Estava decidido a voltar pra casa na manhã seguinte, por ser sexta-feira as vésperas de carnaval já imaginava que não seria fácil achar passagens para o Rio. Mesmo assim acordei cedo e fui atrás de passagens, como esperado a data mais próxima disponível era no domingo a noite. Voltei frustrato por dois motivos, um por não poder curtir o carnaval no Rio como sempre fiz nos blocos da vida e outra porque tinha certeza que iria encontrar com Felipe, já que ele voltaria para casa no sábado.
Na sexta fez um calor infernal que nem parecia estar em região de serra, fui a cachoeira que pra mim equivalia a praia das montanhas. O que seria um passeio para distrair no final só me irritei, Vitor e Gabriel foram juntos e ficaram pagando de casal o tempo todo. Como não sou obrigado me afastei dos dois e subi um pouco mais a cima da queda d'água. O lugar era lindo mas ainda assim me sentia desconfortável por estar segurando vela e com uma desculpa qualquer voltei para casa mais cedo. Por ser "praticamente" carnaval meu pai já estava de folga e em casa. Acredito que minha cara não era das melhores quando entrei, assim que entrei no quarto ele chegou em seguida. O que mais admiro no meu pai e a forma como ele me respeita, mesmo sabendo o motivo do meu incomodo ele não tocava diretamente no assunto.
- Como andam as coisas? - perguntou ele.
- Bem pai, acaba que vou ficar mais uns dias, não tinha mais passagens para o Rio, só domingo a noite. - respondi.
- Suponho que você já saiba que o Felipe volta pra casa amanhã né?
- Sei sim pai. - respondi sem dar atenção mexendo em alguns livros.
- Vai ter um almoço pra comemorar o retorno dele e...
- E... nao irei. A não ser que seja amarrado e amordaçado. - interrompi sem dar chances de argumentos.
- Poxa Dan, o Marcelo e a Nice estão tão felizes, convidou todos nós. Eles ficarão chateados.
- Pai não faz sentido eu ir, acredito que seja uma comemoração íntima. E eles nem sabem que eu vou ficar aqui. - argumentei.
- Não faz essa desfeita filho.
- Pai eu não vou. E se for por uma questão de educação, eu vou embora amanhã cedo.
- Mas não tem passagens! - contra argumentou.
- Eu vou pra Niteroi e de la pego a barca pro Rio ou vou a pé. Dou meu jeito mas não vou a esse almoço - disse já de uma forma mais grosseira.
Ele não aceitou meu não, isso era visível. A única certeza que eu tinha era que ele iria apelar a alto inquisitora mas dessa vez eu não iria mesmo, nem que esse fosse o motivo para eu parar de falar com a minha mãe de vez.
A noite no jantar o assunto não poderia ser outro, a volta de Felipe pra casa, aquele era o momento ideal para saber que tanto segredinho era aquele da minha mãe com Felipe.
- Mãe em que momento a senhora virou amiga assim do Lipe? - questionoei com medo da resposta.
- Não vejo essa amizade toda que você diz. - respondeu seca como sempre.
Notei um olhar diferente do meu pai pra ela e ali tinha algo. Após isso ela falou
- Ele gosta de você e isso não é segredo pra ninguém. Assim que ele chegou de viagem acho que nem entrou em casa, veio direro bater aqui atrás de você. Tentei explicar que você não morava aqui, mas acho que ele pensou que estava mentindo. Após um leve fora ele se mancou e saiu, mas antes anotou o telefone dele e pediu pra eu te entregar. - ela falava isso como se contasse que tinha ido ao supermercado.
- E porquê não me entregou?
- Porque já sabia do noivado dele. E pra mim já basta um filho assim como você, ainda quer que eu aceite uma puta destruidora de casamentos alheio? - falou me olhando feio.
- A puta da história não e bem eu né mãe? - rebati.
- Isso já não e problema meu...
A forma como conversávamos era fria e distante, não me surpreendia muito pois nunca fomos próximos, mas nos últimos meses estava algo atípico.
A história ainda não estava bem explicada para mim, conversando com meu pai depois ele confirmou a história e disse que mesmo se mostrando dura minha mãe considerava o que Felipe sentia por mim, algumas vezes ele chegou a ir lá em casa mas a minha doce mãe sempre o dispensava, o que quebrou um pouco ela foram as visitas de Felipe durante o período de internação. Ele ainda tentou aliviar o clima dizendo que não a levasse tão a sério, pois ela me amava. Aquilo pra mim era uma forma muito estranha de amar, mas ponderei.
Sábado de manhã minha mãe me acordou cedo para ir ao tal almoço, para mim já estava mais que decidido eu não iria, o que foi motivo para mais uma discussão com a minha mãe. Ela insistia que era muita falta de educação minha não ir, já que esse era um momento muito importante para "nossos amigos" de anos. Decidido estava, decidido continuei não iria e pronto. Meus pais seguiram para casa dos pais de Felipe por volta das onze da manhã e fiquei em casa sozinho, pois Vitor havia ficado com o Gabriel.
Tentava por a cabeça em ordem e pensar em tudo, aliás isso havia se tornado quase um esporte nos últimos meses, passava parte dos meus dias tentando encaixar os fatos às emoções. Resolvi por uma roupa e ir correr, idéia esta da qual rapidamente desisti ao ver o forte sol que fazia. Subi de volta ao meu quarto tomei um banho e acabei dormindo novamente. As três da tarde levantei com uma sensação de resaca e por esse motivo sempre evitava dormir a tarde.
Almocei e resolvi encarar o sol para uma boa corrida, quem nunca sonhou largar tudo e sair correndo sem olhar para trás? E bem essa sensação que tenho quando calço o tênis e saio por ai. Por ser uma cidade não muito grande o bosque era um dos poucos lugares adequados a atividades físicas ao ar livre, por lá poderia correr até realmente estar cansado e livre de toda aquela carga negativa, já próximo de terminar meu circuito recebo uma mensagem de Vitor avisando que iria retornar no final da tarde. Aproveitei alguns aparelhos de uma academia a céu aberto pra dar uma exercitada a mais.
Cheguei em casa e enquanto tomava banho a campanhia tocou e só podia ser Vitor. Coloquei uma cueca e desci para abrir a porta que ao abrir tomei tomei um susto.
- O que você quer garoto? - perguntei totalmente sem graça já que estava só de cueca e nunca nos vimos nessa situação.
- Passei pra saber por que você não foi lá em casa? - perguntou Felipe sem desgrudar os olhos das minhas pernas que estavam um pouco inchadas devido os recentes exercícios.
- Nao vejo razões para ir la. Afinal o que tínhamos para conversar já conversamos. Ou não ? - disse inquieto pois ele não parava de me olhar.
- Seria só uma questão de gentileza. - rebateu Felipe.
- Gentileza??? Que porra de gentileza você quer seu merda? Que eu fique rastejando atrás de você igual uma cadela no cio? Não sou tuas nega nao filhão se manca.
Eu já estava puto, ele queria que eu ficasse correndo atrás dele e ele não parava de me olhar o que deixava ainda mais irritado.
- Vamos conversar melhor Dan. - disse Felipe me abraçando por trás.
Pude sentir o pau duro de Felipe contra a minha bunda e um frio subir pela espinha, a barba dele na minha nuca fez as minhas pernas bambearem. Por alguns segundos senti meu corpo seder aos apelos de Felipe, mas logo cai em mim. Caso ele quisesse algo comigo não seria me tratando como um pedaço de carne que ele iria conseguir. Me larguei dele num impulso.
- Que isso cara? Você acha que é assim que funciona? Você vem com papo de tempo, agora vem me agarrando segura sua onda!
- Desculpa foi por impulso. - disse ele desconcertado.
- Você resolveu o que quer da vida? Ou quer mais um tempo? Posso ficar a sua espera cara, sem pressa. - disse irônico.
- Não estou pronto. - falou Felipe.
- Não está pronto? Você tem quantos anos Felipe? 12?
- Ainda estou muito confuso com tudo que aconteceu, ainda penso na Emilly. - falou com um tom de naturalidade que me tirou do sério.
- Ah então é a vagabunda que ainda mexe com você? - subi ao quarto, peguei o anel e voltei a sala e disse - Então pega esse anel e some da minha vida! - falei atirando o anel na testa dele.
Toda aquela situação era muito desconfortável para mim, pela segunda vez ele optava por ela, enxugando as lágrimas ele saiu.
Não conseguia entender o que ele queria, depois de tudo que ela fez com ele, deixou ele na situação que deixou, não sou de jogar na cara as coisas que faço mas tudo que fiz ele deveria ao menos me respeitar. Pouco tempo depois Vitor chegou, super animadinho
- Que isso hein me recebendo só de cuequinha e pra relembrar os velhos tempos? - disse Vitor dando um tapa na minha bunda.
- Não ridículo, anda muito cheio de gracinha, Gabriel não ta dando conta não? - disse já descontraído.
O Vitor sempre conseguia me animar, desde sempre. Tinhamos muitas histórias juntos e intimidade pra certas brincadeiras. Contei tudo que havia acontecido e ele acabou se sentindo culpado, pois só voltei para casa mais cedo porque ele estava chegando.
Meus pais chegaram do tal almoço felizes, acredito que não sabiam o que tinha acontecido.
No jantar meu pai acabou nos convencendo a ficar mais uns dias, era tudo que eu não queria mas Vitor estava tão animado com o convite que eu fiquei. Como boa cidade do interior a tranquilidade reinava mesmo em épocas de festas em que muitas pessoas viajavam deixando a cidade ainda mais tranquila. O programa diário e sempre os mesmos, correr, ir a cachoeira e ficar na Internet de onde surgiram muitos amigos para ajudar a matar o tédio enquanto Vitor estava com o Gabriel.
Minha família é dessas famílias religiosas por épocas e como "bons cristãos" não poderiam faltar a missa da quarta-feira de cinzas, lá iria eu mais uma vez fazer cara de bom moço, mesmo não sendo a minha religião, sempre ia para agradar. Sabia também que Tio Marcelo e Felipe iriam, provavelmente Nice também para posar de família perfeita, era a minha chance de mostrar a Felipe que estava muito bem sem ele e provocar um pouco.
Na igreja não foi muito diferente do que imaginava, Felipe e sua família estava lá, meu pai seguiu sentido os bancos próximos a eles mas o segurei e sentamos perto porém nem tanto. Na saída falei com tio Marcelo e conversamos, ele como de costume muito simpático comentou que sentiu minha falta no almoço na casa dele. A conversa fluía bem até Felipe se aproximar, ele me cumprimentou com um aperto de mao e um olhar profundo o qual ignorei. Me despedi e segui pra casa com aquilo na cabeça, por qual razão ele fazia aquilo? Se não queria, pra quê provocar com um olhar daqueles? Por mais que eu quisesse provar a mim mesmo que ele nao fazia mais parte da minha vida, a lembrança daquele par de olhos numa combinação perfeita com aquele sintilante sorriso me desarmava de qualquer resistência a ele.
Com muita conversa com Vitor e alguns outros integrantes do fã clube do Felipe, me convenceram a ir a procura dele mais uma vez, fui resistente a ideia, pra mim era surreal a hipótese de me humilhar atrás de alguém que já deixara claro que não estava afim de nada. Nunca corri atrás de ninguém, acredito que cada um precisa ter amor próprio acima de qualquer coisa, mas a insistência foi tamanha que sedi. Na quinta-feira a noite tomei coragem e fui ate a casa dele.
A intenção era terminar tudo de vez, mas no fundo eu tinha uma esperança de quem sabe ainda enxergar uma luz no final do túnel.
No curto trajeto ate a casa dele, ensaiava mil coisas que poderiam ser ditas, boas e ruins, tinha que ter assunto. Já no portão dele minhas pernas tremiam, meu coração parecia querer pular do peito. Quem veio atender foi tio Marcelo que com belo sorriso de sempre me convidou a entrar, o que não deu tempo pois logo atrás dele veio Felipe. Sentindo o pesar do clima Marcelo nos deixou a sos.
- Podemos dar uma volta? Conversar um pouco? -disse a Felipe.
- Achei que não quisesse mais falar comigo. - disse Felipe com olhar de criança acuada.
- Também achei, mas tenho que ir embora domingo e não quero deixar nada pela metade.
O passeio ficou só nas palavras mesmo, sentamos na calçada e começamos a conversar. Mantínhamos uma distância que ao meu ver era como se fosse um abismo.
- Olha eu queria realmente me desculpar por toda as babaquices que fiz e te agradecer por tudo. Será uma dívida eterna que tenho com você. - Felipe falava de uma forma mecânica.
- Não tem dívida nenhuma. - disse sentindo um forte aperto no coração.
- Tenho sim, você me alertou sobre a Emilly, me salvando de um casamento que seria um desastre e mais salvou minha vida colocando em risco a sua. Isso ninguém vai tirar de mim nem me proibir. Te peço desculpas por não poder fazer mais por você, mas hoje o que sinto é amizade.
O tom mecânico que ele falava era algo assombroso, não era o Felipe que eu conhecia. A minha reação era a mais patética possível, só conseguia acenar com a cabeça que sim ou não, num impulso de coragem disse a ele
- Então não há chances de mais nada? - falei sentindo imenso medo da resposta.
- Não. - disse Felipe se levantado e entrando em casa.
E galera ta aí o penúltimo capítulo. A vida real sempre nos reserva muitas surpresas né? To aqui postanto enquanto espero o horário de embarcar no ônibus de volta pra casa, prometo postar um final legalzinho pra vocês e já me desculpo se a história deixou a desejar. Novamente agradeço as mensagens de vocês, os contatos e os papos de sempre. Beijos nos vemos em poucos dias ♥♥♥
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