Estava precisando de dinheiro. Não tinha emprego, comida, moradia e nem um familiar presente em minha vida.
Havia me mudado para Salvador há 4 semanas com uma proposta de emprego enganosa. Chegando na capital da Bahia, o coordenador do grupo que viajou recrutando as pessoas inscritas para ocupar essas vagas pelo Brasil, se mandou, deixando todos aqueles brasileiros ali sem saber para onde irem, inclusive eu.
O carnaval tinha acabado recentemente por lá, restando apenas as festas de lava prato, tira teima, chamem do que quiser. Dormindo nas últimas duas semanas em bancos na praça Castro Alves, notei que todas as noites religiosamente uma menina ia com seu namorado entre oito ou nove horas e ficavam namorando sentados no parapeito de frente para o mar.
Ele era um negro alto de musculatura bem definida, traços faciais marcantes como o seu olhar sereno e intenso, já ela era uma menina com cabelos loiros quase acinzentados, olhos com a cor daquele mar, pele branca, de estatura baixa, provavelmente com um metro e meio por aí.
Eu ficava os vendo e chegava a sentir dentro de mim o amor que eles sentiam um pelo outro. Ela procurava os braços dele ao mesmo tempo que repousava sua cabeça em seu peito, enquanto ele acariciava seus cabelos e fazia carinho em suas costas. A sensação era que bastava eles terem um ao outro para viver. Os beijos e olhares que avistava do banco pareciam como cenas de filmes românticos sem ensaio, sem erros de gravação e com perfeita interpretação, a qual não tinha por saber que aquele amor era verdadeiro.
Mais algumas semanas se passaram e eu sobrevivia catando todo tipo de lixo na praça e levando em pontos de coleta, além de doar sangue em troca de algum dinheiro. Eu vivia com o mínimo do mínimo, suficiente para comprar um prato feito de 3 reais por dia e pagar por um banho e lavar minha trouxinha de roupa a cada dois dias em uma pensão onde uma senhora muito simpática abriu uma exceção para mim.
Em uma certa noite esperava como em todas as outras pelo casal apaixonado, mas somente a menina apareceu. Ela chegou e se sentou no parapeito como sempre fazia. Fiquei ali parada a olhando me questionando se o rapaz iria chegar em alguns instantes, mas reparei que ela pôs suas mãos cobrindo o rosto e começou a chorar repentinamente. Aquilo chamou minha atenção, a menina estava se desfazendo em lagrimas, algo não parecia certo. Aproveitei que naquela noite tinha tomado banho e me pré-dispus a oferecer alguma ajuda. Com os únicos trocados que tinha no bolso da calça comprei um algodão doce com o vendedor e fui me aproximando de onde a menina tanto chorava. Me sentei um pouco atrás dela e ouvia, ou melhor, sentia a dor daquele choro. Me aproximei um pouco mais, agachando ao seu lado, oferecendo o algodão doce, afim de começar um diálogo.