IMAGEM DE INSPIRAÇÃO: http://img07.deviantart.net/3125/i/rouge_carries_shadow_by_iloveknucklesshadow.jpg
Shadow chegou a cidade da praia em sua moto no amanhecer, desceu as ruelas onde o ronco de sua maquina reverberavam e retornavam aos seus ouvidos como uma melodia única e que apenas ele entendia em seu mundo, pois sobre sua máquina não existe mais nada além dele e do infinito. O ouriço negro e vermelho subiu na direção da praça alta, feita sobre um penhasco onde as ondas batiam muitos metros abaixo.
Puxou o pé de descanso, retirou o capacete e o pendurou ao guidão, depois aproximou-se da beira onde havia um banco e apoiou o seu pé sobre ele, observou o mar por algum tempo até ouvir ao longe o som do motor da aeronave de Tails vindo ao seu encontro. Olhando ao relógio notou que a raposa havia se atrasado consideravelmente, porém ele também se atrasara, mas por chegar antes sentiu-se na vantagem de sobrepor o pequeno.
Assim que os motores do tornado desligaram e a raposa com os óculos na cabeça, colete com o logo das duas caldas nas costas e a maleta de ferramentas desceu do veiculo, o ouriço logo veio confrontá-lo.
- Porque você se atrasou tanto heim? – Shadow mandará no dia anterior uma mensagem a raposa dizendo que viria a cidade e que queria que ele olhasse sua moto.
- Desculpe, é que minha oficina estava uma bagunça, eu tive que dar um jeito por lá e acabei meio que esquecendo o seu aviso no meio das coisas, eu só achei quando já tinha passado da hora.
- Que seja – disse Shadow numa falsa raiva – então ande logo com isso garoto, pois eu não tenho o dia todo – era outra mentira, pois Shadow viera aquela cidade exatamente por não ter nada melhor para fazer na metrópole onde vivia, só num apartamento escuro dum prédio baixo, próximo a uma rua pouco movimentada e mal iluminada.
Tails rapidamente começou a desempenhar sua tarefa mexendo no motor da maquina e com a ajuda de Shadow, virou a moto ao contrário, para mais facilmente pode manipular o motor. Mesmo sendo sua maquina, Shadow não entendia muito de mecânica, apenas o suficiente para não fazer a moto explodir. Durante o trabalho, Tails observou Shadow se afastando e voltando sua atenção ao mar, em certo momento refletiu no que ocorrera no dia anterior com Cream e que não havia contado a ninguém, por não saber em quem confiar.
Sonic e Knukles com certeza o culpariam agressivamente e correriam para dizer a mãe de Cream o que destruiria sua vida naquela cidade, o forçando a mudar-se para algum outro lugar e viver isolado com sua maquinas, se tornando assim um velho chato e resmungão. Bem, Tails pensara em tudo isso de forma extremamente negativa, como deveria de ser após pesquisar e descobrir que fizera algo muito mais errado do que desconfiava que fosse.
Mas talvez, pensou ele naquele momento, Shadow não o dedura-se e ainda pudesse o aconselhar melhor que Sonic e Knukles, uma vez que ele tinha, aos poucos conhecimento de Tails, uma relação com Rouge. Talvez Shadow saberia como agir com as mulheres, coisa que Sonic tinha pavor e Knukles jamais demonstrará qualquer tipo de ligação com o assunto, mesmo morando numa ilha flutuante a sós com Tikal.
- Shadow – disse ele após ter já terminado de desmontar metade do motor.
- O que foi? Algum problema na moto? – o ouriço veio direto observar a maquina.
- Não é isso, eu queria um conselho seu – Tails falou guardando a ferramenta que usará e pegando agora a lata de óleo para lubrificar as peças que separará para tal.
- Peça ao Sonic ou Knukles, eu não sou seu pai – Shadow desconversou diretamente.
- Por isso mesmo – Tails se explicou – é que eles não podem saber disso, e você deve ter mais experiência com o assunto.
- A sim... – Shadow tirou os óculos de dentro do capacete e os pôs – então desembucha moleque.
- Ei, não me trate como criança! – Tails exclamou enquanto fechava o motor.
- Fala logo de uma vez – Shadow enraiveceu-se, pelo menos aparentemente, Tails até contou-lhe o que ocorreu, mas nesse momento é melhor pularmos a algo que estava ocorrendo em outro lugar.
Sonic adentrara a oficina de Tails a sua procura, pois assim como Shadow, o dia estava chato e ele já fizera tudo que podia para matar o tempo, correu as colinas e voltara umas 3 vezes e a casa da raposa ficava na parte mais próxima de seu ponto de chegada. Ao adentrar ele se deparou com o lugar completamente revirado, mas não que alguém tivesse invadido e ele sabia disso, era apenas a bagunça convencional, porem o cheiro estava forte no que seria o quarto, com penas por todo o lado, a cama desarrumada, restos de comida sobre uma toalha de piquenique e tantas outras coisas que esta descrição não teria fim se Sonic não fosse tão apressado.
Rapidamente ele achou algo com o que perder tempo na geladeira, e incrementou com algo para perder tempo na frente da TV, uma vez que o sinal das antenas alteradas pelo Tails era bem melhor que a sua. Algum tempo depois Tails chegou e em dois passos da raposa, Sonic já deixara a poltrona do outro lado da casa e parara a sua frente com uma expressão de raiva na face – caramba Tails! como você consegue viver aqui? Eu mal consegui achar a TV nessa bagunça, além daquela sua cama que esta fedendo a... – Sonic parou de repente o que dizia ao notar que Tails escondia parte do rosto, a raposa correu para o quarto na esperança do amigo não ter notado-o, mas Sonic rapidamente o alcançou e agarrou sua cara vendo o que ele escondia – quem fez isso com você?
- Ninguém, foi um acidente – o olho direito de Tails quase fora esmagado num soco, e o lado direito do seu corpo, como Sonic notara em seguida, havia uma mancha de hematoma do tamanho de um pé. Tails desvencilhou-se do amigo e correu a arrancar as cobertas da cama e fazer com a toalha e todos os vestígios um saco a ser jogado fora, mas como ele sabia, a desculpa não colaria a Sonic tão facilmente. Ainda mais tratando-se dum soco tão forte, seguido dum chute quase assassino que recebera de Shadow ao contar-lhe o que ocorrera, e se de Shadow que não tem ligação nenhuma com ele acabou recebendo isso, o que Sonic e principalmente Knukles fariam?
- Que tipo de acidente? – Sonic notou que Tails desconversara e não queria dizer o que houve, o ouriço azul era orgulhoso e também respeitava o orgulho alheio e logo pensou que se Tails não o contara quem o atacou, era porque queria cuidar disso sozinho, mas como amigo não podia permitir. Mas ele estava errado:
Tails não tinha a menor vontade de revidar ou algo do tipo, pois quando conversará com Shadow era porque achava que ele e Rouge tinham algo, já que na maioria das vezes que via a mulher morcego ela estava com ele, mas estava errado, não completamente, mas estava e não apenas nisso. Pois assim que o disse o que aconteceu Shadow não pensou duas vezes em atacar a raposa completamente tomado de raiva. “Eu devia lhe fazer muito mais do que isso, seu moleque!...” foram as palavras de Shadow que reverberaram na mente de Tails caindo na praça, contorcendo-se de dor e cuspindo sangue.
Ao se livrar do lixo e jogar os panos na maquina de lavar, Tails viu-se tendo de lhe dar com Sonic enquanto que, não muito longe dali, num quiosque a beira mar, Shadow sorvia um copo de bebida garganta abaixo, olhando o mar por entre os óculos, admirando o por do sol sobre a sua moto, que agora funcionava como nova.
“... Você se enganou em pensar que eu não contaria a mãe dela!” - Ele pensou no que disse a Tails, mas mais do que isso ele foi levado a pensar no motivo que levou a raposa a confiar nele para fazer tal revelação ao invés dos seus “amigos” – aquele moleque achava mesmo que eu e a Rouge tínhamos algo... Que idiota pensaria nisso?
Com o fim da garrafa Shadow refletiu nas diversas vezes que fora chamado pela mulher morcego, sempre o atraindo com charme para algo que ele só descobriria no dia seguinte: ao ter de se livrar da policia em seu encalço por causa do roubo cometido por ela enquanto ele era o bode expiatório. Mais do que isso, ele pensou em algo que revelaria o quão ingênuo estava sendo não só consigo, mas Sonic, Knukles, Jet e todos os outros. Naquele momento o fundo do copo vazio mostrou-lhe que agora Tails era, em um termo indireto, muito mais adulto que todos aqueles que o tratavam como um moleque, e que talvez fosse ele mesmo, quem deveria estar aconselhando os outros ao invés de vir pedir ajuda.
- Aquele pivete – Shadow disse a si mesmo reenchendo o copo com bebida – como ele ousa vir a mim e jogar na minha cara que eu sou um Mané? – Tails não fizera isto, mas na mente alcoolizada de Shadow fazia todo o sentido – talvez ele... Nã! – zombou – aquele idiota não saberia como fazer isso – Shadow demorou um pouco a notar que estava conversando com o seu próprio reflexo na bebida.
- Você não está me dizendo para ir pedir dicas de relacionamento a um garoto? – perguntou ao seu reflexo, e pareceu receber uma resposta inegável, já que voltou a sentar-se e virou mais um gole – você tem razão... – assumiu – eu estou mesmo precisando de ajuda.
Já era noite quando Tails finalmente parou, aos seus olhos metade de sua bagunça fora arrumado, mas se Sonic, ao invés de ficar falando dos problemas que encontrara em sua corrida matinal como carros na rua, buracos no deserto e o cocô de passarinho que demorou muito tempo para limpar, tivesse ajudado-o, talvez estaria tudo arrumado agora. Roupa de cama limpa, um certo espaço e uma boa xícara de chá feito no bule que encontrará era tudo que a raposa precisava para descansar daquele dia cheio, e era o que iria fazer até que a porta de sua oficina fora aberta e os sinos badalaram.
- Está fechado – disse ele de seu quarto esperando que o possível freguês fosse embora, mas a voz de Shadow do outro lado quase o fez soltar o chá no chão.
- Idaí? – falou o ouriço negro que não era tão veloz quanto Sonic, mas sabia parecer ser muito bem, e ser tão inconveniente quanto, ou talvez mais – espero não estar atrapalhando.
- É... Shadow o que veio fazer aqui? – Tails o questionou, quis não demonstrar medo, mas o soco e o chute tinham sido tão fortes que mesmo não tendo medo algum, o seu corpo dizia o contrário.
- Eu não vim me desculpar caso pense isso, e também não vim te bater – Shadow falou como se isso fosse suficiente para “animar” Tails. Não era.
- Então? – Tails perguntou voltando-se a uma cadeira, já que o ouriço negro escolheu usar sua cama como acento e suas pantufas como assoalho para limpar as solas dos sapatos.
- Enfim, vamos direto ao ponto okay? – Shadow nunca fora daqueles que gosta de conversas longas, o que para Tails estava de bom tamanho.
- Tá – Tails disse, sabendo que mesmo que disse qualquer outra coisa não seria ouvido, como não fora desde o inicio da conversa, apenas bebeu o chá e se pôs como espectador do que seria, segundo ele, um monólogo.
- É o seguinte, você achou que eu e a Rouge tínhamos algo e para falar a verdade eu também sempre pensei que sim – Enquanto falava o ouriço se relaxava na cama da raposa, pondo os pés ainda sujos de terra e cruzando os braços atrás da cabeça; se reconfortando ao máximo como se fosse a casa dele – mas eu realmente não entendo as mulheres, elas vêm a nós, nos dominam com sua sensualidade, nos fazem de gato e sapato, e depois nos jogam fora num canto qualquer chupando o dedo. Está me entendendo?
- Sim – Tails não entendeu quase nada, apenas disse o que achava que Shadow queria ouvir e acertou.
- Olha só moleque, eu não sei como você conseguiu, e não estou nem aí para os detalhes, eu só quero... – Shadow parou, como se segura-se um comentário adulto a frente de uma criança, mas logo ao olhar para a raposa, o que confirma ainda mais sua idéia de que estava mesmo falando com uma criança pela feição jovem de Tails ele se viu em duvida se prosseguia ou não.
- Você só quer? – Tails, no inicio não ligava para nada, mas de certa forma conseguiu notar uma enorme insegurança em Shadow, demorou um pouco, pois o jeito de Shadow encarar as coisas é muito diferente dos de seus colegas comuns.
- Bem, está sendo um pouco difícil falar com um moleque sobre isso – Shadow falou a verdade, não era o tipo de pessoa que perde tempo procurando meios fáceis de fazer as coisas.
- Confie em mim, o que você falar aqui, fica aqui – Tails novamente apenas disse o que achava que a sua visita inoportuna queria ouvir e novamente acertou. Shadow ficou de pé sobre a cama e disse.
- Eu quero ela cara! Como você fez com a Cream, eu só quero saber o que tenho de fazer para chegar lá – gesticulando e movendo-se sobre a cama, Tails só conseguiu prestar atenção nas manchas no lençol, deixadas pelos sapatos do ouriço e a bagunça que ele estava fazendo, a mesma que a raposa levou horas para arrumar.
- Olha cara – Tails enfim falou deixando a xícara de chá, já vazia, de lado e encarando-o – você por algum acaso já falou com ela o que quer?
Shadow sentou-se na beira da cama e ia socar Tails de novo, mas se segurou – é lógico, uma vez eu a peguei pelos braços – e enquanto falava ele fazia o mesmo com Tails – puxei ela para perto de mim e falei na cara dela.
Tails desvencilhou-se e se afastou, com raiva na voz e na face logo falou o obvio a Shadow – mas é claro que não ia dar certo, o que você esperava? Que ela caísse aos seus pés? – Tails falava por impulso, estava pouco ligando se ia ou não ajudar o Shadow com o que ia dizer, apenas queria ele fora dali e resolveu usar as porcarias que passam na TV como exemplo – você já assistiu TV? Em algum momento você vê isso dando certo? É claro que não! Você tem que ir com carinho, devagar, conquistando-a com jantar, flores, bebidas, músicas e etc. A força não resolve tudo!
A lógica pegou Shadow de surpresa, o ouriço se viu confrontado com o obvio e contra isso não tinha como revidar, a não ser com a negatividade – e se isso não funcionar?
- Olha cara, eu não sei como ela é, mas sei como você é, então se não der certo segue em frente. O Sonic não se importa com isso e vive bem assim – Tails era movido pelo sono a esse momento.
- É você tem razão – com essas palavras Shadow começou seu caminho para a saída, mas antes de deixar Tails em paz ele se virou e o chamou – Tails!
- Sim? – a raposa olhou-o e se deparou com um sorriso.
- Não deixe ninguém te tratar mais como criança okay? – Shadow disse.
- Se Vanilla não me matar depois de você contar a ela o que aconteceu, eu vou tentar fazer isso – ele respondeu.
- A, esqueça o que eu disse – Shadow se virou e seguiu seu caminho pondo os óculos – eu não falei nada com ela.
A surpresa da ultima frase retirou todo o medo de Tails, mas com isto veio também algumas questões: porque Shadow não contara nada a mãe da Cream? E porque buscara logo ele para essa questão?... Talvez mais do que um rebelde, Shadow fosse um amigo, mas a realidade é sempre menos glamorosa do que se espera, pois ele simplesmente esqueceu-se de contatar a coelha e agora tinha coisas mais importantes a fazer.
[2]
A estrada de volta a metrópole era longa, Shadow não pensava que voltaria aquele fim de mundo tão cedo, mas também não imaginava o que ia ter de encarar numa simples visita. Sua moto estava como nova e o ronco era suave, o vento passando pelo capacete, as luzes noturnas ao longe, as estrelas no céu que não eram visíveis da cidade, tudo parecia estar caçoando dele e pelo que passara. Shadow é um motoqueiro, e como tal não se importava muito se ia chegar cedo ou tarde ao destino, apenas queria curtir a viagem, porém aquela poderia ser uma viagem com um destino um pouco imprevisível demais para ele.
Ao chegar nas ruas movimentadas daquela metrópole que nunca dorme, ele logo se enfiou por ruelas onde o movimento é menor que nas avenidas e costurando os diversos trajetos, fez um caminho demorado até o seu bairro, passou num mercadinho onde fez umas compras e logo foi-se.
Chegando ao seu prédio ele pode ver o portão da garagem aberto, pronto a recebê-lo e a sua maquina, desceu ao subsolo, desligou o motor, travou o guidão e puxou o pé de descanso. Trazia consigo uma sacola com vários objetos que depositou sobre a mesa ao adentrar o apartamento, no mercadinho ele comprara o que necessitaria, tão logo fosse abordado pela mulher morcego. O que ele sabia que poderia acontecer nos dias seguintes, uma vez que ela parecia ter olhos em toda a cidade e rapidamente saberia de seu retorno.
Pensado e acontecido, em dois dias, em uma noite quente, Shadow terminara de arrumar a mesa para o jantar quando escutara sons vindos de sua janela e logo diferiu a silhueta de Rouge entrando por entre as cortinas.
- Velas, flores, vinho... Hum.. Esta esperando alguém? – Rouge disse com a suavidade gótica de costume.
- É – Shadow respondeu-a e logo a ofereceu uma taça – e ela acaba de chegar.
Rouge estranhou, mas logo seus olhos de cílios longos o fitaram com curiosidade, ela pegou a taça e o viu sorver o liquido até a metade do recipiente – não tente me ludibriar ouriço... Eu tenho observado você e desde que voltou tem preparado esse jantar para dois todas as noites – como uma dama ela provou a bebida, era um tinto adocicado bem ao seu gosto, logo olhou-o esperando que também se servi-se e Shadow o fez, bebendo direto da garrafa como se fosse uma bebida qualquer, o que para os apreciadores de vinho seria um ultraje.
- Você aparece quando quer, some quando deseja... O que quer que eu faça? Adivinhe o futuro? – ele puxou uma das cadeiras para ficar de frente a ela, mas mesmo tentando ser menos rude como Tails o dissera, Shadow não conseguia tirar da cabeça as inúmeras vezes que foi usado por aquela mulher, muitas das quais demorou meses para se livrar e que, para piorar o seu estado de raiva, ele apenas recebera como pagamento algum tipo de futilidade dispensável.
- Depois de como me tratou – ela se referia ao ultimo encontro que tiveram, naquele mesmo espaço, um pouco menos arrumado.
- Ah Rouge! – Shadow levantou-se pondo a garrafa e a pouca paciência de lado – eu só quero uma coisa de você.
- A é... E o que seria? – Rouge respondeu sombria como sempre, mas deixando claro a Shadow, pelo jeito como se afastou que sairia dali a qualquer momento se ele se aproximasse mais.
Shadow voltou ate a outra cadeira, a puxou, e engolindo tudo o que queria jogar na cara dela e respondeu; de uma forma nova aquela voz sempre usada para palavreados largados e simples – um jantar.
Rouge não disfarçou a surpresa, aquilo com certeza era uma armadilha, mas como uma ladra escorregadia ela sabia lhe dar com todos os tipos de problemas; ainda mais se pudesse usar tal truque para se divertir com a cara de quem estava tentando aplicá-lo. Ela terminou a taça de vinho e sentou-se a cadeira deixando que Shadow a acomodasse, isso que ele fez da forma dos muitos filmes que assistiu durante esses últimos dois dias.
Sobre o jantar que se sucedeu não ocorreu muito, Shadow não era lá um cozinheiro aplicado, para não dizer que comprara tudo pronto. Macarrão com molho a bolonhesa, acompanhado do mesmo vinho tinto adocicado e de sobremesa uma fatia generosa de torta vermelha, de morangos e chantili para o deleite de Rouge. A conversa por sua vez foi interessante, onde Shadow relatou a rápida visita que fizera a raposa.
- Então você o socou... Acha que ele aprendeu a lição? – Ela o questionou quebrando o silêncio.
Shadow já não suportava mais aquilo e se levantou – sei lá... Eu acho que eu é que aprendi algo, mas é você quem tem de dizer – com isso ele deixou a sala levando os pratos à cozinha em estilo americana que permeava um dos cantos do apartamento.
- Como assim? – Rouge permaneceu sentada até ver Shadow voltando escondendo algo às costas.
- Rouge... – novamente aquele tom estranho que não era nada comum voltou à voz de Shadow quando o ouriço ofereceu a mulher morcego um buquê de orquídeas e um pacote em forma de caveira com bombos, daqueles recheados de bebida. Restou apenas a Rouge levantar-se claramente espantada com aquela ação, ela pegou os presentes o olhando para ambos de forma indiferente não conteve a risada debochada.
- Mas que coisa idiota Shadow – ela disse em meio ao riso – eu esperaria qualquer coisa de você, mas isso! É tão... Tão... Infantil que até parece que somos crianças num encontro.
O deboche, a risada, a cara desleixada com a que Rouge o olhava só fizeram Shadow trazer a si toda a soma de vezes que ela se aproveitou dele e de sua ingenuidade. Shadow deu-lhe às costas e foi-se para perto da porta onde pegou as chaves da moto de cima duma escrivaninha, os óculos e o capacete.
- Ei Don Juan, aonde vai? – Rouge o perguntou não esperando ver a raiva com a qual ele a olhou enquanto abria a porta.
- Isso importa?... Eu desisto! – e com isso saiu batendo a porta atrás de si.
- Ei! Você não está pensando em me deixar aqui! – ela gritou a ele, mas não teve resposta, largou os “presentes” sobre a mesa e voltou-se a varanda – ele não vai... – ao menos esperar pode vê-lo deixando o prédio em sua moto e ganhando os becos soturnos da metrópole – maldito! Você não pode me tratar assim! – ela logo saiu ao seu encalço voando na noite, mas não era tão veloz quanto o motor recém-regulado da moto de Shadow.
Shadow dirige e difere em seu caminho a fauna urbana repleta de bêbados, prostitutas, ladros, mendigos, sociopatas, pichadores, traficantes, policiais corruptos, cães, gatos, ratos, insetos e todo tipo de lixo vivo que permeia os becos e vielas daquele bairro. Parou, com certa desconfiança a frente de um museu fechado, onde pode prender sua moto e onde sabia que as câmeras de muitos edifícios seriam de alguma serventia. Atravessou a rua e adentrou num boteco onde tratou de pegar algo para beber e começou a socializar com os “bichos” da região.
Dentre os baderneiros de sempre, Shadow discerniu numa das pilastras do estabelecimento uma pequena raposa fumando um cigarro, com trajes que deixavam bem claro a quê ela estava ali. Tomado com a certeza de que naquela noite ele não dormiria só, logo se aproximou, empurrando um otário qualquer que estava a enchendo com cantadas esfarrapadas e pedidos de desconto pelo “serviço”.
- E aí? Veio aqui para apreciar a vista, ou está em busca de algo mais? – ele a questionou, não precisava conversar com ela para ter o que queria e logo ela deixaria claro.
- E você? Veio aqui conversar ou “tratar de negócios”, hã... Bonitão – ela falou acariciando o queixo dele.
- Tudo depende de você – e a ofereceu um gole de sua bebida, que ela aceitou de imediata. Os dois deixaram o bar e caminharam para a esquina onde havia umas paredes pichadas, e ali eles já começaram a se roçar quando, para susto de ambos um vulto pousou pesadamente próximo a eles. Mas assim que a prostituta viu as feições de Rouge, logo a tratou como uma rival.
- Nem vem! Esse cliente já é meu – diante da reação de prostituta e da cara de raiva e espanto de Rouge, Shadow não segurou a risada.
- É mesmo! – ele notou – as suas roupas – falou a Rouge – parecem mesmo as de uma prostituta.
- O QUE? – Rouge ergueu o punho de raiva – ESTÁ ME CHAMANDO DE PUTA!
Antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, Shadow apenas sentiu o chão se afastar de seus pés, e para o seu desespero, ao abrir os olhos pode ver a prostituta metros abaixo gesticulando e falando.
- ROUGE! – Shadow estremece tentando se segurar – me põe no chão! Por favor! Não faz isso comigo não! Rouge – ele gritava desesperado enquanto alcançava alturas vertiginosas.
Quando finalmente sentiu algum chão sobre seus pés o desespero deveria diminuir, mas apenas aumentou ao ver que estava no parapeito do prédio mais alto, e não podia descer ao telhado do prédio, pois Rouge esquadrinhava todo o espaço onde ele poderia saltar.
- Então eu pareço uma puta é? – ela disse se apoiando sobre os pés de Shadow e com isso o empurrando ao abismo.
- NÃO! – ele gritava de frente a queda – eu não quis dizer aquilo! Me desculpe, por favor Rouge... Me deixa descer daqui vai.
- Você pode descer o momento que quiser, mas não para esse lado – ela falou serena e sarcástica.
- O que você quer de mim? – Shadow fez a pergunta chave.
- Sofrimento – Rouge respondeu deliciando-se com o terror dele.
- ROUGE! – Ele já não sabia o que fazer, estava prestes a cair para o que seria a sua morte e seria da forma mais inútil que poderia imaginar – eu não aguentava mais, só isso.. Rouge entenda, por favor.
- Não aguentava mais o que Shadow? Seja claro comigo! – Ela soltou os pés de Shadow o deixando com menos equilíbrio ainda, o fazendo surtar.
- Você se fazendo para mim, e depois me deixando literalmente na mão! – Shadow foi o mais direto ao ponto que pode. E claramente isso não ajudou em nada. No instante seguinte ele estava despencando prédio abaixo, tendo tempo apenas para fechar os olhos esperando pela dor, até ser segurado novamente e levado para cima. Ao abrir os olhos pode ver os prédios passarem a pouquíssimos metros, com suas janelas de vidro que davam a impressão de estarem mais perto de que realmente estavam; olhou abaixo e viu os carros estacionados, os fios de alta tensão, as ruas passando em curvas retas e rapidamente se agarrou as pernas de Rouge o mais forte que pode suplicando – Por favor, não me deixe cair.
- Então se segure bem, pois eu não vou me culpar se você escorregar – ela falou, mantendo o mesmo tom sarcástico e seco enquanto plainavam lentamente em direção ao solo circundando o prédio. Quando chegaram ao chão Rouge não segurou risada ao ver Shadow beijando a calçada, enquanto secava as lágrimas e o suor da face.
Rouge se sentou de lado na garupa da moto de Shadow e esperou que ele se recomponha do susto; o ouriço por sua vez balançou a cabeça e logo volou ao seu veiculo, louco para voltar ao seu apartamento e terminar aquele dia maluco de vez – eu vou embora daqui! Chega de aventuras por hoje!
- Aé é? E vai me deixar nesse buraco? – Rouge o encarou enquanto o ouriço destravava a moto e a preparava para partir. Shadow olhou-a tomado de raiva pelo que ela acabara de fazer, tratando-o como um pedaço de lixo, mas depois de ver a movimentação em volta e de respirar fundo, foi tomado por um sorriso tão sarcástico quanto o usado por ela.
- Você não pode voar? – Ele perguntou.
- Sim, mas sua moto é mais rápida, além de que eu deixei minhas coisas no seu apartamento – ela respondeu.
Ele girou o acelerador clareando a fachada do museu; onde drogados usavam seus produtos, os mesmos que logo se levantaram enraivecidos com o barulho e a luz – então sente e... Se segure bem, pois eu não vou me culpar se você escorregar – fazendo das palavras dela as suas Shadow teve a sensação, mesmo que superficial de estar sendo mais uma vez manipulado, porém não se importou, apenas acelerou a maquina deixando os arruaceiros que já os cercavam como zumbis para trás.
A rua passava veloz por baixo da borracha de seus pneus e o som rouco do motor, nunca fora tão reconfortante quanto saber que aquele dia estava para acabar. Talvez um pouco mais, pois ter os braços de Roube apertando sua cintura e as curvas do corpo dela acomodando-se em suas costas era de fato algo a ser acrescentando.
Nenhuma palavra, ambos ficaram mudos durante toda a viaje de volta até que a porta do apartamento fosse fechada, quando Rouge veio a encarar-lhe novamente – então, quer dizer que você ficou cansado de ficar “na mão” toda vez que eu lhe faço de bode expiatório... Mas você se esqueceu, meu caro, que eu pago a você para distrair os guardas.
- Me paga com besteiras, coisas que eu nunca te pedi, valores que eu não precisava – Shadow foi frio e direto.
- A é? Pois então me fale o quanto eu te devo – Rouge pôs as cartas na mesa.
- Não é o quanto, é o que – Shadow aproximou-se – só há uma coisa que eu quero para pagar tudo pelo que passei por sua causa, contando com a tentativa de assassinato de hoje.
- O que? – ela o perguntou, cheia daquele papo todo, daquela noite e contando os segundos para sair dali, mas não contava com as mãos dele a agarrando como da vez que conversaram antes dele viajar as presas para a tal visita ao mecânico no litoral.
- Você – e rudemente Shadow roubou-lhe um beijo. Rouge tentou afastá-lo e não precisou de muito para tal, pois foi ele quem a soltou e se afastou em direção ao banheiro – “eu não entendo“ – ele pensou – “ela tentou me matar e mesmo assim eu não consigo ter raiva dela... O que a de errado comigo em?” – tudo enquanto mandava os litros de bebida que ingeriu nesses dias por água abaixo.
Rouge observou então a janela, poderia sim deixar o apartamento naquela hora e de costume, era o que faria, mas algo chamou a sua atenção. As tais coisas que ela usou como desculpa para que ele a trouxesse de volta estava ali, sobre a mesa, um buque de orquídeas escuras e a caixa dos bombons que logo abriu e provou enquanto cheirava as flores – ele se empenhou mesmo nisso – ela falou a si mesma em voz baixa, seus olhos correram o apartamento e notaram enfim que no chão existia uma espécie de caminho com pétalas negras que ela seguiu até o quarto onde deparou-se com uma cama simples, mas coberta de pétalas, com velas que claramente foram acendidas mais de uma vez.
Numa cadeira ao canto repousava uma camisola negra que ela pegou, ao abri-lo, notou que existiam duas aberturas nas costas perfeitas às suas asas e novamente, correndo os olhos por tudo aquilo suspirou, quase como se segurasse um riso solto de deboche, mas que saiu como um sopro de aceitação – “afinal” – pensou ela – “o que eu perco com isso?... Não tenho nada melhor para fazer mesmo”.
Shadow tomava um banho, deixando que a água caísse sobre sua cabeça e tirasse todo o peso da vergonha que passara naquela noite, para nunca mais se subjulgar a tais coisas. O sabonete, o xampu, o enxágue, a tolha e estava pronto a mais uma noite a sós em seu apartamento, olhando com certa aceitação a sala vazia, a janela aberta que teve de ir fechar, as garrafas que teve de jogar no lixo, a lata que buscou na geladeira quase vazia, e também, a cada passo que dava em direção ao seu quarto com a única certeza de que ia se jogar em sua cama e desmaiar até o dia seguinte.
Qual não fora a surpresa para o ouriço ao atravessar a porta de seu quarto e ver ali, deitada sobre sua cama, trajando nada mais que aquela camisola negra semi-aberta que ele mesmo comprou para ela e, degustando em pequenas mordidas os bombos recheados com uma mão enquanto cheirava uma das flores na outra – você?
- E quem você achou que fosse? O papai Noel? – Rouge debochou, mas apenas para rir, pois entendia claramente a surpresa do ouriço. Ela gesticulou com a flor para que ele se aconchegasse a cama, e quando Shadow se aproximou ela se sentou de pernas cruzadas e olhar perdido – e antes que pergunte – ela disse desenho um arco com os olhos até encontrar os dele – eu também não sei porque não fui quando me deixou ir.
- Rouge – ele a olhou de baixo acima, o que podia ver de tão perto é facilmente explicado numa palavra; tudo.
- Você não é o único que tem ficado “na mão” sabe... – ela estava sendo sincera, ou pelo menos mentia muito bem para animar alguém. Rouge não é uma pessoa, ou animal antropomórfico, que alguém deveria confiar totalmente, já que a mentira corre nas veias; mas o que se sabe deste tipo de gente é que muitas vezes, a falsidade é grande para tentar esconder o medo de algo que eles mesmos julgam ser feio às suas aparências. Rouge não se difere disso, muitos medos escondidos atrás de uma acidez soturnamente gótica, fazem dela quase uma vampira, não fosse talvez o fato de um desses medos que ela esconde seja o de não ter ninguém com quem contar, nem que seja apenas para incriminar como esse caso – se bem que já deveria estar cansado de saber que para mim “o prazer vem antes dos negócios”
- Você só diz isso das jóias que rouba – Shadow replicou, mas o que isso importava agora, pois com o toque suave de sua mão sobre a face da mulher morcego a fez deixar-se levar pelo desejo e aceitar o longo, úmido e enrolado beijo que só terminou com os dois, um sobre o outro, entrelaçados em pura luxúria; os fartos seios sendo apertados e roçados contra a pelagem áspera de Shadow, àquela mão perdida entre as pernas de Rouge a tocar sua quente vagina, as asas que se acomodaram abertas sobre o lençol, os bombons espelhados pela cama, e os primeiros ofegares de ambos.
Rouge ergueu então uma das pernas, abrindo-se a Shadow que deixou seus lábios descansarem e desceu beijando os cantos do corpo quente dela até chegar à parte suculenta; a língua entrando a fez contorcer-se, mas o comentário a seguir...
- Você é bem mais peluda do que parece – Shadow falou acariciando-a e esperando deixá-la sem jeito.
- É só para ficar quente – ela respondeu buscando a mão dele e o puxando de volta “acima” – não é bonito falar isso a uma mulher.
Shadow ignorou-a e com um pouco de força a fez virar-se de barriga abaixo para a surpresa dela.
- Ei.. O que pensa que esta fazendo? – Rouge tentou desvirar-se, mas ele encaixou-se em suas costas de tal forma, pegando suas asas e impondo-a seu peso que ela não conseguiria, nem se quisesse muito sair dali. Shadow novamente não disse nada, apenas a penetrou como a muito desejava fazer, puxando as asas dela e a forçando a ficar de quatro como um animal sob o seu comando – não! Assim não! – Ela o falava, mas não adiantava de nada, os golpes contra o seu quadril a tiravam todo o fôlego, a enchiam dum prazer louco que jamais imaginara sentir e no fundo a fazia gostar daquela forma.
As luzes das velas tremendo ao compasso das estocadas, dos sons estalados dos quadris, do ranger da cama e dos gemidos eróticos de ambos preencheram a noite até que Shadow não aguentaria mais.
- Por favor... Dentro não! – e como num ato de caridade ele obedeceu ao pedido melando as costas de Rouge que caía, tão satisfeita quanto ele pelo prazer que ali sentira, ou até mais. Porém a noite fora ainda mais longa que isso, porém não cabe ser discorrida aqui, pois mesmo esses dois merecem algum tipo de respeito.
Ao amanhecer, por sua vez, Rouge foi despertada pela luz da janela que finalmente tocou sua face, mostrando ser muito mais tarde do que esperava dormir. Ela levantou-se e se vestiu e só então deixou o quarto. Para sua surpresa o apartamento estava como na noite anterior, pela pequena diferença dum papel sobre a mesa endereçado a ela que dizia:
“Rouge, se está lendo isso eu já devo estar a caminho dum lugar que tive de ir, pois preciso agradecer a alguém por algo. Tem comida na geladeira caso queira, e lembre-se de trancar tudo ao sair, pois não sei quando volto”.
Rouge correu os olhos para a escrivaninha, as chaves, o capacete e os óculos não estavam ali, rapidamente fora a janela apenas a tempo de ver ao longe a moto sumir na distancia em direção a estrada enquanto uma grande raiva explodia dentro de si – Maldito! Como ousa me deixar assim? Eu vou me vingar disso Shadow!
Mas ele não podia ouvir, pois no radio de sua moto, um apetrecho que Tails havia instalado e ele só descobriu nesta manhã estava tocando “born to be wild”, e todos sabem como tal musica nos envolve, ainda mais sobre uma moto. Shadow cantava o refrão no momento em que lançou ao horizonte a garrafa vazia que trazia com sigo, descendo a longa avenida à beira-mar, com os raios do sol refletindo em seus óculos escuros, sob a viseira do capacete.
Mal sabia ele que aquela garrafa faria uma trajetória curiosa, descrevendo no céu um arco perfeito para pousar na cabeça duma ave esverdeada que dormia na praia, o despertando tão furioso como quando caiu de sono recostado em seu Gear quebrado. A tal ave levantou e furioso discerniu os mais diversos xingamentos, enfatizando lógico o mais característico deles, e que num primeiro momento não havia sentido algum – Como eu odeio o chão!
Continua... De certa forma.