Cap.3
NARRADO POR RAFAEL
Eu não sei o que houve comigo. Mas por algum motivo ver aquele novato me deixou estranho. E isso se comprovou quando começamos a treinar. Eu no time titular, ele no reserva. Aquele dia eu não estava bem. Estava distraído, por algum motivo ele estava me distraindo. Eu não estava me entendendo, mas era isso que estava acontecendo.
- EI Rafa, presta atenção ! - gritava o técnico, ao ver que eu estava dando passes errados - o que tá havendo com você hoje ? - ele gritava quando eu perdia gols que normalmente não costumo perder. Pra piorar o dia, o novo garoto era muito bom. As vezes em que tocou na bola foram poucas, mas ele foi preciso. Demonstrou o seu talento sem medo de estar entre os profissionais. Aquele dia definitivamente estava sendo péssimo para mim !
NARRADO POR BEN
Aquele dia não podia estar melhor. Os profissionais eram bons caras. Vinham, conversavam, ensinavam dicas, faziam graças. Apesar de ser um treino e do técnico estar em cima de nós o tempo todo, o clima era muito bom. Mas não podia estar melhor, afinal o time havia acabado de conquistar um título, e era o favorito para o Brasileirão.
- Você tem que sempre se posicionar bem, para receber o passe, e ficar de olho na linha de impedimento. Parece que esses são os seus maiores defeitos, já que talento você tem muito ! - dizia o técnico, chutando a bola na minha direção. Só quem não estava bem aquele dia era Rafael. Justo ele, o craque do time parecia desconectado aquele dia. Algumas vezes ele me olhava, de uma forma estranha. Virava o rosto. Em um momento jogamos juntos no mesmo time. Ele estava tão desatento que estava errando passes fáceis, de 2 metros as vezes. Não estava conseguindo finalizar direito. O treino terminou com uma bronca do Aurelio pra cima dele.
- O que foi que houve hoje Rafa ? - ele perguntava, enquanto o time voltava para o vestiário.
- Eu não sei Aurélio. Estou meio desconectado hoje...
- Espero que isso não se repita nos jogos ein... Jogador de corpo mole não fica no meio time.
- Pode deixar, eu estarei bem no dia da estréia, pode deixar !
Como imaginam, os vestiários tem aqueles chuveiros coletivos. Todo mundo toma banho junto. Os jogadores não se importam, claro, são todos Heteros. Mas eu nunca gostei de me mostrar para ninguém. E além disso... Ver um monte de homens pelados me deixava... perdido.
DIAS DEPOIS
Treinamos alguns dias e logo o primeiro jogo do campeonato chegou. Iríamos enfrentar um time do Nordeste, o Recife FC em casa. Não queria nem imaginar a pressão que a torcida faria ,já que ela sempre lota o estádio. Como eu esperava, eu não havia sido escalado como titular. Mas como era o começo do campeonato, eu tinha expectativa de que entrasse no decorrer do jogo.
- Mantenham o foco, e lembrem-se de tudo o que treinamos. Vamos juntos time ! - gritava o nosso treinador, animando a todos. Quando subi ao gramado, foi que senti que o calor da torcida não era nada comparado ao que eu imaginava. Nunca tinha visto tanta gente junta prestigiando o time. Aquele barulho ensurdecedor, aquele calor enorme vindo daquele monte de gente apaixonadas pelo mesmo esporte que eu. Eu não estava jogando. Mas aquele barulho foi o suficiente para me fazer tremer as pernas. O jogo começou. Bola pra lá, pra cá, a torcida junto o tempo todo. Quando a bola passava perto não dava pra escutar barulho nenhum, que não fosse o enorme eco da torcida. Apesar das grandes chances que tivemos, nada de gol no primeiro tempo. E logo voltamos pro vestiário.
- Eu percebi que a marcação deles está muito forte. Vocês precisam girar a bola, jogar perto, pressionar para que eles entreguem. E... Acho que é melhor que nós tenhamos talento no ataque. Por isso, Ben, você vai entrar.
- O que ?
- Tenha calma, e jogue o que sabe. Lembre-se das dicas, e arrebente - meu Deus. De repente um medo enorme tomou conta de mim. Eu teria que encarar a torcida pela primeira vez, e obrigatoriamente tinha que jogar bem, para ter mais chances no time. E o pior (ou melhor), jogaria ao lado do meu ídolo no futebol, Rafael.
NARRADO POR RAFAEL
Os dias foram se passando e ele não saía da minha cabeça. Deve ser algum tipo de inveja, ou fascínio pelo talento que ele demonstra ter. Até uma nostalgia, já que ele lembra muito o meu eu quando estava chegando ao time titular. No jogo, eu estava mais ou menos. Estava mais concentrado, mas a marcação era muito forte em cima de mim e eu não estava conseguindo sair. Por isso o técnico o chamou, já que ele poderia mostrar o seu talento, ser um fator surpresa, já que ninguém o conhece. E assim voltamos para o campo de jogo no segundo tempo. O jogo começou, e durante alguns segundos ele estava tímido. Eu e ele não havíamos tido muito contato, ao contrário de alguns outros jogadores com ele, então eu não sabia como chama-lo pro jogo. Porém, quando vi ele não ir disputar uma bola próxima a ele, não aguentei.
- EI novato ? Vai jogar ou não vai !? - imediatamente ele me olhou. Não esboçou muita reação. Pareceu pensar. E então pareceu ligar no jogo. Começou a conseguir se desmarcar, chutar bem, driblar. Até que em um momento eu recebi a bola. Vi que tinham três zagueiros na minha frente, assim como na final do estadual. Numa outra ocasião eu driblaria os três e chutaria. Mas... Quando vi ele desmarcado... Algo aflorou dentro de mim e fez eu tocar a bola para ele. Ele limpou o goleiro e chutou. Gol ! Era o primeiro gol dele no profissional. Chorou. A alegria estava estampada no seu rosto. Ele voltou a sua formação. Nos olhamos. Seu olhar era intenso e cheio de emoção.
- Obrigado... Pelo passo e... Pela bronca.
- De nada, novato !
Não demorou muito e eu consegui marcar, numa cobrança de falta. Minutos depois ele conseguiu se desmarcar na direita e deu um passe milimétrico para mim dentro da área. Gol. Parecia que enfim, eu e ele estávamos conseguindo se entender.
MINUTOS DEPOIS
O jogo acabou. 3 a 0 no vestiário. E dessa vez eu estava dividindo os holofotes com uma pessoa. O novato alemão.
- O que você tem a dizer a respeito do entrosamento que você demonstrou ter com o Ben ?
- Acredito eu que o nosso talento acabou encaixando e... Tudo fluiu daí...
No vestiário ele, como sempre tímido, tomava banho no canto, acuado. Como sempre fazíamos, eu e um grupo de jogadores muito amigos nos juntavamos na minha casa após a vitória para comer alguma coisa, rir, beber, enfim... Via que ele ia sair sozinho, desacompanhado. Foi quando tive a ideia de chama-lo para nos acompanhar.
- EI ?
- Ah. Oi Rafael. Brigado pelo passe ein, nunca vou esquecer.
- Não foi nada. Você tem que ficar feliz por ter conseguido mostrar o seu talento. Vem cá... Você tem alguma coisa para fazer agora ?
- Não... Eu vou pra casa dormir.
- Ah... Não quer ir comigo e um grupo de amigos comer alguma coisa ?
Continua
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