Sobre o ato de amar.

Um conto erótico de buschtabieren
Categoria: Homossexual
Contém 1342 palavras
Data: 13/02/2005 20:28:20

Talvez possa existir quem diga que a nudez feminina seja o reflexo da sua própria alma, crua, e para muitos, cruel. Encantadora de qualquer forma! Na quase totalidade das vezes. Corpo, movimento, odor, sedução, sentimento e... carne. A mais atraente, quente e sedutora... carne. Seios, quadris, coxas, bocas, sim, bocas, cabeça e olhos, não necessariamente nessa ordem. Foram exatamente durante sete dias e sete noites. O verbo amar conjugado reflexivamente. Sim. Absolutamente. Amamo-nos. Como se fôssemos as duas únicas criaturas sobre a face da Terra. Como uma "science fiction picture". Nossos corpos nus sentindo o sabor da uma terna brisa vinda do mar. Só para nós, como carícias do vento comum-de-dois. Poderíamos ter saído, assim, como estivéramos, nuas e as pessoas, talvez, nem percebessem. Exigiria delas algo mais que dois simples olhos. Como se existíssemos em alguma dimensão, dessas, paralelas, onde não há nada além de liberdade e plenitude. Como se somente o tom de nossas vozes fosse capaz de ser ouvido, ao menos para nós, quebrando um tétrico e sepulcral silêncio existente até então, onde o verdadeiro amor batera na porta pela primeira vez. Junto a ele, o mais prazeroso sexo que duas pessoas poderiam compartilhar. Algo fantástico, surreal, compulsivo, quase indescritível. O desfrute dos mais intensos dos prazeres carnais nos fôra, então, permitido. Talvez os únicos seres com tal permissão. Ficávamos nos alimentando uma da outra, como se nos bastássemos, canibalisticamente... Mas... E na manhã do oitavo dia. Reluto, ainda, em adentrar na lembrança daquela fatídica aurora. Naquela melancólica e cinzenta manhã, que nem o sol ousou aparecer, comovido talvez, encontrei o seu lado da cama vazio, frio, ausente. Até seu cheiro, que sempre me lembrara a flor-de-mel, se fôra, evanesceu, como se nunca tivesse existido. Todavia guardei na lembrança imagens. Muitas imagens, principalmente, a de vê-la dançando, nua, quase sempre nua... ¾ dançavas "A time for us", como em uma valsa, ainda hoje, uma das minhas preferidas, sublime ¾ Encostada a seu travesseiro, havia somente uma carta, enrolada, presa com uma estreita fita de cetim branco... Poderia ter sido vermelho. Mas não, e ainda hoje me pergunto, quais seus significados. A fita, o cetim, o branco...Talvez, nenhum. Sua letra trêmula, talvez escrita com a mão contrariada. Protestando em escrever o que insistia em escrever. Deixou-me algo com que eu pudesse me apegar e tentasse suportar os dias que viriam. É, assim, começaram os mais sombrios dias de minha existência. Não poderia ser menos dramática. A definição é incontestável. Poderia dizer que minha razão de ser até então estava justificada por tê-la conhecido. Os segundos se passavam, eternos. E eu evitava a muito custo que se apagasse de minha memória a doce maciez de seus cabelos cacheados, presos de tal maneira, que alguns fios pendiam propositadamente apenas para esconder suas orelhas. Embora nada em você precisasse ser escondido. Sempre adorei vê-la, nua ainda mais. Houve dias em que tinha a nítida impressão de tê-la junto a mim, novamente, como se jamais tivesse partido. E a sensação era de poder tocá-la, outra vez, assim, como naqueles dias. Inesquecíveis dias. Sete dias. Sentir a sua pele, tão suave, com seus minúsculos pelinhos. Que eu brincava, comparando-os com pele de pêssego. Seus lindos seios com seus mamilos tão pequenos, desenhados só para compô-la, para que eu pudesse, então, admirá-la. Ainda hoje, passados mais de vinte anos, guardo-as, você, a carta, entre meus objetos mais íntimos. Como jóias preciosas. E não deixam de ser. Pois a carta é parte de você. São suas palavras. Vindas do mais íntimo do seu ser. Li, li, reli... Deixei de contar depois das duas centenas de vezes que a li. Talvez, na tentativa de tê-la novamente ao meu lado. Assim como um passe de mágica e você estaria aqui do meu lado. Rindo de olhos fechados. Linda. Como sempre. Seus dentes envoltos em saliva. O contraste da sua língua. O papel da carta, amarelecido pela implacabilidade do tempo. Com manchas que minhas incontáveis lágrimas deixaram. Ácidas, corrosivas. Não foi nem uma, nem duas, as vezes em que a deixei sob meu travesseiro na vã tentativa de sonhar com você. Como se fosse o suficiente. Talvez, quem sabe, na milésima vez em que venha a ler sua carta, você volte... às vezes penso assim, como num realismo fantástico. Não me importaria! Mas eu já perdi a conta e volto a ler... pois nunca vou desistir!.. Leio como se a ouvisse falando só para mim... só para mim... bem pertinho e você diz ... sussurrando com sua deliciosa boca... com seu hálito que me entorpece a alma... assim, coladinha ao meu ouvido: "...o ato de amar requer, antes de tudo, comprometimento, partilha, comunhão. Diferente de sexo, que é objetivamente carnal, satisfativo, quase como uma necessidade fisiológica. Há quem os confunda e eu os entendo. Há, sei, quem procure primeiro um e depois o outro, ou o primeiro, requisito do segundo, ou a concomitância. Bem! Houve um tempo em que, adolescente, confundia "fazer amor" com "fazer sexo". Como se fossem sinônimos. Mais tarde, depois das tantas aventuras e desventuras, consegui distingui-los. Mas sei que, ainda, há quem insista em chamá-los de sinônimos. Lembra do filme que assistimos juntas? "Susan e Jeremy, o primeiro amor". A primeira experiência dos incipientes, no amor e no sexo. O rapaz, inteligente, estudioso, cheio de fantasias próprias da idade. Ela não muito diferente dele, mas com aquele romantismo tipicamente feminino. Ficava clara a relação dos opostos, seja ela, entre homem e mulher, pobreza e riqueza, razão e sentimento, amor e sexo, o feio e o bonito, união e separação, alegria e tristeza. Tomara todos pudessem aprender a amar assim, numa aprendizagem simultânea, sem aluno, nem professor... Mas... entendo que o amor é algo, não só mais abrangente, como também essencial para que ocorra sexo. Nem que seja, no mínimo, o amor próprio, o amor que temos por nós mesmos para podermos sobreviver, natural, instintivo. Sem isso, há suicídio, ou, quando ocorre sexo, nada mais que pura violência, estupro, crime, barbárie, doença. Quanto à união dos sexos, seja ela hetero, bi ou homossexual, entendo que a denominação nada mais é que fruto de uma educação convencional da nossa preconceituosa e rotulista sociedade. Como se tudo que existe no mundo pudesse ser catalogado de forma a ficar arrumado como numa prateleira de supermercado. Nada mais que convenções, tolas convenções. No intuito nada mais que preservacionista, convencionaram ¾ e eu não participei da decisão ¾ que seria mais, para não dizer só, saudável a união heterossexual para que a espécie humana pudesse se manter. Preservada. Em grande parte, um dos motivos de serem os dogmas cristãos eminentemente heterossexuais foi a confusão existente entre preferência sexual com os vícios decorrentes da sua prática. Mas muitas pessoas ainda confundem a bissexualidade e a homossexualidade como sinônimos de promiscuidade, perversão. A visão de que qualquer prática diferente da heterossexual é desvio de conduta, doença ou anomalia, não passa de decorrência do equívoco decorrentes dos ofuscados dogmas religiosos impostos desde os princípios do cristianismo. As diferentes opções sexuais sempre existiram, desde o início dos tempos, sem que, com isso, a espécie humana tivesse sido ameaçada. A preservação sempre esteve segura, mas para quê? Não sei. Ainda entendo que a única nocividade capaz de ameaçar a espécie humana é a falta de amor. A falta de amor a si mesmo, ao próximo e à própria existência. Alguém muito bem poderia dizer que, quando se ama, verdadeiramente, sem ver o objeto amado, independentemente de qual seja seu sexo, com certeza teria atingido um nível, talvez, superior... Elevado. Não quero dizer que todos um dia venham a atingir essa elevação, não. Certamente, nem daqui a milhões de anos. Faz parte da essência do ser humano. As dessemelhanças. O apego à materialidade fútil. Um nível superior! Esse a que me refiro seria privilégio de poucos. Identificá-lo, rotulá-lo. Se assim o fizesse, estaria cometendo o mesmo erro até então cometido... desde os tempos mais remotos... hoje, quando parto para meu destino incerto, posso dizer, com convicção, que amo...que amo, realmente, você... E... lembre-se! Lembre-se sempre disso!..."

E-mail= suelenbuschtabieren@yahoo.com.br

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