As coxas de D. Severina - completo
O rapaz se chamava Inácio, tinha 15 anos feitos e bem feitos. Cabeça inculta, mas bela, olhos de rapaz que sonha, que adivinha, que indaga, que quer saber e não acaba de saber nada. Tudo isso posto sobre um corpo moreno; alto e forte para a idade, ainda que andasse mal vestido. O pai é caseiro de uma casa de praia em Parati, e o colocou como aprendiz de agente, escrevente, ou que quer que era, do procurador Borges, com esperança de vê-lo advogado, porque lhe parecia que os juristas ganhavam muito. Passava-se isto na Rua da Lapa, em 1870.
Como não podia manter-se com os trocados que recebia de Borges, Inácio foi morar na casa do patrão. Lá ele vivia sendo criticado pelo chefe.
Durante alguns minutos não se ouviu mais que o tinir dos talheres e o ruído da mastigação. Borges abarrotava-se de alface e vaca; interrompia-se para virgular a oração com um golpe de vinho e continuava logo calado.
Inácio ia comendo devagarinho, não ousando levantar os olhos do prato, nem para colocá-los onde eles estavam no momento em que o terrível Borges o lhe havia chamado a atenção a pouco. Verdade é que seria agora muito arriscado. Nunca ele pôs os olhos nas coxas de D. Severina que se não esquecesse de si e de tudo. Mas ela era mulher de Borges.
Também a culpa era antes de D. Severina em em usar saia com fendas constantemente. Usava saias comuns, meio palmo abaixo do joelho; dali em diante ficavam-lhe as lindas pernas à mostra. Na verdade, eram belas e cheias, em harmonia com a dona, que era antes grossa que fina, e não perdiam a cor nem a maciez por viverem ao ar; mas é justo explicar que ela os não trazia assim por safadeza, senão porque já gastara todos os vestidos compridos. De pé, era muito gostosa; andando, tinha meneios engraçados; ele, entretanto, quase que só a via à mesa, onde, além das canelas, mal poderia mirar-lhe o joelho. Não se pode dizer que era bonita; mas também não era feia. Nenhum adorno; o próprio penteado consta de mui pouco; alisou os cabelos, apanhou-os, atou-os e fixou-os no alto da cabeça com o pente de tartaruga que a mãe lhe deixou. Ao pescoço, um lenço escuro, nas orelhas, nada. Tudo isso com vinte e sete anos fogosos e quentes.
Inácio demorou o café o mais que pôde. Via só as coxas de D. Severina, - ou porque sorrateiramente olhasse para eles, ou porque andasse com eles impressos na memória.
- Homem, você não acaba mais? bradou de repente o marido.
Não havia remédio; Inácio bebeu a última gota, já fria, e retirou-se, como de costume, para o seu quarto, nos fundos da casa. Entrando, fez um gesto de zanga e desespero e foi depois encostar-se a uma das duas janelas que davam para o mar. Cinco minutos depois, a vista das águas próximas e das montanhas ao longe restituía-lhe o sentimento confuso, vago, inquieto, que lhe doía e fazia bem, alguma coisa que deve sentir a planta, quando abotoa a primeira flor. Um calor que descia da barriga para seu sexo. Tinha vontade de ir embora e de ficar. Havia cinco semanas que ali morava, e a vida era sempre a mesma, sair de manhã com o Borges, andar por audiências e cartórios, correndo, levando papéis ao selo, ao distribuidor, aos escrivães, aos oficiais de justiça. Voltava à tarde, jantava e recolhia-se ao quarto, até a hora da ceia; ceava e ia dormir. Borges não lhe dava intimidade na família, que se compunha apenas de D. Severina, nem Inácio a via mais de três vezes por dia, durante as refeições. Começava a cobiçá-la inconscientemente.Cinco semanas de solidão, de trabalho sem gosto, longe da mãe e das irmãs; cinco semanas de silêncio, porque ele só falava uma ou outra vez na rua; em casa, nada.
- Deixe estar, - pensou ele um dia - fujo daqui e não volto mais.
Não foi; sentiu-se agarrado e acorrentado pela visão das coxas de D. Severina. Nunca vira outras tão bonitas e tão torneadas. A educação que tivera não lhe permitia encará-las logo abertamente, parece até que a princípio afastava os olhos, envergonhado. Encarou-as pouco a pouco, ao ver que a fenda lhe permitia olhar cada vez mais entre as fortes coxas, e assim as foi descobrindo, mirando e amando. No fim de três semanas eram elas, as coxas, moralmente falando, as suas tendas de repouso. Aguentava toda a trabalheira de fora toda a melancolia da solidão e do silêncio, toda a grosseria do patrão, pela única paga de ver, três vezes por dia, o famoso par de pernas.
Naquele dia, enquanto a noite ia caindo e Inácio estirava-se na rede (não tinha ali outra cama), D. Severina, na sala da frente, recapitulava o episódio do jantar e, pela primeira vez, desconfiou alguma coisa. Rejeitou a idéia logo, uma criança! Mas há idéias que são da família das moscas teimosas: por mais que a gente as sacuda, elas tornam e pousam. Criança? Tinha quinze anos; e ela advertiu que entre o nariz e a boca do rapaz havia um princípio de rascunho de buço e o seu peito já era másculo. Que admira que começasse a amar? E não era ela bonita? Esta outra idéia não foi rejeitada, antes afagada e beijada. E recordou então os modos dele, os esquecimentos, as distrações, e mais um incidente, e mais outro, tudo eram sintomas, e concluiu que sim.
Tudo parecia dizer à dama que era verdade; mas essa verdade, desfeita a impressão do assombro, trouxe-lhe uma complicação moral que ela só conheceu pelos efeitos, não achando meio de discernir o que era. Não podia entender-se nem equilibrar-se, chegou a pensar em dizer tudo ao marido, e ele que mandasse embora o fedelho. Mas que era tudo? Aqui estacou: realmente, não havia mais que suposição, coincidência e possivelmente ilusão. Não, não, ilusão não era. E logo recolhia os indícios vagos, as atitudes do mocinho, o acanhamento, as distrações, para rejeitar a idéia de estar enganada. Daí a pouco, (capciosa natureza!) refletindo que seria mau acusá-lo sem fundamento, admitiu que se iludisse, para o único fim de observá-lo melhor e ter certeza de que ele a desejava.
Já nessa noite, D. Severina mirava por baixo dos olhos os gestos de Inácio; não chegou a achar nada, porque o tempo do chá era curto e o rapazinho não tirou os olhos da xícara. No dia seguinte pôde observar melhor, e nos outros otimamente. Percebeu que sim, que era amada e temida, amor adolescente e virgem, retido pelos tabus sociais e por um sentimento de inferioridade que o impedia de reconhecer-se a si mesmo. D. Severina compreendeu que não devia ter medo, e concluiu que o melhor era não dizer nada ao solicitador; poupava-lhe um desgosto, e outro à pobre criança. Já se persuadia bem que ele era criança, e assentou de o tratar tão secamente como até ali, ou ainda mais. E assim fez; Inácio começou a sentir que ela fugia com os olhos, ou falava áspero, quase tanto como o próprio Borges. De outras vezes, é verdade que o tom da voz saía brando e até meigo, muito meigo; assim como o olhar geralmente esquivo, tanto errava por outras partes, que, para descansar, vinha pousar na cabeça dele; mas tudo isso era curto.
- Vou-me embora, repetia ele na rua como nos primeiros dias.
Chegava a casa e não se ia embora.
A agitação de Inácio ia crescendo, sem que ele pudesse acalmar-se nem entender-se. Não estava bem em parte nenhuma. Acordava de noite, pensando em D. Severina. Sonhando com o corpo dela, com o que havia entre aquelas coxas. Na rua, trocava de esquinas, errava as portas, muito mais que antes, e não via mulher, ao longe ou ao perto, que parecesse com ela. Ao entrar no corredor da casa, voltando do trabalho, sentia sempre algum alvoroço, às vezes grande, quando dava com ela no topo da escada, olhando através das grades de pau da cancela, como tendo acudido a ver quem era.
Um domingo, - nunca ele esqueceu esse domingo, - estava só no quarto, à janela, virado para o mar, que lhe falava a mesma linguagem obscura e nova de D. Severina. Depois de meia hora, deixou cair o que lia e pôs os olhos no vão da porta onde viu sair a sua paixão platônica. O natural era que se espantasse; mas não se espantou. Embora com as pálpebras cerradas viu-a desprender-se de todo, parar, sorrir e andar para a rede. Era ela mesma, eram os seus mesmos braços.
É certo, porém, que D. Severina, tanto não podia sair da parede, dado que houvesse ali porta ou rasgão, que estava justamente na sala da frente ouvindo os passos do marido que descia as escadas. Ouviu-o descer; foi à janela vê-lo sair e só se recolheu quando ele se perdeu ao longe, no caminho da Rua das Mangueiras. Então entrou e foi sentar-se no canapé. Parecia fora do natural, inquieta, fogosa, o tesão contido lhe saia pelo bico dos seios; levantando-se, foi pegar na jarra que estava em cima do aparador e deixou-a no mesmo lugar; depois caminhou até à porta, deteve-se e voltou, ao que parece, sem plano. Sentou-se outra vez cinco ou dez minutos. De repente, lembrou-se que Inácio comera pouco ao almoço e tinha o ar abatido, e advertiu que podia estar doente; podia ser até que estivesse muito mal.
Saiu da sala, atravessou rasgadamente o corredor e foi até o quarto do mocinho, cuja porta achou escancarada. D. Severina parou, espiou, deu com ele na rede, dormindo, com o braço para fora e o jornal caído no chão. A cabeça inclinava-se um pouco do lado da porta, deixando ver os olhos fechados, os cabelos revoltos e um grande ar de riso e de beatitude.
D. Severina sentiu bater-lhe o coração com veemência e recuou. Sonhara de noite com ele; pode ser que ele estivesse sonhando com ela. Desde madrugada que a figura do mocinho andava-lhe diante dos olhos como uma tentação diabólica. Recuou ainda, depois voltou, olhou dois, três, cinco minutos, ou mais. Parece que o sono dava à adolescência de Inácio uma expressão mais acentuada, quase feminina, quase pueril. Uma criança! disse ela a si mesma, naquela língua sem palavras que todos trazemos conosco. E esta idéia abateu-lhe o alvoroço do sangue e dissipou-lhe em parte a turvação dos sentidos.
- Uma criança!
E mirou-o lentamente, fartou-se de vê-lo, com a cabeça inclinada, o braço caído; mas, ao mesmo tempo que o achava criança, achava-o másculamente bonito, muito mais bonito que acordado, e uma dessas idéias corrigia ou corrompia a outra.E ela continuou a vê-lo dormir, - dormir e talvez sonhar com ela.
Que não possamos ver os sonhos uns dos outros! D. Severina ter-se-ia visto a si mesma na imaginação do rapaz; ter-se-ia visto diante da rede, risonha e parada; depois inclinar-se, pegar-lhe nas mãos e passar entre suas próprias pernas, levá-las a calcinha, cruzando ali as coxas, as famosas coxas. Inácio enquanto dormia suspirava de prazer. Um prazer que não era infantil. Era com sexo que ele sonhava. O seu membro viril entumecido, visível no pijama, era a prova.
A vagina por baixo da saia de D. Severina estava molhada, por sua vez. A mulher estava subindo pelas paredes. E então pegou a mão do rapaz e a colocou através da fenda da saia entre as suas coxas. Ela estava fora de si de tanto tesão. Agora já não podia se controlar. O instinto lhe dominava e a obrigou a subir a mão de Inácio até sua calcinha. Sua excitação era tamanha que quase gozou apenas com esse movimento. D. Severina, totalmente fora de si afastou com a outra mão a calcinha branca - já ensopada com seu líquido feminino. Imediatamente os dedos de Inácio começaram a se mover entre os lábios vaginais. Ela mordeu os lábios para não gritar. Os dedos do rapaz agiam por instintos primitivos aparentemente e buscam abrigo naquela gruta úmida e quente. D. Severina não pode se controlar e gemeu baixinho enquanto três dedos do rapaz se abrigavam gostosamente dentro dela. Embora não satisfeita ela tirou a mão do rapaz enquanto sentia um gozo profundo por aquela manipulação genital. Sua vontade era atacar o garoto de 15 anos e obrigá-lo a possuí-la de todas as maneiras possíveis. No entanto, inclinando-se para ele abriu os lábio e deixou-lhe um beijo na boca.
Aqui o sonho coincidiu com a realidade, e as mesmas bocas uniram-se na imaginação e fora dela. A diferença é que a visão não recuou, e a pessoa real tão depressa cumprira o gesto, como fugiu até à porta, vexada e medrosa. Mas, se o medo foi passando, o vexame ficou e cresceu. D. Severina não acabava de crer que fizesse aquilo; parece que embrulhara os seus desejos na idéia de que era uma criança namorada que ali estava sem consciência nem imputação; e, meia mãe, meia amiga, inclinara-se e beijara-o. Fosse como fosse, estava confusa, irritada, aborrecida mal consigo e mal com ele. O medo de que ele podia estar fingindo que dormia apontou-lhe na alma e deu-lhe um calafrio.
Mas a verdade é que dormiu ainda muito, e só acordou para jantar. Sentou-se à mesa lépido. Conquanto achasse D. Severina calada e severa e o marido tão ríspido como nos outros dias, nem a rispidez de um, nem a severidade da outra podiam dissipar-lhe a visão graciosa que ainda trazia consigo, ou amortecer-lhe a sensação do beijo. Não reparou que D. Severina uma saia comprida que lhe cobria tudo; reparou depois, na segunda-feira, e na terça-feira, também, e até sábado, que foi o dia em que Borges mandou dizer ao pai que não podia ficar com ele; e não o fez zangado, porque o tratou relativamente bem e ainda lhe disse à saída:
- Quando precisar de mim para alguma coisa, procure-me.
- Sim, senhor. A Sra. D. Severina...
- Está lá para o quarto, com muita dor de cabeça. Venha amanhã ou depois despedir-se dela.
Inácio saiu sem entender nada. Não entendia a despedida, nem a completa mudança de D. Severina, em relação a ele, nem a saia, nem nada. Estava tão bem! falava-lhe com tanta amizade! Como é que, de repente... Tanto pensou que acabou supondo de sua parte algum olhar indiscreto, alguma distração que a ofendera, não era outra coisa; e daqui a cara fechada e saia que cobria as pernas tão bonitas... Não importa; levava consigo o sabor do sonho. E através dos anos, por meio de outros amores, mais efetivos e longos, nenhuma sensação achou nunca igual à daquele domingo, na Rua da Lapa, quando ele tinha quinze anos. Ele mesmo exclama às vezes, sem saber que se engana:
- E foi um sonho! um simples sonho!
Moças ou D. Severinas que tenham gostado, me mandem um email para rogeriosecco13@hotmail.com . Adoraria ver suas fotos mais íntimas e saber de seus desejos mais secretos.