Narrado em terceira pessoa.
- C-calma pai,eu posso explicar- Gabriel falou enquanto começou a tremer.
- Explicar o que? O inexplicável?- Miguel também tremia, porém de raiva.- EU NÃO ACREDITO QUE EU PAGAVA AQUELA DROGA DE ACADEMIA, PRA VOCÊ FICAR SE ESFREGANDO COM AQUELE OUTRO VIADO!!!- O tapa que Miguel deu no seu filho caçula com a costa de sua mão, fez com que seu rosto virasse para o lado.
-AAAAH- O menor deu um grito de dor e começou a chorar.- P-pai, por favor, não faz nada comigo, eu ainda sou seu filho, vamos conversar...
- Meu filho? MEU FILHO? Eu não tenho filho bicha não!- Ele deu outro tapa no rosto do filho, que cortou o canto de seu lábio inferior.- Eu tenho é nojo de você, moleque!- Os olhos de Miguel transpareciam ódio. O choro de Gabriel se intensificou.- E sabe quem mais deve ter nojo de você? Deus. Ele deve ta la no céu te olhando decepcionado. Mas eu vou tirar esse teu demônio nem que seja no tapa.
- Não fala assim pai, eu amo o senhor, não me trata assim...- O peito de Gabriel doía só de ouvir aquelas ofensas. Ele admirava tanto o pai, que não aguentava passar por aquilo.
- Se me amasse, não seria essa aberração!
- Mas eu não tenho culpa de ser assim, pai. Eu nasci assim.
- Nasceu assim? Então quer dizer agora que a culpa é minha e da sua mãe?
- Não, pai. Claro que não. Eu continuo sendo o mesmo, só não gosto de meninas.
- Ah mas vai aprender a gostar, nem que pra isso eu tenha que te dar uma surra, seu viado!- Miguel levantou o filho pelo colarinho da camisa e começou a socar o seu rosto, como se estivesse batendo em alguem do seu tamanho, esquecendo-se que aquele que apanhava era seu próprio filho. O pequeno, por sua vez, gritava desesperadamente para seu pai parar, seus gritos podiam ser ouvidos por qualquer um que passasse na rua naquele momento.
- AAAAAAAH, PARAAAAAA- Gabriel gritava tanto que sua garganta doía. Seu pai o jogou no chão, como se fosse um boneco de pano, pegou o cinto e começou a bater nele. Ele já estava fora de si e se ninguém interferisse ali, ele seria capaz de matar o próprio filho. Foi quando Miguel sentiu alguém dando um soco em seu rosto que fez com que ele se afastasse do corpo de Gabe. Era Gustavo. Ele ficou entre o pai e o irmão.
- VOCÊ FICOU MALUCO? VOCÊ VAI MATAR ELE!- Gustavo estava horrorizado com a atitude do pai.
- É ISSO QUE ELE MERECE, PRA APRENDER A VIRAR HOMEM.- Miguel, ainda fora de si, começou a andar em direção ao filho mais velho. Esse por sua vez, tirou uma faca da cintura e apontou para o próprio pai.
- NÃO SE APROXIME DE NÓS, OU EU NÃO SEI O QUE SOU CAPAZ DE FAZER COM VOCÊ!- O primogênito sabia que não teria chances contra o próprio pai, então pegou uma faca grande da cozinha pra se prevenir e fez certo. - VOCÊ NÃO VAI MAIS TOCAR UM DEDO NO MEU IRMÃO, OU EU JURO QUE ESQUEÇO QUE VOCÊ É MEU PAI!!- Sua mão tremia enquanto segurava a faca. Ele estava muito nervoso e com medo. Gabriel estava deitado no chão e chorava muito, seu rosto estava irreconhecível!- Gabe, você acha que pode levantar?- Gus perguntou ao seu irmão mais novo sem tirar os olhos do pai, que mais parecia um monstro. Com muita dificuldade, o menor acenou positivamente. Ele foi levantando vagarosamente, pois estava muito tonto e se colocou atrás de seu irmão mais velho.- Chega para la!- Falou ainda apontando a faca para o pai.- Eu tenho vergonha de ser seu filho; nojo de um dia já ter te chamado de pai. Você é um monstro isso sim! Que espécie de pai é essa que espanca os próprios filhos? Se um dia, Deus me livre, eu for um pai igual a você, eu me mato! E se depender de mim eu nunca mais olho nessa sua cara, to indo embora daqui, pra nunca mais voltar. Você foi a maior decepção da minha vida!!- O filho mais velho de Miguel despejou tudo o que estava engasgado em sua garganta desde que ele tinha apanhado do pai e agora vendo seu irmão naquele estado, não exitou em jogar umas verdades na cara de seu progenitor que ficou sério e calado diante da situação. Era impossível imaginar o que se passava em sua cabeça naquele momento.- E outra coisa, quem é você pra dizer que Deus tem nojo do meu irmão? Ele deve ter nojo é de você que não tem um pingo de amor no coração. Vamos, Gabe.- Com cuidado, eles foram saindo do quarto e Gustavo a todo momento com a faca estendida.
Eles chegaram na garagem e o mais velho jogou a faca por ali mesmo. Logo entraram no carro de Gustavo, saindo da casa imediatamente. Gabriel Não parava de chorar escandalosamente um minuto sequer, seu choro vinha acompanhado de gritos de dor. No meio do caminho Gustavo não aguentou e uma lagrima, que ele lutava muito para segurar, caiu de seu olho. Ele então mordeu o próprio antebraço com força e abafou um grito. Era um misto de sentimentos: raiva, tristeza preocupação, medo e desespero. Gabriel estava quase desmaiando de dor.
- O papai descobriu tudo, Gus. Descobriu de mim e o Ricardo, da pior forma possível. Minha vida ta acabada!- Gabe falava já de olho fechado. A frase era consciente, mas a aparência dele era de alguem que estava delirando.
- Aguenta firme irmãozinho. Não dorme, por favor.- Ele falava e mexia no ombro do irmão.
- Eu não aguento mais, faz parar de doer por favor!- Gabe gemia de dor. Gustavo estava de coração quebrado vendo o irmão naquele estado. Ele dirigia o mais rápido que podia, porém um sinal vermelho fez com que ele parasse.
- DROGA!- Ele esmurrou o volante. Vendo que o rosto do seu irmão não parava de sangrar, ele tirou sua camisa e deu para o menor.- Toma, segura isso no rosto e pressiona, assim o sangue estanca.- O menor seguiu as ordens, apesar de estar fraco. Gustavo tentava parecer forte, mas por dentro estava perdido e com tanto medo quanto Gabriel.
Ele chegou em uma Unidade de Pronto Atendimento, pois o hospital do plano de saúde estava muito longe e sua mãe estava la de plantão e ele não queria ter que explicar toda aquela situação para ela. Assim que estacionou, o caçula da familia não resistiu e desmaiou. Gustavo teve que entrar no hospital com o irmão no colo. Seu desespero era nítido.
- Pelo amor de Deus, alguém me ajuda aqui!- Falou alto assim que chegou na recepção. Prontamente alguns enfermeiros surgiram com macas e o levaram para uma área onde o estudante de direito não tinha acesso. Ele não insistiu em tentar entrar, colocou a cabeça no lugar e primeiro fez a ficha de entrada do irmão no hospital, na recepção. Depois ligou para a única pessoa que ele sabia que poderia confiar naquele momento.
- Alô? tio Alê?- Sua voz deixou transparecer de cara que algo ruim tinha acontecido.
- Com licença senhores.- Ele estava no meio de uma reunião importante da empresa.- Gustavo, aconteceu alguma coisa?- A voz de Alexandre demonstrou preocupação.
- Tio, por tudo o que é mais sagrado vem agora pro hospital (falou o endereço do hospital) Eu preciso do senhor aqui agora com urgência. Quando o senhor chegar eu explico tudo.
- Ta bem, to indo. Tenta ficar calmo.- Alexandre desligou o celular.- Sinto muito pessoal, mas essa reunião terá que ser adiada.
- Mas Doutor Alexandre, isso aqui é import...
- O que eu tenho que fazer agora é bem mais importante.- falou cortando um acionista.- Depois entramos em contato.- Falando isso saiu da sala de reuniões da sua empresa que também pertencia a Miguel. Ele passou pelas pessoas como um furacão, até que conseguiu chegar ao estacionamento.
Alê saiu em disparada em direção ao hospital. Chegando na recepção viu Gustavo sentado. O sobrinho quando avistou o tio saiu correndo em direção ao mesmo e o abraçou com muita força. Ali Gustavo desabou. Toda força que ele demonstrou, ou tentou demonstrar, na frente do irmão, foi por água abaixo.
- Tio, o Gabe, tio...- Gustavo chegava a soluçar no peito de Alexandre. Toda a sua vulnerabilidade foi exposta naquele momento.
- Calma, meu anjo. O que foi que aconteceu com seu irmão?- O arquiteto ficava cada vez mais preocupado, principalmente por nunca ter visto seu sobrinho postiço mais velho naquele estado.
- O p-papai... espancou e-ele...- Ele respirava pesado, suas mãos estavam trêmulas. O coração de Alexandre pareceu parar.
- Como é que é? Que história é essa?- O queixo de alê caiu quando ele ouviu aquela frase.- Vem cá, vamos pra um lugar mais reservado para você me contar isso direito.- Foram pra um canto do hospital, com Gus abraçado ao tio. O pavor que ele sentia não deixava ele desgrudar de Alexandre.- Me explica isso.
- Ele descobriu que o G-Gabe é... gay.- Alexandre não se surpreendeu com aquilo pois já suspeitava que o sobrinho era homossexual, o que pra ele não tinha problema algum, pois ele amava Gabe independente de qualquer coisa, assim como amava os outros filhos de Miguel.- A-ai ele não aceitou e começou a bater no meu irmão, mas quando eu cheguei ele já tinha batido muito nele. Seu rosto estava todo ensanguentado e tem marcas de cinto por toda parte.- Alê estava horrorizado com tamanha violência.
- Meu Deus do céu...- Sua boca estava aberta.
- Ele só parou porque eu cheguei e estava com uma faca da cozinha que apontei para ele. Você tem noção de como eu estou me sentindo? Eu apontei uma faca para o meu próprio pai!- Gustavo tremia como nunca.
- Não da pra acreditar em uma barbaridade dessas.- Alexandre estava com um sentimento novo. De preocupação e pena, ele começou a sentir raiva.- O Miguel só pode ter ficado maluco.- Nesse momento Gus começou a sentir uma falta de ar muito grande. Ele não sentia isso desde criança quando tinha asma, que foi curada graças à natação.- Você está bem?- O tio viu que o sobrinho não conseguia respirar.
- Eu... estou... passando... mal...- Essa frase quase não saiu.
- Moça por favor me ajuda!- Alexandre disso a uma enfermeira que passava por ali naquele momento.
- Essas mãos tremendo e essa falta de ar... ele está tendo uma crise nervosa.- Eles levaram Gustavo para um leito e ela injetou um calmante na veia dele.
- Eu tô com medo tio.- Essa versão de Gustavo não lembrava em nada aquele cara forte e seguro de si. Ele parecia uma criança com medo do escuro. Ele segurou com força na mão do tio.
- Shiii... vai ficar tudo bem.- O medicamento foi fazendo efeito em Gus e seus olhos foram fechando.
- Cuida do Gabe, tio...- Foi tudo o que ele conseguiu falar antes de dormir.
Alexandre se dirigiu à recepção do hospital e buscou mais informações sobre o seu sobrinho mais novo.
- O medico está agora colocando pontos no seu supercílio, no canto de sua boca e um pouco abaixo do seu olho. Logo após será feita a limpeza dos ferimentos do paciente e em seguida os curativos. Por fim, vamos dar remédios analgésicos e anestésicos para que ele não sinta dor logo de imediato.- Informou uma enfermeira que tinha sido chamada pelo recepcionista. Em seguida surgiu uma outra mulher vindo por trás dela.
- Olá, eu me chamo Cláudia e sou assistente social aqui do hospital. Vi pela ficha do paciente que ele chegou aqui com o irmão mais velho e que foi espancado. Você por acaso é responsável do garoto e sabe quem fez isso com ele?
- Não, eu sou apenas um amigo da família e o problema ta justamente na família. Foi o pai dele que fez isso com ele.- Doeu no amigo de Miguel ter que falar aquilo em voz alta. Claudia mostrou-se indignada.
- Eu vou ligar para a polícia imediatamente. Você não pode sair daqui, vai servir como testemunha. Eu vou entrar com um processo na vara da infância e da juventude, pedindo a guarda provisória dele para o Estado e logo que ele sair daqui será encaminhado a um abrigo. Esse menor não pode mais ficar em posse de sua familia.- Falou colocando o telefone no ouvido, entrando em contato com quem resolveria aquele caso. Ela passou os dados de Gabriel por telefone mesmo e após alguns minutos desligou.- Acabei de descobrir que esse garoto já registrou um b.o por agressão antes e que a assistente social da delegacia deixou sob advertência nos arquivos, que esse pai deveria ficar sob observação de seus comportamentos. Creio que será praticamente impossível agora ele recuperar a guarda do filho e é quase certeza que ele seja preso e acredite, eu não vou descansar enquanto não o ver atrás das grades!
- Sobre essa questão da guarda, eu tenho interesse em ficar com a guarda dele.- Alexandre falou meio sem pensar, pois não poderia deixar que Gabriel, alguem que ele tem como filho, fosse encaminhado a um abrigo ou orfanato.- Entenda, eu o conheço desde que nasceu, tanto ele quanto a seus irmãos. Facilitaria e muito que eles chegassem a idade adulta morando comigo.
- Eu recomendo que o Senhor procure um advogado o quanto antes então. Ele saberá lhe guiar em relação a isso.
- OK então, obrigado pela informação.- Alexandre se afastou da recepção e do lado de fora ligou para Mauro, seu advogado. Ele explicou toda a situação.
- Bom, você vai ter que entrar com um requerimento da guarda. Você obviamente vai passar por testes psicológicos pra saber se está apto pra cuidar desse menor de idade, além de averiguarem questões financeiras e entrevistas com o garoto pra ver se ele aceita morar com você. É basicamente como se fosse um processo de adoção, só que mais rápido.
- Outra coisa, ele tem outro irmão que é menor de idade. O que vai acontecer com ele?- Perguntou se referindo ao Max.
- Se você tiver disposto a pegar a guarda dele, é o mesmo processo, senão ele vai ser encaminhado a um abrigo também. Porem, vale ressaltar que nos dois casos, se eles tiverem parentes dispostos a pegar a guarda deles também, vocês terão que brigar na justiça por eles.
- Entendi. Você pode então dar entrada nesse processo pra mim imediatamente, Mauro. Quero pelo menos a guarda provisória. Não quero meus sobrinhos em nenhum abrigo. E me liga assim que possível.
- OK, tchau.- Alexandre voltou pra dentro do hospital e foi pro quarto onde Gustavo estava sedado. Ele foi abrindo os olhos aos poucos até lembrar o porquê de estar ali e tentar se levantar abruptamente do leito.
- Ei, calma ai, garoto!- Alexandre o segurou pelos ombros, tentando deitá-lo novamente.
- Não, tio. O meu irmão... e-eu preciso cuidar dele e proteger ele daquele monstro.- Gustavo tentava se soltar.
- Olha, ta tudo sob controle, viu? Seu pai não vai mais fazer nada contra vocês. A policia já esta envolvida. Agora é só esperar!
- Eu vou ligar pro Ricardo. Ele tem que ficar sabendo.- Vendo a cara de confuso de Alexandre, Gustavo explicou.- É o namorado dele e meu melhor amigo.- Gus ligou pro cunhado e o chamou para ir até o hospital onde ele estava. Esse por sua vez chegou la super rápido.
- O que aconteceu cara?- Ricardo estava claramente preocupado. Seu melhor amigo o explicou o que aconteceu e à medida que os fatos iam sendo relatados, uma raiva, um ódio mortal ia subindo em Ricardo. Seus punhos foram fechando-se e seu maxilar ficou contraido.
- Onde o Gabriel está?
- Os médicos estão cuidando dele. Não podemos vê-lo agora.- Alexandre respondeu e Ricardo saiu do quarto sem falar nada. Seu rosto era puro ódio. Ele saiu do hospital e entrou em seu carro.
- Não acredito que aquele desgraçado fez isso.- Falou enquanto dirigia.- Machucou o meu príncipe, o meu amor.- Uma lagrima de raiva escorreu pelo seu rosto.- Mas ele vai me pagar... ninguém mexe com a pessoa que eu amo e sai assim... eu vou te vingar meu amor, Eu juro!- Ricardo estava fora de si. Ele só conseguia pensar em fazer Miguel sofrer. Ele parou o carro em frente à casa de Gabriel e tocou a campainha.
- Já vai! Ouviu o pai do seu namorado gritar de la de dentro.
- Vem mesmo, filho da puta! Vem que é agora que eu acabo com a tua raça!- Sussurrou para si mesmo.