Agradeço novamente ao carinho daqueles que leram meu último episódio, em especial a K-elly e Lukas S.
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Marcos passou pela cozinha, sinalizou com a cabeça para que Sueli seguisse-o para o porão. Sempre que havia algo de importante para falar com a esposa este era o local escolhido. O porão era isolado acusticamente, uma vez, que servia de estúdio de música para as lições de piano de Diego e saxofone de Débora que já havia deixado os estudos de sopro à alguns meses dizendo não mais se interessar por aquele instrumento, passando então a estudar bateria.
Aguardando a esposa passar e fechando a porta com uma certa violência, iniciou com um olhar cortante, lançando sobre Sueli toda sua raiva, até então ainda não explicada.
- Você tem noção do que acabei de ver enquanto procurava por Zeus? - Zeus é o cachorro de Débora que havia escapado naquele mesmo dia mais cedo.
- Pode se acalmar e me dizer do que se trata, você está me assustando, o que foi que aconteceu? - Olhando com uma expressão de medo e pavor no rosto, se aproximando do marido.
- É para se assustar mesmo, estava eu passando pela rua aqui de trás, na parte mais afastada e vazia próximo da entrada que dá acesso as trilhas para a Colina Hudson, e eis que me deparo com nosso filho, sendo beijado e suspenso no ar por aquele outro pirralho filho do Mettews e da Melissa Ross, diz pra mim, o que está acontecendo com o Diego? - Esbravejava e sacudia as mão no ar freneticamente.
- Meu amor se acalme, eles são dois meninos apenas. Estão tentando descobrir-se no mundo. - Tentando acalmar as coisas, pegando nas mãos do esposo.
- Se acalmar? - Perguntou ele furioso soltando as mãos recém pegas por Sueli - Você perdeu o juízo mulher, meu filho por ai, se esfregando em outro moleque. Meus Deus o que meus amigos vão pensar, nossos vizinhos e já pensou em nossos familiares? - Encostando de costas na parede, deslizando até chegar o chão, já aos prantos com as duas mãos no rosto.
- Não estou acreditando no que ouço sair de sua boca Marcos. - Afastando-se do marido com um olhar de muito desprezo e surpresa - Sempre te achei conservador em suas atitudes, más jamais pensei que colocaria sua maldita imagem a frente de nossos filhos - Saiu do porão e fechou a porta com tal força que o barulho pode ser ouvido por Diego, que encontrava-se em seu quarto de porta fechada.
Dr. Marcos é um advogado muito respeitado e conservador, além de advogar ele também é professor na Universidade Federal da cidade, ensina Direito internacional. É muito ligado a família, do tipo que se deixa levar pela opinião que os demais tem sobre as coisas, principalmente amigos e familiares. Trabalhou muito para construir uma imagem de homem honesto, trabalhador e pilar da sociedade, pensar em se tornar assunto nas rodas sociais, lhe causava muito sofrimento, principalmente por que sempre foi extremamente conservador quanto as questões sociais que também tinham implicações religiosas.
Encolhido sob um edredom estava Diego. Coração doendo, lágrimas rolando sobre seu pequenino nariz. Em posição fetal - soluçava - chorava e sem poder se conter gemia. Pensando que talvez nunca mais pudesse ver Rapha - Seu pai estava uma fera e com certeza o proibiria de sair de casa por semanas - Porém, ainda haviam as aulas, poderiam se ver na escola entre as aulas ou no intervalo.
“Ótimo Diego, ótimo plano, vê-lo por 15 minutos por dia. E nos fins de semana? Genial solução”.
Toc toc toc! Pode ouvir alguém bater suavemente na porta de seu quarto.
- Pode entrar! - Disse ele sem mover-se na cama.
- Oi querido, você está bem? - Dona Sueli sempre amorosa, sentou na cama, fazendo carinhos na perna do filho.
- Não mamãe, estou péssimo! - Aos soluços, agarrando o pescoço da mãe em um salto - Papai nunca mais me deixará sair de casa, não é?
- Não meu amor, não pense nisso agora, ele só está um pouco confuso. - Abraçando-o e acariciando-lhe os cabelos estranhamente bagunçados em um dos lados.
- Ele não disse uma única palavra depois que entrei no carro, e me mandou para o quarto apenas apontando para a minha porta. - Ainda aos soluços, sem soltar-se de sua mãe.
- Sabe que seu pai é muito explosivo, ele não queria fazer nada de que se arrependesse, ele está chateado e com raiva. Então preferiu não falar com você naquele estado. - Tentando acalmar Diego, que a esta altura já não apertava tanto o pescoço da mãe.
- Não entendo por que ele está tão bravo, eu e o Rapha gostamos um do outro, o que há de errado nisso? - Soltando o abraço para poder olhar nos olhos de Dona Sueli.
- Não há nada de errado em vocês se gostarem, não mesmo! Porém, ainda existem pessoas que condenam o amor entre pessoas do mesmo sexo e seu pai teme muito por você. - Segurando o rosto do filho com ambas as mãos e dando-lhe um beijo na testa, em seguida, lhe abraça forte - Tenha paciência com seu pai, ele ainda não consegue lidar bem com essa situação, é tudo muito novo para ele, ok?
- Será que ele pode ser paciente comigo? Tudo é muito novo pra mim também. - Apoiando o rosto no ombro da mãe.
- Espero que sim filho, ainda acredito que seu pai irá mudar de opinião. - Encostando a cabeça no filho.
Raphael em sua casa não podia mais aguentar a mãe cantarolando aquelas musicas dos anos 70 sem parar, era a última semana de férias dela. Só conseguia pensar que o rádio podia explodir, queria apenas ficar no quarto em silêncio. Seu coração parecia estar congelado, a dor que os pensamento lhe traziam eram quase insuportáveis. Queria muito ver Diego, o vazio que aquele garoto estava causando a ele era muito doloroso, antes não tivessem se conhecido, antes não tivessem ido para Colina Hudson no dia anterior.
- Raphael! - Gritava a mãe esmurrando a porta.
- O que é mãe? Enlouqueceu? - Berrou ele levantando da cama, vestindo apenas uma cueca e uma regata bastante justa ao corpo.
- Não, eu não enlouqueci, más Vossa excelência parece estar sofrendo de amnésia não é? Ou já terminaram as aulas em Agosto? - Totalmente debochada, com os dedos entre os cabelos, que estavam exageradamente bagunçados, fazendo cara de maluca ao encarar o filhos.
- Ah meu Deus, que saco! Eu não quero ir hoje mãe, por favor! - Virando as costas e mergulhando novamente em sua cama.
- Nada disso mocinho, já para o chuveiro, o almoço já está pronto - Pegando o filho pelo braço e o acompanhando para o banheiro.
- Tudo bem, já estou indo pode me largar por favor, preciso pegar uma toalha e meu uniforme. - Sem animo algum, voltou ao guarda-roupas e pegou uma cueca, a sua toalha do homem aranha e o uniforme.
A caminho da escola ele se tocou de que se existia um lugar em que ele ainda podia ver Diego era lá. Em minutos seu humor deu um salto de qualidade impressionante. Ele passou a cantarolar e dançar timidamente pela calçada.
But girls they wanna have fun
Oh girls just wanna have
That's all they really want
Some fun
When the working day is done
Oh girls... they wanna have fun
Oh girls just wanna have fun
Ele adorava Cyndi Lauper, esta música em particular lhe lembrava quando morava em Phoenix - Arisona, ainda com seus 5 anos. Raphael tem dupla cidadania já que sua mãe é brasileira e seu pai é Norte Americano, Rapha nasceu nos EUA, más mora no Brasil desde que tem 7 anos e meio.
Olhava o seu relógio a cada instante, 15:20 era o que mostravam os ponteiros. Seu coração pulava no peito como pipoca. A ansiedade era tanta que ele levantou a mão:
- Professora? - Disse ele inquieto.
- Sim! - Respondeu ela virando para ver quem a chamara. - Diga Raphael!
- Posso ir a diretoria preciso falar com a diretora um assunto relativamente importante. - nervoso e exasperado.
- Não quer esperar para ir depois do intervalo? - Disse ela parecendo realmente acreditar naquela lorota.
- Prefiro resolver isso o mais breve possível, posso ir? - Tentando manter a calma e não demonstrar sua total falta de vergonha na cara.
- Ok, pode ir! Más terá que pegar os exercícios com um de seus colegas, iremos corrigi-los na próxima aula - Voltando a escrever no quadro.
Saiu correndo pelos corredores em direção ao patio central, que ficava ao norte da escola, próximo a cantina. Chegou ao bebedouro, bebeu um pouco de água. Comprou um refrigerante e um sanduíche, sentou-se em um dos bancos a espera de Diego. Conferiu o relógio novamente, as horas pareciam se arrastar, 15:28, era o que mostrava o antigo e prateado relógio que havia ganhado de presente do seu avô ao completar 12 anos.
Enfim, pode ouvir:
Because I'm happy
Clap along if you feel like a room without a roof
Because I'm happy
Clap along if you feel like happiness is the truth
Because I'm happy
Clap along if you know what happiness is to you
Because I'm happy
Clap along if you feel like that's what you wanna do
Essa era a música que tocava sempre que os alunos eram liberados para o intervalo. O silêncio foi quebrado por uma massa ensurdecedora de alunos berrando, saindo enlouquecidos de suas salas e correndo pelos corredores. Pareciam estar sendo libertos de uma prisão, uns pulando nas costas dos outros, alguns jogando grandes bolas feitas de papel e outros apenas seguindo em direção a cantina, com aquelas caras horríveis de fome. Para Raphael aquilo tudo não importava nada, ele apenas buscava entre a multidão por Diego, que para sua surpresa não aparecia entre aquela multidão de alunos. Muito inquieto, não conseguia nem ao menos comer o seu lanche.
- Hey Rapha, colé brow! - Chegando por trás e fazendo ele pular no banco.
- Hey Lipe, de boa e você? Sabe do Vinny? - Estendendo a mão.
- Tô de boa também, o Vinnicius volta para a escola amanhã, parece que ele teve que ir no dentista hoje, vai colocar aparelho. - Fazendo uma demostração patética de como os dentes de Vinny eram exageradamente salientes.
- Legal, vai ser incomodo, más ajuda. Meu irmão mais velho usou por três anos. - Rindo, e olhando em volta a procura de Diego.
- Certo, está esperando alguém? Não para de olhar em volta! - Sentando-se ao lado.
- Sabe se o Diego veio para a aula hoje? Encarando Felipe.
- Talvez eu possa saber né? Já que estudamos na mesma sala! - Cruzando os braços.
- É mesmo havia esquecido disso. Ele veio hoje? Fala cara, estou com pressa! - Se levantando e ficando em pé na frente de Lipe.
- Calma brow, ele veio sim. Quando perguntei se ele não iria lanchar, respondeu que tinha que terminar a lição de inglês que não teve tempo de fazer em casa. - Olhando para o sanduíche de Raphael.
- Ok, vou lá falar com ele obrigado! - Saindo apressado.
- Ei, deixou seu lanche, posso comer? - Tentando se fazer ouvir, más Rapha já sumira na multidão - Acho que isso é um sim - Disse ele avançando sobre o sanduba.
Cruzando a porta, pode ver lá no fundo da sala com a cabeça repousando sobre os braços cruzados, Diego, que olhava pela janela os alunos jogando algum tipo de jogo, que envolvia qualquer um que quisesse participar, o objetivo era meio confuso, más parecia tratar-se de chutar uma lixeira e acertá-la uns nos outros.
Foi aproximando silenciosamente e ajoelhado ao lado da mesa de Diego disse:
- Oi meu amor! - Sussurrou docemente.
- Oiiie! - Saltando para abraçar Raphael.
- Você está bem? - Sendo quase sufocado pelo abraço de Diego.
- Muito melhor agora, meu pai me proibiu de ver você, me disse para não sair da sala nos intervalos. - Encostando a cabeça no ombro dele.
- Eu sinto muito fazer você passar por isso, me desculpe! Frouxando o abraço e encarando ele.
- Não se desculpe, não é nossa culpa, não estamos fazendo nada de errado. - Dando-lhe um selinho.
- Estava com saudades da sua boca - Sorrindo após o beijo.
- Eu também, deixa eu matar mais a saudade! - Voltando a beijá-lo, más dessa vez, o beijo é bem mais quente e demorado.
- Que lindo Diego, papai vai adorar saber disso! - Débora batia palmas e os encarava com uma cara de satisfação.
- Débora não faz isso por favor! - Implorou Raphael de joelhos.
- Ah! que se danem vocês e meu pai, isso não é problema meu mesmo. Porém, meu quarto anda muito sujo e papai pode querer fazer uma vistoria. - Encarando Diego com desdém.
- Tudo bem sua vampira, eu arrumo aquele seu muquifo! - Sentando novamente em sua cadeira.
- Good boy! - Virando se para sair.
- Sua irmã até que é legal - entrando entre as pernas de Diego e o abraçando pela cintura.
- Só se for enquanto está dormindo. - Sorrindo e beijando Rapha novamente.
- Preciso te ver novamente hoje. Vamos se encontrar hoje a noite? Encarando seriamente Diego.
- Como assim? meu pai jamais me deixará sair! - Tentando ponderar a situação.
- Eu vou para sua casa e você deixa a janela aberta, qualquer coisa me escondo no seu armário. - Sorrindo.
- Não sei não, se meu pai te pegar lá, vai ser o fim - Respondeu nervosamente.
- Por favor, por favor! - deitando-se em uma das coxas e fazendo biquinho.
- Tudo bem, podemos tentar, más que fique claro, estou morrendo de medo. - Fazendo cara de quem está pouco a vontade com a situação.
- Vai dar tudo certo, falo pra minha mãe que vou dormir na casa do Vinny, e passo a noite com você. - Levantando-se, segurando o rosto de Diego com as duas mãos e lhe dando mais um selinho.
- Talvez de certo, meu pai sai cedo, a Débora dorme até meio dia e minha mãe só vai chegar em casa as 6 da manhã hoje. - Falando cheio de sarcasmo.
- Sério mesmo! - Disse Rapha.
- Claro que não! Meu pai vai sair as 10 de casa, a maldita da Débora sai as 9 para as aulas de inglês e minha está de folga amanhã. - Olhando-o seriamente.
- Se você não quiser, deixamos então! - Sentando em uma cadeira atrás dele.
- Eu quero, más é perigoso! - Pensativo com uma das mãos coçando a testa - Quer saber dane-se, vamos fazer isso.
- Isso! Isso! - Saltando sobre Diego e lhe enchendo de beijinhos pelo rosto.
“Because I'm happy”
Bom este é o sinal de que devo te deixar em paz. - Disse ele dando um último beijo e saiu dançando pelo caminho até a porta. - Trombou com um outro aluno que vinha entrando. - Desculpe-me! - Sumindo pela porta.
Diego passou o restante da tarde com borboletas vagando pelo seu estomago. Não viu Rapha na saída, achou melhor não dar bandeira, se Débora desconfiasse teria ele que virar empregado dela até o fim dos tempos. Chegando em casa, foi tomar seu banho que estava deliciosamente agradável, um misto de felicidade e desespero percorria os seus pensamentos. Aquilo era uma total loucura - pensava ele - se meu pai pegar ele aqui eu estarei frito.
Após o jantar, deu um beijo de boa noite em sua mãe e dirigiu-se para o quarto, seus níveis de ansiedade estavam nas nuvens. Deitado em sua cama seu coração disparava a cada barulho que ouvia do lado de fora de sua janela. De repente, toc toc toc, na janela, sim era Raphael, seu coração veio parar na boca. Levantou-se rapidamente.
- Xiuuu, não faça barulho se meu pai acordar ferrou tudo. - Com o dedo indicador na frente da boca.
- Desculpe-me! - Pulando a janela com a ajuda de Diego.
- Deite-se na cama, vou fechar a janela. - Apontava ele a cama, que mal podia ser vista, frente a escuridão que tomara seu quarto.
Ao fechar a janela que a anos emperrava Diego usou muita força, o que além de fechá-la, acabou por fazer um barulho bastante alto. Correndo para a cama ele disse:
- Que merda, meu pai acabar vindo aqui! - Sussurrou no ouvido de Rapha.
- Será? - Raphael com olhar apavorado.
- Acho melhor você ir para o armário. - Empurrando o garoto da cama em direção ao armário.
Raphael correu para o armário, e segundos depois ouviu-se a voz grave do Dr. Marcos passar as paredes.
- Diego tudo bem ai, ouvi um barulho! - Batendo na porta com extrema impaciência - Abra a porta vociferava ele.
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Espero que gostem desse capítulo, ele está mais morno, porém, para o próximo teremos muitas novidades...
Até breve
J.D. Ross