No dia seguinte não vi Gelo em canto nenhum e quando perguntei a Helena nem ela soube responder, fiquei com vergonha de perguntar ao resto da sala então deixei de lado. E o dia passou tão lentamente quanto o anterior, só que dessa vez ninguém tinha disposição para fazer mais brincadeiras e a maioria esmagadora parecia não ter dormido muito bem (provavelmente varando a madrugada conversando), no final das contas a única coisa que nós fizemos na “Aula de campo” foi dormir em outra cidade com o colégio.
A partida estava marcada para 15h00minh, sendo que após o almoço na chácara o tempo era só para arrumarmos tudo e descansarmos naquele lugar maravilhoso. Infelizmente eu não estava com cabeça para aquilo e fui para o quarto que dividia com Alessandro, por sorte, ele já estava de saída quando cheguei. Fiquei deitado olhando para o teto pensando na situação estranha da madrugada, em como Gelo... Ou Leo, fosse lá qual fosse o nome, havia conversado, brincado, feito carinho... Comecei a pensar se aquilo não fora só algum tipo de ilusão criada por minha mente e estendi a mão até alcançar minha mochila de viajem, abri-a e remexi até encontrar o que procurava: Um pijama molhado. Agarrei-me a ele como se quisesse agarrar as memórias de um garoto tranqüilo e sereno, que conhecia a mais bela das canções e os segredos das estrelas.
Acordei um tempo depois com Mari me cutucando, avisando que o ônibus já ia sair, guardei o pijama, peguei minha mochila e a muito contragosto andei até a fila indiana que se formava na entrada, para variar, fiquei em último. Ao entrar no veículo da excursão tive uma estranha sensação de deja vu, com todas as cadeiras ocupadas exceto uma, no final do corredor, marchei até lá e deixei a surpresa me pegar. Gelo já estava sentado na dupla de cadeiras, de olhos fechados, com as mãos por cima do livro de capa preta e o colar estranho pendendo em seu pescoço, aparentando ser o ser mais neutro de toda existência, como uma estátua de mármore, e isso só atiçou minha raiva e curiosidade pelo garoto. Coloquei a bagagem na parte de cima e sentei-me à janela, o exato mesmo lugar da ida.
. – Bom dia – disse baixinho.
Silêncio.
. – Poderia ao menos se dar ao trabalho de fingir que você percebe que eu estou aqui? – tentei outra vez.
Mais alguns segundos de silêncio, e então:
. – Vaffanculo, Lucas.
Reconheci a expressão como sendo italiana, mas alguma coisa me disse que eu não gostaria de saber o significado, por isso, deixei-o mais uma vez de lado e fixei o olhar na janela, vendo a viajem transcorrer normalmente com Gelo calado e o resto do povo tagarelando.
Cheguei em casa exausto naquela noite e minha mãe perguntou-me se eu estava de mau humor para ajudá-la a corrigir algumas provas (minha mãe é professora de história e pesquisadora, corrigir as provas de seus alunos de faculdade sempre me animava), mesmo cansado, precisava me distrair e fui ajudá-la. Rimos bastante de algumas respostas ridículas e discutimos sobre outras, até que ela me pediu para passar as notas para seu notebook e eu obedeci. Comecei a olhar os ícones da área de trabalho em seu PC e percebi uma coisa diferente: um arquivo nomeado “Is_Rel”, pensei que fosse mais um dos trabalhos em conjunto com o pastor de sua igreja, mas a curiosidade foi maior e abri-o, levando mais uma sensação de deja-vú. O arquivo era somente um desenho, um desenho de uma lua cheia com uma folha dentro; chamei minha mãe e perguntei o que era aquilo.
. – Ah... – disse olhando o desenho – É um projeto que venho desenvolvendo com o Pastor Ricardo e com Padre Samuel...
Olhei o desenho mais um tempo.
. – Um projeto sobre...?
Ela riu baixinho e fechou a janela.
. – Quando estiver pronto, te falo.
Passei as notas e fui para cama sem tirar o desenho da cabeça, a sensação de deja-vú também não passava, mesmo por que eu sabia que havia visto aquilo antes, mas não conseguia me lembrar aonde. Aquela foi uma das raras noites após a mudança em que Gelo não adormeceu nos meus pensamentos.
A primeira parte da manhã do dia seguinte transcorreu normalmente, com Tigo lamentando por não ter ido e Dan lamentando por não ter passado mais tempo viajando, Mari havia faltado. Não prestei atenção nas aulas, percebendo movimentos discretos na carteira e punho de Gelo... Estava escrevendo alguma coisa, e quando se sentiu satisfeito pediu ao professor permissão para sair e levou um pedaço de papel consigo, mas realmente estranhei quando depois de alguns minutos da volta do garoto recluso Tigo também pediu para sair, só que retornou com uma pontinha de papel branco aparecendo no bolso frontal da jaqueta, sentou-se ao meu lado e continuou a conversa aonde havia parado.
Durante o intervalo procurei por Tigo, mas nem ele nem Leo estavam à vista, por isso perguntei a Dan.
. – Acho que foi para a biblioteca – respondeu-me.
Corri para a biblioteca e forcei minha respiração a normalizar antes de entrar. Passei direto pela bibliotecária e entrei nos corredores de livros, quase todos vazios, até ouvir um par de vozes conhecidas atrás de uma estante (coincidentemente a mesma em que eu ficara ouvindo a conversa duas semanas antes da viajem).
. – Por quê? – a primeira voz perguntou de maneira ríspida.
. – Não acha que já tem gente demais nessa história? – a segunda voz respondeu em tom baixo, mas irritado.
Aquilo me deixou confuso, ouvi a primeira voz suspirando.
. – Não – respondeu no mesmo tom – Não tem, e enquanto você não perceber que isso só lhe faz mal.
Ouvi um grunhido reprimido.
. – O que me faz mal é você – a voz estava visivelmente irritada – Isso é ridículo, já foi a sala inteira, para que mais o novato?
. – Ora, senhor – a primeira pessoa quase cuspiu a frase – Esse é o preço que se paga por negar a verdade.
Alguém bufou.
. – Verdade é um conceito abstrato – naquele momento reconheci o dono da segunda voz: Gelo – É impossível determinar.
Uma risada baixa veio do dono da primeira voz.
. – Você está tão cego que sequer enxerga o óbvio – disse quase com repulsa – Todos se curvaram ao verdadeiro, só você que não. Está só pagando pelo seu erro.
. – E você não está nem tentando melhorar isso, não é? Onde está a compaixão de você tanto fala?
. – Compaixão é para aqueles que merecem, e você está bem longe desse grupo.
Deram-se alguns segundos de silêncio.
. – Não importa – ouvi a voz de Gelo outra vez – Pagando ou não, estando do meu lado ou não – havia alguma coisa diferente em sua voz, parecia... Ressentimento – Deixe Lucas fora disso.
Uma risada veio da primeira pessoa.
. – Isso não é decisão minha.
. – Não pode decidir por ele, mas pode parar de influenciá-lo contra mim.
Ouvi o corpo do dono da primeira voz se recostando na estante.
. – Não. Eu faço o que posso para ajudar O Único. Não percebe que seu caminho sombrio só lhe trouxe desgraça até agora? O Verdadeiro está te punindo pela sua arrogância, é o único jeito de você entender que ele te ama.
Ouvi um suspiro profundo.
. – Você é tão louco quanto sua mãe... – o tom era triste, como se sentisse pena por seu interlocutor – Tiago.
Mesmo já imaginando que Tigo fosse a outra pessoa, ouvir Leo falando daquela forma me pegou desprevenido. Não entendi o que aquilo tudo significava, como assim “Sua mãe”? Como assim “O Único”? E porque eu estava no meio da discussão?
. – Controle sua língua imunda ao falar da minha mãe – ouvi Tigo cuspir rispidamente – Ela é uma revolucionária ao santo favor...
. – E você controle também esse pedaço de carne que chama de língua – Gelo o interrompeu – Ao falar de mim.
. – Você não merece tanto.
Ouvi um suspiro e passos rápidos saindo pela prateleira à esquerda, e um som de choro sendo engolido. Logo em seguida, ouvi passos na direção e contrária, passando pelo corredor acima, se a pessoa virasse o rosto para a direita me veria, era uma posição vulnerável. Por sorte, Leo saiu rápido demais para me ver, mas consegui ter um vislumbre de algo que me despertou a atenção.
O colar.
O colar de dois pingentes: Uma pedra redonda e outra lapidada.
Uma lua e uma folha.
Ciao, signore! Como vão vocês? Estou tentando escrever e adiantar a história, só que acabo me afastando cada vez mais do romance e fazendo um suspense... Scuze, sério. T-T
. Alester - Gratzie, signori... Tentarei manter o tempo de publicação.
. Shot - Hahaha. Não... Brincadeira, não posso falar, mas daqui a pouco vocês vão entender, com o lapso de tempo do próximo conto.
. Lucas M - Hey, sir... Estou tentando, juro...
. Realginário - Agradeço-te muito pelo comentario, caro ragatzzo. Bem, o livro é o mesmo, depois de algum tempo você vai entender... E, bene, parecido como?
. Leo253 - Agraço o comentário, signori, e tanbém sua assiduidade aos meus humildes contos ^^
. Afonsotico - Ainda que fosse, caro mio. No caso deles o buraco é mais embaixo... Bem mais embaixo.
. Por do sol - Signori, perdoe meu francês, mas nem fodendo. Daqui a pouco tu descobrirás o que aconteceu ^^
. Wanderson16 - Ele tem seus motivos, com o tempo vou contando... E é Leo, como na constelação de Leão. ^^
. DW-SEX - Hahahahaha, gratzie piú respecto, signori. Mas é só uma mania, tinha que ver como era quando aprendi a falar Hawaiiano... Aí sim foi o caos.
. UEFA - Ah, meu caro! Como falei, se esquentar fizesse o mínimo jus....
Obrigado a todos vocês, que acompanham meus contos e estão tendo a paciência de aguardar pelo sexo entre os personagens (Não digo de quem nem que me matem u.u). Em todo caso espero logo postar o próximo conto.
Gratzie :3