Senti um calafrio ao ouvir a voz do Ahnrí, de alguma forma não queria que ele soubesse minha conversa com a mãe dele. Por outro lado, eu no fundo achava que aquela conversa da Mari não era fundamentada em algo real. Achava que ela simplesmente não tinha ido com a minha cara e aquilo que ouvi o Ahnrí falar me fez ver que não, que ele realmente tinha algum problema sério, que talvez justificasse que eu me afastasse dele.
O olhar da Mari, visivelmente demonstrava que não era confortável para ela ter sido surpreendida pelo filho tendo aquela conversa comigo.
- Ahnrí, filho, eu….
- Tudo bem mãe, entendo a senhora andar falando de mim dessa forma, mas não é necessário. Posso resolver meus problemas sozinho. - Respondeu ele calmo. - Caleb, podemos conversar no seu quarto? - Completou ele me encarando com aquele jeito meigo que só ele tinha.
- Claro. - Respondi abrindo a porta e convidando-o a entrar, deixando a Mari na porta do outro ap com cara de bunda.
Levei ele até meu quarto bem apreensivo e sentamos juntos na cama.
- Olha Ahnrí. se você não quiser falar nada…
- Claro que vou falar Caleb. - Falou ele em tom levemente impaciente. - Se eu não falar você pode pensar qualquer besteira. Não que não seja algo sério.
- Tudo bem. - Respondi encarando-o. - Sou todo ouvidos.
- Cara, é meio complicado. Eu fiz uma merda muito grande. Muito grande mesmo. - Começou ele em um tom que me preocupou bastante.
“Eu me assumi gay aos 14 anos, minha mãe já era separada do meu pai e vivia com a Lu. Ela aceitou de boa e me assumi porque conheci um garoto, o Leo, e nos apaixonamos, ele já tinha 16 à época. Começamos a namorar e só viviamos juntos. A família dele não aceitava de jeito nenhum, mas ele resistia às tentativas de controle. O pai dele até tentou me agredir uma vez e ele me defendeu. A gente planejava vida juntos, casamentos, podia parecer coisa de moleque, mas o sentimento era muito forte.
Há um ano e dois meses, ele viajava com a mãe e o pai dele para um sítio da família, o pai dele perdeu o controle do carro e morreu ele a mãe dele, só sobreviveu o pai. Aquilo me destruiu e entrei em depressão. Minha mãe gostava do meu namorado, mas tentou de toda forma me fazer me interessar por outras coisas. Três meses atrás, finalmente fiquei com outra pessoa. Conheci um cara e começei a me envolver, ele era mais velho tinha 22 anos. A vontade de superar a perda do Leo era tão forte que tentei mergulhar com tudo na relação. Aconteceu que fiquei três vezes e esse cara novo me dispensou, revelou que era noivo e só queria sexo. Aquilo trouxe todo o sofrimento de volta, não sentia por ele, nao cheguei a gostar de verdade, mas voltei a sentir o imenso vazio que o meu namorado havia deixado. Não sei que merda deu na minha cabeça, minha mãe toma remédio controlado, peguei as três caixas que ela guardava e tomei todos. Quase morro mas o choque me trouxe a realidade, voltei a ver que tinha que seguir minha vida, voltei até a frequentar o terreiro de Umbanda, coisa que tinha abandonado. Só que minha mãe não me quer me envolvendo com mais ninguém, acha que se eu me envolver com alguém e não der certo eu piro de novo. É isso.”
Eu fiquei olhando para ele com cara de bobo. Era informação demais para digerir. De repente, me passou um leve arrependimento pela forma como tratei ele quando me pediu em namoro, mas achei melhor nem tocar no assunto, tudo que alguém que passou por trauma como o dele precisa é que as pessoas ao redor demonstrem pena para a pessoa se sentir mais mal do que já se sente.
- Ahnri. Eu não sei nem o que falar. Obrigado por confiar assim em mim.
Algumas lágrimas corriam pelo rosto dele
- Não liga para isso. - Falou ele enxugando. - Não é de tristeza não. Estou bem feliz que agora você sabe quem eu sou e o que eu passei, se for rolar alguma coisa entre a gente, essas coisas do passado não vão atrapalhar.
Dei um forte abraço nele. Ele era um garoto um pouco misterioso, mas ver a forma como ele abriu o coração me fez enxergar a pessoa maravilhosa que ele era. Ele retribuiu o abraço e deu um beijo nos meus cabelos. O beijo nos cabelos logo evoluiu para um tímido encontro entre nossos lábios, senti o gosto salgado de uma de suas lágrias misturado com o doce de sua boca. Meu coração bateu forte, pulsou de encontro ao dele, por um momento senti como se não fôssemos duas pessoas mas apenas uma, com um só corpo e um só coração. Nosso momento foi interrompido por uma súbita batida na porta.
Larguei ele assustado, não podia ser minha mãe, porque a noite apenas começava a cair, mas não queria arriscar ela me ver aos beijos com outro cara que não fosse o meu suposto namorado.
Fomos juntos até a porta e lá estava o Cléber. Fiquei supreso porque só esperava ele mais tarde.
- Caleb, Ahnrí. Tudo bem? - Ele cumprimentou cordial.
- Oi cara. - Falou o Ahnrí apertamento a mão dele. - Tudo beleza e contigo?
- Tudo bem. Vamos nessa Caleb? - Completou Cleber se dirigindo a mim.
- Não sabia que era sério.
- Ahnrí. Venha aqui por favor. Precisamos conversar. - Era a Mari abrindo a porta do AP dela e se deparando com nós três.
- Mãe… - Começou a falar o Ahnrí em tom de impaciência.
- Agora, Ahnri. Depois você pode voltar. - Falou ela incisiva e ele foi, não sem antes me lançar um olhar apreensivo por causa do Cleber.
- Somos nós agora. - Falou o Cléber. - Vamos?
- Como te disse, não me preparei, não sabia que era sério.
- Mas era, vamos. - Falou ele com certa impaciência.
- Calma, a gente pode esperar o Ahnrí desocupar e fazer algo junto com ele?
- Não Caleb. Vamos agora, tenho uma coisa muito importante para conversar.
Ia falar para conversarmos ali mesmo, não sei porque, aquela conversa com o Ahnrí me tirou o tesão que tinha no Cléber, não sabia se ele iria querer algo, mas eu não estava querendo, ao contrário do dia em que ele anunciou nosso falso namoro. Meu receio dele reagir negativo me fez apenas pegar minha carteira e seguir com ele.
Não conversamos muito no trajeto do carro, ele aparentava estar vindo do hospital, apenas perguntei sobre isso e ele falou que não. Que íamos para um sítio dele pasar o fim de semana e minha mãe já estava avisada.
- Eu não quero ir, vamos cancelar isso.
- Foi idéia da sua mãe, quer passar o fim de semana comigo ou que ela desconfie da nossa armação e te expulse de casa.
- Não acho que ela me expulsaria.
- Quer arriscar?
- Não. - Cedi arrasado enquanto avisava o Ahnrí e a Nat pelo whatssapp.
Ele colocou uma música suave e cochilei, acordei e estava totalmente envolvido por um cenário rural, matos e montanhas por todos os lados.
- Onde estamos?
- Quase chegando. - Ele respondeu sério.
- Cara, você devia ter avisado pelo menos para eu pegar umas roupas.
- Veste umas minhas. - Ele falou sem olhar para mim.
Olhei no celula e vi que tinha dormido uma hora e meia, se estávamos chegando o sítio era razoavelmente perto. Alguns minutos depois ele adentrou uma estrada de terra, seguimos alguns kilômetros e chegamos a um vilarejo, alguns casas de alvenaria e outras de barro. Logo chegamos a uma que se destacava, era uma chácara muito bem cuidada, cheia de árvores frutíferas e flores. Um homem correu para abrir o portão e entramos com o carro, mas ninguém nos recebeu na casa.
- Não mora ninguém aqui? - Perguntei descendo.
- Não, o caseiro mora lá atras, e a ordem é nunca vir sem ser chamado quando eu estiver aqui, gosto de privacidade.
Entramos na sala, ele com duas bolsas e eu apenas com minha roupa, celular e carteira.
- Pensei que a gente ia apenas dar um rolé. - Falei rindo para ele e calando imediatamente ao perceber um olhar de raiva em seu rosto. - O que foi?
- Você está tendo algo com aquele garoto?
- Aquele garoto tem nome, o Ahnri. - Falei debochado. - Não estou entendendo…
- Mas logo vai entender. Tira roupa que vou comer você.
- Cleber. - Falei calmo. - Era isso que queria conversar, eu não quero mais que role nada entre a gente.
- Como é? - ele falou agressivo se aproximando e segurando meu queixo. - Não era você que perguntou se eu não queria os beneficios?
- Foi cara, mas eu estava…
- Estava nada, viadinho. Você pensa que está no controle? - Indagou ele apertando minha bunda com tanta força que doeu. - Você não está no controle. A partir de agora quem controla essa porra sou eu. Aceitou o namoro porque quis.
- Você só pode estar brincando… - Falei tentando me soltar e então senti um forte tapa no meu rosto.
- Sente o tamanho da brincadeira. - Falou ele ainda com a mão erguida. Meu olhar de surpresa e horror o deixaram feliz a ponto de le abrir um enorme sorriso. Fiquei completamente atordoado, eu conheci um Cléber sério, mas atencioso e muitas vezes carinhoso, não sabia quem era aquele homem que estava ali na minha frente.
Até amanhã pessoal.
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Neguinha_evangélica* : Seus emails também continuam guardados, nunca vou esquecer minha surpresa do primeiro email ter vindo de uma leitora tão diferente.
SafadinhoGostosoo :D :D :D :D
Victor1607 : Matei a curiosidade? :D
cintiacenteno: é mania parar na hora do suspense.
kaduNascimento : será que foi surpresa? :)
geomateus : obrigado.
K.B: vlw :)
Augusto3 : a arte imita a vida :D
THI_RJ : já tá sabendo.
GUINHO : :)
stylo : concordo com você :D