Meu filho, o que houve?
- Me solta! Me deixa em paz! Para de fazer isso comigo.
- Filho, não estamos fazendo nada, você está bem?? O que aconteceu??
- Para! Para por favor! Não! Para pelo amor de Deus! – eu ouvia os gritos cada vez mais altos, pensei que eu iria enlouquecer, que aquilo nunca ia acabar.
Sei que de repente tudo acabou e eu despertei. O teto era branco, não havia janelas, uma porta também branca, tudo era branco. Eu estava deitado em uma maca com uma camisola de hospital e com meus braços e pernas amarrados com ataduras.
Eu tentei me desamarrar, mas não consegui, queria chamar alguém, mas estava muito fraco, literalmente dopado, deviam ter me dado um tranquilizante. Tentei me libertar novamente e parecia que estava novamente dentro daquele pesadelo e logo entrariam para me ridicularizar... voltei a chorar.
Não demorou muito e um médico entrou, eu fiquei esperando ele me xingar, mas não, ele me cumprimentou e me analisou:
- Boa tarde Eduardo.
- Boa tarde.
- Como você se sente?
- Como eu vim parar aqui?
- você teve um ataque histérico, entrou em surto e foi trazido pra cá.
- Não foi um pesadelo?
- Não, você fez algumas coisas que assustaram sua família, mas eles conversarão com você.
- Eu estou melhor?
- Isso que vamos ver, você vai ficar mais uns dias aqui, em observação e tendo apoio psiquiátrico.
- Entendi. Você pode me desamarrar?
- Vai se comportar?
- Sim.
Ele veio e me desamarrou e eu me senti bem melhor. No final da tarde minha mãe e meu pai foram me ver. Eu estava muito envergonhado por tudo o que aconteceu, mas tinha que encará-los.
- Oi meu amor, você está bem?
- Sim mãe, só meio zonzo...
- Você nos deu um susto!
- Desculpa mesmo, estou morrendo de vergonha...
- Deveria sentir, você estava todo gozado e gritando igual um doido!
- Marcos, cala a boca! – Gritou minha mãe com ele.
- Deveria estar drogado! Você está usando drogas Eduardo?? Não vou admitir drogas na minha casa!
- Sai daqui! – falei com ele.
- Sai logo Marcos! – minha mãe falou empurrando ele.
- Viciado! – e saiu.
- Mãe, eu juro pela minha felicidade, eu nunca usei drogas, eu... eu... estava ouvindo vozes gritando comigo, era como se um pesadelo não terminasse e perdi o controle. O esperma é que... acordei assim. A senhora entende né?
- Claro meu filho, nunca pensei mau de você, o médico fez exame e falou que você estava limpo, e diagnosticou como ataque histérico. Agora me promete uma coisa...
- O que mãe?
- Vai conversar tudo com o psiquiatra, fala francamente com ele... ele não vai nos falar nada, não queremos saber da sua vida, só queremos você bem...
- você quer né mãe... aquele cavalo não quer nada, só me acusar.
- Não fala assim do seu pai... ele só está assustado, pensou que tinha te perdido para as drogas.
- Manda ele ir a merda!
No final da hora de visita eles me deixaram lá. Mais tarde eu recebi a visita do psiquiatra. Ele chegou de mansinho... eu estava sentado na cadeira ouvindo rádio e ele chegou me saudando:
- Bom dia Eduardo, como você está hoje?
- Tô ótimo, quero ir logo pra casa.
- Bem, mas você não pode sair ainda, temos que saber o que aconteceu com você para podermos te ajudar.
- Não aconteceu nada demais, eu só tive um pesadelo e acordei gritando, só isso.
- Hum... e as coisas que você quebrou? E as pessoas que você quis agredir? Nós precisamos te sedar para você não machucar mais ninguém... você se lembra disso?
- Não, eu fiz isso tudo?
- Sim, gritava que não era verdade, mandando parar, parar, mas não dizia o que tinha que parar, assim você começou a tentar bater em todos ao seu redor, como se fosse seus pais e amigos que estivessem te afligindo.... não se lembra disso?
- Lembro do que me afligia, mas não de ter feito tudo isso... Eu machuquei alguém?
- Não, conseguiram te segurar até a ambulância chegar, você só arranhou seu pai e tentou morder sua mãe – não resisti e comecei a chorar.
- Não queria fazer isso! O que aconteceu comigo? Porque eu fiz isso?
- Calma, fica calmo... quer se deitar, é melhor para relaxar e podermos conversar.
- Não posso te falar nada, é muito particular.
- Eu juro, juro pra você que nada do que você falar aqui vai ser revelado para ninguém, nem para outros médicos, nem para seus familiares, será um segredo meu e seu, porque eu quero te ajudar, não queremos que isso aconteça de novo e eu sei que algo está a ponto de explodir em você.
- Como você poderia me ajudar?
- Conversando, primeiramente, mas se for algo muito grave, com medicamentos que só você vai saber por que.
- Você jura? Isso pode acabar com a minha vida se você contar pra alguém...
- pode confiar...
Eu fiquei em muita dúvida se deveria contar tudo para ele, mas aquilo estava gritando dentro de mim e eu precisava conversar com alguém sobre isso, então que seja um médico não é? Mas mesmo assim eu fiquei completamente perdido, sem saber o que fazer, se deveria contar ou não. Mas algo em seus olhos me fez confiar nele, eram azuis clarinho, quase como os olhos do Bruno, porém do os olhos do Morcego eram cinza como uma manhã nebulosa e eu me perdi dentro daquela neblina, aquele médico poderia me trazer de volta pra realidade.
- Bem... eu estou sentindo coisas que eu nunca senti antes, estou tendo desejos que nunca tive e eu estou em dúvida se eu estou ficando maluco ou não...
- Sim... mas começa do começo, que desejos você sente? – mas eu fiquei mudo. – tem vontade de ter coisas que não são suas? – mas eu neguei com a cabeça – você... tem vontade de machucar alguma pessoa, ou algumas pessoas?
- Não!
- Você deseja ter relações amorosas com alguma pessoa? Uma pessoa do mesmo sexo? – Eu olhei fixamente pra ele e as lágrimas voltaram a rolar novamente, tranquilamente dos meus olhos. – É isso? – e eu afirmei com a cabeça. – Ok, agora respira fundo e se tranquilize, fica calmo, está tudo bem.
- Não! Não está tudo bem!! Isso não é normal, eu nasci homem e não posso estar me tornando viado, isso é absurdo, como se nascesse carro de árvores, o mundo está de cabeça pra baixo, isso está me matando!
- Calma Eduardo, calma, não precisa ficar nervoso. Vamos do começo e nós vamos entender, juntos, o que está acontecendo com você, talvez não seja nada demais, fica tranquilo.
- Ok, ok.
- Então, como você começou a sentir esses outros sentimentos?
- Bem... minha irmã tem um amigo que me tira do sério, ele me irrita demais, eu tenho muita raiva dele, tudo o que ele faz me irrita.
- Você sente isso desde que conheceu ele?
- Não, foi desde que eu o peguei no meu quarto mexendo nas minhas coisas.
- Como foi isso?
- Eu sai do banho e fui para o quarto e peguei ele lá. Juntei ele pela blusa e o joguei pra fora do quarto.
- Hum... teve um contato físico bem próximo né...
- Sim, mas minha vontade era quebrar ele...
- mas não o fez...
- Não.
- E depois disso?
- Sempre que eu o via, sentia vontade de mexer com ele, causar-lhe dor de alguma forma e eu escolhi humilhá-lo...
- E o que ele fazia?
- Nada! Só ficava parado com uma cara de babaca, me olhando e que olhada que ele tem, um olhar 44, que parece que quer olhar nossa alma, é muito estranho.
- E quando você começou a sentir algo diferente de raiva?
- Sei lá, de repente minha mente começou a me sacanear, a ficar pensando nele, primeiro em como ele é babaca, mas depois ela começou a cogitar que ele era bonito e por fim, na noite passada eu sonhei que... sonhei que... nós transávamos.
- Hum... isso perturbou você?
- Claro, porra, eu sou macho, não era pra eu sonhar que estou pegando outro cara, é loucura! Eu acordei assustado com aquilo e não acreditando no que tinha rolado... então eu me vi no meio de um monte de gente gritando que eu era viado, bichinha e outras coisas, tentei fazê-los parar, mas não conseguia, então comecei a gritar para eles pararem com aquilo e a brigar com eles... Acho que nessa hora que eu perdi os sentidos né?
- Sim, você teve um surto mesmo, mas não que você esteja louco, mas só está apavorado, isso que você sente é medo. O rapaz sabe que você sente isso?
- Ele me ama.
- Como você sabe?
- Ele me falou, não falou diretamente, mas através de uma música.
- Qual?
- Eu preciso dizer que te amo.
- Hum... então Eduardo, eu tenho que te dizer a verdade... Eu já sei o que você tem...
- O que houve? O que eu tenho?
- Nada.
- Como assim nada!?
- Você é absurdamente normal!
- Mas e tudo isso que eu fiz?
- Você só usou o instinto de proteção que todos nós temos... quando estamos acuados, apavorados, nós atacamos e foi isso que sua mente fez, ela te atacou e você tentou atacar ela, mas não tem como atacar nossa própria mente. Você entende? Houve uma luta dentro de você, uma guerra que só deu uma trégua, e se nós não cuidarmos dos seus medos, ela vai recomeçar.
- Mas é normal eu sentir tudo isso?
- Claro que é!! Porque não seria normal você ser gay?
- Gay é a puta que te pariu!!! – falei levantando, já pronto pra dar nele.
- Calma Eduardo, eu não estou te chamando de gay, não estou te acusando, só estou te fazendo refletir. Deita ai novamente por favor. Vou perguntar novamente e quero que você reflita antes de responder. Porque não seria normal você ser gay? – aquela pergunta fazia meu sangue ferver.
- Porque ser gay é uma merda! Ninguém te respeita, todo mundo te julga, além do que não é normal uma porra dessas.
- Entendi... Então você acha que o amigo da sua irmã é um maluco, um anormal.
- Sim!
- Me diz quem pra você é normal!
- Eu, você é, meus pais...
- rsrs, e se eu for gay? Se seu pai, antes de se casar com sua mãe, tivesse tido relações com outros homens ? Se sua mãe tem relações com outras mulheres? Ela é anormal? Sua mãe é anormal?
- Sim, mas... mas... ela é minha mãe né...
- E porque é diferente com os outros?
- Não sei...
- Se você sentir um desejo incontrolável por esse rapaz, isso faz realmente você se tornar uma pessoa pior?... Reflete.
- Isso está me deixando mais confuso...
- Eu vou te dar alta, mas com uma condição...
- Qual?
- Você vai no meu consultório uma vez por semana para nós conversarmos mais, ok?
- Tudo bem... mas eu sou um perigo para a minha família?
- Não, só pra você mesmo.
- Eu vou me matar?
- Quem sabe, possivelmente não, mas vai sofrer muito se não for ajudado. Você precisa se entender, entender a sociedade, pra poder resolver seus problemas.
- Tudo bem... eu sou gay?
- O que você acha? Eu não posso dizer o que você é ou deixa de ser, você é quem tem que saber isso e aceitar isso na sua vida e não ficar lutando contra... Se você for gay, eu te garanto que as pessoas que te amam não vão te julgar por isso, quem ama de verdade não julga, você mesmo me falou isso agora, se sua mãe fosse gay, você não a julgaria. Só mais uma coisa, esse menino está sofrendo tanto ou mais que você, então tenta ser bonzinho com ele ok?
- Vou tentarEstamos muito felizes com os comentários e qe todos estão gostando. Valeu meu povo! Abração
luiz-boladao1@hotmail.com e eduardocastilhoedu@hotmail.com