CAPÍTULO I
Existem diversos tipos de pessoas; pessoas com muita sorte, pessoas com muito azar; pessoas que se dão bem na vida, pessoas que nem tanto; pessoas para que a vida sorri apenas uma única vez e pessoas para quem o destino apenas tem um leve escárnio; enfim, não importa quantas pessoas exista, o que importa é que para cada uma delas o destino reserva um destino inesperado e, na maior parte das vezes, insólito.
De alguma forma, sob este aspecto, observa-se que a vida é uma experiência que deve ser apreciada – sim apreciada – em todos os sentidos e com todos os sentidos, sem se importar muito com as consequências, exceto é claro, quando essas forem danosas para si próprio, ou ainda para outros que não tem nada a ver com isso.
Vejam o caso de Afrânio que vamos contar agora. Desde muito pequeno este sujeito mostrou-se um indivíduo sem perspectiva, mais um daqueles que iria passar pela vida sem muita agitação. Apenas passaria como uma pessoa, um rosto desconhecido em meio a milhares, milhões que transitam diuturnamente pelas cidades, metrópoles e demais cercanias.
Assim seria não fosse certa dose de ironia do destino em relação ao dito cujo. Afrânio não era simpático, não tinha charme, sua educação era mínima: curso colegial completo como ele mesmo costumava dizer e ainda um “superior incompleto” que ele simplesmente se recusava a declarar em que especialidade, até mesmo porque, provavelmente, ele não se lembrava.
Tinha um emprego miserável, de encarregado de segurança em uma empresa multinacional, fato este que compensava toda a sorte de humilhações à quais era submetido tanto pelos colegas como pelo seu superior, um obeso médio de cara amarela e feições grosseiras, chamado Coutinho, supervisor de segurança, que também achava ótimo o emprego pelos benefícios e ainda pelo salário que não era ruim. Tanto Afrânio como Coutinho eram obrigados a manter contatos ocasionais durante o expediente, porém sempre dentro de um falso formalismo que se impunha pelo ambiente de trabalho e muito mais pelos olhares constantes do Diretor de Patrimônio.
Jefferson, ou simplesmente Jeff, era um sujeito pálido como cera (americano “of course”), de olhos azuis claros profundos e brilhantes com cabelos de cor platinada que, além de exercer o cargo de Diretor de Patrimônio da empresa e chefe mediato de Coutinho e Afrânio, também era homem de confiança da alta administração do grupo econômico sediada nos Estados Unidos da América. Este americano estranho mantinha uma constante vigilância sobre seus subordinados, pois além de conhecê-los pelos primeiros nomes sabia de tudo que acontecia à sua volta, tanto dentro da empresa como fora dela. As despesas pessoais de cada empregado eram objeto de sua constante observação e qualquer deslize ou excesso era imediatamente acusado e se tornava objeto de uma diligência particular em relação àquele funcionário, podendo este, inclusive, ser demitido se a sua justificativa não fosse adequada.
Diziam que o sujeito havia sido agente da C.I.A., razão pela qual tornara-se um especialista tão requisitado vindo a trabalhar naquela empresa a convite direto do CEO (Chef Executive Officer) que não aceitou qualquer escusa para ter Jeff em seus quadros; se bem que... Dizem à boca pequena que o interesse transcendia ao profissional.
Enfim. Voltemos ao nosso amigo Afrânio. A vida corria de forma discreta e medíocre para ele, e tudo parecia caminhar para um futuro totalmente previsível e sem sobressaltos. Parecia. Certo dia, não mais que de repente, Jeff anunciou que Coutinho ia ser promovido a seu assessor especial deixando vago o cargo que ocupava e, consequentemente, oportunizando a promoção de um de seus subordinados.
Afrânio, tomado inicialmente de sobressalto pela notícia, viu, no entanto a oportunidade de sua vida! Pela ordem natural das coisas, acreditava ele em seu raciocínio curto, que ele seria o mais indicado a ser o substituto de Coutinho e, assim seria.
Imediatamente, foi cumprimentar o colega de trabalho abraçando-o efusivamente sob os olhares argutos de Jeff. No mesmo momento sussurrou em seu ouvido se ele teria qualquer chance na promoção. “Vamos ver, vamos ver”, foi a resposta imediata de Coutinho que aproveitou o abraço e o sussurro para responder-lhe de forma próxima demais para qualquer gosto.
Seguiu-se um pequeno discurso de Jeff e outro de Coutinho, ambos repletos de ironia e sarcasmos característicos, ouvido avidamente por Afrânio que esperava naquele mesmo momento o anúncio de sua promoção para o cargo vago, fato este que não se concretizou, causando enorme mal-estar não apenas o interessado, mas também nos demais presentes que, de alguma forma subconsciente acreditavam que ele, Afrânio, seria indicado para a promoção. A não concretização deste evento, além de decepcioná-lo, frustrou-lhe expectativas, bem como tornou-se alvo dos comentários maldosos de seus pares.
De qualquer maneira, Afrânio não podia se dar por vencido; ele tinha que tentar convencer o seu superior geral que ele era a pessoa indicada para o cargo. Ademais, seria seguir “a ordem natural das coisas”, pensou com aquela obviedade que macula a inteligência humana nas horas mais inapropriadas. E ainda teria que ser naquele dia, pois caso esperasse mais, ou o caso iria “esfriar”, ou, pior do que isso: alguém poderia sair atirando na frente.
No final da tarde, quando Afrânio já havia decidido que aquele ia ser o momento de “dar o bote no chefe”, foi informado que iria rolar uma comemoração num restaurante próximo, verdadeira “boca livre financiada pelo boss”, como todos diziam evento que confirmou as intuições estúpidas daquele indivíduo pobre de espírito e de espirituosidade, dando-lhe aquela certeza característica dos falsos vencedores de uma oportunidade imperdível. “Vamos ao ataque”, pensou Afrânio que, ao contrário do que fazia habitualmente, não deixaria de aproveitar a oportunidade que se descortinava na comemoração que estava por vir.
E a festa rolava solta, com tudo a que tinham direito. Risos histéricos de alguns, malícia no olhar de outros, e muita, muita bebida alcoólica para satisfazer todos os desejos incultos e incautos que naquele ambiente fervilhavam em corações e mentes, desde as mais pervertidas até aquelas que se consideravam acima de tudo e de todos.
Afrânio, com algumas cervejas na cabeça, acompanhadas de outras doses de uísque de boa safra, lá pelo adiantado da hora, decidiu que era chegado o momento de conversar com o chefe e expor-lhe os motivos “relevantes e significativos” para que ele fosse o novo supervisor de segurança, achando que as bebidas a mais, o cheiro insuportável de álcool somado com aquele odor arrastado de fim de expediente, seriam mais que suficientes para convencer Jeff de que ele era a pessoa certa para o lugar certo.
Com passos meio incertos, mas constantes, caminhou na direção da mesa onde estavam Coutinho, Jeff e outros integrantes da “cúpula” da empresa. Caminhava e pensava, caminhava e treinava as palavras que iria dizer; pensava com firmeza nas assertivas que fariam com que aquele “gringo dos infernos” se convencesse do óbvio, concordando docilmente com o pedido (grande final de sua eloquência paupérrima) de promoção. Afinal, era seu direito, ele merecia aquele gesto de reconhecimento por aturar as brincadeiras sem graça de Coutinho, os comentários maledicentes de seus colegas sobre sua capacidade limitada de cidadão “pouco esclarecido, mas esforçado”, e as observações mais acuradas dos mais próximos que não “lhe davam um centavo furado de credibilidade”. Tudo isso seria vencido ali, naquele momento.
Estava muito próximo de atingir seu objetivo quando percebeu que Coutinho – como sempre mais rápido e mais esperto – levantou-se de onde estava e caminhando em sua direção abraçou-o pelo pescoço fazendo ambos girarem na direção oposta àquela em que Afrânio caminhava com relativa determinação e, afastando-o da mesa onde estava o pessoal da diretoria, forçou a caminhada em acompanhamento, mais parecida comum páreo empatado de cavalos de fraco desempenho.
“Eu sei o que você quer malandrão!”, disse Coutinho com um tom de voz totalmente embargado pelo excesso de álcool que já havia consumido. Afrânio fez expressão de espanto, mas ele também percebeu que Coutinho não havia chegado aonde chegou se não fosse um pouco mais esperto que a grande maioria dos que o cercavam no ambiente de trabalho.
“O que você quer dizer com isso?”, perguntou o sujeito tentando fazer ares de despercebido da situação. Antes que houvesse qualquer resposta por parte do céu companheiro, ambos entraram no banheiro masculino do restaurante, e na mesma sequência insólita, viu-se lado a lado com um individuo que abria o zíper das calça e começava a tentar acertar o coletor de urina fixado na parede, mas que acabava por mijar em seu próprio sapato.
“O negócio é o seguinte, bonitão, estou sacando qual a sua e se você quer tanto assim uma promoção vai ter que entrar no esquema”, disse Coutinho com uma expressão embargada e um hálito tão carregado que Afrânio pensou que ia desmaiar quase de imediato.
“O que você está tentando insinuar? Que eu não sou o indicado?”, retrucou Afrânio com a certeza de que dava as cartas daquele jogo meio desconhecido para ele. E antes que pudesse esboçar qualquer outro comentário, enfrentou o olhar direto de Coutinho que enquanto tentava em são fechar o zíper da calça disse demonstrando muito mais autocontrole do que seria esperado de um bêbado. “O cargo é seu. Eu o indiquei. Não que você merecesse, mas porque eu quero que você o ocupe. Mas, como você bem sabe a vida não é mole para quem é leso; então, meu chapa, o negócio é o seguinte”, e neste momento enfiou a mão no bolso do paletó e sacou de um papel onde se via um endereço anotado.
“Esse é o endereço de um lugar onde podemos conversar melhor. Te espero lá após esse bundalelê terminar. E vê se não vai dar pra trás! Eu conto com você”. Na mesma seqüência, Coutinho voltou-se em direção à porta e desapareceu daquele banheiro onde o que restou foi apenas o odor forte da sua urina e o rosto estupefato de um sujeito que não havia entendido nada daquela conversa estranha.
CAPÍTULO II.
Afrânio ainda estava completamente atônito com a conversa que tivera com Coutinho minutos atrás no banheiro do restaurante onde rolava a comemoração pela sua promoção dentro da empresa. Ele não era capaz de entender ao que se referia seu ex-colega quando disse “conversar melhor”, conversar melhor sobre o quê? Ou ainda sobre quem, e com quem? Não dava para compreender a dimensão daquela realidade absurda, mas real que ele sequer imaginava até onde iria chegar.
De qualquer modo, Afrânio procurou se recuperar do choque do que ouvira e o mais rápido que pôde retornou ao salão do restaurante onde o clima de confraternização havia alcançado níveis fora do controle. Alguns funcionários conversavam entretidos em uma mesa enquanto em outra, todos babavam pela secretária de Jeff, uma loura estonteante cujo decote só não era mais ousado porque poderia parecer vulgar. Ao mesmo tempo, na mesa do chefe ele próprio, Coutinho, uma assessora e outra mulher que Afrânio não conseguia identificar conversavam de forma sutil com uma animação meio que “selvagem”.
Ele não sabia o que fazer. Olhou para o relógio e decidiu que estava na hora de cair fora daquele hospício corporativo. E foi o que fez, saiu de fininho, implorando mentalmente pra não ser percebido. Pegou seu carro e, meio que sem direção, simulou dirigir-se para casa. “Casa?”, pensou ele; “Que casa que nada! Apenas um local para comer e dormir durante o final de semana”.
Rodou por algum tempo que não sabe precisar quanto, até que, parado em um semáforo, lembrou do bilhete que Coutinho enfiara em seu bolso. Pegou, abriu o pequeno papel leu e depois pôs-se a pensar. E pensou. E pensou. Pensou até o momento em que foi tirado bruscamente deles pela buzina estridente do veículo que estava imediatamente atrás do seu.
“Toca o barco”, pensou mais uma vez antes de arrancar com seu carro seguindo inconscientemente na direção do endereço que lera no bilhete. Não sabia o que o aguardava, mas tinha certeza de que não podia ser boa coisa vindo de um sujeito sórdido como o Coutinho. Um sujeito que nunca fora seu amigo, nem mesmo de forma, digamos, corporativa. Era um egoísta que apenas pensava em si mesmo e no seu empreguinho que ele próprio considerava a maior maravilha do mundo.
Um homem sem princípios nem escrúpulos, que sempre dizia o que pensava e que mesmo assim era muito querido por seu superior, o americano de cor de cera e rosto inócuo. Eles se prestavam, sem sombra de dúvida. “Eles eram feitos da mesma merda”, pensou rindo consigo mesmo. Fosse o que fosse que estava por acontecer, não importa, ele não iria mais se abalar com aqueles sujeitos sórdidos e sem caráter, cuja única identidade era a corporação; uma corporação que, literalmente, corporificava a todos à sua imagem e semelhança.
Chegou, finalmente, ao tal endereço. Era um flat na região nobre da cidade, um daqueles lugares onde todos parecem importantes, mesmo sendo criminosos ou executivos – afinal qual a diferença entre ambos – e onde todos são tratados como integrantes de uma raça superior por outra raça que se considera inferior.
“Mas que merda! Se eu estou aqui, como saber se aquele calhorda também já chegou?”; e enquanto pensava assim, foi surpreendido pelo toque sutil, mas constante de seu celular. Atendeu de imediato e antes que pudesse respirar mais profundamente, ouviu a voz esganiçada que lhe falava do outro lado da linha. “E aí, mano! Já chegou ou ta enrolando? Sobe logo que to te esperando”.
Sem dúvida era o Coutinho. Como ele fora tão rápido, Afrânio não conseguia entender, mas, tudo bem, era hora de saber o que ia rolar “na real”, pensou enquanto descia do carro ao ser abordado pelo manobrista que o cumprimentou cordialmente (e pelo nome), informando que o Dr. Coutinho já estava a sua espera no quarto de número 69 (“que porra de número!”).
O elevador foi rápido demais, muito mais rápido que os pensamentos de Afrânio que não sabia mais o que fazer. Prosseguir ou recuar? Pagar para ver ou criar juízo e fugir dali como um cachorro magro assustado? Nada mais fazia sentido. Nada mais parecia real, principalmente quando, antes mesmo de tocar a campainha a porta se abriu e ele deu de cara com o Coutinho nu. E não é que o sujeito estava completamente nu, pelado por completo. A barriga avantajada que o terno do trabalho escondia, agora surgia obscena e nojenta seguida de um pênis pequeno e murcho feito um empanado amanhecido. Ridículo, totalmente ridículo.
Ele sorriu da forma mais irônica possível, deu de costas e caminhou em direção à pequena saleta que compunha o primeiro ambiente daquele quarto. “Vai entrando aí, mano. Não liga pra bagunça, é sempre assim em casa de quem é solteiro”. Afrânio seguiu aquelas palavras, mas meio que de forma mecânica, sem saber bem o que fazer ou o que pensar. Aliás, pensava em socar aquele bastardo até sangrar, bater nele até a pele ficar avermelhada e depois roxa, enfiar seu pé naquela cara gorda e nojenta e ver o sangue fluir entre os dentes.
Todavia, não houve tempo para tanto, pois Coutinho voltou-se para ele, olhou-o de cima abaixo e depois sentou-se em uma poltrona larga e confortável. “Vai. Fica a vontade. Faz de conta que ta na sua casa garoto. Eu não mordo, apenas chupo de vez em quando”, disse ele com a mesma voz embargada, porém, agora com certo toque de sutileza que não lhe era característico.
“Eu sei muito bem o que você quer meu coleguinha”, continuou Coutinho sem se importar com o olhar duro de seu interlocutor. “Você ta louco pelo cargo que sobrou na empresa, não é? Pois muito bem, eu lhe ofereço a possibilidade de ter o que você quer, mas existem condições”. Afrânio ficou surpreso com a naturalidade com que aquele sujeito sórdido falava de algo que parecia ser seu, sua propriedade. Era como se ele fosse a única pessoa capaz de nomear alguém para a sua antiga função. Negociava um latifúndio de grandes proporções com a mesma naturalidade que pudesse ter ao vender um carro usado. Afrânio não sabia como encarar tudo aquilo: ou se revoltava e chutava o pau da barraca, ou aceitava o jogo e entrava nele de corpo e alma.
Decidiu jogar para ver até onde ia o cacife daquele sacana. “Quais são as condições?”, perguntou sem titubear. “Bom, a primeira você já satisfez, pois está aqui, o que demonstra que sabe muito bem cumprir ordens e guardar segredo sobre elas. Bom, muito bom, garoto”. Afrânio não resistiu e esboçou um sorriso com os lábios demonstrando segurança.
“Agora, tem mais. Vai tirando a roupa que lá vem a segunda condição”, disse Coutinho novamente soltando um olhar guloso na direção de seu interlocutor. Afrânio sabia que a cartada era alta, mas ele tinha que abusar da sua própria sorte. E assim, não se fez de rogado, despiu-se o mais rapidamente que pode, deixando Coutinho examinar todo o seu corpo que, segundo avaliação de Afrânio “não era nenhuma Brastemp, mas dava para o gasto”.
“Verô, vem cá meu amor. Tenho um presente pra você”, gritou Coutinho sem tirar o olhar do corpo nu que estava à sua frente. E, repentinamente, uma mulata linda saiu do cômodo contínuo ao que eles se encontravam. Estava apenas de calcinha de renda branca que realçava ainda mais a sua silhueta estonteante, destacando suas formas voluptuosas. Era de tirar qualquer chapéu aquela negra linda e de corpo escultural que Afrânio já conhecia de vista, pois ela prestava serviços com o terceirizada da empresa onde ele e Coutinho trabalhavam. Aliás, relembrou que ela nunca havia olhado para ele, posto que o contrário era mais que verdadeiro. Como é que uma mulher daquelas poderia se entregar ao safado do Coutinho pensou, mas ao mesmo tempo obtendo uma resposta: tudo por dinheiro!
Após impor sua presença no recinto – em especial para Afrânio que imediatamente ficou excitado e não se preocupou nem um pouco em esconder tal sensação, a mulata não se fez de rogada e colocando-se na frente de Afrânio, ajoelhou-se passando imediatamente a aplicar-lhe uma felação daquelas, completa e sem qualquer pudor ou receio.
Afrânio entrou imediatamente no clima, sentindo seu pênis latejar com uma ereção repleta de vigor. Foram alguns minutos de excitação, em que o rapaz não conseguia ficar de olhos abertos, sentindo seus músculos tesos e sua respiração arfante. Quando teve a possibilidade de abrir os olhos vislumbrou Coutinho que se masturbava feito louco apenas vendo aquela cena insólita.
A resistência foi mais que o normal, porém Afrânio acabou por ejacular vigorosamente, ao que Verônica, receptivamente acolheu sem perder uma só gota. Engoliu tudo e continuou lambendo o membro meio mole meio duro que ainda permanecia em sua boca. Sem dúvida, foi divino aquele orgasmo com aquela mulata de deixar qualquer um louco.
“O que vêm a seguir?”, pensou Afrânio, ainda sob os efeitos daquele orgasmo inesperado, mas muito acolhedor – diga-se de passagem, que Verônica, a mulata, era mulher sem qualquer crítica – conseguindo apenas, sentar-se na beirada da cama que estava atrás de si, com o corpo suado e o membro meio endurecido. Após certo tempo olhou para frente e viu algo impensável: o seu ex-superior masturbando-se enquanto a mulata maravilha dava tapas em sua cara gorda ordenando em alto tom de voz que ele gozasse depressa do jeito que ela estava ordenando.
Aliás, o termo aconteceu exatamente como a mulher havia ordenado e o gordo metido gozou depressa espalhando sêmen para todo o lado (“fazendo merda como todo o velho gordo e mole”, pensou Afrânio, com uma vontade enorme de cair na gargalhada). Afinal, parecia que aquele seria o ponto alto do show estabelecido por Coutinho para assegurar a promoção de seu subordinado.
Mas, como sempre, a vida está pronta a pregar uma peça nos incrédulos; e não é que o espetáculo ainda não havia terminado, pois, imediatamente após aquele orgasmo ridículo, Coutinho pôs-se em pé ordenou que Verônica acomodasse aquele corpo escultural ao lado de Afrânio, mas “sem sacanagem”, e prosseguiu dizendo: “Muito bom. Agora é que o bicho vai pegar meu garoto. A condição final ta lá; no outro quarto te esperando e você têm que dar conta do recado. Caso seja necessário a Verô aqui vai te ajudar no que for possível, mas sem forçar a barra entendeu! Vem comigo ô cavalão!”.
O quarto contíguo estava em absoluta penumbra, não possibilitando ver o seu interior. Verônica, que havia se adiantado ao seus acompanhantes, entrou, e dirigiu-se em direção à escuridão, vindo a surgir com uma vela acesa nas mãos, com a qual acendeu mais algumas estrategicamente disposta no ambiente.
Mesmo assim, não dava para ver muita coisa. Apenas contornos dos móveis ali existentes, principalmente uma cama enorme que ocupava boa parte do ambiente. Pouco a pouco, Afrânio percebeu que havia alguém deitado sobre a cama, alguém que parecia estar desnudo, deitado de bruços e olhando por cima do ombro na direção do grupo. Não dava para perceber que era aquela pessoa – nem mesmo se era homem ou mulher – apenas que estava nu pelo contorno do corpo e que parecia esperar algo que partisse de Afrânio ou de Coutinho.
“Que merda!”, pensou Afrânio, temendo o que o esperava a seguir, mas certo de que, fosse o que fosse, iria topar. Quem já bancou o palhaço para o Coutinho, poderia enfrentar qualquer coisa que estivesse por vir. Voltou seu olhar duro na direção de Coutinho esperando as instruções que deveriam seguir-se.
Porém não houve qualquer palavra pronunciada de início. Apenas Coutinho que, afastando-se do grupo, caminhou na direção da pessoa deitada e sentou-se ao lado dela, passando então, a acariciar o corpo desnudo.
“Pois é garoto, ta na hora desse pinto mostrar que é capaz de encarar uma boa foda por trás! Vem aqui, vem; esse cuzinho ainda virgem ta te esperando faz tanto tempo que você nem imagina! Vem logo o seu merda que a noite ta correndo”.
Sem qualquer hesitação, apenas a certeza da presença de Verônica de quem procurou segurar a mão antes de partir para a ação, puxou-a consigo ansiando pelo menos por um público mínimo para o espetáculo grotesco que iria começar.
Bem próximo da cama, Afrânio sentiu a mão quente da garota segurar-lhe o pênis meio mole acariciando-lhe o contorno exuberante, como que antecedendo o que estava por vir, da mesma forma que pode perceber que a pessoa sobre a cama estava se posicionando de forma a poder acolher o membro que se aproximava do caminho final.
Todavia, antes que algo pudesse acontecer Verônica ajoelhou-se outra vez tomando o membro com a boca a chupando-o vigorosamente. “Ela está apenas lubrificando o bicho, afinal, este cuzinho pode ser virgem, eh eh!”, disse Coutinho com a voz embargada pelo álcool e pelo tesão.
Após alguns minutos de preparação, Verônica soltou o pênis já endurecido e ficou novamente ao lado de Afrânio esperando e parecendo apreciar o espetáculo que iria acontecer. Imediatamente, o rapaz não se fez de rogado, afinal uma promoção estava em jogo – a sua promoção – e de forma contida, mas resoluta introduziu o membro naquele ânus que o esperava.
E não era mesmo verdade que o tal era virgem. Estava difícil de introduzir e Afrânio teve que impor mais força que o usual até que, finalmente, a resistência foi rompida e o ânus invadido pelo pênis duro e latejante. Mesmo assim, Afrânio ainda não sabia se a pessoa submetida era homem ou mulher, fato que veio à tona quando um grunhido mais forte denotou uma voz suave, porém mais masculina que feminina.
“Que porra é essa!”, gritou Afrânio ao perceber que as poucas palavras pronunciadas a seguir pelo estranho denunciadas pelo sotaque ainda carregado, mas característico demonstravam de forma inequívoca que o submetido era Jeff o seu superior, o maioral, o “boss” como todos diziam. “Agora é que eu to mesmo fudido!”, pensou Afrânio achando que tudo aquilo fora uma armação de Coutinho com a finalidade única de prejudicar sua escalada profissional na empresa.
Repentinamente, Afrânio cessou os movimentos de vai e vêm esperando pelo pior, mas o que ouviu a seguir deixou-o completamente perplexo. “Ei, não pará não garoto, não vê que ele está gostando e querendo mais! Vai em frente que atrás vêm gente”, disse Coutinho, inclusive com o assentimento corporal de Jeff que recuava seu traseiro na direção daquele pênis em ação.
“Bom, já que comecei, vou terminar, nem que seja a última coisa que eu faça!”, pensou Afrânio enquanto retomava os movimentos de penetração anal desferidos contra o chefe em posição de acolhimento.
A coisa toda perdurou por um bom tempo. Por incrível que possa parecer Afrânio resistia bravamente aos movimentos pélvicos de Jeff e seu membro não dava sinais de que iria fraquejar ou desistir. O suor escorria pelo corpo enquanto que Verônica acariciava aquele peito másculo e viril que acompanhava os movimentos sincronizados do resto do corpo, ambos acompanhados por Coutinho que, dado momento, ajoelhou-se na cama e com uma das mãos ofereceu o pinto frouxo para que Jeff pudesse sugá-lo com vontade, ato continuo ao qual Jeff não se fez de rogado, abocanhando aquele membro mole e passando a chupá-lo com muita vontade.
A coisa toda parecia que nunca iria acabar, se bem que Afrânio não se importava mais, tudo era pelo dinheiro, pelo cargo, pela promoção, pelo prestígio. Ele estaria acima da onda e poderia fazer o que quisesse ser quem ele mesmo quisesse. Era um pensamento tão espetacular e, ao mesmo tempo tão sórdido, quando considerado no conjunto de ações que resultariam naquela independência tão sonhada, que o próprio Afrânio era incapaz de discernir entre certo e errado, entre aquilo que seria moralmente aceitável e os atos que houvera praticado naquele momento – ou melhor, o ato que estava praticando naquele momento – porém, acreditava que nada mais tinha tanto valor quanto o poder e o dinheiro, elementos que aprendeu, a duras penas, a respeitar desde cedo; desde o momento em que foi vilipendiado por “amigos” e “colegas” de trabalho, de vida, que também tinham em mente o mesmo objetivo: dinheiro e status social.
Estava tão envolto naqueles pensamentos que não percebeu quando a outra mão de Verônica, sorrateiramente, desceu por suas costas alojando-se estrategicamente na altura de suas nádegas passando a acariciá-las, as vezes suavemente, as vezes de maneira mais brutal, até chegar ao ponto de esboçar palmadas que começaram de foram ingênua, e acabaram por tomar uma feição mais vigorosa.
Aquele gesto, embora pudesse ter toda a verve de uma ato premeditado, não irritou Afrânio, pelo contrário, excitou-o mais ainda, fazendo com que seus movimentos se tornassem mais vigorosos e com uma cadência mais ritmada. Aliás, tudo aquilo o deixava extremamente excitado, a ponto de seu olhar voltar-se na direção daquele rosto exótico, quase parecendo uma pintura clássica tanto na forma quando no conteúdo estético. Olhava para aquela mulher com o olhar de um homem verdadeiramente excitado e neste olhar era plenamente correspondido por olhos negros enormes, hipnotizantes, acrescidos de uma boca sensual e bem delineada.
Aquele ato parecia não ter fim, posto que todos os envolvidos estavam extremamente excitados e seus corpos suados refletiam uma atividade insana, mas totalmente repleta de desejo, de conjuração, de obtenção de uma orgasmo que poderia assemelhar-se ao gozo definitivo, o gozo dos deuses do sexo.
Afrânio, em especial, mas também todos os demais gemiam constantemente – à exceção, é claro, de Coutinho que mais parecia grunhir palavras ininteligíveis – e seus gemidos e gestos eram todos para Verônica que parecia corresponder integralmente aos seus anseios. A luz das velas delineava as formas esculturais de Verônica, fato esse que deixava o rapaz mais excitado e mais tomado de desejo, fazendo com que seus movimentos se tornassem cada vez mais rítmicos, cadenciados e vigorosos, muito embora ninguém dava sinais de cansaço ou de sobrecarga de esforço.
Repentinamente, Afrânio sentiu que o orgasmo estava por vir, não porque houvesse sinais de extenuação por parte dele, mas sim porque a excitação era tamanha que não dava mais para controlar os seus instintos. Aliás, todos estavam também prenunciando a chegada do ápice daquela loucura, inclusive Coutinho que tinha o seus membro totalmente agasalhado pela boca de Jeff que o sugava vigorosamente, como alguém que estivesse chupando um doce delicioso e não pretendia que ele acabasse tão depressa.
Assim, Afrânio passou a gemer com mais intensidade, fixando seu olhar no olhar de Verônica que acompanhava os movimentos de seu corpo com as mãos nele pousadas. Não havia mais como controlar, e, de uma vez, Afrânio balbuciou alguma coisa no sentido de que estava para gozar.
Súbita e inesperadamente, sem que qualquer reação pudesse ser tomada, Verônica, com a mão colocada de forma anunciada em suas nádegas, não titubeou em procurar o ânus do rapaz e rapidamente, enfiou-lhe o dedo médio na maior profundidade que fosse capaz. Foi um gesto tão rápido e tão surpreendente que o pobre rapaz não pode dizer nem fazer nada, apenas retesar os músculos de suas nádegas, esperando pelo orgasmo que chegou com tal pujança, que inundou o ânus de Jeff de forma quase animal, e porque não dizer, anormal mesmo.
Todavia, enquanto gozava, sentido o dedo de Verônica em suas entranhas mais pudicas, não foi capaz de negar a si mesmo que aquele ato tresloucado da menina causara-lhe enorme sensação de prazer, como se aquele orgasmo tivesse sido multiplicado por mil vezes em sua intensidade. Foi algo misto de obsceno e imensamente prazeroso.
Mesmo absorto em seus pensamento impuros, Afrânio não pode deixar de perceber que seus parceiros também havia chegado ao clímax, sendo certo que Jeff gozara duas vezes: uma pela penetração de Afrânio e outra ao sentir o sêmem de Coutinho invadir-lhe a boca como um rio de leite repleto de prazer.
Todos estavam exauridos e extenuados pelo esforço físico depreendido, de tal forma que quedaram-se na enorme cama, vindo calmamente, a adormecer como estavam: nus, suados e realizados, inclusive Verônica que não perdeu a oportunidade de aninhar seu corpo junto ao de Afrânio, nem que fosse pela mera oportunidade de ter um corpo másculo e quente ao seu lado por algumas breves horas.
CAPÍTULO III.
A luz do sol entrando vigorosamente pela janela do quarto fez com que Afrânio acordasse de forma involuntária, posto que o cansaço e as dores no corpo revelavam de forma inequívoca que tudo aquilo que acontecera na noite anterior não havia sido um produto da sua mente: tinha realmente acontecido e na exata forma com que sua memória lhe descrevia detalhadamente. Tudo era verdade, ele havia possuído o seu chefe, como um gigolô que possuí o travesti que lhe serve; tinha literalmente sido o macho eloqüente daquele de quem recebia ordens. E agora? O que iria acontecer a partir de então? Ele não sabia de nada. A única certeza que tinha era a de que se Coutinho armara uma arapuca, ele havia caído como o esperado.
Com os olhos ainda turvados pelo sono e pelo excesso de luminosidade solar, Afrânio olhou em volta e percebeu que estava só. Todos haviam ido embora. Somente ele ocupava aquela cama, a única testemunha dos feitos acontecidos anteriormente. Levantou-se e com um andar incerto e titubeante, caminhou em direção ao outro cômodo, onde constatou que suas roupas ainda estavam no mesmo lugar onde as havia deixado na noite anterior.
Vestiu-se e pensou que deveria ir embora o mais depressa possível, antes que alguém entrasse e o surpreendesse no quarto de um flat que ele nem mesmo fazia idéia de a quem pertencia. Caminhou em direção da porta quando percebeu em cima da pequena mesa que ornamentava o hall de entrada um pequeno pedaço de papel com algumas palavras escritas. Tomou-o nas mãos e leu seu conteúdo soletrando cada palavra, já que seu cérebro não era capaz de processar informações com a velocidade normal, conspurcado que estava pelo sono, pelo cansaço e pela tensão emocional que ainda cercava seu espírito.
“Parabéns, você cumpriu as qualificações que o cargo exige. Ele é seu. Mas não abuse da sorte. Abraços, Coutinho. P.S. Tudo aquilo que aconteceu, não aconteceu, certo!”.
Afrânio leu atentamente o bilhete mais de uma vez para certificar-se de que estava entendendo seu conteúdo e depois sorriu para si mesmo; afinal, atingira o objetivo, sabe-se lá de que forma e por quais meios, mas, enfim, tudo o que restava era a certeza de que por mais sórdido que o mundo fosse ele estava incluído no jogo, com oportunidades iguais a todos, sem medo de errar, porque não haviam conceitos preestabelecidos de certo e errado, apenas de oportuno e conveniente para todos.
Hoje, Afrânio é supervisor de segurança e patrimônio (a natureza do cargo foi ampliada, é claro, por Jefferson), ganhava bem, comprou um apartamento decente, um carro mais novo e passou a transar regularmente com Verônica, embora os dois ainda fossem parceiros de Jeff, Coutinho e outros clientes que começaram a surgir com a indicação feita pelo americano que, embora não extravasasse suas inclinações exóticas sobre sexualidade, não escondia que tanto Coutinho como ele gostavam muito de encontros bizarros e oportunos.
Afrânio não ligava mais, afinal estava no jogo para ganhar e não apenas para passar a bola para outro. “É assim que a vida funciona”, pensava ele enquanto ria internamente de toda aquela situação ridícula, sórdida, porém absolutamente verdadeira. Acreditem ou não, ele não pretendia esquivar-se mais de qualquer oportunidade que surgisse.
Afinal, uma oportunidade perdida não volta nunca mais, e a dor da perda é muito maior que a dor do fracasso.
São Paulo, 01 de janeiro de 2007.
NOTA: Os fatos e eventos, bem como seus personagens são totalmente fictícios e qualquer similaridade com fatos tidos como verdadeiros será apenas mera coincidência.