Cap.1
Hoje, uma das maiores discussões do mundo envolve homossexualidade. Esse assunto ainda é tabu em muitas culturas. Tratada como crime e doença em alguns países árabes e africanos. Em alguns países, os homossexuais são condenados a morte. Apenas por amarem o mesmo sexo. Enquanto criminosos que realmente afetam a vida das pessoas as vezes são perdoados, reinseridos na sociedade como se nada tivesse acontecido, um garoto homossexual é tratado como assassino por muitas pessoas. No Brasil, apesar de não ser crime, ser gay não é nada fácil. A maior parte do povo é conservador, e ainda aponta o dedo quando vê um casal de homens andando de mãos dadas, ou se abraçando. Algumas vezes são humilhados. A família briga, não aceita. Alguns são agredidos, de todas as formas. Tudo isso por amar alguém do mesmo sexo. Por sentir algo que não escolheu. Se no século XXI é assim, imagine como era a 97 anos atrás. No início do século XX, o Brasil ainda sobrevivia em parte do Café, em parte da Borracha. Um país extremamente rural, um mundo em plena Primeira Guerra. O catolicismo imperava, junto com ele mitos, lendas e preconceitos. Se no século XXI é difícil ser gay, imagine no início do século XX, em que mal havia sido inventado o rádio. Naquela época, ser gay era doença, desvio psiquiátrico. Dificilmente se via um homossexual assumido. A maioria vivia nos cabarés da vida, ou se escondiam no armário, e levavam uma vida de hétero como se não sentissem nada pelo mesmo sexo. É nesse contexto histórico que se inicia a minha história. Me chamo Antônio de Bragança. Um sobrenome extremamente poderoso e feroz. Sou filho de Pedro Bragança, um famoso deputado, ferrenho opositor dos direitos das mulheres. Meu pai é do tipo que acha que a vida das mulheres deve ser sempre dedicar-se ao marido e aos filhos. Todos sabíamos que ele traía minha mãe, Cristina, e que não tinha mais amor por ela como quando se casaram. Vivia viajando entre a nossa Fazenda, próxima a Juiz de Fora, em MG e o Rio de Janeiro, capital da república na época. Eu morava na fazenda... Para desgosto deles, era filho único. Na verdade, o desgosto era muito maior pra minha mãe, já que pelo fato de ser homem, meu pai já estava satisfeito pois teria um herdeiro homem. Nasci em 1903, tinha 15 anos em 1918. Era um adolescente como qualquer outro da época. Vivia correndo pra lá e pra cá, no sítio, subindo nas árvores, brincando no riacho e tendo aulas em casa. Não era totalmente igual aos garotos da época pelo fato de eu não ter muitos amigos. Ficava extremamente recluso dentro de casa e minhas únicas brincadeiras eram com primos ou filhos dos criados. Sofria muita solidão por isso. Naquela época não via muita maldade no mundo. Não sabia o que era assalto, nunca tinha visto alguém morrer. Mal sabia que meu amiguinho servia para outra coisa além de mijar. Poucas vezes havia saído do sítio, na maioria das vezes ia para o Rio para consultas, ou quando era época de eleições, e meu pai precisava da família para fazer média. Como disse, estudava em casa. Esse era um motivo a mais para eu não ter amigo. Não sabia direito o que era sexualidade. Nem sabia direito o que era o certo ou errado. Era ingênuo demais... Tudo continuava da mesma forma até aquela notícia chegar. Era horário de almoço. A Diana, nossa governanta servia o almoço, e eu estava prestes a dar a primeira garfada quando aparece um homem na porta. Um homem ofegante que acaba assustando a todos.
- Aí meu Deus, Dona Cristina ! - parecia que ele estava correndo a quilômetros.
- Quem é você ?
- Eu... Eu sou Eduardo, assessor do Deputado Pedro.
- O que faz aqui ?
- É que... O deputado faleceu esta manhã.
É, meu pai havia nos deixado. A sua morte não me causou muito efeito. Eu só sabia que tinha um pai porquê ele me foi apresentado, pois meu pai de verdade ele nunca foi. Eu fui basicamente criado pela minha mãe e só. Me disseram que ele estava dentro de um barco, que estava indo até um navio da Marinha resolver uma revolta. Foram recebidos a bala, e um desses tiros o atingiu. A partir daí a minha referência masculina cessou. Desde então, minha mãe fechou ainda mais o cerco. Queria me proteger sempre de tudo e de todos. Vivia dizendo que eu havia sido a única jóia que havia restado a ela. Acabou sendo obrigada a começar a gerir os negócios. Como vivia acompanhando tudo de perto, ela sabia como funcionava a burocracia e não teve problemas com isso.
- Filho ? Não quero você andando por dentro dessa floresta ! Dizem que tem uma onça por lá. Os homens ainda não a acharam...
- Pode deixar mamãe, não vou andar por lá - todo dia ela parava e me observava por alguns minutos. E dizia então a mesma coisa...
- Você é igual ao seu pai ! - meu pai era descendente de alemãos, cujas características acabaram chegando em mim. Era bem branco, tinha cabelos loiros, lisos, bem claros. Olhos esverdeados, um corpo bem magro e boca bem vermelha...
Durante pouco mais dos primeiros 4 meses de 1918, eu e minha mãe ficamos sozinhos na fazenda com os empregados. Até ela receber um telegrama.
" Querida amiga Cristina, quem voz escreve é Natalie, sua grande amiga que mora em Paris. Você sempre disse que poderia contar com você sempre que precisasse. Este é o momento que mais preciso. Meu filho Maurice vai completar 18 anos daqui a um mês, e estou amedrontada com a possibilidade de ele ser convocado para a Guerra, para defender a França. Penso que é melhor envia-lo ao Brasil, pois ele ficaria muito bem escondido na sua fazenda. Peço humildemente que permita que ele possa morar com você !"
Ao terminar de ler a carta, ela parou, e começou a pensar.
- O que diz aí mamãe ?
- Natalie quer que o filho dela venha morar conosco.
- Natalie ? Aquela moça que veio aqui a uns 3 anos atrás ?
- Ela mesma... Eu devo um favor a ela... O garoto com certeza deve ser bem educado. Fala mal o português mas deve conseguir se virar. Ele vai vir morar conosco !
- Ué, mas a senhora o conhece ?
- Sim, o vi da última vez que fomos ao Rio. Estava lá levando as últimas coisas da mãe para Paris...
- Entendo ! Ao menos teremos uma companhia a partir de agora.
- É mesmo...
Assim, minha mãe rapidamente respondeu a carta, e esperamos o mês terminar, e o garoto francês chegar.
DIAS DEPOIS
Havia chegado o dia. Não nego que fiquei ansioso, pois teria um garoto com idade quase igual a minha transitando pela casa. Era algo novo, pois eu quase não me relacionava com ninguém. Fora que seria bem diferente a experiência de ter mais alguém em casa, pois mesmo quando meu pai estava vivo isso quase não acontecia. Pouco antes do almoço, vimos a charrete se aproximar. O novo hóspede estava chegando. No passo lento dos cavalos, foi se aproximando. Parou em frente a casa. A porta foi aberta, e de dentro saiu o garoto. Era diferente de tudo o que eu havia imaginado...
Continua
E aí ??? Gostaram da temática ??? Obrigado por comentarem... Beijos