No dia seguinte contava com a ajuda de Gabriel e Vitor a procura de Felipe, além do Tio Marcelo que ao me ver de manha abriu um lindo e incandescente sorriso. Nice veio atras e esboçou um breve sorriso também, esta eu não fazia muita questão nem de olhar quanto mais de ser simpático. Meu pai seguiu para seu trabalho e Nice ficou com a minha mãe, antes de sair não pude deixar de observar que bela dupla, Nice e minha mãe, não que eu odeie a minha mãe sei que tudo que fez foi querendo me "proteger" mas eu ainda nao conseguia a perdoar e nem ter qualquer resquício de sentimento por ela.
Outro fato que me gerou imensa curiosidade ao sair de casa foi a forma como Vitor e Gabriel se cumprimentaram, ouvi sinos tocando e olhares íntimos demais pro meu gosto. Como não sei me segurar perguntei logo
- Que amizade linda e rápida, ontem ao deixar os dois a sós imaginava sangue e eu indo a delegacia resgatar um dos dois, mas não é o que imaginava. - disse encarando os dois.
Era engraçado mas não sentia ciumes dos dois, via no rosto de Vítor um sorriso maroto que eu já conhecia muito bem.
- Conversamos muito ontem para nos livrar da má primeira impressão. - disse Vitor lançando um olhar para Gabriel.
- Huuuum conversa sei.. - disse provocando.
Saímos e fomos aos lugares mais óbvios como o Bosque, o cruzeiro, alguns lugares mais tenebrosos da cidade e nada de acharmos. Eu imaginava um lugar possivel de encontrar ele mas me negava a crer que ele tivesse chegado a esse ponto.
O local imaginado era uma comunidade de risco em uma cidade próxima chamada Guapimirim, o local era bem barra pesada então não poderíamos ir todos como uma comitiva. Essas áreas qualquer movimento suspeito é o suficiente para os "chefes" meterem bala sem perguntar quem é. Comentei sobre a minha suspeita com todos e o mesmo medo que eu sentia era replicado em cada um. Lembrei então de um guri que frequentava o clube na mesma época que eu e quase ninguém falava com ele por se tratar do filho de um traficante. A primeira coisa a fazer era lembrar o nome do guri e onde ele morava, isso se ainda morava por ali. Ninguem foi favorável a essa idéia mas não tínhamos outra saída, quem é carioca mesmo, nasce com a malandragem no sangue e não seria o fato de entrar em uma favela que iria me intimidar.
- Você não vai !! E se for nao ira sozinho! - afirmou Vitor.
- Gente não vamos a um passeio turístico. Não da para irmos todos. - ponderei.
- Se alguém tiver que ir quem vai sou eu. - Decretou Tio Marcelo.
- Então iremos nos dois! - concluí.
Me recordava que das poucas vezes que havia conversado com esse guri no clube ele disse que morava nos Jardins um condomínio bairro vizinho ao que morava. Mas como procurar uma pessoa que não via a mais de 5 anos e que nem o nome lembrava? Retornamos para casa e convidei Marcelo para almoçar almoçar conosco. As atitudes e olhares entre Gabriel e Vitor ainda me despertavam curiosidade, certos momentos eles se olhavam como se escondesse algo. Chegando em casa chamei os dois para o quarto para conversar
- Vocês dois vamos lá em cima precisamos conversar - disse num tom severo como se fosse a minha mãe para assutar os dois.
Já sabia que tinha rolado algo no momento que deixei os dois no bosque na tarde anterior, mas queria saber mais estava curioso.
- Podem me explicar o que está acontecendo com os dois? - disse ainda serio.
A cara de pavor dos dois era hilaria, eles se entre olhavam com cara de "E agora?"
- Ninguém vai falar nada? Estou esperando?
- Dan nós nos beijamos ontem. - disse Vitor entre os dentes e de cabeça baixa.
Minha vontade era de rir mas segurei e mantive a cena mais um pouco.
- Mais alguma coisa que eu deva saber Gabriel? - disse realmente segurando o riso.
- Eu acho que gostei. - disse Gabriel olhando para o chão.
Vitor olhou tão rápido para Gabriel que eu não sei como ele não deu um mal jeito no pescoço. Nesse instante não consegui segurar o riso e cai na gargalhada, os dois pareciam aqueles casais de guri de 12 anos do ensino fundamental quando são flagrados pelos pais.
- Mais que bonito né? Eu me ferrando com o mundo desabando na minha cabeça e os mocinhos se pegando.
- Desculpa mas aconteceu. - disse Vitor se justificando.
Sentei entre os dois na cama e abracei
- Que bom que no meio disso tudo ao menos vocês acharam algo de bom! To com vocês!!
- Estava com medo de você achar que te traímos - comentou Gabriel.
No fundo tinha sim um recentimento, mais por orgulho do que por qualquer outro motivo mas não iria deixar isso ir além. Descemos para almoçar e combinamos de ir ao clube a tarde para levantar algumas informações. Fomos apenas nos três, mas não tivemos sucesso. Dois dias depois cansado daquela situação resolvi levantar cedo e ir a tal comunidade. Lá chegando pude observar que se tratava de apenas mais uma área da periferia massificada pela mídia, haviam muitas casas humildes e uma pequena área de comércio, levei comigo uma foto do Felipe a qual não consiguia parar de olhar por todo o trajeto. Não tinha esperanças de encontra-lo de cara, mas conversando com um dos comerciantes e explicando a situação de vício de Felipe ele me sugeriu que fosse à uma região mais afastada com uma grande concentração de usurários.
A cena era degradante, todas aquelas pessoas entregues ao vício sem perspectiva de vida ou salvação. Andando em meio aqueles zumbis não foi difícil achar o Lipe, estava imundo de sujo jogado ao pé de uma parede com um olhar vago e distante. Minha vontade era de socar a cara dele, como pode chegar a esse ponto?
Corri até ele, dando um abraço que não foi correspondido
- Lipe, o que houve cara o que você ta fazendo aqui - disse o abraçando. Ele nem se quer reagiu ficou inerte enquanto eu me acabava de chorar. Ele cheirava mal, estava magro, abatido e com um olhar que nao era o mesmo que eu sempre via e tinha um brilho especial. Tentei levanta-lo e tirar daquele lugar mas ele não respondia a nada. Falava com ele e tentava um dialogo mas ele nao esboçava qualquer reação. Quando finalmente disse algo foi o que eu menos esperava ouvir
- Prefiro apodrecer aqui do que voltar para aquele inferno com você. - disse ele com uma voz enrolada.
Não tinha saida precisava ligar para o Tio Marcelo e pedir a ajuda dele. Este quando eu disse onde estava quase enfartou por eu ter ido só até lá mas não pensou muito e em pouco tempo chegou. A ele Felipe pouco teve resistência e seguiu para casa, voltei com eles e nenhuma palavra sequer foi trocada em todo percurso, em casa eu estava destroçado não saía da minha cabeça aquela imagem, aquelas pessoas naquela situação. Por tempos fiquei com aquilo tudo em mente, Vitor já não sabia mais o que fazer para me animar. A noite olhando meus emails vejo um lembrete da data da minha colação de grau que seria em poucos dias, em 4 para ser mais exato.
A noite fui a casa de Felipe, Nice me olhava como se quisesse algo mas não tive assunto com ela, diferente disso conversei bastante com Tio Marcelo. Entre os assuntos falamos sobre o que seria feito com Felipe, ele iria na manhã seguinte para uma clínica de reabilitação que fica num sitio em Teresopolis. As fotos que Tio marcelo mostrava aparentava ser um local bem agradável e que faria bem ao Lipe. Já me despedindo disse que voltaria ao Rio, pois precisava participar da minha cerimônia de colação de grau e não tinha previsão de retornar visto que também precisava arrumar um emprego.
- Você não quer ir la em cima ver ele? - disse Marcelo
Não tinha como recusar, subi eu e ele juntos e Nice veio atrás. Entrando no quarto dele pude ver algo muito confortante, Felipe dormia como um anjo. Não resisti e fui até ele, abaixando pude sentir seu cheiro. Instintivamente uma lágrima caiu de meus olhos, fiquei ali alguns minutos o observando como ele era lindo, apesar de alguns machucados pelo rosto. Levantei e sai, o silêncio era algo inevitável não havia o que falar. Quando já estava no portão Nice me abraçou forte, acho que por arrependimento e culpa. Me soltei dela de forma educada, não era um abraço sincero da minha parte então não fazia sentido.
Já em casa acertei com Vitor os detalhes da nossa volta ao Rio e fomos dormir.
Não tive mais coragem de ir visitar Felipe, voltei ao Rio, participei de todos aqueles cerimoniais de formatura, fui fazer meu registro profissional no concelho, enfim tentava seguir a vida normal, mas sem Felipe nada é normal.
Vitor me encheu a paciência dizendo que precisava visitar Felipe, mas eu não tinha coragem. Não sabia a reação dele, nem no que ele pensava e isso me gerava uma angústia sem fim.
Finalmente criei coragem de ir até a clínica o visitar. Fui sem avisar ninguém, tinha medo de avisar que ia e desistisse no caminho. O endereço era fácil de chegar, não era muito longe do centro de Teresopolis, a entrada era linda e muito bem cuidada. Entrei conversei com alguns médicos sobre o grau de recuperação dele e todos foram unânimes que ele era um dos mais esforçados em se recuperar e isso me animou muito.
Chegada a grande hora, a de encarar e saber que fim teríamos. Felipe estava em uma área de horta da qual os internos cuidavam, o seu sorriso já era o de sempre, radiante e lindo. Chegando perto dele deu um bom dia que mais pareceu um miado, minhas pernas tremiam de tal maneira que eu nem sei como me aguentei em pé. Ele virou e fez uma expressão de susto, afinal desde quando deu entrada lá eu ainda não havia o encontrado.
- O que você ta fazendo aqui? - disse rápido.
- Vim te visitar, mas se for uma hora ruim eu posso voltar outra hora.
Pronto, naquele momento já se passaram milhões de coisas na minha cabeça, fiz menção em sair quando ele disse.
- Não e comum visitas aqui segunda feira de manhã. Mas que bom você veio - disse isso levantado e me dando um abraço e falou - Obrigado por ter me resgatado.
O cheiro dele, a voz dele no meu ouvido, tudo aquilo era algo que me desmontava.
- Não tem o que agradecer, faria tudo de novo. - disse com os olhos rasos de lágrimas.
- Chegou a hora de conversar, e temos muito! - disse Felipe me olhando fundo nos olhos.
Senti um tremor por todo corpo, o que poderia me aguardar agora?
Bem pessoal primeiro desculpa pela demora mas nao queria escrever sem antes ir visitar ele, fui hoje e acho que as coisas estão caminhando para um fim. Mais uma vez obrigado e nao deixem de entrar em contado contos.meninodorio@gmail.com