Com a grande inquietaçao em que eu me encontrava, nao pude esconder mais tarde de Tony que Mauro tinha voltado.
- Ele esta horrivel, Tony - falei, num nervosismo - Esta com Aids.
Tony emudeceu, me olhando, mas nao tao surpreso como eu esperava. Sera que ele ja desconfiava? Porque mostrava nojo por Mauro assim que se livrou dele?
Estavamos sentados frente à frente na sacada do apartamento, observando a garoa envolver a cidade.
- Tem certeza, Marquinhos? - ele perguntou num tom sombrio.
- O proprio Mauro me confessou - respondi, olhando a chuva - Pior ainda: afirmou que passou a doença a voce, e que voce ja deve te -la passado a mim.
- Mas que absurdo! - exclamou Tony se erguendo, inquieto e tenso, indo para a sala e depois voltando - Nos nao temos nada, esse miseravel esta blefando. Minha saude vai de vento em popa, sempre foi assim. Esse desgraçado nao tinha que vir com uma mentira dessas!
Observei -o acendendo um cigarro, sentando -se outra vez na cadeira de plastico azul, batendo a ponta do pe no chao, nervoso. Nem ele acreditava decerto no que tinha acabado de dizer.
- Estou com medo, Tony - falei baixinho, secando depressa uma lagrima que correu por meu rosto.
- Nao, Marquinhos - ele largou o cigarro sobre o cinzeiro na mesinha e veio para o meu lado, me abraçando apertado, e eu me agarrei com força a ele, como a um suporte inabalavel - Eu sei que estamos limpos, nao pegamos essa merda nao. Fica calmo, moleque.
Fizemos silencio por um longo tempo, ouvindo a garoa e o som dos automoveis passando la embaixo.
- Voce faria o exame comigo, para tirar a duvida? - perguntei quando nos soltamos e ele retomou o cigarro.
- Nao! Para que? - respondeu ele, sacudindo a cabeça - Nossa saude esta perfeita, cara, sossega. Aquele infeliz nao me passou nada, tenho certeza.
- Se esta com tanta certeza assim, melhor ainda. Assim esfregamos o resultado negativo do exame na cara do Mauro.
- Mas eu nao quero fazer! Ja disse que nao precisa - ele se irritou, apagando o cigarro pela metade no cinzeiro - Paranoico voce, que acha que se pega Aids facil assim, pelo vento. Deixe disso, esqueça essa ideia, garoto. Nao quero medico nenhum olhando pra minha cara e pensando que sou veado e vou morrer seco igual uma mumia. Nao quero e nao vou fazer.
Ele estava com tanto medo quanto eu, era visivel, porem nada mais dissemos. Busquei uisque la na sala e voltei para a sacada. A garoa me acalmava, e ao fundo, dava para perceber longinquos claroes de relampago no ceu.
- Vamos prometer um ao outro esquecer esse assunto, certo? - disse Tony apos longo momento de silencio, me olhando com uma determinaçao subita - Prometa, Marquinhos.
- Prometo - respondi, fitando -o nos olhos.
- Que o Mauro parta em paz - ele esboçou um sorrisinho tenso, vindo se sentar ao meu lado na namoradeira e me beijando com gosto de cigarro na boca - Estamos bem, cara. Confie em mim.
Era como um grao de poeira a confiança que eu tinha nele. Mas era alguma coisa, mesmo que pequena, e me ajudou no esforço enorme que fiz em esquecer a cara encovada do Mauro e suas palavras terriveis e de mau agouro.
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Beijao em cada um! :D