Quando deu a hora do intervalo eu juntei tudo a minha volta, ele saiu na frente, apoiei a mochila no ombro direito e saí, recitando uma música qualquer, eu precisava manter a calma. Segui pela faculdade, fui ao refeitório, atravessei por um lado aonde as colunas fazem uma sombra, ele segura meu braço
- Ei, não, me siga
- Eu estou com fome
Ele sorriu, um arrepio correu pelas minhas costas
- A gente resolve isso melhor fora daqui
Me senti como uma criança que estava sendo arrastada pra casa, mas senti que uma criança não estaria gostando da situação, havia ali duas maçãs na minha mão. Uma me dava o poder de controlar isso e deixar tudo pelo meu jeito, a outra dava todo e completo domínio para ele. Parei, ele me encarou, soltou meu braço. Eu mordi a maçã, fiz minha escolha. Sorri e dei meu braço pra ele levar de novo, ele sabia que estava dando o controle. Perdi o fôlego com o que as curvas dos lábios dele.
- Você sabe que não tenho boas intenções, não é?
- Quem disse eu tenho?
Ele me empurrou contra a parede, senti a força e a pressão. Meu fôlego escapou e saiu em meio a um gemido
- Garoto, eu não posso fazer nada aqui
- Vamos sair da cidade então
- Você não tem medo?
- Tenho, mas isso me faz por mais fogo na coisa
Desci a mão até o pé da barriga, cheguei perto, olhando os lábios dele, larguei e corri pro estacionamento. Ofegando, olhei para trás e ele estava vindo. Peguei meu cigarro, acendi e o esperei. Ele chegou e me tomou o cigarro, eu gosto quando ele faz isso, e é a segunda vez que ele faz. Será que mordi a maçã certa?
- Você tem ritmo, garoto, será que eu aguento?
Aquilo me ofendeu um pouco, pela conotação sexual, eu não queria transar. Eu queria experimentar o perigo. Apenas.
- Não sei se saberemos. A vida tem suas surpresas
Ele abriu o carro, acertei sem querer. Fiquei parado e ele me olhou de volta
- Me desculpe, te ofendi?
- Não, sem desculpas. Só quero saber aonde vai me levar
- Sair por aí, podemos improvisar
- Bom, bom
O jogo era sujo, eu tinha medo de onde eu iria parar, mas eu ainda tinha tempo e mordi a outra maçã.
- Eu escolho, vem pro banco do carona.
Ele fez uma cara de dúvida, mas olhei em seus olhos e sustentei, fiz a cara mais feroz que tinha, ele entendeu o recado, eu não me dobraria muito fácil.
- Sabe dirigir, garoto?
Tirei a chave do meu bolso e destravei meu carro, em seguida travei de novo. Ele sorriu
- Ok, não corra muito
- Acho que nós dois já estamos correndo muito
Entrei no carro, girei a chave e liguei o carro, liguei o som, me surpreendi com a música que tocava, Love Spent da Madonna, eu adorava aquela música. Comecei a cantar junto com ela, ele estava pondo o cinto de segurança enquanto eu manobrava
- You had all on me, you wanted more...
- Não sabia que você conhecia essa música
- É a minha favorita, descreve a linha tênue entre o interesse e o sentimento. Todos nós temos o amor gasto
Ele me admirou, eu sabia que tinha ganhado alguns pontos
- Interessante, então tudo se resume a isso? Interesse e sentimento?
- Não, pra mim tudo se resume em duas coisas. Quem domina e quem é dominado e no que se ganha e no que se recebe. Nada vai sem que haja uma esperança de retorno
- Um pensamento forte, Vítor
- Obrigado, senhor
- Você disse que aqui fora não me chamaria assim
- Eu disse? Desculpa, isso torna as coisas mais interessantes
Ele sorriu, me senti desconfortável, será que ia valer a pena isso tudo? Onde estava a minha ousadia?
- Pq estamos na estrada?
- Eu disse que queria sair da cidade, senhor
- Mas para onde?
Ele me olhou assustado, aquilo me deixou com um divertimento interno e uma pulga atrás da orelha
- Não vamos longe, ainda tenho que pegar meu carro
Seguimos em frente, por uns 10 km, silêncio, apenas Madonna estava fazendo algum barulho, cantei todas que tocavam, mentalmente. Já estávamos chegando a um lugar que eu gostava muito. Virei a direita, entramos em um ramal asfaltado, ele estava nervoso, achei que tinha ido longe demais. Parei o carro e o desliguei. Respirei fundo e saí. Me encostei no capô enquanto ouvia ele saindo do carro. Olhei para o céu, fazia tempo que não fugia para lá. As estrelas pareciam intensas, a brisa abraçava enquanto ele se aproximava.
- Um belo lugar
- De nada, medroso
- Eu não estava com medo, só fiquei em dúvida, isso parece loucura
- Isso o que? Eu ou a localização?
- Você é louco. Mas me refiro a localização
- Eu não sou louco, eu sou livre
Dei dois passo e abri os braços, ele seguiu e me abraçou, sabia que chegava a hora. Ele segurou meu rosto, olhou em meus olhos, pela luz da lua eu vi a faixa de ouro que me hipnotizava agora. A sua respiração era quente e forte, foi se aproximando, meu coração não só batia mais, debatia e rebatia, sinto a pressão dos lábios dele nos meus, macios, a leveza ia dando lugar a necessidade, o que era aquilo? A língua invadia, feroz, minha boca, eu não respirava mais, eu estava ali, entregue aos lábios daquele homem que eu mal conhecia. Eu soube na hora que era uma queda eminente. Eu não caí naquele precipício, eu me joguei e o beijei com mais sede ainda.
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