O Início — 1.0
Aquele momento parecia ter parado no tempo. Meu olhar no dele, o coração acelerado, aquele clima de “quem vai tomar a atitude?”, o silêncio que foi interrompido pelo toque do celular…
Eu nunca tinha vivido uma situação assim, acho que esse tipo de situação é rara. A única coisa que eu tinha em mente era de admirar aquele par de olhos azuis intenso, aquele rosto perfeito que fazia harmonia com uma barba que o deixava mais lindo ainda. Sabe aqueles cabelos que só de olhar da vontade ficar fazendo cafuné o tempo todo? Então, o Davi tinha esse tipo de cabelo. A pele branca que em exagero o deixava com o aspecto pálido. O físico não é muito interessante, mas digamos que ele tem um corpo normal, nem gordo e nem magro.
— Não vai atender? — Falou baixinho, quase não entendi o que ele havia falado.
— Q-quê? — Gaguejei. — A-Ah, é mesmo… Tinha até esquecido disso. — Falei acordando do transe.
Ele apenas sorriu com os lábios, abaixou a cabeça e voltou a mexer no seu celular. Enquanto isso, eu falava com a Jani, que estava numa voz aflita e perguntando onde eu estava. Disse pra ela ficar tranquila, eu estava numa lanchonete que ficava poucas quadras dali e que eu estava bem. Ela se acalmou, mas disse que qualquer coisa só era eu telefonar. Eu sorri. Sabe, apesar de conviver muito tempo com a Jani e considerar ela como membro da família, ficava feliz por ela ser tão atenciosa comigo. As vezes me sinto uma criança que recebe amor de seu irmão mais velho.
Eu olhei para ele e estava da mesma forma que vi minutos atrás, sentei na cadeira à sua frente e fiquei encarando. Ele não expressava reação, nem sequer olhava para mim. Olhei para seu prato e só tinha uma mordida no seu sanduíche, o copo com o suco de laranja estava cheio ainda. Ele só mexia no celular, parecia estar triste.
— Davi, ta tudo bem com você? — Perguntei.
Ele ergueu a cabeça novamente e olhou para mim, apenas confirmou com a cabeça. Seus olhos estavam marejados, aquilo me deu a certeza de que ele não estava bem.
— Olha, sei que você mal me conhece e obviamente não imaginava que isso ia acabar acontecendo assim, do nada. Mas quero que saiba que…
— Meus pais — Ele me interrompeu. — Amo eles cara, mas eles são muito preconceituosos com pessoas que se relacionam com outras do mesmo sexo. Já conversei com eles sobre isso, que é normal e tudo mais, só que é em vão. — Desabafou.
Ele não se conteve, as lágrimas começaram a cair. Eu fiquei triste também, me veio em mente quando eu assumi para meus pais. Eu entendia a dor dele, eu também passei por aquilo e sei como é difícil essa parte da vida.
— N-não chora Davi… Olha, eu queria muito te ajudar e te dar conselhos, pelo menos te deixar um pouco mais seguro sobre isso, mas infelizmente eu também passei por isso que você tá passando e não sei como te ajudar… — Falei.
— Tudo bem… É… Desculpa, mas eu esqueci seu nome. — Falou enxugando as lágrimas.
— Júlio… Julio César dos Santos.
— Esse nome não me parece estranho, famoso você hem kkkk. — Disse ele ironizando meu nome.
A gente sorriu. Engraçado, ele mudou de humor de uma forma tão rápida. Pelo menos não estava mais com aquela cara de choro e as lágrimas que escorriam no seu rosto deram lugar ao seu sorriso e o mesmo era lindo. A voz dele estava normal dessa vez e ela era bem grossa. Davi era diferente de todos os caras com quem eu havia saído, ele era simples e seu olhar não demonstrava malícia. Ficamos ali conversando até a lanchonete fechar, só tinha nós dois e o gerente até perguntou se a gente ia acampar lá. Não teve graça a piada, mas dei aquela risada forçada.
Íamos andando pelas ruas e aos poucos ficávamos mais íntimos. Davi é bonito, simpático, tem problemas pessoais mas sabe contornar a situação erguendo a cabeça. Aquele homem era admirável.
“Mas que porra é essa Júlio? Vamos com calma né?”
— Júlio César — Falou sorrindo, aposto que lembrou da piada.— Eu moro ali naquele apartamento, qualquer coisa cara, é só me visitar tá bem?
— Ah, entendi… Bom, eu moro um pouco longe daqui, mas se você quiser me visitar, basta me ligar e a gente marca um local e tals…
— Ta bom…
A gente ficou frente a frente, ele foi se aproximando e nos abraçamos. Foi um abraço rápido de 2 segundos, mas parecia que o tempo tinha parado novamente. Eu sentia o corpo, o calor e o cheiro do perfume dele. Parecia que aqueles segundos foram o bastante para limpar o peso que eu sentia por dentro. É, eu não sei explicar o que estava acontecendo direito, só sabia sentir aquilo. E foi bom.
Cheguei em casa, a Jani e a Eduarda já haviam chegado. Como sempre, o mesmo interrogatório.
— Ai mano, já tava ligando pra polícia e os bombeiros. Onde você tava? — Falava com as mãos na cintura e aquela cara de preocupação.
— Meu Deus Jani, denovo essa preocupação toda?! Ai ai… Mas deixa eu te contar, eu tava com um boy e… — Fui interrompido pela Eduarda.
— Para tudo Brasil!!!! — Gritou. — Sr. Júlio saindo com os boys e não nos conta nada? Passada, vamo fala logo tudo sobre o boy. — Disse ela toda escandalosa.
Eu e a Janiele caímos na risada. A Eduarda sem sombras de dúvida era a alegria no nosso AP, sempre com aquela auto estima elevada e com um bom humor sem igual.
Bom, eu falei toda a história para elas, que ficaram fazendo piadinhas o tempo todo e aquilo tudo era muito divertido. Conversamos por muito tempo sobre o Davi e elas me falavam da balada. Era quase 3 da madrugada, elas estavam dormindo abraçadas no sofá, peguei um lençol e cobri elas, tão lindas juntas ♥.
Tomei meu banho, vesti apenas um calção fino de dormir e peguei meu celular e os fones de ouvido, comecei a escutar minhas músicas que eu mais gostava, fiquei olhando para o teto do meu quarto e comecei a pensar no que tinha acontecido não só hoje, mas nos dias anteriores. Eu simplesmente estava desistindo daquela vida e tirando da cabeça de uma vez por todas que app de relacionamento gay não era o lugar certo para mim, que ali só podia encontrar caras em busca de transas e nada mais. Do nada, aparece o Davi e mexe com o meu psicológico de uma forma tão rápida, que me deixa surpreso. Um rapaz gente boa e educado que eu tentava encontrar em algum cara, e que só fui achar nele. Enquanto a gente conversava pelo caminho, eu percebia como ele especial num todo. Sério, acho que se eu fosse falar do Davi, passaria horas e horas escrevendo. Mal nos conhecemos e já estava todo bobo por ele.
Esse meu momento “Pensado na Vida” foi interrompido por uma ligação, era o Rafael, um cara que conheci em um dos aplicativos. A gente ficou por umas 2 semanas, eu até achava que ia dar certo mas estava enganado, ele é legal e tudo mais, porém é (muito) ciumento. Ele queria simplesmente me privar de todos os meus amigos, queria monitorar todos os meus passos e eu tinha até que avisar pra ele quando eu fosse sair de casa só, pode isso produção?
Eu não atendi a ligação, na verdade já até bloqueei ele das minhas redes sociais, não queria ver o Rafael na minha vida nunca mais.
Ele tem 22 anos, pardo dos olhos e cabelos pretos, 1,80 de altura e com um físico definido por causa da academia, morava em um bairro longe do meu (AINDA BEM), no outro lado da cidade. O Rafael é primo da Eduarda, ela já havia me falado dele antes mesmo de nos conhecer, mas ela não sabia que ele é assim dessa forma. Enfim, isso é águas passadas e não vale a pena relembrar.
Acordei tarde no outro dia, o clarão que vinha da janela e batia no meu rosto me incomodava. Eu estava com uma dor de cabeça horrível, parecia até que estava de ressaca, olha que nem bebi tanto assim. Mal conseguia abrir os olhos, fiquei tateando a cama, tentando achar o celular. Tinha mensagem no WhatsApp, era o Davi. Ele havia mandado uma mensagem de voz, estava com uma voz de choro, era perceptível. Falava que seus pais brigaram com ele novamente e que as coisas tinham ido mais além, mas não dava pra entender direito o áudio, parecia que alguém tinha tomado o celular dele. Eu fiquei aflito, escovei os dentes, passei uma água no rosto, nem tomei café, vesti a primeira roupa que vi no guarda roupa e fui as pressas para o AP do Davi. Chegando lá, falei com o porteiro do edifício, ele autorizou minha entrada, falei com a recepcionista e ela me informou onde ficava o AP da família do Davi.
Eu ia subindo as escadas com o coração na mão, não sabia o que ia acontecer depois que eu aparecesse lá, mas de uma coisa eu tinha certeza: eu vou ajudar o Davi no que ele precisar.
…
Antes eu queria agradecer aos leitores que comentaram, leram e votaram no meu primeiro conto, volto a dizer que a opinião de vocês foi essencial para continuar com a história, valeu!
(PS: Sim mano, eu troquei o nome da Janiele por Juliana kkkkkkk, desculpa. Corrigindo então, o nome correto dela é Janiele 😂💙)
Essa foi a segunda parte da história, eu espero que vocês gostem tanto quanto gostaram da primeira. É isso gente, muito obrigado por tudo e até a próxima. ♥ flw