— Sim, senhor.

Eu odiava ser chamado de senhor por alguém que visivelmente era mais velho do que eu, mas apenas assenti.

— Pode, sim, mas é confidencial. Não é pra ela abrir.

— Acredito que ela não faria isso, mas vou deixar avisado — ele sorriu, ainda que parte de seu semblante estivesse bastante curioso. Tentei não culpá-lo por isso.

O estagiário segurou o seu carrinho e fez certa força para continuar a jornada pelo andar da coordenação, mas eu o interrompi antes que se afastasse de vez:

— Espera, Jamilson! Poderia... hum... me avisar se ele... estiver aqui ou em Los Angeles?

— Claro! — o homem piscou um olho e, como fiquei calado, finalmente foi embora.

Fechei a porta e inspirei bastante ar aos pulmões. A sala inteira estava com o cheiro das florzinhas coloridas, que eu tinha regado assim que cheguei para mais um dia de labuta. Mas aquela fragrância me lembrava do Thomas. E todo esse processo fazia com que me recordasse do sexo maravilhoso que tivemos, além da cena nítida em minha memória de seus olhos claros fixos em mim, observando-me com malícia, desejo, tesão.

E então a memória se tornou mais corporal e pude até sentir suas mãos me tocando com possessividade. Como se eu sempre tivesse sido dele.

— Meu pai amado — murmurei e caminhei na direção da minha mesa.

Eu ainda tentava me acostumar com aquela nova rotina. Ao longo do dia participei de algumas reuniões, inclusive a que estava remarcada com Martha Simas, e tive que dar conta de papeladas que custei a compreender. Mesmo um pouco perdido, percebi que tinha me livrado de vez da sensação de ser um impostor. Aquela era a minha área, a que eu tinha escolhido, estudado e me dedicado por anos, logo, era questão de tempo até me adaptar e fazer o meu melhor.

Não me faltaria empenho.

Quando eu estava chegando da hora do almoço foi que vi Jamilson circulando pelo andar mais uma vez. Entregou-me algumas papeladas que a Martha havia mencionado que me enviaria e falou, sorrindo:

— Ah, Bruno, deixei sua encomenda com a Mariana, ok? Seu Orsini está mesmo em Los Angeles.

Quase derrubei os papéis no chão. Não sabia por que tinha ficado tão nervoso com a notícia. Não era nada demais que ele tivesse viajado. O homem estava prestes a abrir uma filial no exterior, logo, era aceitável que precisasse ir para lá muitas vezes. Eu mesmo precisaria ir em algum momento, como coordenador, já que algumas partes do processo não poderiam ser remotas. Só que o meu corpo, especificamente o meu coração apertado, não entendia nada.

Eu não soube o que pensar, simplesmente.

— Tudo bem. Obrigado, Jamilson.

Ele apenas sorriu e prosseguiu com o seu trabalho.

Ao me sentar à mesa de novo, com um monte de serviço para dar conta, pensei em como Thomas realmente tinha levado a minha negativa a sério. Já fazia três dias desde que nos vimos e, pelo visto, estava pronto para seguir com a vida normalmente. Não insistiria mais e nem voltaria atrás em sua decisão. Era definitivo, como no meu íntimo duvidei que fosse.

Embora eu estivesse ciente de que tinha acabado de quebrar a cara de uma forma bem bonita, apenas sorri, pois um lado meu se sentiu satisfeito.

E de repente Thomas Orsini subiu um pouco em meu conceito.

**********************

Os dias foram se acumulando até que rapidamente se transformaram em duas semanas longas, com muito trabalho e a minha adaptação cada vez mais concreta. Já me sentia seguro o bastante para participar ativamente de todo o planejamento tático da filial em Los Angeles. Algumas de minhas ideias foram compartilhadas com outros coordenadores e muitas mudanças na matriz também seriam feitas, para acompanhar toda a qualidade e eficiência dos serviços como um todo.

Eu já não temia mais pelo meu emprego. Até porque Thomas cumpria a sua promessa fervorosamente – havia me esquecido de vez. Não tive sequer notícias dele, somente em uma única reunião que acompanhou de forma remota, sem tecer nenhum comentário durante ela e, por fim, apenas dando as devidas permissões para o que foi falado ser colocado em ação.

Nada de telefonemas ou mensagens.

Foi no décimo quinto dia depois da última vez em que vi seus olhos que fui surpreendido quando desci os elevadores da InterOrsini, pronto para ir para casa. Encontrei ninguém menos que o Márcio, parado logo na entrada da empresa. Não era a primeira vez que ele ia me buscar no trampo, mas geralmente o cara avisava do desejo de me encontrar e a gente marcava uma foda rápida após nossos expedientes, já que ele não trabalhava tão longe de mim.

Foi por isso que, quando o olhei e ele me encarou de volta, sorrindo amplamente, tive vontade de esganá-lo.

— O que faz aqui? — fui logo dizendo, com uma careta. Não consegui controlar minha expressão facial. Ele não deveria ter ido ali sem meu consentimento. — Está perdido? — tentei amenizar, já que percebi que soei meio antipático a troco de nada.

Márcio não tinha culpa pelo meu mau humor.

— Larguei um pouco mais cedo e pensei em te fazer uma surpresa — continuou sorrindo, alheio ao meu descontentamento.

Márcio era um cara normal, que vivia uma vida bem parecida com a minha. Tinha cabelos escuros como os olhos, corpo comum, um pouco mais alto que eu e dono de um sorriso bonito. Sua qualidade maior com certeza era o pinto e o desempenho na cama.

— Uma surpresa? — continuei com a careta. — Por quê?

Ele me puxou pela cintura, mas, sabendo que eu não gostava de chamar a atenção de ninguém da empresa, manteve-se afastado.

— Só me deu vontade — e esgueirou-se para murmurar em meu ouvido: — Saudade do seu cuzinho apertado.

Ergui uma sobrancelha, surpreso e sem saber o que achar daquilo. Eu não estava muito a fim de sexo. O problema nem era ele, era eu. Já fazia quinze dias desde a noite com o Thomas, mas eu não me sentia muito pronto para seguir adiante. Embora devesse. E foi por saber disso que abri um sorriso meio sacana pra ele.

— Você devia ter deixado uma mensagem — ainda assim, falei, e comecei a caminhar para o local onde ele sempre deixava o carro. Não sabia se iria com ele, mas pretendia tirá-lo de frente da InterOrsini com urgência.

— Eu deixei, você que não me respondeu.

Márcio quase sempre era sem noção, por isso resolvi nem discutir. Eu não tinha nem visto a mensagem, pois estava evitando ao máximo usar o celular, mas, falando sério, você iria atrás de uma pessoa que nem te respondeu? Não, né?

Aquele pequeno detalhe foi a gota d’água para que me decidisse:

— Então... Não vai rolar, Márcio. Eu estou meio enjoado — menti. Eu não estava a fim de discutir. — Além de com fome, nem tive tempo de lanchar.

— E se a gente fosse comer uma parada legal? — ele perguntou, caminhando ao meu lado e com as mãos nos bolsos, mas parei de andar para encará-lo. O homem, definitivamente, estava estranho. Nunca saíamos para nenhum outro local além de um motel. — Abriu um restaurante novo aqui perto, eu estava doido pra conhecer — prosseguiu, já que só o olhei de maneira interrogativa.

— Eu não sei, a gente não funciona assim. Você sabe disso.

— Fala sério, Bruno, só um jantar. Queria te foder, mas já que não dá, custa nada comer. Aliás, pra você não vai custar nada mesmo. Eu pago — e sorriu abertamente.

Olha, eu rejeitava muitas coisas na vida, mas comida de graça recebia uma atenção sempre muito especial para o meu discernimento. Pensava milhões de vezes antes de negar.

Estava faminto, cansado e querendo comer algo gostoso, por isso não vi nenhuma desvantagem em jantar com o Márcio no restaurante novo que mencionou. Ele sabia que não tínhamos nada além de sexo e só passaríamos um momento aleatório juntos para que não perdesse a viagem.

Sem contar que depois ele sempre me dava uma carona pra casa. E eu não estava exatamente contente em ter que pegar o metrô.

— Beleza, vamos lá. Mas só jantar mesmo, tá?

— Pode deixar, gato. Vamos comer e ficar de boa. Outro dia a gente marca pra fazer bem gostoso.

Não o respondi porque ainda me sentia esquisito só de pensar em ir pra cama com outra pessoa. Precisava seguir em frente, mas sei lá... Só não estava a fim de transar e pretendia respeitar o tempo do meu corpo. Pra que forçar, né? Eu não era nenhum desesperado e talvez devesse trocar de P.A., ou mesmo me abrir a relacionamentos mais profundos. Era uma possibilidade que não descartava.

Márcio até que foi bem cavalheiro. Abriu a porta do seu carro para que eu entrasse e me levou a um restaurante que visivelmente não era barato. Eu não o conhecia, mas gostei muito quando adentrei o ambiente sofisticado e com um cheiro bom de comida pairando no ar. Senti meu estômago se animar com a ideia de estar ali.

Fomos levados por um funcionário a uma mesa ao canto, com um clima romântico bem agradável, porém, assim que me sentei e Márcio se aquietou na minha frente, a primeira coisa que enxerguei foi o que havia atrás dele, numa mesa com três homens vestidos de terno. Um deles, exatamente o engravatado que estava diante de mim, era o Thomas Orsini.

E o seu olhar já estava sobre o meu. Não deu nem tempo de tentar me esconder.

O garçom veio com o cardápio e o Márcio se distraiu com ele, enquanto apenas mantive meus olhos arregalados no homem que me observava de um jeito tão sério e frio que dava para sentir dali.

Eu não soube o que fazer. Ir embora me parecia uma completa babaquice. Não devia nada ao Thomas. Com quem eu saía ou deixava de sair não era problema dele.

Ainda assim, senti-me completamente perdido e muito puto da vida. Porque, venhamos e convenhamos, a cidade tinha milhares de restaurantes, bares e afins, um número infinito de lugares que aquele homem poderia estar. Inclusive, achei que nem no Brasil ele se encontrava. Mas não... O sujeito estava bem ali, naquela hora, naquela data, olhando-me como se eu fosse um traste.

É pra se foder!

— O que acha do filé à parmegiana? — Márcio perguntou, porém só ouvi um pequeno chiado.

Assenti, forçando um sorriso, sem nem mesmo saber com o que concordei.

O meu acompanhante fez o pedido e acabei dizendo sim também para a água com gás, gelo e limão. Que droga.

— E então, como você está? — Márcio se aprumou na cadeira, relaxando e me olhando com curiosidade. — Nunca mais apareceu. Senti sua falta — tocou a minha mão por cima da mesa.

Suspirei profundamente e fiz uma força descomunal para desviar a atenção para ele. Por que diachos estava me tocando em público daquela forma? Discretamente, retirei a mão e passei a mão pelo cabelo.

— Estou bem. Na verdade, ótimo, fui promovido.

— Sério? Eu também! Agora sou o novo gerente de... — começou a falar sobre si mesmo, como sempre fazia toda vez. Aquele foi um dos motivos por eu não querer nada com Márcio. Ele não sabia conversar a respeito de nada sem se mencionar. Para mim, ele calado era um poeta.

Minha atenção rapidamente ficou dispersa e voltei a encarar Thomas Orsini. Ele parecia desligado do que acontecia em sua própria mesa tanto quanto eu. O olhar transparente me analisava com minúcia, e mesmo quando o encarei ele não foi capaz de desconectá-lo de mim. Suspendi a respiração.

Aquela merda de jantar havia sido uma péssima ideia.

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Comentários

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PQP. Tanto tesão, tanto desejo. Pra que tanto cu doce? Deixa rolar e vamos aproveitando desse sexo maravilhoso.

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Já quero mais!! Quero saber quando um dos dois vai ceder!!

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