Me refugiei na casa do William, não era um sentimento de alívio, de liberdade, mas sim algo ruim, uma espécie de calafrio e medo que me preocupavam o tempo todo.
Eu não saía para fora de casa, o máximo que conseguia fazer, era levar o lixo até a lixeira que ficava na esquina. A Sara foi me visitar com a Luma e insistiu que eu voltasse a viver normalmente, que eu deveria parar de me preocupar, pois, eles não fariam nada de ruim.
Elas estavam erradas.
Passaram-se dez dias, minhas roupas estavam na casa do William, alguns pertences pessoais e eu estava me adaptando a minha nova vida ao lado daquele que fazia das tripas coração, para me deixar a vontade e feliz.
Eu estava feliz, mas o medo ainda me impedia de ir mais além, e me entregar de cabeça na relação.
Um passo errado e aqueles três demônios que caçariam como uma lebre na floresta.
O Gabriel me ligou:
- Henrique, até quando você vai brincar de policia e ladrão? Meu pai já está começando a ficar irritado com você. Ele não vai te perdoar se você não voltar pra casa!
Ele falou aquelas palavras tão calmamente, como se estivesse conversando sobre futebol ou uma novela qualquer.
Era frio e bastante calculista, soou quase que como uma brincadeira. Eu respondi:
- Gabriel eu não vou admitir que você faça ameaças, não falei de vocês até agora, mas se você continuar com isso, eu escancaro com tudo. Você e o Jean são tão ruins quanto eu, o fato de ser o ativo agressivo não faz de você um macho e sim um gay assim como eu e o William, e acredito que o "seu pai" não irá gostar dessa história.
Ele: Você é idiota mesmo garoto! Dr. Roberto não vai me ouvir, não vai ouvir o Jean e muito menos as meninas ou nossa mãe. Eu estou tentando te ajudar Hick, pra mim, pouco importa se você está com o William ou com a puta que o pariu. Vou estar aqui para quando você quiser, não foi eu quem começou isso tudo, foi você, foi você que me fez ser assim, te desejar tanto que me faço violento. Mas dessa vez o seu problema é com o velho, e eu não vou entrar no meio disso, é melhor você voltar para casa enquanto é tempo.
Ele pareceu nervoso no telefone, mas não dei muita atenção. Dava para ouvir a respiração dele do outro lado da linha, segurei o telefone na mão por algum tempo antes de desligar, talvez ele estivesse dizendo a verdade ou não, talvez fosse outro jogo deles, já que eu não lembrava de muita coisa com relação a minha intimidade com meu pai.
O fato é que eu me sentia num beco sem saída, virando em volta a meu próprio corpo.
Foi numa quinta feira a tarde que recebi outra ligação, agora do meu pai.
- Seu maldito, filho de uma puta, você vai voltar para sua casa hoje, hoje, você está me ouvindo? Seu namoradinho vai ter um contratempo, vou te mostrar do quê sou capaz.
Ele gritava no telefone que quase pedi para desligar, pois, eu poderia ouvi-lo da janela.
- Pai eu não vou voltar, não adianta fazer ameaças.
Falei aquilo e parece que o homem encorporou o demônio e gritou ainda mais:
- Você vai dizer que não quer mais ficar aí, vai pegar suas coisinhas, sua troxinha de roupa e vai voltar pra cá. Vai terminar sua sociedade com ele, vai dar uma desculpa qualquer ou eu não respondo por mim. Mas você quer me desafiar não é moleque, pois bem!
Naquela tarde no farol, o carro do William foi parado por quatro rapazes trajando roupas escuras em duas motos.
Dois deles entraram no carro e apontaram uma arma em sua cabeça, fizeram ele mudar o rumo da rota e o levaram até uma rua afastada e menos movimentada.
Eles bateram no William de todas as formas que você possa imaginar, o deixaram apenas de cueca e meias pela estrada.
- Vai ralando peito rapá e não olha para trás, ou eu pipoco a sua cabeça de bala, entendeu?
Ele caminhou por algumas horas pela estrada escura, de cueca e meias sem saber muito bem onde estava, até avistar ao longe, um clarão de luzes numa casa que parecia estar bastante movimentada.
Chegando nessa casa, um senhor veio atendê-lo, estava tendo uma festa infantil e por isso o senhor pediu que ele entrasse pela porta dos fundos, lhe entregou roupas e também o telefone para que pudesse ligar para a polícia.
Logo em seguida ele me ligou e me contou sobre o ocorrido, eu não sei dirigir e tenho medo, liguei para a Sara e o Matheus e pedi que me levasse até o endereço.
O Matheus foi me buscar e foi comigo até lá para buscar o William, no caminho ele sugeriu que eu sabia o porque de tudo aquilo e de fato eu sabia, mas não queria aceitar, que tinha sido a mando do meu pai.
"Eu fazia parte da família do poderoso chefão, e o meu pai era louco"!
Pegamos o William no endereço e seguimos para a delegacia, encontraram o carro dele intacto alguns quarteirões do local que o deixaram.
O próprio policial que nos atendeu, perguntou se o William tinha alguma rixa com alguém, algum mau entendido, pois aquilo parecia ser um avisou ou uma espécie de vingança ou susto.
- O Senhor brigou com alguém ou tem algum inimigo, Senhor William? Conhece ou sabe de alguém que poderia ter feito isso com o Senhor?
William foi assaltado, mas o que ele não sabia é que foi armação do meu pai.
Ladrões contratados por ele para me mostrar que se eu não fizesse o que ele mandava eu poderia perder o meu grande amor.
Nós o levamos até o hospital e naquela noite eu liguei para o meu pai e pedi a ele que revesse sobre a ideia de me fazer voltar e nôs deixassem em paz, mas ele riu e me deu três dias para deixar a casa e a vida do William ou não teria outra opção a não ser nôs separar de uma forma mais dolorida.
Fui até o banheiro do hospital e me desmontei no choro e na frustração de não poder fazer nada contra aquele velho satânico.
Nas palavras do meu pai:
- Luiz Henrique eu já vivi minha vida, te dei educação, te dei tudo do bom e do melhor, você nunca precisou se rebaixar para ninguém e olha como você me agradece? Indo se deitar com outro homem! Você poderia ter a mulher que quisesse, mas prefere uma rôla.... Você tem até domingo para voltar, ou não terá outro aviso! Eu mando matar o William, coisa que eu deveria ter feito a muitos anos atrás.
- Eu me lembrava daquelas palavras e chorava ainda mais, até ouvir o Matheus bater na porta dizendo que o William já estava liberado para ir para casa.
Ele nos levou até o apartamento do William e na porta antes de se despedir ele me perguntou:
- E aí? Você e eu sabemos quem foi o autor desse "falso assalto". O que você vai fazer Hick?
Eu: Não sei Matheus, não sei! Se eu voltar pra lá eles vão montar nas minhas costas e vou só confirmar que realmente sou um fraco.
Ele: É, mas você não tem outra opção! Quando o Roberto quer, ele quer e tem que ser feito. Se você contrariar ele machuca sem dó, acho que essa parte você ainda não lembrou né? As lembranças que mostram toda a autoridade e tirania do seu pai! Vou te dar um conselho cunhado... Volta para sua casa, e, lá você pensa numa maneira de se livrar dessa obsessão do seu pai.
O Matheus me deixou ainda mais apreensivo.