Papai e Mamãe,
Sai do Rio de Janeiro para morrer em um assalto no Amazonas. Isso não era justo. Ainda tinha tantas coisas para fazer, como pegar o Zedu, perder 30 quilos e talvez ganhar um prêmio Nobel da Paz. O que vai ser dos meus irmãos? E da tia? Não podia ser verdade. Não!
***
— Leva o que você quiser, mas não me mate. — supliquei com as mãos levantadas.
O motoqueiro continuou acelerando sem sair do lugar. De repente, uns garotos aparecem e começam a rir. Um deles era o Vando, o cara sem noção que adora fazer piadas gordofóbicas. Ele estava filmando tudo e quase não conseguia falar, apenas gargalhava.
Uns garotos saíram de uma parte escura da rua, todos rindo alto. Um deles era Vando, um cara sem noção que morava nas redondezas. Ele estava filmando tudo.
— Pensei que um cara desse tamanho fosse mais valente. Olha quase fez xixi na calça. — ele disse mostrando o vídeo.
— Eu pensei que ele fosse desmaiar. — comentou outro garoto que não conhecia.
— Precisa ser mais valente rolha de poço. — Vando me aconselhou.
Idiota. Babaca. Cara desprezível. Tudo de ruim que existe dentro de mim parecia querer sair. Cheguei em casa e o pessoal não estava. Abri um pacote de biscoito e fiz quatro sanduíches, a comida me confortava de algum jeito. Era um alívio.
Subi para o meu quarto, abri o computador e Ramona já havia enviado algumas fotos para o meu e-mail. Selecionei algumas para imprimir. Fiquei admirando o Zedu por algum tempo, ele era realmente lindo. Dormi com o notebook em cima da cama.
***
Acordei cedo para preparar o café dos meus irmãos. O Richard é intolerante a lactose, então, era preciso ter cuidado com a alimentação dele. Geralmente, coisas mais naturais era indicadas pelos médicos. A minha tia já se preocupava com tanta coisa, deixei essa responsabilidade para mim. Infelizmente, o Richard não cooperava, sempre que eu achava uma receita nova, ele praticamente cuspia na minha cara.
Já a Giovanna não podia viver sem seu leite e queijo de búfala. Sabe o preço desses itens? Só posso dizer que são caros. Fora que ela tinha toda uma rotina matutina. Quando estudava no Rio de Janeiro, a minha irmã acordava às 5h da manhã para se maquiar e preparar os cabelos para a aula.
Naquela manhã, fiz uma receita de crepioca de queijo sem lactose. Enchi de frutas para enganar o Richard que odiava experimentar coisas diferentes. Nos últimos meses, ele perdeu muito peso e resolvi investir em novas alimentações.
— Essa banana tá gostosa. — ele disse olhando para mim e rindo.
— O que você aprontou? — perguntei com desconfiança.
— Nadinha. — Richard franziu a testa e mostrou os dedos. — Juro.
— Richard, o que você fez? — questionei mais uma vez. — Quebrou algo? Assassinou algum animal inocente? Bateu em alguém? Envenenou a água do bairro?
— Não. Não. Não. E isso foi uma vez só. Eu não sabia que água sanitária fazia mal. — ele disse revoltado com minhas suposições. — Na verdade, eu queria ir lá na quadra do Parque. O Zedu disse que eles vão treinar hoje.
— Você? Perto de outras crianças? — ri alto da possibilidade dele chegar perto de outras crianças. — Nem pensar.
— Qual é! Só hoje!
Giovanna deu o ar da graça, apenas para tomar seu leite de búfala. Enquanto isso, Richard continuou insistindo com a ideia de brincar com meus amigos. Eu poderia ganhar um prêmio celestial por aguentar os dos pestinhas. Finalmente, Giovanna entendeu meu dilema e ajudou.
— Nem pensar! Lembra o que aconteceu da última vez que deixamos ele praticar um esporte?
RIO DE JANEIRO – MESES ANTES
Meu irmão caiu acidentalmente na piscina da escola dele e nadou de uma borda a outra em menos de dois minutos. O técnico da equipe de natação adorou e o convidou para integrar o time do colégio. Em um dos campeonatos, um aluno mexeu com o Richard e o pior aconteceu.
— Fala. Fala de novo. Eu não tenho mãe, né? — gritou Richard afogando o colega.
— Pelo amor de Deus. Richard, solta o Jorge!!!! Solta o Jorge!!! — implorou o treinador
pulando na piscina e separando os dois.
MANAUS – ATUALMENTE
— Pobre, Jorge. Acho que a família dele até mudou de cidade. — falei.
— Eu vou!!!! — Richard gritou e bateu na mesa.
Olhei assustado para Giovanna. O Richard nunca havia reagido dessa maneira. Para evitar qualquer tipo de confusão, acabei deixando ele ir, entretanto, criei regras para controlar o pestinha. A Giovanna se auto convidou e tivemos que esperar o seu cabelo secar.
No quarto, entrei mais uma vez no dilema da roupa. O meu guarda-roupa era separado em camisetas, pijamas, calças e bermudas. Optei pelas peças mais leves, afinal, às tardes em Manaus costumam ser calorosas.
Chegamos no Parque e a turma já estava lá, para a minha surpresa o Vando também. A Giovanna levou uma cadeira de praia e ficou lendo um livro. O Richard era o mais animado, logo pediu para experimentar a corda do Slackline, um esporte onde se coloca uma fita elástica entre dois pontos e pode fazer manobras. Fiquei preocupado, mas descobri que o Brutus e Zedu eram campeões da modalidade.
Richard saltou para um lado e pulou para outro. Ele dava trabalho, porém, por alguma razão desconhecida, o sorriso na boca daquele moleque conseguia iluminar o meu mundo. O Zedu logo tirou a camiseta, que merda, acho que ele faz isso de propósito. Será que o Zedo é o Tarzan do Amazonas?
— Quer experimentar, Yuri? — ele perguntou se aproximando de mim que estava sentando ao lado de Giovanna.
— Acho melhor não. Não sou de coisas radicais. — falei.
— Segura a minha camiseta? — ele pediu me entregando a peça de roupa.
— Ok. — dise fingindo naturalidade, mas surtando por dentro.
Jamais toparia subir naquela corda. Imaginei subindo e quebrando tudo. Era difícil para mim, com todo aquele peso, praticar qualquer tipo de atividade física, na verdade, a maior parte podia ser caracterizado como preguiça.
Só que os meninos continuaram insistindo, apesar da minha recusa. Eu não queria ser o responsável por acabar com a brincadeira deles. O Vando, como sempre, se meteu e soltou mais uma de suas pérolas gordofóbicas.
— A corda vai é quebrar com tanto peso. — Vando falou rindo de sua própria piada ruim.
— Pirou Vando? — Brutus veio em minha defesa e repreendeu o amigo.
— Se não quer ajudar, também não atrapalha. Ok. — interveio o meu príncipe encantado.
— Deixa quieto gente. É só uma brincadeira. — tentei limpar a barra do Vando para não deixar o clima ruim.
O meu irmão ao ver Vando gargalhar do comentário que fez, subiu na corda, balançou o mais alto que pode e se jogou em cima do gordofóbico. Eles caíram no chão, entretanto, o impacto foi todo em cima de Vando, que ficou todo sem graça.
Apesar de tudo, o meu irmão ficou comportado. Imaginei ele aprontando muitas coisas, mas ele se concentrou em aprender mais sobre como manter o equilíbrio. Depois de um tempo, Ramona e Letícia chegaram com lanchinhos, as duas também eram fera no slackline. Deram um show nos professores.
— Elas aprenderam tudo o que a gente sabe. — Zedu me surpreendeu e sentou ao meu lado.
— Eu acredito. — brinquei dando um soquinho no braço dele.
No meio da brincadeira, a Letícia avisou que os pais não estavam em casa e nos convidou para uma sessão do filmes. O meu irmão se meteu no assunto e sugeriu que assistíssemos ao longa "Massacre da Foice Sangrenta - parte 4 - Os comedores de tripas". Meus amigos começaram a rir, afinal, esse tipo de produção não é feita para uma criança.
— Esse menino não é normal. — destacou Vando indo embora.
— Ainda bem que ele foi embora. — soltou Ramona aliviada. – E não. Esse filme não tem muito sangue. — acabando com os planos do Richard.
— Eu desconfiava disso. A segunda parte é melhor. Tem aquela cena que o bebê recém-nascido arranca os olhos da mãe dele. — disse meu irmãozinho com uma naturalidade de surpreender.
Após mais uma tarde divertida, levei os meus irmãos para casa. Preparei uma janta bem nutritiva para eles, mentira, comprei pizza. Depois fui tomar banho. Desci e a tia Olívia estava na sala. Avisei que assistiria a um filme na casa da Letícia. Antes de sair de casa, fiquei preocupado com outra brincadeira do Vando. Então, parecia um espião nas ruas do Parque 10.
A casa da Letícia não ficava tão distante, achei com facilidade, porém, não queria outra surpresa do Vando. Era uma casa bonita de dois pisos, na verdade, a maioria das casas naquela região eram de dois pisos. Apertei a companhia e fiquei aguardando a Letícia, mas para minha surpresa quem abriu foi um Deus Grego.
— Oi? — ele disse com uma cara de tédio, mas que não tirava nenhum pouco da beleza dele.
— Oi, a Letícia mora aqui? — perguntei nervoso.
— Sim. Você é amigo dela, né? Pode entrar. — ele pediu abrindo espaço.
Leonardo era o irmão da Letícia que estava na faculdade. A beleza deveria ser herança de família. Ele era alto, branco, cabelo curto e um tanquinho que dava inveja em qualquer garoto. Leo me levou até o quarto de Letícia.
A minha amiga não estava lá, então, sentei na cama e fiquei analisando o quarto. As cores eram neutras e haviam fotografias espalhadas em toda parede, a maioria com a turma. De repente, Letícia aparece apenas de sutiã e calcinha, desfilando como se fosse a coisa mais natural do mundo.
— Oi, amigo. Chegou cedo! Bom que me ajuda a preparar uns petiscos. Tem pipoca, pão de queijo e acho que farofa de calabresa. — enquanto falava, Letícia vestiu uma camiseta folgada e um shortinho jeans. – Vamos.
— Sim. Vamos. — respondi atônito e desviando o olhar dela.
Essas pessoas magras e bonitas são tão destemidas. Nunca que eu ficaria assim tão à vontade com pouca roupa. E, por causa do calor da cidade, os magros podiam andar descamisados a qualquer momento do dia. Eu olhei para um grande espelho que havia na sala da casa de Letícia e me imaginei com muitos quilos a menos. Um sonho impossível, ainda teria que trabalhar muitos problemas internos. Eu tinha consciência disso, mas não tinha coragem de começar.
A cozinha da casa de Letícia era espaçosa e iluminada. Haviam vários pontos de luz no teto de gesso. Letícia pede para que eu pegue as jarras de suco que estão na prateleira. A companhia começa a tocar, Letícia pede licença e vai atender. Provavelmente, deve ser o resto da galera.
Estava com dificuldades para pegar as jarras. De repente, sinto alguém chegando por trás e me assusto. Era o Leonardo, na hora tenho uma ereção. Ele me ajudou a pegar as jarras, mas ficou um tempo extra se esfregando em mim. Eu não acreditava que aquilo realmente estava acontecendo. Infelizmente, durou pouco e Leo foi embora quando o pessoal entrou.
— Yuri, nossa parece que viu um fantasma. — comentou Ramona entrando e deixando algumas garrafas na mesa.
— Oi. — disse Zedu.
— E aí, grandão! — gritou Brutus usando fones de ouvindo e tirando logo em seguida. — Desculpa, falha minha.
— Trouxe umas bebidinhas que o papai estava guardando. — confessou Ramona tirando várias garrafinhas de dentro da bolsa.
Eles começaram a falar sobre os sabores maravilhosos do álcool e eu, claro, fiquei patinando no assunto. Zedu percebeu e falou que a melhor opção para quem estava começando era uma batida de frutas. Algo leve, porém, saboroso. Pedi da Letícia para usar o banheiro, precisava de um tempo sozinho. Muita informação foi jogada em cima de mim.
Era a primeira vez que eu beberia álcool. Estava nervoso, principalmente, pelo que aconteceu antes com o irmão da Letícia. Entrei no banheiro e sentei no vaso. Respirei fundo e fui até a pia para lavar o meu rosto. Olhei no espelho e respirei fundo novamente. Ao sair do banheiro esbarrei com o Leonardo.
— Você é bonito. Não sabia que minha irmã tinha amigos gordinhos. Eu me amarro em gordinhos. Qual sua idade? — ele questionou tocando meu rosto.
— Eu, eu, te.. tenho 16. — falei gaguejando.
— Tenho 18. Não é muita diferença, né? — Leonardo pegou na minha mão e me levou para o seu quarto.
Aconteceu muito rápido. Meu coração parecia um carro desgovernado. O Leonardo me colocou contra a parede e beijou com vontade. Era a primeira vez que eu beijava alguém para valer. Do nada, o Leo baixa a calça. Bem, o resto deixo pela conta da imaginação de vocês.
Sim. Fiquei com um homem pela primeira vez. Nunca em todos os meus sonhos mais selvagens, imaginaria uma coisa daquelas. O auge da minha existência aconteceu naquela segunda-feira. Infelizmente, o Leonardo ficou assustado quando Letícia chamou o meu nome e acabou o clima.
— Acho melhor você ir. — pediu Leo colocando a roupa. — Ei. Se você contar pra alguém, eu acabo com você.
Minha primeira experiência homossexual e ameaça de morte também. Desci apressado, todos já estavam sentados e com copos de bebidas em mãos. Sentei entre a Letícia e o Zedu. Já o Brutos e Ramona ficaram nas almofadas colocadas no chão. Assistimos o filme "A Noite do Mortos-vivos", de 1967.
— Mulher burra! Corre!! — gritou Brutus apreensivo e quase derrubando a bebida.
— Você sabe que isso é um filme, né? E que ela não tá te ouvindo? — questionou Ramona revirando os olhos.
— Yuri, quero me esticar. — pediu Zedu colocando almofada no meu colo – Vou deitar um pouco.
— Tá. Pode encostar sim, mas depois cobro R$ 10. — brinquei.
O resto do filme foi tranquilo. Letícia ficou chocada quando uma filha mordeu a própria mãe. Brutos continuou xingando os personagens. A Ramona ficou bêbada e chorou lembrando dos animais em meio à uma pandemia zumbi. Minha mão acabou indo involuntariamente até os cabelos do Zedu e ficou fazendo carinho. Foi involuntário, juro. Ele não protestou, então, estava tudo bem.
Depois que o filme terminou, Ramona encontrou mais bebidas e colocou em copos totalmente errados para a ocasião. A gente bebeu bastante, a primeira vez que ingeri álcool na vida. Fiquei um pouco zonzo e decidi parar. Ficamos conversando e cada um foi para sua casa.
No dia seguinte, acordei com uma forte dor de cabeça e tomei um remédio para aliviar. Fiz o café dos meus irmãos e voltei a dormir. Acordei para fazer o almoço e dormi novamente. Além de dores, a bebida também me deixava mais sonolento. Sonhei que transava com o Leonardo.
A titia estava trabalhando muito. Na empresa, ela precisava lidar com pessoas muitos influentes, então, sempre estava preocupada com alguma coisa. A firma pagava e bem, entretanto, ela decidiu dar uma notícia nada agradável para nós naquela noite.
— Então, como vocês sabem, esse é um ano atípico para nós. Novo emprego e uma cidade onde não conhecemos nada. Estou tendo gastos além do esperado, como comprar novos moveis, por exemplo, e também teve o carro. A gente precisa se locomover de alguma forma…
— Titia. Onde a senhora quer chegar com esse discurso? — perguntou Giovanna, impaciente, cortando tia Olívia.
— Conversei com os pais dos amiguinhos de vocês e eles me indicaram a escola onde eles estudam e…
— Tá, qual delas? La Salle? Latu Senso? Martha Falcão? — Giovanna cortou titia novamente.
— É uma escola pública. — disse titia fechando os olhos.
Uma terceira guerra mundial foi instaurada na cozinha da nossa casa. Giovanna ficou abaladíssima com a notícia. Ela prezava por uma boa educação e não abriria mão de estudar em um colégio particular.
— A senhora ficou maluca?! Nunca estudei em uma escola pública. — falou minha irmã levantando e andando de um lado para o outro. – A minha vida está arruinada. Escola pública?
— Gio. — falei pegando na mão dela. — Se acalma.
— Me acalmar?! Me acalmar?! — minha irmã atingiu um novo nível de surto e começou a chorar. — O mundo está desabando sobre a minha cabeça e você pede para eu me acalmar?!!! E o dinheiro dos nossos pais? — perguntou Giovanna virando para a tia Olívia.
— São para os gastos com a faculdade. — explicou titia.
— Vou entrar em uma universidade federal. A educação na escola pública é horrível. Quero estudar em uma instituição particular. Não sou obrigada a ficar no mesmo lugar que pessoas comuns. Titia, eu fui a melhor da classe em todas as matérias, eu faço balé e canto coral. Eu preciso disso. Eu preciso!!!!! — Giovanna bateu os pés e saiu da cozinha.
— Ok. Foi menos pior do que eu imaginei. Ela surtou mais quando soube da viagem para o Amazonas. — falei olhando para tia Olivia e dando um riso amarelo.
— Você!!! — Giovanna voltou nos assustando. – Sabia desde o início, né? Concordou com a maluquice dela!
— Giovanna, chega! Não fale nada que vá se arrepender. — pedi elevando um pouco minha voz.
Debatemos por um bom tempo, melhor usar debater que discutir, né? Demorou para convencermos a Giovanna. Então, fizemos um acordo: a gente buscaria uma escola mais em conta para ela e o Richard. Eu ficaria em uma escola pública, só deveria achar uma que aceitasse a matrícula tão em cima.
— Valeu por ficar do meu lado. Sei que isso não te agradou também. — agradeceu tia Olívia pegando na minha mão.
— Tia. Não gostei, mas não sou burro. Sei que vivemos em um momento de crise e as coisas não são mais como eram antes. Vou sobreviver.
Encontrei meus amigos, nossa falei amigos? É tão legal fazer parte de uma turma. Ainda estou me localizando e eles contam histórias antigas que eu fico sem entender. Um dia teremos nossas próprias histórias para rir. Eles me levaram para conhecer o Teatro Amazonas. Um lugar completamente encantador, mas para a minha surpresa o único que conhecia o teatro era o Brutus.
— Eu também sou cultura. — se gabou Brutus.
— É realmente encantador. Imagina. — falou Letícia sentando em umas das poltronas do Teatro. — Aquelas madames de época. — cruzando as pernas.
— Você ia ficar linda em um vestido. — disse rindo da atuação dela.
— E a gente de smoking, hein? Nesse calor dos infernos. — imaginou Zedu.
Realmente. O Teatro Amazonas é lindo e preserva parte da decoração original. A guia nos contou que a cúpula do Teatro é composta por 36 mil peças nas cores da bandeira do Brasil. Grande parte da infraestrutura é importada da Europa.
Entre os artistas que já adentraram o Teatro Amazonas estão o tenor José Carreras, Roger Waters, as bandas Spice Girls e The White Stripes; assim como os brasileiros Heitor Villa-Lobos, Milton Nascimento, Ana Botafogo e Bibi Ferreira
Depois da visita ficamos em uma praça que integra o espaço do Teatro Amazonas, o Largo de São Sebastião. Pedimos pizza e apenas conversamos sobre vários assuntos aleatórios.
Eles fizeram perguntas sobre a minha vida e eu questionei eles também. Descobri que a Letícia já quebrou um braço, o Zedu odeia dormir no escuro, a Ramona é fã da turma da Mônica e o Brutus sabe tocar piano.
— Gente. E sobre a escola de vocês? Falem um pouco sobre lá. — questionei meus amigos.
— Ela é bem perto daqui. Você tá afim de passar pela frente? — perguntou Zedu tirando dinheiro da carteira.
O nome da escola era Dom Pedro 2 e ficava em frente a uma bela praça. O prédio se destacava pela imponência, lembrava algumas escolas do Rio de Janeiro. Havia uma quadra bem ao lado e parecia um pouco velha, mas de acordo com a turma era considerada uma das melhores escolas.
***
A próxima semana passou correndo, literalmente, pois, consegui uma vaga na escola dos meus amigos graças ao pai da Ramona, que conhecia a diretora, entretanto, precisei fazer uma avaliação. Claro que passei. Os assuntos já havia revisado na escola antiga.
Infelizmente, o assunto escola particular mais barata ainda estava em alta na minha casa. A tia Olívia não aguentou a teimosia da Giovanna e elas brigaram feio. Como eu sei disso? Encontrei o Richard escondido de baixo da mesa. Entrei no quarto da titia e a encontrei reflexiva.
— Dia difícil? — perguntei sentando ao lado dela.
— Eu não sei mais o que fazer…
— Tia. Eu fiz algo sem consultar a senhora.
— O que, Yuri? Brinco, tatuagem, entrou para uma banda e vai viajar pelo Brasil? — ela questionou assustada e olhando todas as áreas do meu corpo.
— Não, tia. Eu me matriculei na escola dos meus amigos. Fica no Centro. A educação é boa e não vou pagar mensalidade. A gente pode matricular meus irmãos em uma escola particular.
Enquanto conversava com tia Olívia, a Giovanna ouvia tudo pela porta. Emocionada, a titia me abraçou e agradeceu pela ajuda. Na real, eu que precisava agradecer, ela manteve nossa família unida. Mostrei para a tia algumas opções de escolas mais acessíveis e escolhemos a que tinha uma grade educacional descente.
— Essa escola é muito boa e o valor não é tão caro. Se a senhora quiser mexer na minha parte do dinheiro. — tentei negociar com ela.
— Infelizmente. Vou precisar mexer, mas reponho aos poucos. — garantiu tia Olívia.
— Vou marcar uma reunião amanhã e peço pro Zedu me levar. Vai dar tudo certo. Vou ver como está a fera indomável. — falei abraçando tia Olívia e saindo do quarto.
***
A Tia Olivia estava tentando, eu percebia, mas, ao mesmo tempo, era visível que ela não parecia bem. Acho que precisava de um namorado ou amigos. Sua rotina era do trabalho para casa. Torcia para que ela conquistasse também sorte no amor. Uma vez que já estava estabelecida no mercado de trabalho.
A empresa da tia Olívia ficava até que perto de casa. Pela primeira vez, ela contava com a ajuda de um estagiário. Ele se chamava Carlos, um homem um pouco mais velho que estava realizando o sonho de se formar em direito.
— Boa tarde, Olivia? — desejou Carlos deixando alguns documentos na mesa da tia Olívia.
— Olá, Carlos.
— Então, hoje vamos ter um happy hour após o expediente. Quer ir? — ele convidou de forma natural.
— Não sei. Meus sobrinhos estão em casa e…
— Eles não podem ficar com a mãe deles? — ele soltou fazendo a titia revirar os olhos.
— Ela faleceu, Carlos. Então, eu sou a mãe deles. — Tia Olívia exagerou na grosseria.
— Er… nossa. Desculpa. — pediu Carlos, antes de sair da sala.
Será que um novo interesse amoroso estava surgindo na vida da tia Olívia? Espero que sim. Afinal, ela em nenhum momento se questionou sobre suas atitudes em relação a nós. Simplesmente, nos abraçou como filhos e nos protege de todas as formas. Por isso, sempre tentava apaziguar qualquer discussão entre ela e meus irmãos.
— Minha irmã. — falou titia pegando uma fotografia nossa que ficava em seu escritório. — Estou tentando, eu juro. Eles são tão especiais. Será que eu dou conta? Será? — ela questionou chorando.
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