Capitulo vinte e três.
Enzo não foi o único apanhar. Meu pai veio até mim e me deu o soco mais forte qua já havia tomado em toda a minha vida.
— Demônios! — ele gritou enfurecido — Eu odeio vocês!
E ele chutou Enzo que permanecia caído no chão o fazendo gemer de dor. Olhei para porta e vi minha mãe em prantos olhando para nós. Algo havia acontecido e até aquele momento eu não estava entendendo.
— Solta ele! — Miguel correu e segurou meu pai enquanto eu ficava ali sem reação.
— Me solta! — ele pediu enlouquecido de ódio — Me solta.
— Vamos conversar! — Miguel pediu em desespero ainda sem entender o que havia acontecido.
Meu pai começou a chorar, mas a raiva ainda era visível em seu semblante.
— Eles estavam fudendo — meu pai disse — Eu vi no DVD que aquela menina me deu. Eles estavam fudendo agora. Aquele ali ainda está nú.
Só então me lembrei que ainda estava sem roupa. Me agachei e vesti minha bermuda que estava caída no chão sentindo nada novamente. Toda a satisfação que senti ao ver Miguel e Enzo desmoronar havia sumido assim como a dor de ver o amor da minha vida sofrer. Não restava mais nada em mim a não ser um buraco em meu peito que eu conhecia muito bem.
— Você entregou para ele? — Enzo perguntou com dificuldade enquanto se levantava do chão — Mostrar para Daniel não era o suficiente?
— Eu não enviei o DVD para ele — disse.
— Mentiroso! — Enzo gritou.
— Desta vez ele não está mentindo Enzo — A voz da minha mãe era dura apezar do choro — O nome dela era Brenda. Ela nos entregou o DVD e nos trouxe até aqui.
"Se Miguel é uma cobra, Brenda é um ninho inteiro de cascavéis" Jony havia me avisado sobre ela, mas eu não dei atenção.
— Como vocês puderam fazer isso conosco? — Meu pai perguntou chorando — Como puderam destruir nossa familia desse jeito?
— Eu não destruí essa familia — Enzo respondeu — Eu amo meu irmão e ele me ama.
Minha mãe deu um tapa forte na cara de Enzo.
— Não bata nele — pedi assim que uma ponta de ódio brotou em meu peito ferido.
— Cale a boca — Minha mãe ordenou — Você não tem o direito de exigir nada.
Ela estava muito desapontada, pois ela nunca falaria assim comigo se não estivesse.
— Apesar de nos últimos anos você ter esquecido, eu sou seu filho — argumentei — Tenho todo direito de exigir que não machuque meu irmão!
— Você não é meu filho e pelo que pude ver hoje ele não é seu irmão! Meus filhos morreram quando eram crianças. Vocês dois são apenas estranhos cheios de pecado que eu desprezo — ela estava chorando mais do que nunca.
— Não fale assim — implorei começando a chorar assim que tristeza surgiu ao lado da raiva rompendo a barreira que eu havia criado.
— Mas ao contrario do meu marido eu não vim aqui para mata-los — ela se aproximou de mim — Vim aqui para que vocês possam olhar em meus olhos e digam que não são vocês naquele DVD. Me digam que nada aconteceu. É só isso que lhes peço — seus olhos castanhos me encararam por um tempo querendo que eu lhe falasse exatamente o que ela queria ouvir, mas eu não podia. Não podia mais mentir. Não podia mais manter segredo sobre mim e sobre Enzo.
— É verdade — disse sentindo a dor de acabar com a vida de minha mãe — Tudo o que você viu era verdade.
— Então desejo-lhes apenas que se arrependam e encontrem Jesus — disse chorando ainda mais — Mas se um dia isso acontecer, não me procurem. Não serei capaz de olhar para vocês nunca mais em toda a minha vida.
Se virou e foi embora.
— Queimem no inferno! — meu pai se livrou de Miguel e deu mais um forte soco em Enzo que caiu inconsciente no chão. E em seguida foi embora nos deixando sozinhos.
Miguel correu para o telefone e ligou para uma ambulância enquanto eu ia para a janela e via meu pais entrando no carro e indo embora. Mas havia mais uma pessoa naquela rua que me chamou a atenção. Uma pessoa que apesar de conhecer a pouco tempo, achei que fosse minha melhor amiga.
Desci correndo as escadas e fui até ela que sorria enquanto lagrimas escorriam por seu rosto. Lágrimas de felicidade.
— Piranha! — disse lhe dando tapa na cara — Por que fez isso comigo?
— Não foi por sua causa — ela disse chorando — Foi por culpa do seu irmão! Ele matou o meu irmão! Foi por culpa dele que meu irmão morreu!
Nessa hora eu ouvi o som da ambulância chegando e a vi parando enfrente ao prédio.
— Seu irmão transformou o meu em viado e o fez se suicidar! Enzo fez isso com ele e agora teve o que merece! — ela sorriu sadicamente — Eu só queria ter visto a cara dele quando viu você com Miguel. Deve ter sido lindo!
A barreira que criei em meu interior para esconder toda a dor e sofrimento que aquela noite me causou se rompeu e toda a ira, tristeza e culpa transbordou em um soco que desferir contra Brenda, tão forte que a fez cair no chão com sangue escorrendo-lhe pelo canto da boca.
— Não sei qual foi a história entre Enzo e o seu irmão, mas tenho certeza de que Enzo não teve culpa pela morte dele. Enzo é uma pessoa boa.
E nesse momento eu vi a maca saindo do prédio carregando meu irmão que convulsionava. Olhei para Brenda que sorria ao ver meu irmão naquele estado e corri até ele, mas não sem dar-lhe outro tapa na cara.
— Se afaste por favor — um paramédico me disse quando me aproximei de Enzo.
— Ele é meu irmão! — disse e ele me deixou passar.
O olhar de Enzo era vidrado e ele se debatia a espumava pela boca com uma faixa que o impedia de morder a própria língua. Havia muito sangue em seu rosto e isso me deixou ainda mais desesperado.
Eles o colocaram dentro da ambulância e eu o acompanhei. Não o tinha notado até o momento em que ele tentou subir na ambulância.
— Você já fez o suficiente — Impedi Miguel de subir.
— Mas ele é meu amigo — rebateu.
— Era seu amigo — disse e os paramédicos fecharam as duas portas traseiras da ambulância que logo entrou em movimento — O que ele tem? — indaguei a médica que o segurava.
— É apenas uma convulsão causada por um trauma na cabeça — ela me disse — Ele foi agredido.
Não era uma pergunta e sim uma afirmação.
— Foi — disse me lembrando da cena de meu pai o chutando — Nosso pai fez isso. Ele descobriu que nos estamos... Juntos — tentei amenizar as coisas.
Pela cara da médica e dois dois paramédicos presentes, minha tentativa de eufemismo não foi bem sucedida. Os três me olhavam com uma mistura de repulsa e surpresa.
— Até eu faria o mesmo — a médica não conseguiu segurar tais palavras.
— Com licença, mas o que você tem a ver com isso? — indaguei furioso — Seu trabalho é socorrer as pessoas não importa que ou o quem sejam.
— Vou fazer meu trabalho — respondeu furiosa — Só fiquei um pouco chocada.
— Guarde seu choque e suas opiniões para si mesma Doutora! — rebati e pude ver que ela não gostou nem um pouco e se manteve extremamente profissional o resto do tempo.
A convulsão de Enzo não durou nem mais um minuto depois da minha discussão com a médica, porém ele continuava desacordado. Ela colocou uma mascara de oxigênio em seu rosto e rumamos o curto caminho até o hospital.
Não foi surpresa nenhuma ver o carro de Miguel parar logo atrás da ambulância quando desciam Enzo e o levavam para a sala de trauma.
— Eu já disse que fez o suficiente — disse lhe assim que ele saiu do carro.
— Não o suficiente — ele me atirou a carteira de Enzo — Você esqueceu os documentos dele.
— Obrigado — agradeci — Agora já pode ir para casa.
— E deixa-lo aqui sozinho? — ele disse — Ele é meu amigo!
— Você disse que a amizade de vocês tinha acabado — Lembrei-lhe mais uma vez naquela noite.
— Eu disse isso em um momento de raiva! — disse furioso — Por mim ele é e sempre vai ser meu amigo. Já você...
— Eu nunca quis ser seu amigo — disse — O que houve entre nós acabou.
— Com toda a certeza — concordou e me jogou também um casaco preto de fechecler ao perceber que eu estava sem camisa.
Vesti e o agradeçi novamente.
Eu entrei na recepção acompanhado da médica que cuidou de Enzo na ambulância. Nesse momento dei graças a Deus por Miguel não ter ido para casa, pois precisava de alguém maior de idade para acionar a ficha de Enzo e eu só completaria dezoito dali a dois meses. A médica então foi embora para atender outro chamado deixando Enzo nas mãos de outro médico, uma enfermeira e dois técnicos de enfermagem que cuidaram de seu nariz e de um ferimento na parte de traz da cabeça causado pelo impacto no chão.
— Está feliz agora? — Miguel me perguntou enquanto aguardávamos na sala de espera ao lado — Conseguiu sua vingança.
— Nunca quis isso — admiti — Só queria fazê-lo sentir a dor que eu senti. Enzo me enganou dizendo que ficaríamos juntos e depois me largou. Queria que ele sentisse a dor de ser traído por aquele que ele mais amava.
— E que DVD é esse que vocês tanto falavam? — Miguel falava com um calma que me assustava. Depois de tudo o que houve naquela noite, ele ainda assim se mostrava sereno.
Respirei fundo antes de falar.
— Enzo e eu voltamos a algumas semanas — contei e ele não pareceu surpreso — Eu nos filmei transando sem que ele soubesse e coloquei em um DVD e Brenda deu um jeito de entregar a Daniel.
— Mas por que pediu para Brenda?
— Eu não pedi. Ela me sugeriu essa vingança e depois pediu para deixar que ela encontraria uma forma de entregar o DVD a Daniel e conseguiu. Hoje a única coisa que eu tinha que fazer era encontrar a forma de transar com você para que Enzo nos visse juntos.
— Mas como ela sabia o endereço do seus pais e por que ela lhes entregou uma cópia do dvd?
Me lembrei do que fazíamos quando lhe entreguei o DVD e finalmente entendi o motivo dela ter me mostrado tantos lugares no google maps.
— Estávamos vendo lugares que gostaríamos de visitar e ela me mostrou onde morava antes de vir para cá e eu lhe mostrei onde morava. Ela apenas copiou o endereço. E quanto ao motivo, ela disse que o irmão dela se matou por causa do Enzo.
— Espera ai... Essa é a Brenda irmã do Gustavo? — Miguel indagou como se soubesse de toda a história.
— É sim — disse — Você o conheceu?
— Se conheci? Era um dos meus melhores amigos na faculdade e namorou com Enzo por pouco tempo.
Essa ultima parte me magoou, mas eu estava curioso para saber mais.
— E como ele se matou?
Miguel me contou como Enzo o ajudou a se aceitar e como eles se gostavam. Me contou o que os pais de Gustavo fizeram com ele e sobre como ele se matou. Senti pena de Brenda nessa hora, mas também fiquei com mais raiva ainda. Ela disse que Enzo o transformou em gay e que depois ele se matou. Ela culpava meu irmão injustamente pela morte do dela. Se havia algum culpado pela morte de Gustavo, esses eram seus pais.
— Ele acordou — Disse o médico que cuidou de Enzo — Disse a ele que estavam aqui e ele disse que não quer ver nenhum dos dois.
— Não me importo com o que ele quer — disse ao médico — Eu tenho que ver meu irmão!
— Eu entendo ... — ele tentou se lembrar do meu nome, mas nunca se lembraria, pois eu não tinha lhe dito.
— Gabriel — disse.
— ...Gabriel — completou — Mas o paciente teve um trauma sério em seu crânio e precisa de descanso. Creio que vê-lo contra sua vontade agora o estressaria e ele pode piorar. Por que não espera até amanhã quando ele estiver mais descansado?
— Mas...
— Tudo bem então — Miguel me interrompeu para concordar com o médico — Mas vamos vê-lo amanhã.
— Isso. Vão para casa e descansem. Pelo visto tiveram uma noite difícil e prolonga-la não fará bem para ninguém.
Tentei protestar dizendo que passaria a noite ali, mas Miguel não aceitou. Ele me levou para casa onde tomei um banho longo e quente. De repente toda a dor daquela noite desmoronou em mim me fazendo sentar no chão do banheiro e chorar enquanto a água quente levava minhas lágrimas para longe.