Observação I: os fragmentos que constam com parênteses e/ou apresentam um tom mais “engraçado” podem ser considerados como um amigo imaginário travesso (ei!). Ainda que pareça, o Felipe não é maluco (ou quase). Logo, logo escrevo o início da história dos dois (capriche!).
Observação II: As histórias do “relicário de memórias” não são, necessariamente, reais ou interligadas, mas alguns personagens são e eles se encontram ora ou outra (afinal, o mundo é tão pequeno, não é?).
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Parte I: Adolescente
Tudo estava indo da maneira que costumava ser. A escola, a família, os amigos e a vida. Sem altos nem baixos, apenas linear. Aquele seria o último ano do ensino médio (um alívio). Terceiro ano do segundo grau, na escola Pedro de Albuquerque. Depois de dois anos mornos, sem nenhuma expectativa de mudança, este seria o terceiro ano com os mesmos professores, mesmos alunos quase a mesma sala. Pelo menos, tinha os amigos de sempre e uns novos adquiridos no ano passado. Samanta, Rafael, Fernanda, Ricardo, Pérola e Iris. Cada um com uma característica marcante que me faz lembrar os bons momentos que tivemos até hoje. Samanta com sua alegria, Rafael com sua humildade, Fernanda com sua inteligência, Ricardo com sua extravagância, Pérola com sua oratória e Iris com sua loucura.
Naquele mesmo ano, além da EEPA, ingressei em curso pré-vestibular. Seria um novo ambiente, novos professores, gente nova. Para mim, algo que poderia ser bom. Pelo menos era o que eu pensava (a história do curso será contada com mais detalhes em outro fragmento do “relicário de memórias”).
Primeiro dia foi o de sempre: palestras. No curso, seria uma semana inteira de apresentações, diálogo, entrosamento e revisões, já na Pedro Albuquerque seriam aulas normais após o dia internacional das mulheres. Engraçado é que Samanta aniversariava neste dia e ela foi chamada para falar para todos (ela deve ter chantageado alguém, vai saber). O que representava para ela aquele dia, além do aniversário. Claro que nada de bom poderia sair daquilo entre as frases mais históricas ditas por ela a melhor foi: “Completo ano no dia internacional das mulheres brasileiras...”. Depois do discurso, o diretor Klaus a agradeceu, mas lembrou a todos que a comemoração continuava sendo internacional e não apenas brasileira. Todos riram.
[...]
Primeira semana “de enrolações” terminada. Agora seria a aulas normais (leia-se mornas) de sempre. Na Pedro Albuquerque, as disciplinas foram dividias metade para o início do ano e a outra para o fim. Achei interessante. Menos assuntos para estudar e conciliava com o cursinho. Entretanto, hoje, analisando isso, vejo que foi horrível para mim, pois não me lembro de quase nada que estudei naquele ano.
Na EEPA, foi anunciado que naquele ano haveria aulas preparatórias (“aulões”) para o Enem e o vestibular aos sábados e/ou domingos. A data exata não foi confirmada.
[...]
As aulas continuavam como sempre, uma avaliação ou um seminário aqui e acolá e nada mais do que isso. O tempo foi passando e apareceu na EEPA um curso adicional de qualificação e empreendedorismo para o mercado de trabalho. A grade me interessou, por isso ingressei no curso. Estar atarefado me impedia de pensar as velhas “besteiras” da adolescência (leiam-se romances proibidos e alvos de guerra, forma carinhosa como H., meu amigo imaginário, chama as pessoas que me interesso).
No sábado seguinte, primeiro dia do curso, nós conhecemos a professora Roseli. Nesse dia, nos apresentamos à classe um de cada vez. Eram os mesmos rostos de sempre, mas Achei interessante a dinâmica do curso incessante, pois toda semana tínhamos um trabalho em equipe para resolver.
As semanas passaram rápido, mas mesmo assim nos divertimos muito com as palhaçadas da professora. Inventamos um apelido perfeito para ela “loucali” e sua sandália que arrastava. Bons tempos.
[...]
Na escola, foi anunciado o primeiro dia de aulões do Enem para o próximo sábado, no mesmo dia do fim do curso, em que haveria uma pequena festa de despedida e a entrega dos certificados.
[...]Acordei naquele sábado ansioso pelo aulão e pelo fim do curso, mal sabia eu que seria o dia mais especial da minha vida, até agora (leia-se exagero). Tomei café e comecei a ler alguns livros que tinha pegado emprestado da biblioteca. Li até o almoço e depois das três horas tomei banho para ir ao curso.
Perto do fim os certificados foram distribuídos. Nesse ínterim, a professora começou a chamar os participantes. Em certo momento, ela diz o nome de uma menina. Alguém se levante e ela direciona a mão para entregar, mas a pessoas a ignorou completamente. Nesse instante, Roseli falou: “Só um buraco para me esconder agora”. Em seguida, Ricardo fala: “Só se for uma cratera, né filha?”. Todos riram.
A festa tinha acabado e ainda vimos “loucali” reclamar do “pequeno” pedaço de bolo que deixaram para ela. Decidimos esperar pelo aulão na escola. Enquanto isso, falamos todo tipo de bobagens, coisas de adolescente sem maturidade alguma: namoros escondidos, rumores de algum professor, o fato de “loucali” ser uma nutricionista, o pequeno pedaço de bolo, sua inseparável sandália que teimava em arrastar, o incrível e inusitado fato de que Roseli ser uma nutricionista, segredos sórdidos dos alunos, enfim, de tudo um pouco. Entre os envolvidos nesse crime de falta de maturidade Fernanda, Pérola e Rafael (o mais tímido do nosso grupo) foram o menos indiciados. Iris e Samanta já estariam presas se fofoca fosse crime. Acho que eu também estaria. Principalmente, por rir tanto das loucuras das duas.
As horas passaram e nem percebemos quando várias pessoas entraram na sala de reuniões da EEPA. Ao se dar conta da hora, entramos na sala e logo após os professores também.
Os professores começaram a falar de suas experiências com os vestibulares que fizeram. Um aluno atrasado entra na sala de reuniões. No mesmo instante, olho para trás e vejo uma bolsa laranja e um capacete que ele levava na mão, não reparei no rosto dele. Voltei a prestar a atenção nos professores e nas besteiras que Samanta falava ao meu lado. Passou certo tempo e tive curiosidade de ver o aluno que tinha se atrasado. Ele estava na última cadeira da mesma coluna que eu estava.
No momento que olhei para o lado, ele olhou de volta para mim. Do nada, meu coração começou acelerar, minha cabeça a doer e meu estômago a embrulhar (drama). Fechei meus olhos, por um instante, e me perguntei o que tinha sido aquilo. Fiquei desnorteado, sem rumo, deu vontade de sair da aula e correr para bem longe. Os sinais clássicos (de paixonite) estavam acontecendo. Não tive coragem de olhar novamente, mas depois de alguns instantes abri meus olhos e o vi me observar com a mão no queixo. Recuei meu olhar e voltei a prestar a atenção nos professores. O professor Pedro comentava os pontos positivos e negativos de cursar geografia e de ser professor. Logo após, foi a vez da professora Ângela de português falar um pouco de sua vida acadêmica e profissional
Nesse ínterim, questionava-me o que era tudo aquilo, mas tinha certeza que era bom, especialmente bom. Agradeci como se tivesse recebido alguma graça divina por aquilo e olhei de novo para ele. Alto, realmente alto, bonito, moreno, magro, olhos negros.
[...]
Contagem regressiva para o acontecimento...
5,4,3...
Era a primeira vez,
a primeira vez que iria amar,
o primeiro olhar.
[...]
Versos de um pequeno poema que escrevi, certa vez, ecoavam na minha mente. Era amor eu tinha certeza.
─ Não tanta certeza assim, mas fica mais bem escrito dessa maneira, o correto seria uma grande curiosidade pelo belo (nem tão belo assim) rapaz de bolsa laranja. Desconsiderem o exagero dele.
─ Ciúmes H.?
─ Nem em um milhão de anos.
─ Você não tem jeito mesmo.
Sem saber o nome ou a idade ou ainda onde morava, apaixonei-me pelo desconhecido atrasado do sábado (não falei?). Depois da aula sai de cabeça baixa sem falar com ninguém. Estava com vergonha de rever aquele olhar, tinha medo, angústia, mas principalmente amor. Amor que me fez sorrir o caminho todo antes de chegar a minha casa (ao estilo novela mexicana).
Na noite do sábado, quase não consegui dormir. Fiquei horas a fio pensando nele e como queria revê-lo mais uma vez. Perguntava-me “será que ele sentia algo por mim?”. Essa dúvida me deixou bastante preocupado. “E se ele não gostar de mim? E se ele não gostar de garotos? Se ele não me notar?”. Foram vários “se’s” que me ocuparam o resto da madrugada.
─ Você o conheceu “hoje”, seja menos dramático, Felipe.
─ Deixe-me continuar o relato H.!
─ Certo, certo, parei.
O domingo passou rápido e logo chegou à segunda. Quase não tive coragem de me levantar da cama, mas com muito esforço fui à aula. Depois de dois dias, ele continuava na minha cabeça. Queria que o sábado chegasse logo para ver ele de novo. A semana foi passando lentamente, pareceu uma eternidade.
Enfim era sábado. A minha ansiedade havia crescido cada vez mais. Só olhar para ele era o suficiente, pelo menos era o que eu pensava, para me satisfazer, para me deixar de pernas bambas e pensar mil coisas. A aula começou e nada dele chegar. Fiquei olhando no relógio todo o tempo a ponto de Sam’s (Samanta) me perguntar se estava esperando alguém. Desmenti e fiz alguma piada qualquer. Depois de um tempo, ele chegou. Novamente, atrasado ainda mais que do outro sábado. Estávamos na sala de português (local das aulas) ele chega com sua bolsa laranja e capacete na mão. Era incrível como eu achava aquilo tudo sexy. Ele se sentou na última cadeira da terceira fila. Lugar que não dava para olhar ele com frequência, já que eu estava na frente, por isso não prestei atenção em nada que os professores falaram. Apenas dava um tempo para ver ele, que quase toda às vezes retribuía o olhar. Aquilo me deixava louco. Principalmente, pela mão no queixo, como se estivesse me observando com muito cuidado. Dava para mergulhar naqueles olhos só em olhá-los.
─ Quase todas às vezes? Sei. Mentir é feio F.
─ Shiu, H.
A aula tinha acabado e eu já estava triste por não poder vê-lo um pouco mais. Fui andando para casa e pensado como seria ter meu primeiro beijo com a pessoa que amava. Mas no mesmo instante pensei de como minha família iria ficar decepcionada por saber que eu gosto de garotos. Isso me atormentou e me fez para um pouco de pensar no desconhecido.
─ Te atormenta até hoje, não? Gostar de garotos? Ainda ter amigo imaginário com 16 e ser totalmente virgem (em todos os sentidos)?
─ Um pouco, só a primeira das três. Ter um amigo imaginário não é de todo ruim. Ainda mais com um travesso e irônico. É divertido. E quanto a ser virgem, não acho que isso seja um problema.
─ ...
[...]
. Na noite daquele sábado, tentei dormir, contudo foi em vão. Não parava de pensar nele e ao mesmo tempo tentava parar de ter esses pensamentos, o que foi inútil. Passei a noite toda só pensando nele e conversando com meu amigo imaginário enquanto ele zombava do meu drama. Mas mesmo assim não pude evitar, afinal até o meu sonho foi sobre ele. No sonho, eu o observava e ele não me olhava. Eu estava triste e desviava o olhar.
As semanas logo passaram. Em todos os sábados eu o via chegar atrasado com sua famosa bolsa laranja e o capacete. Meus olhares se tornaram tristes. Não queria que os outros soubessem o meu estado, então, comecei a olhar para baixo com frequência. Os outros começaram a perceber que eu não estava bem.
Não dava mais vontade de ir à escola ou fazer qualquer coisa, mas decidi fingir que nada estava acontecendo. E nessa ideia fixa, passei a partir daquele momento a enganar meus sentimentos. Jurei para mim mesmo que não iria mais olhar para ele. Nunca mais mergulhar naqueles lindos olhos negros.
[...]
O tempo foi passando, lentamente, e as coisas foram se ajeitando. Os pensamentos que tinha sobre ele já não eram mais intensos como antes, mas sim, tristes, melancólicos e nostálgicos como se mesmo não o conhecendo eu sentisse um estranho sentimento de saudade, por algo que nunca tive. Por um amor que nunca tive.
. Depois daquele sábado, ele não apareceu mais nos aulões. Por um lado achei bom, porque seria quase impossível não quebrar o juramento que fiz. Por outro lado, fiquei triste por ele não aparecer mais.
Faltavam três meses para o fim do ano as turmas dos terceiros anos já se organizavam para festa de formatura. Seria uma segunda feira normal para mim se não fosse por um desconhecido desavisado que apareceu em plena manhã na escola. Eu estava saindo da aula de filosofia e quase esbarro em um garoto por estar olhando para lado, observando-o. Era ele em direção à sala de informática. Depois de tanto tempo sem vê-lo, todos os pensamentos antigos vieram à tona. E o maior deles era saber o seu nome. Essa vontade era tão grande que quase deu vontade de ir perguntar pessoalmente. Mas a minha falta de coragem venceu a determinação. Continuei meu caminho e ele o dele (deveria ter perguntado seu bobo, para ficar tão triste assim...).
No mesmo dia, o revi antes de ir para casa o que me fez pensar nele todo o caminho de volta. Tentei controlar os pensamentos e me focar no cursinho que já me tomava muito tempo, o que não ajudou muito. Eu já estava chateado com a EEPA, dos alunos, dos professores. Deu vontade de largar tudo, mas era apenas uma raiva momentânea. “Controle-se”, pensei, “controle-se”.
Depois disso, fui obrigado a vê-lo quase todos os dias (como se você não tivesse gostado). Certa vez ele quase fala comigo, ou foi essa impressão que eu tive, mas andei rápido e sai da sala de informática, por puro medo.
Depois soube que ele vinha quase todos os dias para fazer um o curso de inglês que eu tinha feito no segundo ano, segundo contaram Samanta e Iris, as informantes da escola. O professor Bruno responsável pela sala de informativa era também de inglês à noite.
[...]
Em meus pensamentos: “acho que perdi a oportunidade de saber seu nome nessa época. Ou até quem sabe ter um relacionamento. Se fosse reciproco o amor que eu tinha por ele. Sei que essa probabilidade é bem baixa. Não acho que alguém venha a se apaixonar por mim. E, além disso, eu não tinha coragem (nem tenho) de ser feliz, minha felicidade custa muito caro, prefiro viver a vida sem ser completamente feliz. Sem correr riscos. Uma vida linear sem altos nem baixos. Como de costume”.
[...]
─ Sorte que isso é uma grande mentira, não é F.? Você era muito bobo e dramático naquela época.
─ Realmente. Tenho que concordar.
─ Sorte sua eu estar ao seu lado.
─ Eu não diria sorte...
─ Ei!
─Mas obrigado, muito obrigado. Nunca foi solitário.
─ ...
[...]
Os meses passaram e minha tristeza só aumentou. O fingimento foi caindo por terra, faltando um mês para o fim das aulas ele começou a não vir mais de manhã, nem nos sábados.
Sem perceber entrei em um quadro de depressão. Ia para escola, mas permanecia calado ou longe dos amigos. Hora ou outra pensava nele e por que não tinha vindo mais nos sábados. As aulas estavam quase no fim e nada dele parecer. Fui ao último dia de aula com muita esperança de vê-lo na reunião de fim de ano, mas não o vi.
Fiquei muito triste, mas ao mesmo tempo me achava patético sofrer tanto por um amor que nem ao menos começou ou que eu nem sabia ao certo que existia. No fim, poderia ser um amor unilateral por um desconhecido que nem o nome eu sabia. Diferente do costume, H. já não zombava mais desses sentimentos, tinha se tornado uma ótima companhia, ainda que isso me afastasse um bocado do mundo real. Imagino qual seria a reação de Sam’s ou a de Rafael ao saber que com 16 anos eu ainda tinha um amigo imaginário tão presente. Ou que eu gosto de garotos...
[...]
As aulas em fim tinham acabado. Por um lado, estava aliviado, por outro a depressão foi se agravando. Tanto pelo fato de gostar de garotos como por causa dele. Tentei algumas coisas como o meu corpo que me envergonho agora. Se matar foi uma delas. Na mais efetiva, tomei remédios para dormir, mas não surtiu o efeito que desejei. Apenas tive um bocado de vergonha. Comecei a ir a médicos, psicólogos e psiquiatras e sempre mentia sobre a causa de tanta tristeza. Fui melhorando aos poucos. Mas depois minha mãe me fez mudar de médico, o que ocasionou uma piora momentânea, já que ele me forçou a contar a verdade e eu não queria. Parei de ir para os médicos. Deixei de falar com as pessoas, com os amigos, a família, todos. Basicamente, só comia ficava no computador, lendo livros e dormia. Passei um bom tempo assim, pois não queria que ninguém soubesse. Na época me sentia de alguma forma sujo, enojado, tanto pelo meu corpo como pelos meus desejos. Erem sentimentos complicados que alteraram completamente a forma como eu me via. Aquele garoto alegre e um pouco sincero demais tinha se tornado reticente, não mais olhava nos olhos dos outros e tentava ser o mais invisível possível.
Essa situação perdurou por alguns anos, mas fui melhorando aos poucos ainda que a passos curtos.
[...]
─ Agradeça ao seu Chapolin Colorado.
─ Obrigado, Chapolin.
[...]
Toda a situação parece um exagero sem precedentes ao ser relembrada, afinal era só no máximo um amor platônico, mas pensando bem havia um fato que eu tentei me esquecer: eu continuava gostando de garotos.
Além disso, no presente, ainda penso nele (às vezes), mas vejo que não vale a pena me autodestruir por um amor unilateral que é impossível se concretizar. Vou seguindo a minha vida à medida que os dias passam. À medida que me aceito mais o que sou sem me sentir “sujo”. À medida que o amor diminui. Até um dia que não pensarei mais nele. Meu primeiro amor ou ao menos minha primeira paixonite. Como H. fala meu primeiro grande alvo de guerra.
[...]
Hoje, faz mais de dois anosdo começo de tudo isso. Tudo mudou. A família, os amigos. A vida. Sinto-me feliz como a levo agora. Falo com as pessoas, saio de casa vou às festas, vou aos médicos. Sinto-me normal. Não penso muito nele. Vejo que todo aquele amor fez mal, minha decisão pode ter sido errada, nunca saberei o que teria acontecido se tivesse falado com ele ou entregado uma carta de amor. Poderia ter sido rejeitado, o que me dava medo, mas também ele poderia aceitar meu amor. Nunca saberei. Nunca saberei se isso tudo foi só coisa da minha cabeça. Esse é o preço da covardia, devo arcar com ela. Agora devo resolver mais algumas pendências da vida. Não me sinto obrigado a contar a ninguém minha condição, mas se for para tirar um pouco o peso dos ombros não faz mal confiar e contar toda essa história para alguém além do meu amigo imaginário ou do meu relicário.
[...]
Continuo sem saber seu nome, onde morava, ou a sua idade. Nada sobre ele. Só que costumava se atrasar, que carregava uma bolsa laranja e um capacete. Nada, além disso. Saber mais poderia me fazer mal. Agora espero o tempo passar mesmo com medo do futuro. Com medo do amor, de se apaixonar, de sofrer. Prometi para mim mesmo que não me apaixonaria por mais ninguém. Dói saber que tudo isso aconteceu por um primeiro olhar de curiosidade que ocasionou o primeiro e falho amor. Claro que essa promessa é só da boca para fora, um drama mexicano, segundo H. Nessa questão, tenho que concordar com ele, mas como as novelas mexicanas a vida pode ter muitas surpresas. Até mesmo uma bolsa laranja pode reaparecer ainda que atrasado como de costume. Mas isso já é outra história...
[...]