Quando ele chegou ao quarto, seu rosto se encheu de lágrimas. Um vazio tomou conta do seu ser. Era como se ele fosse preso a sua própria liberdade. Se aproximou da janela, e levou um susto, ao ver que , o rapaz das tatuagens olhava para sua janela.
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Um medo percorreu seu corpo. Porque motivos, aquele rapaz o estava observando? Davi pensou em se afastar, mas sua adrenalina falou mais alto, e resolveu permanecer estático ao lado do vidro, e também o encarou. Mais uma vez, o tal cara, ria para ele. Era um sorriso misterioso, secreto, e ao mesmo tempo assustador. Tomou outro susto, quando o Fábio fez um sinal para que ele descesse.
- O que está vendo na janela, Davi? – sua mãe surgiu do nada.
- Que susto mãe! Nada. Eu não estava vendo nada. – ele ficou nervoso.
- Porque não vai ler a bíblia hein? Faz com que a nossa alma fique mais limpa.
Toda vez que a mãe dele falava daquele jeito, ele se sentia o pior ser humano da terra. Mal sabia ela dos sentimentos do filho. Como ele podia ser feliz, se nem o próprio Davi era capaz de aceitar a si mesmo?
- Mãe, ainda são sete da noite. Será que eu posso dar um pulinho na casa do Rafa?
- Por mim tudo bem, mas acho que o seu pai ao vai deixar. Ele não gosta que você saia à noite. E as ruas estão perigosas.
- Por favor, mãe! Já faz uma semana que não o vejo. Desde o dia do acidente de bicicleta.
- Tá bom! Aproveite que o seu pai foi até a casa do Pastor resolver problemas da igreja, e vá. Mas não demore voltar, ouviu bem?
- Pode deixar.
Ele queria muito ver o amigo. Ambos pareciam irmãos de tão unidos e próximos. A amizade dos dois se fortaleceu devido à mesma situação que ambos passam. A diferença entre o Davi e o Rafael, é que o último, era mais esperto e extrovertido.
A caminho da casa do amigo, que morava no bairro vizinho ao dele, Davi teve a sensação de estar sendo seguido. Ele caminhava com a cabeça baixa, quando um vulto o puxou pelo braço.
- Ei pastorzinho, tá indo pra onde?
- Seu idiota! Dá o fora Leo! – disse ele ao colega de escola.
- Como seus pais teve a coragem de deixar o bebezinho deles, sair de casa a esta hora?
- Eu sei me virar sozinho. Agora dó fora daqui.
- Eu pensava que você fosse mudo. – ele parou em frente ao Davi, bloqueando a sua passagem. O Leo tinha o dobro do tamanho dele, e um gênio perverso.
- Calma. Não precisa ficar nervoso. Dizem por aí, que o pastorzinho é florzinha. Isso é verdade?
- Me deixa cara. Sai da minha frente ou eu vou gritar!
- Que meda! KKkkkkkk... Vem comigo que eu vou te levar num lugar divertido. – ele segurou o braço do Davi com força.
- Eu não quero ir pra lugar nenhum. Para com isso Leo, e me solta! Você tá machucando o meu braço.
- Vem comigo cara. – ele arrastava o Davi pelo braço.
De repente o inesperado acontece!
- Ei babaca, solta o garoto! – do outro lado da rua, um cara vestido de camiseta, bermuda jeans e boné pra trás, fazia uma cara de bravo. Era na verdade o Fábio, o tal vizinho do Davi. O Leo pouco se importou e continuou a arrastá-lo, quando foi surpreendido pela chegada do Fábio, que o segurou pelo pescoço, apertando até sufocá-lo.
- Quando eu pedir pra soltar é pra obedecer, seu otário! - Fábio o jogou no chão e fez sinal pra que ele saísse dali correndo.
Um silêncio se formou...
- E... Eu... Não sei como agradecer. Obrigado. – Davi estava tímido e morrendo de medo. Pela primeira vez ele encarou o tal rapaz. O corpo dele era cercado por tatuagens e seu rosto tinha os traços perfeitos. Ele era uma espécie de bad boy.
- Dá próxima vez, vê se não anda por aí sozinho garoto. Lugar de criança é em casa.
- Eu não sou criança! E eu já disse, obrigado.
Fábio o encarava, e com o seu jeitão moleque, ria da cara do Davi.
- Por acaso eu pareço com um palhaço? Quer saber, eu já vou indo.
- Espera! – ele segurou no braço do outro. – Você é o meu vizinho não é?
- Pelo visto, sim.
- Será que a gente pode conversar depois?
- Não. Meus pais jamais me deixariam conversar com você.
- Ué! Você acabou de me dizer que não é mais criança. E outra coisa, eu não sou nenhum bicho, e nem mordo.
- Não é isso. É que... Eu nem conheço você direito, e confesso que eu sinto um pouco de medo de você.
- Medo de mim? Rsrsrsrs... Ele deu o sorriso mais safado que um homem pode dar. Ele era mais velho que o Davi; tinha 23 anos.
- Todos dizem que...
- Eu sou marginal, drogado, ladrão... É, eu sei que falam isso de mim. – Ele pegou um cigarro do bolso e ascendeu, nem dando importância ao que o Davi dizia.
- Você fuma? – Davi abanava a fumaça que se formava em sua frente. – Você deve mesmo ter uma vida errada. Se quiser, eu te levo pra igreja.
- Igreja, eu? Você tá falando sério?
- Quer parar de rir? O melhor caminho para sermos felizes se chama Jesus. O aceite.
- E você? Já o aceitou? Eu sei que você...
Davi tremeu só em pensar na conclusão da frase que poderia sair da boca dele.
- Eu não tenho muito tempo. Você vai conversar comigo depois ou não vai? – disse o Fábio impaciente.
- Eu já disse que não! Agora se me der licença.
Ambos mais uma vez ficaram se olhando. Algo místico e forte ligava os dois. Pareciam que eles se conheciam de outra vida. Duas personalidades totalmente diferentes se encarando, como se cada um quisesse descobrir o pensamento um do outro. O Davi não sabia explicar o que estava sentindo por dentro, mas uma agitação percorria suas entranhas. Tinha de sair dali o mais rápido possível, e foi o que ele fez. Saiu correndo, deixando que o Fábio apenas o observasse de longe. Aquele seria só o primeiro de muitos encontros e desencontros dos dois.
CONTINUA...