O CRIME DOS VIEIRA DE MELO - Parte 21
André Vieira, por muito tempo, cumpriu com a sua promessa de não beber. Ou, ao menos, parar de beber antes de ficar embriagado. A negra Violeta também prometeu a si mesma que não iria mais foder com o sinhozinho. Até porque tinha criado afeição por Ana de Faria e não queria mais traí-la. Tanto que passou a chamá-la carinhosamente de Donana. Os escravos de propriedade dos Vieira e o povo da Vila de Olinda a imitaram, dando o mesmo tratamento carinhoso para a moça. Ela também ganhara a simpatia de todos pelo seu afinco religioso e por ajudar a todos da Vila que necessitassem dela. Diferentemente dos Vieira que olhavam mais era pros próprios umbigos. O padre Sipriano foi o primeiro a alardear a bondade e solidariedade da jovem que passava o dia todo ajudando nos assuntos da igreja onde casara e ensinando catecismo às crianças da Vila.
Bernardo Vieira de Melo e seu filho, no entanto, começaram a passar dias, até semanas, fora de casa. Diziam que estavam resolvendo assuntos das propriedades, mas o padre Sipriano certa vez confidenciou a Donana que eles estavam metidos em conspirações políticas que desagradavam à Santa Igreja e ao rei de Portugal. Mas Ana de Faria achava que não devia se meter nesses assuntos de homens e desconversava quando lhe inqueriam sobre isso. D. Catarina também ficava na dela e a vida ia sendo levada. A megera deixou de se intrometer tanto na vida do casal e Ana de Faria e Violeta eram sempre vistas juntas. Naquele dia se dirigiam a pé em direção à Igreja do Carmo, que não era muito longe da residência dos Vieira, quando toparam com um cavaleiro muito esquisito.
O homem tinha as vestes imundas. A pele tinha sujeira grudada pelo suor em quase toda a sua totalidade. Os cabelos compridos e desgrenhados, tal qual sua barba enorme, completavam o quadro de imundície. O cavalo quase couro e osso que ele montava fedia. Talvez, tanto quanto seu dono, não tomasse nunca banho. Ana de Faria percebeu que a escrava Violeta ficou tensa quando o viu. A negra fez o Sinal da Cruz várias vezes. Estava pálida de medo. Quando a sinhazinha perguntou o que estava acontecendo, o homem olhou em direção às duas. Seus olhos, de um cinza muito claro, se destacavam na sujeira do rosto. Eram olhos malignos, que causaram um calafrio em Ana. Seu sorriso, de dentes amarronzados de fumo mascado, era de pura perversidade. Ele parecia ter reconhecido a escrava. Inclinou o chapéu de abas largas que tinha no topo da cabeça como um arremedo de cumprimento. A escrava arrepiou-se toda, antes de responder baixinho:
- Cruz Credo! O demônio está de volta. Valei-me meu pai Oxalá!
Ana olhou para trás e, confirmando que o homem seguia caminho e se distanciava delas, perguntou de novo:
- Quem é esse homem, Violeta? Por que você tem tanto pavor dele? Diga-me pelo amor do Senhor Jesus Cristo!
Antes que a negra respondesse, no entanto, uma voz se fez ouvir:
- Esse é o capitão-do-mato Felipe Ortega. Uma alma atormentada e atormentadora. As duas deveriam voltar comigo para a casa dos Vieira. Boa coisa esse sujeito não quer por aqui - disse o padre Sipriano já bem perto delas.
O padre vinha esbaforido pelo esforço da carreira que empreendera, levantando o hábito carmelita para que não arrastasse pelo chão de barro. Parou perto das duas mulheres e tentou respirar melhor. Quando recuperou o fôlego, puxou-as pelo braço, caminhando em direção às propriedades dos Vieira. Violeta tentou completar as informações sobre o homem:
- Ortega é um assassino frio e sádico. Dizem que saiu pra fazer um mandado de D. Catarina e nunca mais voltou. Ninguém nunca soube que mandado foi esse, mas todos pensavam que ele havia morrido. Deram graças a Deus por isso. Faz uns três anos que ele sumiu. Agora, se está de volta, alguma maldade foi ou será feita.
- E D. Catarina está em perigo. Precisamos chegar depressa lá - disse o padre apressando o passo - pensando bem, é melhor vosmecês ficarem aqui. Eu vou até lá.
- Iremos com Vossência - disse Ana resoluta.
O padre nem ouviu. Já corria a passos largos em direção à casa, que podia ser avistada perto. D. Catarina estava de pé sob o alpendre, frente ao homem montado. Este retirou um saco de estopa que estava preso à sela e jogou-o no chão, aos pés da megera. Ana, que tinha o ouvido mais apurado que a negra e o padre, ouviu nitidamente o homem dizer:
- Estão aí. Cumpri minha parte para a senhora D. Catarina. Espero que vosmecê tenha a decência de cumprir a sua.
Catarina Leitão estava lívida. Notava-se bem em seu semblante a surpresa de ver aquele homem ali. Esta percebeu a vinda de Ana, do padre e da escrava e disse ao sujeito mal-encarado:
- Recolha esse saco e vá para o casebre onde o senhor dormia, quando vivia nestas terras. Mandarei uma escrava levar-lhe água para um banho e logo estarei lá para resolvermos nossa questão.
Ele deu um sorriso maldoso. Olhou para a escrava que se aproximava e disse com os dentes podres à mostra:
- Mande-me a negra Violeta. E peça para ela levar umas roupas do senhor seu marido que estas que visto não prestam mais.
- Certo. E eu mesma lhe farei um suco de frutas e levarei pessoalmente até lá. Juntamente com umas broas de mandioca e pães de milho que eu sei que vosmecê gosta.
O homem cuspiu uma borra de fumo no chão, quase aos pés de Catarina Leitão. Depois, sem pressa, desceu da montaria e apanhou o saco de tecido rude que tinha jogado ao chão. Subiu de novo no cavalo e rumou para os fundos da residência. O padre foi o primeiro a chegar perto da matrona, perguntando se ela estava bem.
- Eu me sinto ótima. Estou apenas tratando de negócios e não precisam temer por mim - disse Catarina - Já vosmecê, sua negra, pegue umas jarras com água limpa e leve pro casebre. E trate de fazer tudo que o senhor Ortega mandar.
Violeta ficou pálida. Voltou-se para Donana com os olhos pedindo ajuda. Esta, no entanto, fez um gesto com a cabeça dizendo que a escrava fizesse o que lhe tinham mandado. A negra, mesmo amedrontada, aviou-se em atender as ordens de D. Catarina. Confiava na sinhazinha e sabia que ela faria de tudo para protegê-la. Mas o padre Sipriano interviu:
- Deixe que eu vou servir ao homem, Violeta.
Todas olharam para ele, surpresas. A matrona quis dizer algo mas ele interrompeu-a, dizendo:
- Diga-me onde estão as jarras e eu mesmo as levarei lá. Não vou expor vocês a esse homem - foi dizendo isso e caminhando em direção a um par de jarras de barro que viu ao pé de uma árvore, perto da casa. Ana quis pegar uma delas para ajudá-lo a levar, mas ele a impediu.
- Não quero ninguém comigo. Eu cuido sozinho desse senhor.
- Então, que o Senhor Bom Deus cuide de Vossência, padre Sipriano.
- Ele está comigo - disse o padre pegando as duas jarras cheias d'água de uma só vez, demonstrando uma força impressionante. Ana pensava para si mesma que era Deus o ajudando.
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- Eu pedi que me mandassem a escrava, padre - disse o homem já nu, perto de uma tina vazia, ao ver o padre entrar no casebre com as jarras.
- Não há nada que ela possa fazer que eu não possa, filho - disse o padre despejando a primeira jarra na tina.
O homem mostrou, novamente, seus dentes imundos:
- Estou há muito tempo sem cobrir uma mulher, padre. Então, não vai poder me satisfazer como imagina - o homem dizia isso coçando as longas barbas imundas - a menos que esteja disposto a me emprestar esse cu franzino.
O padre Sipriano ficou lívido. Baixou a cabeça, encabulado. Mas depois olhou bem nos olhos do sujeito quando afirmou:
- Estou disposto a fazer tudo o que vosmecê queira, porquanto que não faça nenhum mal às mulheres desta casa!
O homem deu uma risada medonha. Então, de repente, pegou o padre pelo hábito surrado e rasgou-o quase sem esforço. O padre ficou apenas de ceroulas. Mas logo teve as vestes íntimas estraçalhadas pelas mãos rudes do sujeito. Felipe Ortega deu um safanão no padre que o derrubou ao solo. Chutou-o no flanco, fazendo com que rodopiasse no ar e caísse de bruços. Então, puxou-o pelas pernas, fazendo com que elas se dobrassem. Ajoelhou-se e se posicionou atrás do religioso, apontando a cabeçorra cheia de sebo da sua pica imunda. Nem cuspiu para lubrificar. Enfiou sua rola grossa entre as pregas do cu do infeliz religioso.
FIM DA VIGÉSIMA PRIMEIRA PARTE