Dizem que a lua cheia mexe com as águas de dentro das moças. Se isso é realmente verdade, Clara não tinha certeza; mas tinha agora dois motivos para acreditar que sim. O primeiro é que havia nascido numa noite dessas, iluminadas pelo farol lunar. Sua mãe, que era enfermeira em uma maternidade, sempre lhe contara do poder da lua cheia de tirar as crianças de dentro das mulheres, e o seu nome era, assim, uma homenagem àquela dona do céu, redonda e clara, que ajudou sua mãe a dar à luz.
O segundo motivo que a fazia acreditar no poder lunar sobre as águas femininas é que naquela noite de lua tinha havido uma cheia dentro dela. Isso mesmo, uma cheia. Veio como uma onda ardente, do interior de suas entranhas, e transbordou para fora de seu corpo. Havia descoberto o poder de ser mulher, e foi como se ela houvesse nascido de novo; parida de seu próprio ventre.
Já tinha ouvido falar a respeito, há vinte anos atrás. Numa aula de biologia, quando fazia a oitava série, o professor ensinava o assunto da reprodução humana e aproveitava para explicar algumas coisas sobre sexo pra garotada curiosa. Clara prestava muita atenção, até porque tinha “virado moça” naquela semana, e tinha aprendido com as aulas o significado do sangue que vinha de dentro dela: seu corpo estava “preparado para reproduzir a espécie por meio do ato sexual”, nas científicas palavras do professor. Mesmo que a explicação fosse insosa, pareceu-lhe mais completa e refinada do que as palavras rudes de sua mãe, ao lhe entregar um pacote de absorventes: “Daqui em diante, não deixe nenhum homem se aproximar, porque senão você pega bucho”. Clara, por sua vez, ainda não sabia ao certo os limites entre o tal do “ato sexual” e a “aproximação” dos meninos proibida por sua mãe. Será que o Marquinhos, ao pedir a borracha emprestada e tocar nas suas pernas daquele jeito, com aquele sorriso que a deixava mole, estava cometendo algum “ato sexual” com o qual devesse se preocupar? Entendeu que não na aula seguinte, depois das explicações sobre a funcionalidade da “penetração do pênis na vagina” para a "reprodução da espécie”.
Durante as explanações sobre a ejaculação masculina, Clara lembrava de uma conversa que ouviu de suas primas mais velhas sobre calcinhas molhadas quando estavam com os namorados. Se encheu de coragem e perguntou: “Professor, e a mulher, não tem isso não? Não ejacula?”. Em meio à algazarra da turma, um menino gritou lá no fundão: “Tem, sim, tem mulher que esguicha!”. Tentando disfarçar certo embaraço, o professor começou uma nova explicação, daquele jeito científico dele. Disse que, realmente, havia um fenômeno não muito estudado ainda pela ciência que indicava haver uma espécie de “ejaculação feminina”, mas que não era exatamente uma ejaculação, já que não expelia sêmen. Tratava-se da expulsão de líquido pela uretra, o que levava alguns estudiosos a concluir que o líquido nada mais seria do que urina, embora os relatos apontassem consistência e odor diverso; o que estava possivelmente relacionado à excitação da mulher durante o ato sexual. Alguns fizeram cara de nojo. Outros, de dúvida. E o sinal tocou, indicando o término da aula, para alívio do professor.
Somente vinte anos depois, Clara pôde entender o que aquilo realmente significava, numa noite de lua cheia. Estava em uma festa muito animada, e havia reencontrado, por acaso, após muitos anos, Marcos, sua paixonite de infância – o Marquinhos, da borracha. Ele continuava com o mesmo sorriso encantador, e com o mesmo cheiro agri-doce que a deixava enebriada. Repassaram juntos alguns episódios dos tempos de colégio, as marcantes aulas de biologia e as descobertas que haviam feito juntos, por trás do muro da escola, na hora da saída. O primeiro beijo. A primeira vez que Clara sentiu a calcinha molhada, como as de suas primas. O dia em que Marquinhos beijou seus seios e adentrou seu corpo com os dedos.
A essa altura da conversa, os dois já não se preocupavam com a indiscrição no meio da festa: dançavam se apertando o mais que podiam um contra o outro; sentiam os cheiros de seus corpos misturados; sussurravam ao pé dos ouvidos e mordiscavam orelhas e pescoços enquanto conversavam. A música foi interrompida para dar início a uma nova apresentação, que foram prestigiar bem na frente do palco. Clara posicionou-se com as costas para Marcos, e rebolava roçando o seu bumbum no membro dele, cada vez mais firme e ereto.
Resolveram sair dali para prosseguir com a indiscrição, no carro dela. Partiram sem destino, e pararam numa rua escura, no meio da madrugada. Devoraram-se num beijo ardente, igual àqueles por trás do muro da escola; mas com as malícias mais profundas da vida adulta. Ele abriu a calça e ela, rápida, abocanhou seu sexo de forma sedenta, sem se preocupar com os perigos de uma rua deserta na madrugada. Chupava, lambia, cheirava; e lembrava dos tempos em que sentia apenas o volume daquela coisa desconhecida que crescia entre as pernas de Marcos por trás do muro, enquanto se beijavam. Uma vez chegou a tocá-lo, de leve, mas não prosseguiu. Com essa lembrança, tomou aquele pau em uma de suas mãos enquanto o sugava, num frenético vai-e-vém, vibrando com os gemidos que provocava em sua antiga paixão. Quase chegando ao ápice, Marcos a puxou para o banco do carona, onde estava. Clara, montada em cima dele, rebolava intensamente, já gritando de prazer, enquanto ele chupava seus seios. O gozo veio intenso e sincronizado. Um estado de dormência eletrizante se estabeleceu em seus corpos, e eles permaneceram encaixados, quietos, temporariamente satisfeitos.
Seguiram para o motel mais próximo. No caminho, um certo estranhamento. Quem seria aquele homem ao seu lado? E se ele fosse um crápula inescrupuloso, filiado ao PSDB?– pensava Clara. E se os dados registrados no motel denunciassem aquela aventura proibida? – preocupava-se Marcos, que estava prestes a se casar dali a duas semanas. A súbita racionalidade se esvaiu quando adentraram o quarto. Sedentos um do outro, arrancaram as roupas rapidamente e se apreciaram, nus, por um instante, abraçados, admirando a sua forma de casal refletida no grande espelho de teto, ela deitada em cima dele com as suas curvas envolventes.
Transaram uma segunda vez. E uma terceira e uma quarta. Entre um momento e outro, ele, deitado entre as pernas dela, ouvia e contava as lembranças mais marcantes de trás do muro da escola. Sobre como se masturbaram, por anos e anos, com aquelas memórias. Sobre o desejo interrompido por nunca terem transado. Sobre como estava gostosa aquela mordidinha na orelha.
Marcos, então, escorregou até o sexo de Clara e começou a tocá-lo, cheirá-lo, beijá-lo. Enfiou os dedos profundamente, massageando um exato local que a deixou em êxtase. Meteu a língua delicadamente, ao início, e depois chupando com força, sugando aquele gosto para dentro de sua boca. Lembrou de um dia, atrás do muro, em que Clara se virou de costas e ele enfiou o dedo, de leve, na entrada do seu cuzinho, enquanto roçava a pica em sua bunda gostosa. Foi quando a deitou de bruços e passou a estimular, com os dedos, aquela região do corpo dela. Clara recebia todas aquelas carícias respondendo com gemidos de prazer, à medida em que empinava mais a bundinha para que ele continuasse. Marcos, então, meteu seu pau no cuzinho dela, enfiando delicadamente até que estivesse todo dentro, excitando-se ao notar que ela se empinava e gemia cada vez mais. O tesão insuportável antecedeu o gozo, e ela ficou mole, antes dele, que logo entregou-se também. Repousaram uns instantes, antes de continuarem aquela maratona do sexo, talvez cientes de que poderiam passar tempos sem se ver novamente, e por isso tinham que aproveitar ao máximo.
Dessa vez, ela por cima, cavalgando nele, enquanto passava a língua em todos os milímetros de seu corpo. Clara estava num estado incomum de excitação. Explorava essa sensação ao máximo, deixando-se enebriar por todos os seus sentidos: inalava o cheiro dele misturado ao cheiro de sexo espalhado pelo quarto; sentia o gosto dele ao lambê-lo por todo o corpo; ouvia seus gemidos; tocava sua pele, via em sua face o prazer que ele estava sentindo...
Foi quando deu-se a cheia de Clara, o seu encontro consigo mesma por meio da força da lua em suas águas. Aquilo nunca tinha lhe acontecido. Encharcou-se. Inundou o peito de Marcos e também os lençóis. Uma força da sua natureza de mulher que não podia explicar. Lembrou do professor de biologia, e, nesse momento, parece que Marcos leu os seus pensamentos. Ele passou a mão no peito, cheirou o líquido viscoso que havia saído de Clara, tentando entender o que era aquilo. A lua se retirava do céu, dando lugar aos primeiros raios de sol. Os dois tomaram banho juntos e se despediram, certos de que aquela noite ficaria para sempre em suas memórias, como as aventuras por trás do muro da escola.