TRAVESSIA [35]~ Eu devo tudo isso a travessia

Um conto erótico de BERNARDO
Categoria: Gay
Contém 7463 palavras
Data: 12/05/2024 20:15:13

Abri meus olhos lentamente naquela manhã e me deparei com os intensos olhos verdes de Vítor. Ele me olhava carinhosamente da outra cama. Sorri por reflexo ao sentir aquele sentimento bom me invadir. Ele estava dizendo que gostava de mim sem abrir a boca.

- Vigiando meu sono? - Perguntei sem me levantar da cama.

- Não, te admirando.

- Admirando o quê?

- Os traços seus que o tempo mudou, e para melhor devo acrescentar.

- Bobo. - Falei escondendo o rosto no travesseiro com vergonha.

- Sério.

- Eu não mudei tanto assim.

- A maior parte de você está aí sim, mas é normal que algumas coisas tenham mudado em você nos últimos anos.

Rejeição, morte de um ente querido, sua própria quase-morte, a fama, o sucesso, ninguém passa em branco por isso. Por fora pode parecer que você é o mesmo, mas para mim que convivi tanto tempo com você, a mudança é visível.

- Humm... - Falei analisando suas palavras – Mas você errou aí, pois a morte não foi de somente um ente querido, tá? Felipe foi, é e será muito mais que isso. Muito mais mesmo.

Ele ficou meio sem graça.

- E em que eu mudei? - Falei para melhorar o clima.

- Você cresceu, em todos os aspectos. O Bernardo que eu conheci criança era muito alegre, mas muito inseguro e vulnerável ao que os outros pensavam. O Bernardo de hoje é seguro de si e não deixa ninguém lhe fazer mal. Se ele tem um problema, ele o enfrenta. Se tem alguém no seu caminho, ele passa por cima. Se ele tem um objetivo, não vai se cansar até alcançá-lo. O Bernardo de hoje é uma força da natureza.

Ri da sua definição, que analisada a fundo não deixava de ser verdade. As situações pelas quais eu havia passado nos últimos anos haviam me mudado mesmo. Me lembrei que a forma que ele me via era a mesma forma como eu via Beatriz quando a conheci. Bem que ela me disse que éramos iguais. Seis anos depois, ela provou que estava certa.

- E o que mais? Agora fiquei curioso sobre a forma como você me vê.

- Não sei, isso foi o que descobri até agora. O resto você vai ter que me dar um tempo para descobrir.

- Não sei se você vai gostar. E estou falando sério!

- Eu aceito o risco.

Olhei para ele admirando a forma como ele estava me arrebatando. Sorri sem jeito com suas palavras e ele sorriu de volta.

- Melhor a gente se levantar, você tem uma grande tarefa hoje. - Falei me levantando.

- Nem me fale! - Ele falou colocando as mãos sobre o rosto.

- Está querendo dar pra trás? - Provoquei.

- De jeito nenhum. Está mais do que na hora de resolver isso.

Tomamos café e seguimos para a fazenda. No caminho Vítor ligou para Mariana e marcou para encontrá-la dentro de meia hora na fazenda do Cercadinho.

Eu estava segurando para não rir em respeito a Vítor que estava muito nervoso.

Eu não queria rir por achar engraçado, mas pela mais pura e simples felicidade. Finalmente eu teria minha revanche. Eu tinha enfrentado Mariana algumas vezes nos últimos anos, mas desta vez era diferente porque eu tiraria dela seu último trunfo: seu noivado com Vítor.

Eu acreditava veementemente que depois daquilo eu nunca mais precisaria me preocupar com ela.

Acho que a felicidade me cegou e me fez ficar inocente. Mariana não era do tipo de pessoa que suportava golpes passivamente.

Chegamos na fazenda e eu avisei a Vítor que esperaria por ele no quarto de Rafinha. Ele se sentou na varanda para esperar Mariana. Dei graças a Deus por não encontrar tia Rosa ou tio Alfredo em casa, pois morreria de vergonha depois de tudo que Vítor lhes contou. Subi até o quarto de Rafinha, bati na porta e entrei.

- Olha quem se lembrou que eu existo! - Ele falou brincando sem desgrudar os olhos do computador.

- Você sabe que os últimos dias tem sido bem cheios.

- Eu sei, Vítor me contou. - Ele falou puxando uma cadeira para mim ao seu lado.

- Como tem andado as coisas entre vocês?

- Mudou da água para o vinho. Passou a me tratar super bem, ficou carinhoso comigo e sempre vem me pedir conselhos e suspirar de amor por você. - Falou revirando os olhos. - Viramos melhores amigos.

- Que bom que vocês se acertaram.

- Pois é, eu duvidava que isso um dia acontecesse. Tudo graças a você.

- Que nada...

- Lógico que foi porque você conversou com ele! Minha mãe está quase mandando o seu pedido de canonização pro Vaticano pelo milagre.

- Sua mãe não deve estar querendo me ver nem pintado de ouro depois do seu irmão se assumir...

- Não acho isso não. - Ele falou com um sorriso misterioso no rosto - Você vai se surpreender quando encontrá-la.

- Como assim? - Perguntei curioso.

- Deixa pra lá, você vai ver.

- E você, como está?

- Você não vai acreditar...

Ele falou já se levantando e sentando em meu colo de frente para mim. Me abraçou e me deu um beijo no rosto. Eu retribuí, é claro. Então ele continuou, olhando para mim:

- O quê?

- Acho que estou gostando de alguém.

- Jura? Quem?

- Aí está a surpresa... - Ele falou fazendo suspense. - É uma menina.

Olhei para ele, confuso.

- Mas você não era... - Falei me lembrando da nossa conversa em Belo Horizonte.

- Pois é, eu sei, eu não tenho explicação para isso. Estou muito confuso com tudo. - Ele falou aflito. - E se der tudo errado? E se eu não “conseguir”?

- Sabe o que eu acho? - Falei tentando tranquilizá-lo.

- O quê?

- Acho que o amor não escolhe sexo. Por isso que não há nada de estranho em se apaixonar por uma menina.

- Você acha?

- Acho.

Lá fora ouvimos o barulho de um carro estacionando próximo ao casarão.

- Quem será? - Rafinha perguntou.

- Deve ser a Mariana.

- E o que ela está fazendo aqui?

- Seu irmão a chamou para terminar tudo com ela.

- Sério? - Gritou entusiasmado me fazendo rir.

- Sério.

- Estava na hora.

- Pois é. Como eu não queria perder esse momento, pedi para vir junto, mas vou ficar esperando aqui no seu quarto.

- Sem chance, vamos ouvir tudo lá embaixo. - Ele falou se levantando do meu colo e me puxando, mas eu o segurei.

- Lógico que não, essa é uma conversa privada, Rafinha.

- Não tem a mínima possibilidade de eu perder esse momento histórico. Vem!

Eu sorri e ele também. Nem deu tempo de eu falar nada e ele já me puxou e eu não tive como impedi-lo.

Ou melhor, tive sim, mas alguma coisa dentro de mim queria assistir àquela cena, então deixei que ele me levasse.

Uma parte de mim estava ansiosa por ver o sofrimento de Mariana. Eu e Rafinha nos posicionamos no alto da escada, de onde podíamos escutar a conversa de Vítor e MarianaEntão, meu amor, me chamou por quê? Saudades? - Ela perguntou docilmente.

- Ela finge que o noivado é perfeito mesmo quando só estão os dois? - Perguntei surpreso e sussurrando para Rafinha.

- Pra você ver o nível da loucura. Rafinha me abraçou e ficou agarradinho comigo me dando beijinhos o tempo todo. - Nem reclama. Eu adoro beijar você. - E continuou prestando atenção na conversa.

Dei um beijo nele também. E sorrimos um para o outro.

Que menino fofinho! Que delícia de garoto cheiroso!

Eu viajava naquele gatinho abraçado a mim...

Voltei também a prestar atenção na conversa deles.

Não dava para vermos os dois, só ouvir, mas mesmo assim eu sentia o nervosismo de Vítor. Ele estava prestes a dar um passo enorme.

- Mariana... - Ele parecia querendo ganhar tempo para formar um discurso na cabeça. - Eu te chamei aqui para terminarmos tudo.

- O quê?

Senti minha boca amargar, mas o gosto não era ruim. Aquele gosto na minha boca me proporcionava prazer de uma forma nova e interessante. Aquele sabor na minha boca era o gostinho da vingança.

- Como assim terminar? Estamos de casamento marcado. Ficou doido? - Sua voz estava bastante alterada.

- Até quando vamos continuar fingindo? - Ele foi ficando nervoso também com sua dissimulação. - Nós dois sabemos que isso nunca foi um relacionamento de verdade.

- Mas meu amor!

- Não sou seu amor. Vai continuar fingindo? A gente só ficou junto até hoje por causa das aparências.

- Não é verdade! Nós nos amamos! - Pela sua voz ficou bem claro que ela estava chorando.

- Não, não nos amamos. Tenho quase certeza que você só está comigo todo esse tempo para não dar o braço a torcer.

- Lógico que não!

- De qualquer jeito, sinto muito, Mariana. Esse é o fim.

- Mas por que agora? - Ela pareceu fazer uma pausa para pensar e rapidamente ligou os fatos. - Foi aquele viado, né?

- Dobre a língua para falar do Bernardo!

- Eu sabia! Ele te enfeitiçou de novo!

- Abra os olhos, Mariana! Ele nunca me “enfeitiçou”, o que aconteceu entre nós foi uma coisa natural.

- Natural entre viados, que é o que vocês dois são! - Sua voz transmitia raiva.

- Quer saber de uma coisa? Eu achava que isso podia acabar bem de alguma forma, mas como já vi que isso não vai acontecer, deixa eu te explicar direitinho: EU AMO O BERNARDO! Eu sempre amei. Muito antes dele descobrir que me amava EU JÁ O AMAVA!

Apesar dele já ter dito aquilo outras vezes, ali teve um significado especial. Era como se Mariana representasse todas as coisas ruins do nosso passado e com aquelas palavras ele o estava enterrando.

Aquelas palavras fizeram meu coração bater diferente, de um jeito que não batia há muito tempo.

Eu poderia me apaixonar por Vítor de novo?

Sorri feliz com aquela simples dúvida e foi como se o mundo todo tivesse se transformado num lugar melhor. Me levantei do lugar onde estava escondido e desci as escadas lentamente.

Rafinha veio abraçado comigo, curioso sobre o que iria acontecer.

Cheguei à sala e Vítor e Mariana estavam parados um de frente para outro em posições ameaçadoras. Os dois se viraram para me ver chegar.

Acho que ao me ver sorrindo daquele jeito, Vítor entendeu o que estava se passando comigo e sorriu também. Já a reação de Mariana foi completamente diferente. Seu rosto se enrijeceu e dos seus olhos pareciam sair fogo.

- Seu desgraçado!

Ela correu para me atacar, mas Vítor foi mais rápido e a segurou pela cintura, tirando seus pés do chão.

Rafinha ria daquilo tudo como se fosse a coisa mais engraçada do mundo. Eu não me deixei ser afetado pela reação de Mariana. Meu peito estava tão inundado de sentimentos bons como a esperança de ser feliz, que tudo o que eu conseguia fazer é sorrir.

- Acabou, Mariana. - falei. - Agora eu e Vítor vamos ficar juntos.

Ele me olhou admirado e eu jurei ter visto uma lágrima descer dos seus olhos. Sim, ficaríamos juntos.

- Eu te mato, sua bicha!

Ela esperneava e gritava tentando se libertar dos braços de Vítor para vir para cima de mim.

- O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI?

Nos viramos para olhar e eram os pais de Vítor que tinham acabado de chegar. Eles olhavam sem entender aquela confusão na sala de sua casa.

- O que está acontecendo aqui? - Repetiu tio Alfredo.

Vítor soltou Mariana que ficou quieta. Nós quatro não falávamos nada. Eu estava bastante nervoso. Era a primeira vez que os encarava depois que Vítor contou sobre nós.

- Finalmente Vítor terminou com Mariana! - Falou Rafinha, ainda abraçado a mim.

Eu, Vítor e Mariana ficamos mudos. Não tinha muito o que ser dito naquela situação. Mas a chance de Mariana passar passivamente por aquilo era nula.

- O seu filho, dona Rosa, está me trocando por um outro homem! - Falou ameaçadoramente, provavelmente achando que eles não sabiam.

- Vítor, olha o que você está fazendo com sua vida! - Ralhou tio Alfredo, com mais desespero do que raiva na voz.

Acho que ele tomou um sacode da minha tia. Um daqueles bem dados mesmo, pois a sua postura era bem diferente da esperada por todos.

- Eu estou tentando ser feliz, pai, só isso.

- Ser feliz? Isso é vida?

- Isso - Falou tirando seu anel de noivado do dedo. - é que não é vida.

- Acho que está na hora de você ir embora, Mariana. - Falou tia Rosa.

- O quê? A senhora concorda com isso? - Ela respondeu parecendo bastante ofendida.

- Vítor nos contou tudo ontem, inclusive os anos de coação ao seu lado. Você não é mais bem-vinda nesta casa.

- Você vai ser conivente com essa pouca vergonha? - A cada minuto Mariana perdia mais o controle.

- Eu não sei o que é certo ou errado. O que eu sei é que não me lembrava mais do sorriso do meu filho até a chegada do Bernardo. Tudo o que uma mãe quer é que seu filho seja feliz, e eu acho que Vítor só vai ser feliz com Bernardo.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Ela sorriu para mim carinhosamente. Ela estava do nosso lado. A felicidade me corroía por dentro. Tio Alfredo assistia tudo atenciosamente, era impossível saber o que ele estava achando daquilo tudo.

- Eu não acredito no antro de podridão que virou essa família! - Falou Mariana.

- Cuidado com a boca, mocinha. - Falou tio Alfredo.

- Exatamente; sua hora já deu. - Falou Rafinha. - Vaza...!

Mariana nos olhou com raiva. Seu corpo chegava a tremer emanando coisas ruins, mas eu não sentia medo. Eu estava tão feliz que nada do que ela dissesse ou fizesse poderia me atingir.

Ela fixou seu olhar em mim e disse entre os dentes:

- Isso não vai ficar assim. Vai ter volta. Quero ver por quanto tempo vocês conseguem se manter felizes.

Com suas últimas palavras ela saiu pela porta. Eu tinha absoluta certeza de que ela ia fazer alguma coisa para nos atrapalhar, mas também tinha absoluta certeza que juntos poderíamos sobreviver a qualquer ataque seu.

O próximo a sair da sala foi tio Alfredo, que não disse mais nada. Eu e Vítor olhamos tristes enquanto ele ia embora. Tia Rosa percebeu e já foi falando:

- Deem um tempo a ele. É tudo muito novo, mas ele vai acabar aceitando. Ele quer ver vocês felizes, e em breve vai perceber que isso só vai ser possível com vocês juntos.

- Obrigado por nos aceitar, Tia Rosa. - Falei ainda emocionado a puxando para um abraço.

- Me agradeça fazendo meu filho feliz.

- Prometo me esforçar ao máximo.

Rafinha e Vítor se juntaram ao abraço e nós quatro ficamos ali por um tempo, apenas curtindo o momento.

- Meus meninos... - Falou tia Rosa chorando.

Depois de um tempo ela seguiu para cozinha para preparar o almoço e forçou Rafinha a acompanhá-la.

Vítor e eu ficamos sozinhos na sala, rindo um para o outro como crianças bobas sem dizer nada.

Ele foi se aproximando de mim lentamente, passou a mão pela minha cintura e me puxou para um beijo, mas eu virei o rosto antes dele conseguir.

Ele me olhou confuso.

- Mas você disse que nós...

- Disse e reafirmo, mas eu ainda não posso beijar ninguém. Depois dele já fiquei com mais de cem, mas nunca beijei nenhum.

Ainda tenho o meu amor aqui comigo e preciso que ele me permita beijar outra boca que não a dele.

Vou conversar com o Lipe, mas sozinho, no escuro do meu quarto e com a alma e o coração leves de qualquer sentimento negativo. Só assim é que nós conversamos.

E para você poder me beijar, terá que ser especial. Eu quero que amanhã de manhã você arrume uma pequena mala para passar dois dias fora comigo.

Ele riu e me abraçou forte. Nossos rostos ficaram colados.

- O que você está planejando?

- Vai ter que aparecer para saber...

- Você me ama mesmo?

- Hum... Gosto muito de você. E eu me lembro de uma música antiga que dizia mais ou menos assim:

“É que eu preciso dizer que te amo

Te ganhar ou perder sem engano...

É que eu preciso dizer que te amo”

Ele me olhou tão intensamente que achei que poderia ser atravessado por aqueles olhos verdes. Passamos o resto da tarde nesse clima de romance açucarado, mas nunca indo muito além de caríciasBernardo?

- Oi.

- E o Rafael?

- O que tem o Rafinha?

- Ele não larga de você e vive te beijando. Aquela hora lá no seu quarto você estava de pau duro com ele pelado em cima de você e... - O interrompi.

- Rafinha é o meu melhor amigo. Ele é simplesmente um garoto maravilhoso que Deus colocou no meu caminho. Se ele me beija eu retribuo e não tenho vergonha nenhuma de fazer isso e na frente de quem quer que seja.

- Mas você estav...

- Eu estava de pau duro porque tinha acabado de acordar. E também eu sou gay e gosto de ver um pau bem duro e cheiroso sim. E tive que fazer malabarismos para me segurar quando ele ficou peladinho e pulou em mim. Mas ele é um garoto. Não sabe ainda quase nada dessas coisas e eu nunca teria a coragem de me aproveitar dele. Rafinha é meu irmão e faço qualquer coisa por ele. Agora, eu não sou de ferro também, né?

- Então nunca aconteceu nada entr...

- É claro que não! Está me achando um tarado por garotos agora? Já disse e repito que eu sou do Felipe. Só-do-Fe-li-pe! - Já Rafinha é o meu amigo mais importante do mundo. E vai continuar sendo, ok?

- E ele sabe disso? Vai que ele inventa de te agarrar...

- Ele sabe de tudo. Entendeu? Nós sempre conversamos tudo a meu respeito. Ele conhece meus sentimentos, conhece meus medos e conhece a minha dor. Ele conhece a minha vida e já participou dela em vários momentos diferentes. Ele enxerga como sou por dentro. E ele sabe o que somos um para o outro sim.

- E eu?

- O que tem você?

- Uai! Se Rafael é seu melhor amigo, quer dizer que eu não sou?

- Claro que não! Você é uma lembrança maravilhosa da minha infância e a maior decepção que já passei na vida. Agora você está deixando de ser nada e procurando um novo espaço no meu coração.

- Só isso?

- Sim! É o que eu posso te oferecer de concreto. Uma chance para você conseguir conquistar esse espaço. Mas continue tentandoTio Alfredo não apareceu mais e entendi que ele precisava ficar sozinho um pouco, com seus pensamentos, para analisar o que estava acontecendo. Isso era um bom sinal.

À noite, na casa da minha avó, tomei um banho demorado, me tranquei no quarto e pedi para não ser interrompidoRespirei fundo e abri meu coração me libertando de toda energia e sentimento que me rondava naquele dia.

Me ajoelhei e rezei a Deus pedindo luz em minha vida.

Senti um perfume passar por mim e reconheci na hora aquele odor. Felipe estava ali comigo. Era o seu cheiro à minha volta.

Chorei de saudades daqueles olhos azuis e daquele carinho que ele me dava. Chorei sentindo a sensação de ser abraçado por ele.

Chorei sentindo sua falta e sentindo muita falta de ser amado.

Pedi a ele que me permitisse ser amado e principalmente poder amar de novo. Coloquei em suas mãos a minha vida.

Ele prometeu cuidar de mim e somente ele iria me dar o rumo certo a seguir em minha caminhada.

- Eu te amo, Felipe!

Nunca mais vou amar alguém nessa intensidade.

Posso até ser feliz novamente, mas você estará sempre aqui comigo, no meu coração. Uma lembrança feliz e verdadeira.

Daqui pra frente seja o que Deus quiser! E o que você me permitir, meu amor!

Amém!

(...)

Estava arrumando minha mala para viajar com Vítor na manhã seguinte quando meu telefone tocou. Nem acreditei quando vi no visor do celular o nome de Renata.

- Olha quem lembrou que eu existo! - Falei brincando.

- Oi, Bê, desculpa não dar notícia por tanto tempo, mas é que a minha vida anda meio corrida. - Sua voz transmitia um certo desespero que eu não estava entendendo.

- Certo. Tudo bem com você, Renata?

- Comigo sim, mas acho melhor você se preparar para o que vai vir.

- Como assim?

- Você está em Morro Velho, né?

- Estou, mas como você sabe? Eu não contei para ninguém além da minha família.

- Pois é. Mais cedo uma fonte anônima ligou para os principais jornais e revistas falando onde você estava.

- Para que isso? No que é relevante?

- Tem mais. Essa fonte também contou toda a sua história, o porquê de você ter saído da cidade, do seu pai ter te expulsado de casa e até sobre o Felipe falaram.

Mariana.

Essa era a sua vingança. Mais uma vez ela conseguiu me atingir, o que eu achei que não seria mais possível.

Eu não queria ver tudo aquilo que eu vivi na capa dos jornais, eu queria enterrar aquilo de vez! Foi para isso que voltei a Morro Velho.

O pior de tudo é que aquilo não iria atingir só a mim, mas a todos ao meu redor, principalmente Vítor.

- Quanto tempo eu tenho, Renata?

- Eles já começaram a investigar. Dentro de mais um ou dois dias no máximo Morro Velho vai ser invadida por repórteres.

Vítor conheceria então minha outra face, a pessoa pública que me tornei. Seria a nossa prova de fogo.

“Eu tinha que fugir com Vítor” - Era só isso que eu pensava. Eu precisava tirá-lo do olho do furacão para, pelo menos, ter tempo de prepará-lo para o que estava por vir. Comuniquei a situação a Zeca e tia Marta, que cuidavam da minha imagem, e eles prometeram fazer o que pudessem para impedir o ataque da imprensa.

Na manhã do dia vinte de dezembro, entrei no meu carro em direção à fazenda do Cercadinho. Parei o carro na porta, buzinei e Vítor apareceu na mesma hora. Ri.

Ele devia estar me esperando há um bom tempo e não se aguentando de ansiedade.

- Alguém acordou muito animado, hein? - Falei enquanto ele entrava no carro.

- Era pra menos? E agora o senhor pode me informar para onde estamos indo?

- Acho que agora posso. Uma cidadezinha aqui perto. Aluguei um chalé só para nós dois. - Falei sorrindo.

- Parece bom...

- O melhor ainda está por vir...

Rafinha apareceu na porta e eu não consegui não o abraçar com carinho.

Ele estava radiante e me sorriu muito feliz.

- Te adoro, Bê!

- Te adoro, Rafinha.

- Tentem se entenderem, heim?

- Sim, meu querido!

(...)

Nós dois fomos conversando bobagens até chegarmos no lugar. Foi difícil conseguir de última hora, mas nessas horas é bom ser famoso; as portas se abrem para você.

Era um lugar muito charmoso. O chalé era todo feito de madeira e ficava em meio a árvores típicas de regiões mais frias. Ficava no alto de uma montanha, de onde era possível ver os outros chalés da propriedade e a casa maior que servia como restaurante.

- Caprichou, hein? - Comentou Vítor assim que descemos do carro.

- Me recomendaram há algum tempo, mas nunca tive a oportunidade de vir conferir pessoalmente. Vamos ver por dentro?

O interior do chalé era ainda mais charmoso. Todos os móveis tinham uma aparência antiga, mas muito elegante, dando um ar acolhedor ao lugar. Até mesmo uma lareira.

- É lindo... - Falou Vítor, admirando o lugar.

Coloquei nossas malas em cima da cama e fiquei de frente para ele. Ele me olhou com aqueles olhos verdes que eu tanto gostava.

Seu olhar era tão intenso que parecia ver além de mim, o que estava dentro de mim, o que eu estava sentindo.

Ali, ele estava vendo o quanto eu gostava dele.

Nossos rostos foram se aproximando lentamente sem fazermos esforço para isso, como se nós nos atraíssemos. Nossos lábios foram se encontrando até estarem completamente grudados. Nossas bocas se abriram e nossas línguas se enrolaram.

O beijo era calmo, mas extremamente romântico. Não era um beijo de tesão, era um beijo de amor.

Vítor passou o braço sobre a minha cintura e me puxou para mais junto de si. Nossos corpos se pressionavam numa dança suave pelo quarto.

- Eu te adoro... - Falei sem fôlego quando nossas bocas se desgrudaram.

- Eu te amo. Você não tem ideia de quanto eu espero para te ouvir falar isso.

- Estou caminhando para conseguir.

- A espera valerá?

- E como! Vem comigo! - Falei puxando ele.

- Para onde? Eu achei que... - Ele falou sem entender.

- Se fosse para passar o dia todo no quarto, eu tinha ido para um motel e não para um chalé.

Ele riu e me seguiu. Dei a mão a ele que me olhou intrigado.

- Não tem medo de alguém ver?

- Não, normalmente os funcionários desses locais são treinados para serem muito discretos. E além do mais, não tenho nada para esconder.

Vítor riu e apertou forte a minha mão. Caminhamos por toda a propriedade, conversamos, rimos, admiramos a natureza do local e, quando a fome bateu, almoçamos uma deliciosa comida caseira no restaurante do lugar. Depois fomos descansar sob a sombra de uma árvore.

- Nem acredito que estou aqui com você depois de tudo. - Ele falou.

- Nem eu. O caminho está sendo longo...

- Eu sei, se eu tivesse poder para mudar o passado, faria tudo diferente.

- Eu não.

Ele me olhou curioso com a resposta, mas ela foi sincera.

- Como não? Olha por tudo o que você passou.

- Passei por muitas coisas mesmo, mas foram essas coisas que fizeram a pessoa que sou hoje e que está aqui com você.

Até mesmo as piores coisas, como a morte de Felipe, me ajudaram. Ter sentido a dor de perder alguém tão próximo me ensinou a relevar as pequenas coisas da vida, como a mágoa que eu sentia por você.

Se eu nunca tivesse ido embora, nós dois nunca teríamos dado certo. Essa nossa bagagem nos modificou tanto a ponto de tornar possível nosso relacionamento.

Ele ficou pensativo, possivelmente vendo que eu tinha razão.

- “O que importa não é a chegada ou a partida. A graça da coisa está na travessia”. - Ele falou me fazendo rir.

- Nunca ouvi uma frase tão verdadeira. Sou grato pela travessia que me trouxe até aqui.

Travessia é a palavra que define tudo o que eu passei. Se eu pegasse o início e o fim da minha história e os unisse, causaria estranhamento, elas não se encaixam. Sem o “meio”, sem a música, sem Felipe, sem Beatriz, sem Belo Horizonte, sem o Rio de Janeiro, a minha história não faz sentido. Sem a travessia eu ainda seria um menino fraco, inseguro e rancoroso que não conseguiria ser feliz ao lado de Vítor, antes um menino ciumento, medroso e incapaz de tomar as rédeas da própria vida.

Eu devo tudo à travessia.

- Bernardo...

- Sim? - Falei acordando dos meus pensamentos.

- Você acha que a Mariana pode fazer alguma coisa contra a gente agora?

Eu não tinha como fugir, eu teria de contar tudo pra ele.

- Acho que ela já agiu.

- Como assim?

Suspirei fundo e contei para ele o que Renata havia me falado. Ele ficou em silêncio por um tempo antes de comentar alguma coisa.

- Como vai ser agora?

- Não sei. - Respondi. - Possivelmente serei o assunto de todos os jornais e revistas por algumas semanas. Depois a história vai cair no esquecimento.

- E como a gente fica?

Me virei de frente para ele e o admirei por alguns segundos antes de responder.

- Você tem que decidir como ficamos agora. A fama é uma parte de mim, não dá pra separar mais. Se fica mais fácil, pense nela como um dos meus defeitos. Você está disposto a ficar comigo apesar de todos os meus defeitos?

- Sim. - Ele respondeu tão rápido e com tanta firmeza que me surpreendi.

- Tem certeza? Você entende o que isso implica?

- Sim. - Ele me respondeu com um sorriso no rosto. - Eu demorei tanto tempo até ter você que não estou disposto a abrir mão por causa de alguns fotógrafos e revistas de fofocas.

Sorri também com sua declaração e lhe roubei um beijo.

- Quem deixou? - Ele perguntou se fingindo de bravo.

- Você vai ser todo meu agora, não preciso pedir permissão.

- Ah é? Pode correr, porque se eu te pegar você me paga!

Saí correndo pelo gramado com ele atrás de mim, feito duas crianças.

No resto da tarde, jogamos vôlei com alguns outros hóspedes e nadamos. Jantamos e íamos subindo para o chalé.

Ambos estávamos nervosos pelo que viria a seguir.

Seria a nossa primeira vez.

Mas pensei em Vítor. Se eu estava nervoso, imagina ele que nunca teve nada com homem nenhum?

Eu queria que fosse especial para ele, então tive uma ideia...

- Me espera aqui. - Falei enquanto saíamos do restaurante.

- Para quê?

- Para eu arrumar o chalé.

Ele sorriu e eu saí correndo para preparar tudo. Pedi algumas coisas a uma funcionária da pousada e ela me ajudou a arrumar. Velas, vinho, pétalas de rosas vermelhas na cama. Liguei meu Ipod no alto-falante e deixei uma música instrumental bem sensual e elegante tocando.

Quando terminei me orgulhei do meu trabalho. Tirei minha roupa ficando só de cueca. Liguei para o celular de Vítor e falei para ele subir. Ele devia ter vindo correndo, pois não demorou nada.

Abriu a porta e encontrou o chalé todo decorado. Seus olhos percorreram todo o ambiente até pararem em mim, de cueca com uma taça de vinho na mão, junto à lareira. Acho que ele perdeu a noção de hora e lugar, pois ficou lá, parado me olhando.

- Vai ficar aí? - Perguntei em tom de brincadeira.

Lentamente, ele foi tirando os chinelos, a bermuda e a camiseta que usava. Eu ainda não tinha tido oportunidade de conferir seu corpo e o que eu vi me agradou muitíssimo.

Ele estava fortinho, mas nada exagerado. No peito não havia pelos o que o deixava ainda mais sexy. Suas pernas também eram bem lisas e com pouquíssimos pelos loiros bem fininhos.

Ele foi se aproximando de mim devagar, me atiçando ainda mais. Nenhum de nós falava nada, mas conversávamos no olhar. Coloquei minha taça de vinho em cima da lareira e deixei que os braços de Vítor dessem a volta na minha cintura colando nossos corpos. Nossos paus, duros, se relavam fazendo com que já ofegássemos.

- Você não cansa de me surpreender? - Ele perguntou. - Está tudo lindo; fico pensando se eu mereço tanto.

Embalado pelo momento romântico, lhe respondi cantando baixinho:

“Hoje eu quero a rosa mais linda que houver

Quero a primeira estrela que vier

Para enfeitar a noite do meu bem

Hoje eu quero a paz de criança dormindo

E o abandono de flores se abrindo

Para enfeitar a noite do meu bem

Quero a alegria de um barco voltando

Quero a ternura de mãos se encontrando

Para enfeitar a noite do meu bem

Ah! eu quero o amor o amor mais profundo

Eu quero toda beleza do mundo

Para enfeitar a noite do meu bem

Ah! como este bem demorou a chegar

Eu já nem sei se terei no olhar

Toda ternura que eu quero lhe dar.”

(A Noite do meu Bem – Dolores Duran)

A sua resposta foi um beijo. Não um beijo romântico e lento como o que demos mais cedo, mas um beijo urgente e cheio de tesão. Sua boca me sugava com desejo, como se aquele fosse o último momento de nossas vidas.

Por ser mais forte que eu, ele conseguiu me levantar do chão colocando minhas pernas em volta da sua cintura, isso sem soltarmos nossas bocas por um segundo sequer.

Caímos na cama com ele por cima de mim. Fui abaixando sua cueca e ele terminou de tirá-la. Me virei por cima dele na cama e comecei a beijar seu pescoço, seu peito, seus mamilos, descendo cada vez mais, até chegar ao meu objeto de maior desejo.

Era grande, mas nada muito assustador, e grosso. Fui dando beijinhos de leve por todo o corpo do seu pau e o engoli de uma vez, fazendo Vítor gemer bem alto de prazer.

Fiquei por ali um bom tempo e, sem pudor algum, fui descendo a língua até a sua entrada. Ele não demonstrou resistência alguma, me fazendo entender que eu podia fazer o que quisesse com ele. Fiquei lambendo e dando beijinhos naquela região por algum tempo embalado pelos seus gemidos altos.

Pus a camisinha no seu pau e fui sentando devagar. Fazia um bom tempo que não fazia aquilo e também devido à anatomia avantajada de Vítor, doeu bastante, mas logo passou, ficando apenas o prazer.

Comecei a cavalgar em cima dele com vontade, enquanto me deliciava com as expressões de prazer em seu rosto.

Ele gemia muito mesmo. Empurrava o corpo para cima enfiando seu pau inteiro em mim. Eu ia à lua e voltava.

Continuamos aqueles movimentos por um tempo até que ele falou:

- Sua vez.

Desci de cima dele e me posicionei na sua frente. Ele entendeu e levantou suas pernas. Coloquei a camisinha e fui o penetrando bem devagar, aproveitando cada centímetro. Em nenhum momento ele reclamou de dor ou me pediu para parar. Fui bem devagar no começo e ele logo começou a rebolar no meu pau. Parecia estar sentindo o mesmo tanto de prazer que eu, pois ainda estava tendo uma ereção.

Há muito tempo que eu não fazia amor com alguém e isso estava me deixando louco de tanto prazer. Eu gemia muito mesmo e ele estava adorando sentir meu pau entrando no seu cu.

Rebolava feito louco e falava coisas que eram impossíveis de se entender.

Seu pau estava mais duro que tudo e o meu parecia uma pedra. Estávamos fazendo amor e o mundo não existia ali naquele momento só nosso.

Depois de algum tempo naquele vai-e-vem, senti que ia gozar. Tirei meu pau de dentro dele e comecei a me masturbar. Ele fez a mesma coisa. Nos masturbávamos olhando no fundo dos olhos do outro. Ali, transbordando de tesão, gozamos um no outro e caímos, exaustos na cama.

Ficamos conversando por um tempo até que ele falou:

- Para que você usou camisinha? Eu sou só seu e você vai ser só meu mesmo...

- Vítor... - Falei sendo sincero, assim não ia enganá-loeu nunca mais na vida vou transar sem camisinha. Somente uma pessoa sentiu meu pau de verdade, sem essa capa de borracha. E só essa pessoa me comeu sem nada disso entre a gente. Isso nunca mais vai se repetir. Impreterivelmente!

Foi uma promessa...

E se você me quiser terá que ser assim.

Ele tentou demonstrar que estava tudo bem, mas no fundo mesmo ele sentiu o peso daquela minha atitude.

Não sei se ele achou que seria uma questão de tempo. Mas não foi, não é ainda e nunca será.

- Ok. Tudo bem para mim. - Mas me beija então.

O beijei sim e com verdadeiro sentimento de carinho.

Eu posso até ter sido duro demais, mas eu fui verdadeiroAntes de cairmos num sono profundo, ainda tivemos forças para um beijo.

Acordei com o Sol invadindo as grandes janelas do chalé. Fazia frio lá fora, mas eu me sentia aquecido. Vítor me abraçava, ainda dormindo nu atrás de mim. Eu me senti protegido do mundo em seus braços.

Enfim, eu acho que me sentia feliz.

A minha viagem de volta a Morro Velho tinha valido muito a pena.

Todo aquele sentimento que eu sempre sentia de que alguma coisa estava faltando foi embora.

Eu achava que o que me faltava era um passado, mas me enganei. O que me faltava era um amor.

Parece que não faltava mais.

Eu tinha Vítor, e não pretendia me separar dele de novo.

Não me permiti fazer nenhum movimento. Apenas fiquei encolhido nos braços de Vítor assistindo o Sol iluminar o mar de montanhas.

Pelos movimentos, percebi que Vítor acordava. Me virei para olhar seus lindos olhos verdes aparecendo atrás do seu rosto amassado de tanto dormir. Ele me deu um sorriso lindo e um selinho carinhoso.

As demonstrações de afeto eram maiores por parte dele do que de minha parte. E eu não sei dizer o porquê disso, pois eu estava gostando muito de tudo o que estava acontecendo.

Mas acho que ainda estava fazendo um novo caminho para mim.

- Bom dia, meu amor. - Eele falou ainda rouco de sono.

- Bom dia. Como foi sua noite? - Perguntei rindo.

- Foi ótima! Melhor do que qualquer fantasia.

- Fico feliz que tenha gostado.

- Sim! respondeu rindo.

- Vem, agora vamos tomar um banho porque ainda estamos sujos de porra e suor.

- Você é porquinho! - falou brincando.

- O porquinho aqui adoraria que alguém desse banho nele...

Ele riu e fomos caminhando juntos para dentro do banheiro, onde houveram mais beijos e juras de amor dele.

Ficamos o resto da manhã naquele clima de namorados. Tomamos café no chalé mesmo e só descemos na hora do almoço.

Comemos e fomos arrumar a mala para irmos embora.

- Queria ficar mais. - Ele falou enquanto entrávamos no carro.

- Também. Se não estivéssemos tão perto do natal eu aumentava nossa estadia.

- Bom, podemos voltar outra vez.

- Uhum.

No caminho conversávamos sobre amenidades.

Tudo entre nós estava bom, que nem nos lembramos do que Mariana havia feito.

Só voltamos à realidade ao entrarmos na fazenda do Cercadinho e vermos diversos carros de reportagem e muitos repórteres em frente à entrada do casarão.

- Mas o quê? - Falou Vítor bestificado.

- Eu não acredito que eles chegaram a tanto!

Parei o carro por reflexo e eles nos notaram. Parecia a final da São Silvestre.

Até eu, que estava mais ou menos acostumado, me assustei com a forma como eles correram até o carro querendo uma declaração minha.

Me senti zonzo com aquilo e demorei um pouco para absorver o que estava acontecendo. Olhei para Vítor que estava mais assustado do que eu.

- E agora? - Perguntei completamente perdido.

Ele me olhou, sorriu sem graça e respondeu.

- Que jeito? Vamos lá! - ele falou e pegou na minha mão.

Sorri admirado com sua coragem. Quando íamos saindo do carro, tio Alfredo apareceu na porta com uma espingarda na mão.

- Vocês têm cinco segundos para sair daqui. - e deu um tiro para cima que ressoou bem alto.

Foi uma corrida maior ainda dos repórteres até seus carros e de lá para fora da fazenda.

Eu e Vítor olhamos a cena e começamos a gargalhar ainda dentro do carro. Tio Alfredo nos salvou os expulsando da fazenda, pena que ele não podia os expulsar da cidade também.

Entramos na sede da fazenda assim que os repórteres saíram correndo. Tio Alfredo já tinha guardado a espingarda, mas ainda estava muito nervoso e andava de um lado para o outro da sala. Tia Rosa tentava acalmá-lo enquanto Rafinha ria da situação.

- Mil desculpas por isso, gente! - Falei ao entrar.

- Que isso, Bernardo, você não tem culpa. - Falou tia Rosa.

- Claro que não. A culpa é da Mariana que ligou para eles contando a história toda. - Completou Vítor.

- Ela fez o quê? - Gritou tio Alfredo ainda com raiva. - Até onde ela é capaz de ir?

- Nós todos sabemos aqui que muito longe. - Respondi.

- Sempre soube que essa menina ia nos dar problemas. - Falou tia Rosa.

- Eu avisava, mas ninguém me escutava! - Falou Rafinha.

- Enfim, parte da culpa é minha sim. - Falei. - Agora, se me permitem tenho que voltar para a casa da minha avó e enfrentar a fera.

- De jeito nenhum! Você fica aqui, onde eles com certeza não vão voltar.

- Muito obrigado, tia, mas eu não posso. Tenho que ir enfrentá-los.

- Você vai amanhã, hoje você dorme aqui.

- Não, tia... - Tentei recusar.

- Alguém tem algum problema com isso? - Ela perguntou.

Teoricamente ela estava falando com todos, mas entendemos que ela se dirigia mais a tio Alfredo. Ele balançou a cabeça, me olhou e disse:

- Fica por aqui hoje. Tem uma cama extra no quarto do Rafael.

Percebi que Vítor ia argumentar que no quarto dele tem uma cama de casal, mas dei um sinal para ele se calar. Não queria forçar a barra com tio Alfredo que ainda parecia estar se acostumando com a situação.

Deixar claro para ele que estou dormindo com seu filho não é um bom caminho a se seguir neste caso.

- Ok, mas só por esta noite. - Falei me dando por vencido.

Peguei minha mala no carro e coloquei no quarto de Rafinha, que não aguentando de felicidade e curiosidade já foi me perguntando:

- Vocês transaram, né?

- Rafinha! - Falei envergonhado.

- O quê? Eu sou curioso.

- Não vou conversar com você sobre essas coisas.

- Isso quer dizer que sim?

- Tá, ok, transamos. - Eu estava vermelho de vergonha.

- Nossa, vocês devem ter derrubado as paredes, sete anos segurando o gozo!

- Rafinha!

Ele ria e eu fui obrigado a rir também. Ele me abraçou e me beijou. Ele era lindo demais mesmo.

Vítor, que havia ido tomar banho, apareceu na porta do quarto e me sequestrou, não deixando espaço para o irmão caçula protestar.

Ele me empurrou para dentro do seu quarto, trancou a porta e já foi pulando em cima de mim num beijo ardente.

- Seus pais... - Falei quando finalmente consegui desgrudar nossas bocas.

- Meu pai foi à cidade e minha mãe está ocupada cozinhando, ninguém vai vir nos importunar.

- Vítor...

Fui protestar, mas ele já havia me calado novamente com seus beijos. Ficamos naquele amasso gostoso por muito tempo. Lá fora o sol já estava se pondo atrás da montanha. Ainda em cima da cama, me deitei em seu peito e ficamos calados apreciando a vista da sua janela. Senti que ele estava se segurando para me falar alguma coisa, e não estava enganado.

- Bernardo?

- Sim?

- Você gosta de ser famoso?

Ali estava. Eu sabia que os fotógrafos tinham incomodado ele bem mais do que ele estava demonstrando. Senti medo daquela pergunta, mas não por causa da resposta e sim por causa da discussão que ela acarretaria. Ele começava a se dar conta do mundo que me cercava.

- É uma questão complexa. Tem dois lados. Eu gosto do reconhecimento, de me sentir admirado e invejado, faz muito bem para o ego. Mas como você pode ver hoje, existe também a parte ruim. Qualquer coisinha que você disser ou fizer pode acabar virando manchete de jornal.

- Você conseguiria viver sem a fama?

Nós dois conversávamos sem nos olharmos, ainda na mesma posição. Eu já não estava gostando nada do rumo daquela conversa.

- Sem a fama sim, sem minha profissão não.

- Mas a sua profissão cobra um preço muito alto da sua vida pessoal, não?

- Sim, mas eu escolhi pagar esse preço.

- Mas as pessoas à sua volta não escolheram...

- Verdade. Mas a música faz parte de mim, e com ela veio a fama. Se alguém me fizesse escolher entre ela e a música, uma coisa que me faz tão feliz, eu teria sérias dúvidas se essa pessoa me ama de verdade.

Apesar de verdadeiras, eu não queria ter dito aquelas palavras daquela forma tão dura. Nós dois entendemos muito bem sobre o que estávamos falando: o futuro do nosso relacionamento.

Acho que aquilo sempre nos preocupou desde que concordei em tentar com ele novamente, mas ambos nos calamos com medo de que o momento mágico que vivíamos fosse quebrado.

A aparição dos fotógrafos nos forçou a encarar aquela questão. Deixar minha carreira de cantor estava fora de questão, mas eu entendia que aquilo poderia ser coisa demais para Vítor lidar.

Chegamos a um impasse.

- Acho melhor eu ir tomar banho, daqui a pouco sua mãe já está nos chamando para jantar.

- Vai lá, pode usar meu banheiro.

Me levantei da cama e ele tinha o olhar perdido em algum ponto do horizonte pela janela. Lhe dei um selinho carinhoso, fui no quarto do Rafinha, peguei minha roupa na mochila e uma toalha, e fui para o banheiro.

Enquanto a água caía sobre meus ombros, eu tentava achar uma solução para aquela complicada situação com Vítor.

Nossas vidas eram incompatíveis.

Um não podia pedir ao outro para abrir mão delas porque seria egoísmo. Uma vez ouvi falar que só amor não é o bastante. Seria esse o caso?

Ou nos amávamos o bastante para superar qualquer obstáculo?

Saí do banho e Vítor me avisou que o jantar já estava pronto. Nos sentamos à mesa como no dia em que cheguei a Morro Velho, mas era diferente. Se há mais de uma semana todos naquela mesa estavam tensos, agora nós nos divertíamos relembrando passagens de quando eu morava lá.

Até tio Alfredo sorria para nós, visivelmente alegre, mas eu desconfiava que tinha uma certa influência do álcool ali.

Como uma família feliz, depois de jantar nos sentamos na frente da televisão para ver as novelas. Fazia anos que eu não assistia TV, por falta de tempo mesmo, e não entendi nada das tramas, mas mesmo assim eu me diverti como há muito tempo não acontecia. Eu estava feliz e em paz ali. Olhei para Vítor que assistia atentamente à novela como se aquilo fosse a coisa mais interessante do mundo e ri em silêncio.

Pela primeira vez na vida, eu senti uma vontade real de construir uma família, de preferência com Vítor.

Mas nós conseguiríamos? Seria possível burlar nossas diferenças e sermos felizes? Seria possível adequar nossas vidas e ficarmos juntos?

O nosso amor seria capaz de sozinho vencer tudo?

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Comentários

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A fama, até certo ponto, pode até ajudar, mas tbm atrapalha bastante principalmente no relacionamento. Hj em dia não muito, porém ainda atrapalha. Mas na época em que se passa a história, ainda atrapalha bastante. Vamos ver se Vitor vai conseguir viver ou se adaptar ao mundo do Bernardo. Super ansioso por isso!!!!

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