O Mundo Vai Nos Ouvir? V

Um conto erótico de Irish
Categoria: Homossexual
Contém 1829 palavras
Data: 07/08/2015 18:11:51

Sentia os olhares surpresos do grupo todo sobre mim, e num relance, divisei a expressao de furia contida de Carlos a me encarar. Achei que ele faria uma cena deploravel em frente aos caras, porem para meu alivio ele pareceu se conter.

Biel cheirava à colonia desodorante e roupa limpa, seu rosto macio se comprimindo ao meu. Afastou-se, ainda emocionado, sem deixar de me olhar, e nesse momento Cleiton e Vagner se aproximaram para me cumprimentar, fazendo as esperadas perguntas sobre quando eu tinha voltado, se viera para ficar, se BH foi assim tao ruim... Me apresentaram os integrantes novos do Diversidade, todos jovens beirando os vinte anos. Nao perguntei sobre as lesbicas, embora tenha ficado com vontade.

Carlos exibia uma especie de sorriso doloroso, quase um ricto de odio, me observando. Fuzilou Biel com o olhar, sem que o garoto percebesse, ergueu-se e apertou minha mao de modo forte.

- Imaginei que nao o veria nunca mais _ disse, apertando meus dedos mais forte ainda, causando dor; olhei para sua mao e notei ali uma grossa aliança dourada; entao ele tinha se casado? Com quem?

- Agora vim para ficar, Carlos _ respondi, retirando a mao _ E espero que o grupo me receba outra vez.

- Mas e' claro! E' claro que sim! _ disse Biel, nao se contendo de alegria; cedeu a propria cadeira para mim, e embora eu recusasse, ele insistiu ate que aceitei _ Eu fico bem em pe'. Estavamos discutindo sobre um panfleto homofobico que andaram distribuindo no final de semana...

Ele estava tao bonitinho! Usava uma camiseta cinza de gola em V, jeans escuro e justo, e tenis. Nao parava de me olhar, encantado, e dava para ver que ele explodia de vontade de ficar sozinho comigo; sentado perto de mim, um garoto da idade dele, de cabelos louros platinados e oculos de armaçao roxa, nos olhava toda hora, fazendo cara feia.

Carlos retomou a discussao, contrariado, meio perdido a principio. Quando pegou o tal do panfleto outra vez, suas maos tremiam, creio que de raiva; ao me encarar seus olhos emitiram chispas, e a custo ele modulou a voz. Assim prosseguiu a reuniao.

O caso dos panfletos era uma mistura de bizarrice e má fe'. Uma organizaçao com vies integralista e ultracatolico andou distribuindo aqueles papeis na Praça da Republica, no sabado. Numa folha sobre fundo cinza, um texto delirante alertava sobre "A Conspiraçao Gay Contra a Familia", listando abaixo todas as nossas supostas "intençoes", nos acusando de destruir a sociedade em favor de nossas "praticas abominaveis", e "aliciaçao de menores". Em resumo, uma barbaridade escrita por algum homofobico esquizofrenico. O Diversidade planejava entrar com uma açao contra a organizaçao, alem de fazer uma manifestaçao na Praça, no sabado.

- A açao e' facil de mover, e usarei meus contatos junto ao Ministerio Publico para levar isso a esferas superiores _ dizia Carlos, e pelo seu tom compreendi que agora o lider do grupo era ele _ Quanto á manifestaçao, chamaremos a imprensa. Vamos fazer barulho, sim, senao nunca vao nos ouvir.

Houve uma pequena discussao sobre os depoimentos acerca da manifestaçao, que membros do grupo dariam nos jornais. Carlos nao queria deixar um tal de Michel, jornalista e membro do Diversidade, tomar a frente nessa questao.

- Eu falo com eles _ disse _ Sou advogado, bem articulado e mais velho. Darao mais importancia às minhas palavras.

- Conheço bem esse pessoal, Carlos. Escrevem tudo á maneira deles nos sites, e ainda acho que posso... _ começou Michel a argumentar, mas Carlos o interrompeu irado.

- E voce acha que vao levar a serio uma entrevista sua, nessa sua voz ridicula de pato? _ gritou _ Engrosse a voz, fale como homem, e ai sim vao te ouvir! Se falar assim na TV as pessoas vao rir de voce, da manifestaçao, do grupo inteiro!

Michel se calou, humilhado, e pude notar Cleiton e Vagner trocando um olhar de frustraçao, como se dissessem: a que ponto chegamos?. Sim, a coisa estava pior do que eu tinha deixado, e nao imaginava aonde aquilo iria parar. Deu para notar que o grupo estava insatisfeito, que nao havia democracia là dentro, so' Carlos ditando as ordens. Me peguei olhando para aquele painel de um metro de largura, na parede, a fotografia da fachada do Stonewall Inn em preto e branco, com a bandeira LGBT colorida se sobressaindo, pregada do lado de fora do iconico bar. Tanta luta, tanto cansaço para que? O poder, quando em maos erradas,causava danos terriveis. Carlos seria bem capaz de elaborar um panfleto como aquele dos homofobicos, num texto de "alerta" sobre a conspiraçao de lesbicas feministas, bissexuais e travestis contra os homens gays, numa tentativa de "manchar" o movimento perante a sociedade. Ah, ele seria capaz disso! Nao tive duvidas.

Ao final da reuniao, Cleiton citou meio por alto a intençao do Afro-Iris, um grupo LGBT formado por negros e pardos, de participar de nossas reunioes vez ou outra. Carlos foi contra.

- Nao acho que devemos misturar as... pautas _ disse _ Cada um na sua. Eles estao focados na luta dos negros, que jà tem todos os direitos garantidos, e deixam a questao gay em segundo lugar. Melhor nao. Deixem os negros pra là.

- Voce veja como fala _ replicou Vagner, indignado _ Nao se esqueça que minha filha e' negra.

Se referia à Clara, o bebe que ele e Cleiton adotaram ano passado. Felicitei-os muito por isso, na ocasiao. Agora, Carlos apenas o fitava com um sorrisinho cinico.

- Nao quis ofende-los, meus amigos _ disse e olhou o relogio _ Por hoje já chega. Voces ai, levem os cartazes e terminem em casa. Biel, voce volta comigo. Agora.

- Eu quero falar com o Paulo antes _ disse o garoto.

Por um momento achei que Carlos fosse investir aos socos contra nos, tamanho o odio que se estampava nos seus olhos. Ele jà nao era bombadinho como antes, estava com um corpo normal, o cabelo começando a ficar grisalho, como o meu, o terno impecavel; era um ano mais velho do que eu, um quase quarentao ainda muito gostoso. Esperou que os outros saissem, se aproximou de mim, quase tocando o rosto no meu, e disse entredentes:

- Vai se arrepender de ter voltado. Pedofilo!

- Para, Carlos! _ Biel puxou-o de perto de mim _ Voce nao manda mais em mim! Jà tenho dezoito anos.

- Vai, dà pra ele entao! _ exclamou Carlos com asco _ Nao era o que voce queria desde os treze anos? Sua vadia. Devia era ter te enchido de porrada naquela vez!

Biel ficou vermelho, fez que ia enfrenta-lo mas me olhou, com vergonha. Pegou-me pela mao e me tirou ali da sala; do lado de fora, o garoto de cabelos platinados o esperava. Assim que nos viu de maos dadas, ficou ainda mais branco, gaguejou algo que nao entendi e se afastou apressado. Biel me olhou como se pedisse desculpas.

- E' o Caio _ disse _ A gente estava ficando, agora ele te viu e... Bom, eu nunca escondi dele de quem eu gosto de verdade.

Achei melhor ficar em silencio. Caia a tarde, e a rua arborizada fazia uma sombra fresca e pontilhada de sol poente pelas calçadas. Biel falou em tomarmos um sorvete.

- Vamos na Sorveteria America e là poderemos tomar sorvete de graça _ disse, todo alegre outra vez _ Nao te contaram, nao e'? O Carlos se casou com o Rui. Ano passado. Por isso meu cunhado me deixa tomar sorvete de graça, quando eu quiser.

Essa mescla de adolescencia e infancia parecia presente nele, tornando-o atraente para mim, e agora sem qualquer culpa. Ele me olhava e sorria.

- Voce esta ainda mais bonito, Paulo _ falou baixinho _ Amo homens de cabelo grisalho, amo esse visual daddy. Voce so' melhorou com o tempo. Sabe, foi tao injusto o que Carlos fez, separando a gente... Apesar de que, sei que com a minha idade aquela vez seria impossivel qualquer relacionamento. Quando entrei para o Diversidade, Cleiton me disse que voce estava em BH, mas Carlos o proibiu de passar seu telefone para mim, alegando relaçoes cortadas. Voce viu, agora ele manda no grupo. O marido dele nada em dinheiro, coloca muita verba là dentro, entao tudo funciona do jeito que ele quer. Depois que Cleiton e Vagner adotaram Clara, ficaram tao sobrecarregados que passaram a liderança do Diversidade para o Carlos, mas jà era ele quem apitava lá fazia tempo. Expulsou as lesbicas, mudou as politicas do grupo, de modo que agora so' se aceitam homens gays brancos e de classe-media.

- E' terrivel, Biel _ falei, chocado por ouvir a confirmaçao daquilo que eu suspeitava _ E' uma politica eugenista, de segregaçao extrema. Um apartheid dentro do proprio movimento. Preconceito vindo de quem sofre preconceito. Como isso e' visto pelos demais grupos aqui na capital?

- Nos odeiam, claro. Afirmam que manchamos a imagem do movimento, ao que Carlos argumenta que se trata apenas de um grupo direcionado a um segmento da sigla, e que os outros, lesbicas, bissexuais, transgeneros, podem ter seus proprios grupos sem que briguem entre si. E' cinico da parte dele, pois ele nega que segrega, ainda que todos vejam.

Apesar de Biel ter "passe livre" na Sorveteria America, preferi pagar por nossos sorvetes, nao queria nada que viesse de Carlos e seu marido. Conversamos ainda sobre coisas que fizemos nesse tempo todo, Biel contando que se assumira aos quinze anos, mas que nao houve brigas com os pais, pareciam desconfiar.

- Nao sei como _ disse, encucado _ Eu nao dou pinta, dou?

"Nao muito", pensei, sorrindo. As vezes ele sacudia demais as maos, ou exibia uma alegria excessiva. Seu visual tambem poderia levantar uma certa suspeita, mas tinha voz grossa, corpo de um garoto de dezoito anos que frequentava a academia. Para mim ele era maravilhoso.

- Voce esta lindo _ afirmei com sinceridade, e ele sorriu corando um pouco.

A noite já estava caindo vagarosa quando saimos da sorveteria. Alguns quarteiroes depois, entramos em silencio numa pracinha mal iluminada, e num espaço escuro entre duas arvores ele me encostou num tronco nodoso e me beijou sem dizer nada, me abraçando forte. A mesma boca macia, farta, e agora um corpo maior, mais forte nos meus braços. Beijei-o sem culpa, com desejo.

- Ainda te amo _ ele sussurrou no meu ouvido, beijando meu pescoço.

"O que a gente vai fazer agora", me perguntei, apertando-o pela cintura numa afliçao estranha.

- Me leva para tua casa essa noite, Paulo _ ele pediu, acariciando meu mamilo por cima da camisa, todo entorpecido de desejo _ Por favor.

Sem responder, acariciei seu rosto, vendo-o muito mal na penumbra. Já estava quase que completamente escuro, e os sons da rua e da calçada chegavam ate nos, mas pareciam distantes, em outro planeta. Dentro de mim, a sombra de Mordor finalmente estava se afastando, vencida pelo calor do corpo do Biel encostado ao meu. Era bom, e agora era permitido.

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Valeu! Abraços em todos :)

aline.lopez844@gmail.com

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Comentários

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O Carlos eh o Ó! Ele eh Tucano? Rsrsrs Ele vai pra marcha contra a Dilma neh hehe Assim... Estou decepcionadissimo com o governo, mas naum sou Tucano.

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O negócio agora vai esquentar! Gostando bastante da sua forma de escrever e do seu conteúdo com relação aos direitos das minorias. Muito legal! Abraços

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todos os links que achei antes no google foram removidos flor, vou ver agora.

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Olá! *Ru/Ruanito, valeu boy! * MAD MAX obrigada por ler :) * Danny Fioranzza, cara, tenta baixar o MP3 nesse site aqui www.minhateca.com.br.Joga no google o site e o nome da musica. Sao varios os links, escolha a vontdade. Ah, precisa fazer login pra baixar tá? É facinho: um nick e teu email e pronto. Pode tambem tentar baixar no Skull, outro site de downloads de mp3. É muito simples ;) Valeu!!!!

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