Quando o sábado já se transformava em domingo, Pedro acordou. Sentiu uma enorme dor nas costas por ter passado tanto tempo deitado e procurou uma nova posição na cama para acomodar sua coluna. Ao abrir os olhos, viu Igor no escuro, iluminado apenas pela luz emitida pela tela do computador.
- Igor?
- Oi.
- Por que está no escuro?
- Porque você estava dormindo.
- Que horas são?
- Quase meia noite.
- Dormi tanto assim? Meu pai deve estar louco atrás de mim.
- Ele veio mais cedo, mas não quis te acordar.
- Você disse que eu não consegui vender?
- Disse...
- Hum... E ele ficou chateado?
- Acho que não. Ele mostrou mais preocupação pelo fato de você estar cansado.
- Hum...
Pedro se levantou e acendeu a luz. Ao voltar para a cama, sentou na borda, de frente para Igor.
- E você?
- Eu o que?
- Não está chateado comigo?
- Não. Por que eu estaria?
- Pelo o que a gente combinou no dia em que você quebrou o braço.
- Ah, aquilo? Não se preocupe não. Eu estava chateado naquele momento, mas foi só aquele momento.
- Tem certeza?
- Tenho. Lembra que eu disse que não vou mais embora? Então... Agora tanto faz como tanto fez.
- É que... Você precisava ver a sujeita. Uma idiota, uma nova rica metida a socialite. Ela disse que mesmo antes de ver os pisos, ela já não queria comprá-los mesmo. Disse que só estava fazendo isso porque o marido insistiu.
- Por que ela não pediu que enviássemos um catálogo então?
- Foi exatamente o que eu disse...
- Então você sabe que não foi culpa sua.
- Mesmo assim... Sei lá. Eu me sinto idiota por...
- Por?
- Não, deixa.
Igor achou aquela conversa muito engraçada, afinal, quando ele imaginaria que Pedro um dia sentaria ao seu lado e, com uma pequena angustia lhe incomodando, tentaria desabafar. Pela primeira vez Pedro pareceu se sentir a vontade para falar de seus problemas e dificuldades, como se Igor fosse seu melhor amigo, alguém íntimo e de confiança. O garoto sabia, ou supunha, que as palavras que Pedro diria seriam sobre como ele se sente incomodado por ter medo das pessoas e da sua dificuldade em se relacionar com elas. Mas não insistiria.
- Não está com fome? – perguntou enquanto voltava a sua atenção ao computador.
- Muita!
- Eu fiz sopa pra você.
- Fez sopa? Pra mim?
- Sim.
- Pra mim?
- Não foi só seu pai que se preocupou pelo seu cansaço.
Aqueles dois já se sentiam mudados, um em relação ao outro. Não eram mais os mesmos, nem para si, nem para o outro. Eram outros. São novos Igor e Pedro. Mas o que são agora? O que são para si? E o que são para o outro? Não tinha como definir o grau de incerteza em Pedro e em Igor. Pedro sabia que sentia um carinho muito grande por aquele garoto, mas não saberia descrever o que era. Talvez fosse culpa por tudo o que já fez contra ele, talvez um tesão reprimido, ou até mesmo a necessidade que sua alma tinha em estabelecer uma paz para si. Quanto para Igor talvez fosse ainda mais difícil e delicado tentar definir. Em sua mente a primeira transa foi traumática e isso ainda latejava. Igor conseguia olhar para Pedro e não sentir nada. Sentia algo quando bem queria. Poderia ver Pedro nu – e o via quase todos os dias – e não lhe vinha nada na cabeça que lhe provocasse excitação. Mas quando se deixava levar por aquelas curvas, poderia sim imaginar como seria transar com ele de novo. Mas era um pensamento que prontamente se bloqueava com violência. E, honestamente, Igor estava em estado de paz mais por si mesmo que por Pedro. Então eram eles mais estranhos para si mesmos que um para o outro.
Era uma nova sensação. Dormir e acordar praticamente juntos. Durante toda a semana, após despertarem, continuavam deitados e alertas, embora os corpos ainda estivessem muito relaxados. Era possível sentir um pouco do cheiro de suor que cada um produzia enquanto dormiam. E o cheiro já havia se tornado hábito, algo íntimo e compartilhado sem nenhum pudor. As pernas abertas, deixando as virilhas respirarem, o elástico da cueca incomodando a pele. O estalar dos dedos dos pés, aquecendo por conseguinte todas as articulações do corpo, numa tentativa de avivar as sensações e abandonar a dormência.
- Eu tive um sonho.
- O que?
- Sonhei que os pedreiros não vinham hoje.
- Seria mesmo um sonho!
Mas ainda não conseguiam olhar nos olhos, pois seria muito revelador.
- Eu acho que o feijão está bom.
- Deixa eu ver.
- O cheiro está bom.
- Sim, parece bom.
Não havia mais (ou quase) uma frase comum a um ou ao outro. Pedro poderia dizer algo que Igor diria. Poderiam ser eles detentores das mesmas palavras.
No domingo seria aniversário de Breno. Igor, seu único filho, seria a companhia ideal, pois não havia programa melhor que ir ao Estádio do Rei Pelé, ver o time de coração jogar contra algum outro clube de algum interior distante. As cores do time, o CRB, vermelhas como o amor e intensas como o ódio. “Bem que eu poderia ir de azul!”, nas cores do time rival, mas não faria sentido, já que o rival daquele dia vestia verde. Poderia então haver esperança. O CRB poderia perder.
Breno já buzinava com ira em frente ao portão do casarão. Não poderiam se atrasar, pois ainda comprariam as entradas. Pedro assistia a aflição de Igor enquanto se vestia apressado. Não poderia evitar que o garoto fosse e não gostava da ideia de vê-lo junto ao pai de novo.
- Como eu odeio futebol!
- Não tanto quanto você odeia o seu pai.
- É tão notável assim?
- Claro.
- Você bem que poderia vir comigo, não é?
- Você gostaria que eu fosse?
- Claro que sim. Mas isso é impossível. Meu pai não gostaria que você fosse.
- Por quê?
- Porque ele teria ainda mais vergonha de mim.
Ao ver o filho abrindo o portão, Breno logo iniciou o berreiro.
- Anda, Igor, deixa de ser molenga. Vamos perder o jogo!
- Eu já estou indo. – entrando no automóvel.
- Você sempre se atrasa. Que saco. Vamos perder o jogo e já deve ter filas enormes na bilheteria!
Em frente ao estádio havia todos os tipos de homem que Igor nunca chegaria a ser. Para começar, tinha verdadeiro preconceito com aqueles que, sem estarem na praia ou numa piscina, andavam na rua sem camisa. Além de tudo, gritavam ao falar, se faziam entender pelo berro – e como aquilo lembrava Breno! – as risadas levadas ao exagero. A tapinha nas costas que estalava como se fosse levado por fúria. Mas nada era pior que o cheiro de urina que impregnava todas as paredes. Era um zoológico de machos. Para Igor, todos nojentos e dispensáveis. Era talvez o único momento em que o garoto esquecia toda a sua humanidade e até tinha prazer em pensar que uma bomba poderia explodir e matar a todos de uma forma dolorosa e lenta. Breno poderia estar também entre os torcedores. “Um bando de idiotas gritando por causa de vinte e dois homens ainda mais idiotas. Coitada da bola!”.
Caminhou com o pai até a fila e, quanto mais olhava para os lados, sentia-se mais deslocado. Os adolescentes de classe média, assim como ele, pareciam ainda mais patéticos que os de classe mais baixa. Obviamente tudo era um enorme preconceito de Igor, que não se ajustava àquela situação e não fazia questão disso. Era o que poderia sentir em resposta a tudo o que o futebol representava para a sua vida íntima. Era um símbolo consistente de que Igor era um viadinho de merda!
- Tome o ingresso... Vamos!
Seguiram para os portões, onde as pessoas se amontoavam e esperavam ser revistadas por policiais. Um verdadeiro desconforto. Já caminhando pelas rampas, foram ao bar do estádio Rei Pelé. Um corredor estreito, de paredes enegrecidas pela imundice e um bando de gordos descamisados e suados exigindo com urgência as suas cervejas.
- Vamos comprar. Espere aí.
- Eu não quero cerveja.
- Você já pode beber.
- Eu sei e, na verdade, eu já bebo. Mas não quero agora.
- Besteira, você vai tomar.
E não adiantava discutir. Breno não o ouviria, assim como fez durante esses dezoito anos. Não era por maldade, mas simplesmente porque não conseguia entender que “não” era realmente “não”. Com dois enormes copos de cerveja, semelhantes a pequenos baldes, Breno saiu daquele amontoado de testosterona e entregou a bebida para Igor. O garoto não conseguia segurar com uma mão e andar ao mesmo tempo. Na arquibancada, seu pai sacou um pequeno rádio do bolso, ligou e começou a ouvir a locução. Igor só conseguia pensar que poderia ser morto a qualquer momento por uma bala perdida, por alguma grande confusão entre torcidas, ou algo assim tão comum a qualquer jogo de futebol em qualquer estádio do país. Claro, tudo informações que ele tinha pela televisão.
Breno avistou um amigo do trabalho, que também estava acompanhado pelo filho adolescente e logo o chamou... Não, logo berrou. Enquanto eles vinham, Breno olhou para Igor e viu que ele quase não bebia a cerveja.
- Você ainda está ai? Beba logo essa cerveja, senão vai esquentar.
- Mas eu estou bebendo, só que é muita.
- Beba logo isso, Igor!
Ao chegarem, Breno e Igor os cumprimentaram e continuaram de pé. Apenas Igor se sentou. Continuou segurando a cerveja com as duas mãos (ou pelo menos tentando segurar também com a mão direita) e bebendo grandes goles. A bebida descia com dificuldade e o gosto não o agradava. Os três conversavam afoitamente, aguardando pelo início do jogo, enquanto Igor não conseguia se envolver. Seu pai o olhou com raiva, rapidamente, e Igor se levantou, mas nada mais disse, pois não entendia nada.
- Lembra quando vocês dois eram pequenos e faziam escolinha juntos?
- Escolinha?
- Sim, Igor, escolinha de futebol!
- Lembro por foto.
- Você sempre era o goleiro. – disse Henrique, o outro garoto.
- Nunca fui bom nisso.
- É, você era muito preguiçoso. – disse Breno.
- Você já está na faculdade, não é?
- Sim, eu faço Arquitetura.
- Henrique vai tentar Engenharia esse ano.
- Tem muita diferença de Arquitetura para Engenharia? – perguntou o Henrique.
- Não muita. A maior diferença é que Engenharia trata da parte mais estrutural das construções, é mais científico, talvez, mais matemático. Arquitetura tem disso, mas é também mais estético, estudamos História da Arte, por exemplo.
- É tipo decoração?
- Não, não, é tipo...
- Igor, cala a boca. O jogo já começou! – disse Breno de imediato.
Igor não fazia questão em falar, então não achou tão ruim fechar a boca. Sentou-se e voltou a beber a cerveja. Não conseguia ver graça em futebol e muito menos em assisti-lo em um estádio. De onde estavam mal dava para enxergar os jogadores e a bola. Olhava para os lados e não conseguia sentir nenhuma emoção, exceto alguma repulsa. Mas Igor sabia ser paciente e aquela não era a primeira vez que via um jogo. Breno, pelo contrário, se desesperava, berrava e xingava. Agitava a mão, indicando por onde o jogador deveria ir para concluir o passe. Esqueceu-se por completo de Igor. O primeiro tempo acabou e logo Breno estava tão cansado como todos os outros torcedores. Olhou para Igor e se incomodou com a sua apatia.
- Alberto, eu vou comprar cerveja, você vai ficar?
- Vou, eu não vou beber hoje. Estou dirigindo.
- Ué, eu também!
- Não, não vou beber hoje.
Caminharam então os dois para o bar e, ao se afastarem um pouco mais, Breno segurou o filho pela nuca e o apertou com força, enquanto andavam.
- Você não gosta de me ver feliz, não é, Igor? Nem mesmo no dia do meu aniversário!
- O que eu fiz?
- Nem parece que veio ver o jogo...
- Mas eu estou vendo...
- E por quê não torce?
- Porque o senhor sabe que eu não gosto de futebol.
- Todo homem gosta de futebol.
- Eu não gosto... Ai, pai, está me machucando!
Breno o largou com um leve empurrão e seguiu para o bar. Igor quis chorar, mas por sorte não produziu lágrimas. Esperou de longe que o pai voltasse com os copos de cerveja e voltaram calados. Já na arquibancada, Breno voltou ao desespero com a partida e Igor apático, dando pequenos goles no copo. O time de Breno, o CRB, já ganhava o jogo por dois à zero. Mas não era o suficiente. Quando o atacante se aproximou da trave do adversário, Breno agitou o braço com força, jogando-o para trás e para frente, em seguida. Mas não percebeu que, com aquele gesto abrupto, bateu com a mão no copo de Igor, derramando toda a bebida no garoto. Henrique não conseguiu segurar o riso e começou a gargalhar da situação. Breno ainda não tinha percebido, pois o lance do jogador ainda não tinha acabado.
- Puta que pariu, que atacante burro!
Mas as risadas de Henrique finalmente foram ouvidas e Breno se entreteve com isso.
- O que foi?
Henrique só conseguiu apontar para Igor todo encharcado de cerveja. O garoto ainda estava sentado e calado, olhando para a roupa toda molhada. Até suas meias dentro do tênis estavam úmidas.
- Você derramou a cerveja? Está com a mão furada? – berrou Breno.
- Você quem me molhou!
- Eu?
- Você bateu no meu copo e ainda molhou o meu gesso!
- Se estivesse em pé torcendo isso não teria acontecido.
Igor, em seu primeiro ataque de fúria contra o pai, levantou-se do banco e olhando em seus olhos, gritou.
- Vá tomar no cu!
O garoto então saiu em disparada sem saber muito bem onde era a saída. Breno ainda não acreditava naquelas palavras, mas reagiu com rapidez. Olhou para o amigo e se despediu, saiu atrás do filho, que se perdeu entre os vários corredores daquela enorme construção.
- Igor, Igor volte aqui!
- Onde fica a porra da saída nesse inferno?
Com mais algumas voltas, ganhou a rua e não soube para onde ir. Estava ele na calçada, próximo a estrada, olhando para todos os lados, pois tudo estava vazio. Havia apenas alguns vendedores ambulantes e uma camada de lixo cobrindo todo o chão. Breno finalmente atravessou os portões da saída e encontrou o filho perdido.
- Igor!
- Eu vou embora.
- Igor, quem você acha que eu sou pra me mandar tomar no cu?
- Eu odeio futebol. Odeio. Todas essas pessoas que estão aqui nesse estádio são um bando de idiotas desocupados que não tem mais nada pra fazer da vida. Futebol é uma merda, um lixo, eu quero que todo mundo que gosta de futebol morra. Eu quero que esse estádio desabe e que todo mundo morra. Bando de gente idiota!
- Cale a boca, Igor...
- Não vou calar, não vou calar. Eu odeio futebol e você nunca vai me fazer gostar dessa merda toda. E não me importa que todo homem goste de futebol, eu sou homem e não gosto. Porque eu sou homem, mas não sou babaca pra ficar gritando, berrando e bebendo cerveja ruim, enquanto um bando de retardados corre atrás de uma bola. De onde a gente estava nem dava pra ver a bola...
- Você me odeia, não é Igor?
- Odeio futebol. Por que não jantamos e assopramos uma velinha ao invés dessa merda toda?
- Porque homens fazem isso. Levam seus filhos pra verem futebol. É disso que eu gosto, é disso que homens normais gostam. E você é meu único filho.
- Azar o seu, azar o seu. Tenha outro filho e arraste ele pra esse lixo. Olha a rua como está. Olha essas paredes nojentas de mijo e merda e eu sou obrigado a sentar nessa nojeira. A beber cerveja nesses copos nojentos. Um bando de ratos e baratas que passaram por eles... Fique ai e feliz aniversário!
- Eu vou te matar, Igor, antes que você me mate de desgosto.
- Pode matar, pelo menos eu nunca mais vou precisar vir nessa privada de novo!
Breno levantou a mão o mais alto que pode e a largaria no rosto de Igor, mas ele, no momento em que viu o gesto, pôs o braço engessado na frente. Breno passou três segundos pensando se o bateria, mas se intimidou pelo gesso. Ele então baixou o braço e, com lágrimas nos olhos, desabafou.
- Você é a vergonha de qualquer pai.
- E eu nem ligo. Não vou morrer se você parar de me amar. Se é que já amou algum dia. Eu vou embora. E se quiser me espancar, passe no casarão mais tarde. Eu estarei lá esperando.
Igor deu as costas imediatamente para o seu pai e atravessou a rua. Breno assistiu a sua partida com um ódio que o incomodava, pois não conseguia odiar por odiar. O fato de Igor ser seu único filho pesava na balança. Breno era sem dúvida um homem tradicional, que não conseguia se desprender de seus valores. Filhos devem ser cuidados com austeridade para que demonstrem respeito e obedeçam a qualquer comando. Devem respeito aos homens e os mais velhos da família, ignorando ética e defendendo a moral familiar. Igor era o oposto de tudo isso e Breno só não o odiava mais porque, em sua moral, era proibido odiar alguém da família. Ainda mais quando este é seu único filho homem, o seu herdeiro.
Finalmente Igor pode chorar depois de todo aquele misto de cheiros e gostos desagradáveis. Ele não era uma pessoa arrogante, mas simplesmente odiava qualquer aparelho simbólico da máxima heterossexualidade repressora que tanto aprisionou a sua alma em seu corpo. Caminhava deixando lágrimas sobre o negrume da calçada. Subiu em um ônibus e partiu de volta ao casarão. Pedro se preparava para sair, pois jantaria com os pais naquela noite. Igor atravessou o portão e, já dentro de casa, começou a subir as escadas. Pedro se espantou com os ruídos, mas logo percebeu que se tratava de passos nos degraus. Esperou então pelo seu inesperado visitante olhando para a porta do quarto.
Um Igor sujo, triste e choroso surgiu e Pedro assustado com aquela cena, se aproximou imediatamente.
- Igor, o que houve? Cadê o seu pai?
- Eu quero que o meu pai se exploda!
- O que aconteceu?
Igor passou por Pedro, ignorando a sua preocupação. Com os próprios pés tirou os sapatos, mas para se desvestir das meias, ele teve que se encostar na cômoda e puxá-las com a mão esquerda. Elas, assim como toda a roupa, cheiravam a cerveja.
- Igor, você brigou com o seu pai?
- Pedro, por favor... Por favor...
- Desculpe, é só que eu não entendo.
- Esqueça!
Com muita rapidez, puxou a bermuda e a cueca. Quando essas peças já estavam no chão, Igor as chutou e se desequilibrou. Cairia, mas Pedro se apressou e o segurou pela cintura. O garoto agora precisava se livrar da camisa, mas como faria isso? Tentou puxá-la para cima e retirá-la pela gola, mas o gesso sempre impedia. Igor estava prestes a rasgá-la, mas Pedro se aproximou para ajudá-lo.
- Calma, Igor, calma...
- Me deixa, Pedro, me deixa!
- Deixa eu te ajudar, espera... Não se mexe, espera, deixa eu puxar aqui.
- Para, Pedro, me deixa, me deixa...
Pedro, mesmo com os sacolejos de Igor, já conseguia passar a manga pelo braço engessado e agora só faltava a manga esquerda e a gola.
- Para de se mexer, Igor.
- Me deixa, eu já disse, me deixa!
- Eu já estou conseguindo tirar.
Faltava agora apenas a gola, ou seja, todo o rosto de Igor estava coberto pela camisa. Mas agora com a mão esquerda livre, o garoto sacolejava mais ainda, atrapalhando a ajuda de Pedro. Este, por sua vez, ficou ligeiramente irritado pelas manhas de Igor.
- Para, Igor, você vai acabar se machucando!
- Me deixa, me deixa... Eu não consigo respirar. Tira logo isso, tira.
- Então fique... Fica quieto, Igor, para de se mexer, que saco!
- Então me deixa, que eu mesmo tiro, sai, sai daqui!
- Para, porra!
- Sai, Pedro, sai, sai daqui...
Aqueles dois já se odiavam como antes e ofegavam como touros prestes a atacar a muleta do toureiro. Mas o rosto de Igor ainda estava coberto e seu pescoço estava sendo sufocado pela gola. Sem desistir de puxar a camisa, Pedro empurrou o corpo de Igor para a cômoda e o imprensou contra o seu próprio corpo. Suas pernas se entrelaçaram e Pedro, sem querer, pisou no pé descalço de igor.
- Ai, meu pé!
- Então para de se mexer...
- Vai tomar no cu, Pedro!
- Eu que vou enfiar essa camisa no seu cu!
Quando Pedro finalmente conseguiu puxar aquele pedaço de pano sujo da cabeça de Igor, os dois continuaram parados, um olhando para o outro, alimentando um ódio, que só crescia naquele quarto. A pouca luz que os iluminava permitia que apenas os brilhos de seus olhos se destacassem naquele quase inicio de noite. Quando Pedro largou a camisa no chão, sem querer passou a mão sobre o quadril de Igor, próximo a sua nádega. A pele ainda estava um pouco úmida e fria. Naquele momento, Pedro sentiu sede de água – uma sensação demasiadamente estranha. A sede incomodava a sua garganta, impedindo-o de respirar normalmente. Igor o fazia mal. Mas antes que pudesse beber água, sua mão se apossou da cintura de Igor, forçando-o a se aproximar mais ainda de seu corpo e, com a agressividade que lhe era comum, socou o garoto. Seus lábios estavam tão rijos e tensos que aquele beijo parecia um soco!