Não sou do tipo de pessoa que acredita em destino. Naquele dia, depois de tudo que aconteceu nos últimos meses, exatamente no momento que o Fael estava com seu grosso dedo indicador apontado para minha testa, eu percebi. Aquele homem era meu e eu já era dele. A posse. Ele mirou no fundo da minha alma com aquele olhar único e foi como se eu sentisse queimar todo o mundo que existe em meu interior. Ele estava ali, no dia do meu aniversário, na minha frente, diante do portão da minha casa e me olhando, fazendo todo o restante desmoronar e eu amava essa sensação.
- Tô bem. Tu também, né... - meio que afirmei, ainda temente de outra repreensão.
- Assim que eu gosto, cria. - e mandou outro daquele riso de canto de boca, enquanto desceu o dedo que antes estava apontado para o meio da minha testa.
Ver aquela cara de pilantra depois de tanto tempo era maravilhoso. Mas mais além, existia algo entre nós. Não sei se foi porque, ao vê-lo, desistira de todas as desculpas que queria pedir e isso acabou se perdendo em algum fundo da minha mente, deixando espaço só para os bons sentimentos. Só sei que a forma de olhar pra mim, apesar de sempre desconfiada, estava mais envolvente e misteriosa que antes. Ou era o que eu queria que fosse? Não. Sem dúvidas, não.
- Pegar esse baile de natal? - interrompeu minha viagem.
- Baile...?
- De natal. Bora?
Ainda que fosse morador de favela desde pequeno, nunca havia ido a um baile. Meus pais diziam que era um lugar de perdição e uso de drogas, então nem preciso explicar mais. Nada disso importou na minha mente. E, além do mais, agora eu tinha dezoito anos, tava na hora do foda-se.
- Partiu. Que horas? - perguntei.
Antes que ele me respondesse, um barulho semelhante ao de um bip apitou próximo, seguindo de várias vozes baixas enroladas. Pareciam homens gritando como numa transmissão mal feita de rádio. Uma das mãos se dirigiu à parte de trás da bermuda, procurando algo. Algumas mexidas e outro bip. O barulho cessou.
- Toma teu banho. - falou como se nada tivesse acontecido.
A mesma tranqüilidade, porém com uma nítida desconfiança estampada no rosto.
- Do lado do som. - continuou - Brota de lá.
- Já é. - respondi.
Ele empurrou um dos meus ombros, virou as costas e começou a andar. Antes de dobrar a esquina, porém, tirou aquele aparelho que tanto bipava do bolso e começou a falar. Sumiu. Era um radinho. "Vapor?", pensei. "Fael virou vapor?". Se aquilo era mesmo um rádio comunicador, então isso significava que Fael fazia parte do movimento. Entre outras palavras, era um bandido em possível formação e ascensão na hierarquia do tráfico. Poderia ser que ele roubasse, matasse e até estuprasse mulheres por aí, e era o tipo de pessoa com a qual eu estava lidando sem saber. Era muita informação pra pouco tempo de digestão mental, minha cabeça chegou a doer. Por um lado, me senti presenteado pela volta do meu cafuçu, justamente no dia do meu aniversário de dezoito anos, mas por outro, fiquei um pouco triste, pois não pedira as desculpas que planejara e senti que isso talvez explicasse a forma séria com a qual ele me tratara no nosso reencontro. Como se não bastasse todo o tempo que esperei em dias nublados, ainda tinha que lidar com a possível novidade: Fael virando bandido. Seu retorno, mais até do que o sumiço, me deixou curioso, e o que a curiosidade faz comigo, em tudo que diz respeito aquele sacana, acaba sendo intenso. Dito e feito. "Um jogo que vale a pena perder".
Esqueci de tudo. Peguei qualquer roupa, tomei o banho mais rápido que pude e meti o pé pro baile. Minto, inventei de fazer a barba antes de sair, porque já tava incomodado. Vesti uma calça jeans, sapato e camisa escura, dessas de sair mesmo. Por dentro, parte do mundo estava revirada e a outra parte eu tava doido pra revirar. Queria descobrir tudo sobre o mulato, tinha muitas perguntas a fazer, mas sabia que precisaria de segurar a bola. Cheguei na quadra do Acari meia noite e pouca e comecei a procurar pelo Fael no meio da multidão. Dez minutos. Nada. Vinte. Nada. Mandei mensagem no whatsapp. Nada. "Ainda não chegou, só pode", tentei me tranqüilizar mentalmente. Nessa hora, parei de procurá-lo e comecei a notar o ambiente ao redor. Era um espaço enorme, lotado de todos os tipos de gente dançando, muito cheiro de maconha e um som assustadoramente ensurdecedor próximo. Quem já foi no baile do Acari sabe do que eu tô falando. Parado, senti as ondas de som mexendo minhas roupas e arrepiando os pelos do braço e da nuca, como se fossem ventinhos atravessando meu corpo. "Surreal. Seria a velocidade do som?". Pensei em como ainda não tinha visto ninguém armado, quando, do meio da multidão na qual me encontrava imerso, fui puxado pelo braço para trás e forçado a virar com todo o corpo.
- Tirou a barba, moleque! - era ele. - Cara de ninfeta!
Estava falando diretamente no meu ouvido, por causa do volume da música. Usava uma dessas blusas de time de basquete americano, deixando os brações de fora. O mesmo cordão de prata de sempre. Não consegui ver o resto da roupa por conta da quantidade de gente ao redor. Um perfume deliciosamente vagabundo.
- CARA DE QUE!? - berrei pra poder ser ouvido.
- Ninfetinha!
Eu gargalhei, obviamente sem graça, mas absolutamente não levando nada daquilo a sério (mentira, já me senti a própria ninfetinha dele).
- Bora ali. - e virou, sem se importar se eu tinha ouvido ou não, se iria segui-lo ou não, me deixando apenas com a visão daquelas costas largas e um número dez enorme impresso na blusa branca.
Segui por vários minutos, cortando caminho na multidão incansável que dançava o infinito "quica, quica, quica" que saía das caixas de som. Atrás de uma delas, uma mesa enorme, um pouco mais afastada da massa, só com os homens mais importantes daquela favela e seus acompanhantes e mulheres. Era a famosa roda de Acari. Sobre as mesas, várias garrafas diferentes de bebidas que sequer sei pronunciar o nome, algumas armas e drogas. Fael me deixou um pouco afastado, falou com um deles e retornou com uma garrafa de alguma mistura alcoólica e copo. Quem mora em favela tá acostumado com esse tipo de contato, então não era incômodo estar ali. Ainda que fosse diferente, quem mais estava comigo? Isso. Ele veio pro meu lado, serviu um pouco da bebida no copo e ofereceu. Eu já tinha tomado algumas cervejas antes, mas aquilo era novo.
- Vodka, viado! - falou rindo.
Tomei um gole e senti a garganta queimar. Aquilo era horrível, tinha um gosto artificial de maçã verde misturado com guaraná energético.
- Vira tudo! - mandou. Ao mesmo tempo que virou no próprio gargalo da garrafa que trouxera da mesa.
Fiz o mesmo e virei o copo. A cabeça chegou a esquentar, aquilo tava muito forte, mas de uma vez tudo era menos pior. "É hoje!". Ficamos nessa um tempo, dançamos e demos umas voltas pra fumar uns baseados. Apesar da vontade, não era o local e nem a hora ideal para conversar. E também nem lembrava mais disso direito, conforme ia misturando a onda da bebida com a da maconha. Essa era a primeira vez que ficava bêbado de verdade. Diferente da erva e do papel, a bebida desinibe a gente comportamentalmente. Você sente que pode fazer de tudo e é invencível, inerrável. Penso que, se no dia do papel estivesse bêbado, teria feito pior. Na onda da bebida, fiquei animado e ri de tudo que Fael fez, até da forma como dançou. Era uma dança própria do morro, na qual ele pareceu simular sexo com alguém que estava de quatro em sua frente, enquanto mexeu o quadril com uma das pernas levantadas. Às vezes ele parava e ia até a área dos traficantes pegar mais bebida. Numa dessas, me surpreendi ao vê-lo abaixado de cara para a mesa, com uma espécie de canudo na altura do nariz, seguindo um movimento de vai e vem que era sucedido por algumas pausas tossidas. Pó. Eu sabia o que era aquilo.
Era perto das duas horas quando aconteceu. Apesar de bêbado, estava realmente assustado com aquele novo Fael que começava a descobrir. Não saberia dizer se fiquei mais assustado ou curioso, mas, talvez por causa do ambiente e da bebida, não me senti normal. Mesmo que o tivesse visto cheirar, não poderia dizer se estava ou não drogado, já que desde o começo ele estave agitado, bebendo. Seus olhos agora pareciam distantes, sofridos, mas atentos a todos os movimentos. As pupilas pareceram simples pontos negros, totalmente contraídas. Os movimentos eram rápidos e pareciam muito necessários, precisos, com vontade e força. Não sabia qual onda dele presenciava, estava perdido nos pensamentos e nem dançava mais. Comecei a me sentir zonzo e precisei de algo doce, ou até água. Senti vontade de ir ao banheiro e o avisei.
- Se liga, seu porra! - falei. - Vai e volta, ein!!
Empurrou minha cabeça de leve com o dedo e isso me deu a impressão de que era uma outra pessoa ali. Fui até uma das filas do bar. Perdi uns cinco minutos, comprei uma garrafa de água e fui pro banheiro. Outros bons minutos lavando o rosto e tentando focar a visão, mas tudo se mexendo conforme as batidas de funk ecoavam pelos azulejos, por mim e também por dentro da minha mente. Zonzeira. Senti o estômago mexer impulsivo e corri pra um dos vasos, preparado pra vomitar. Não deu outra.
- Com calma na bebida, fiel! - disse um rapaz moreno que me viu passar mal. - Não pode misturar!
Limpei a cara, lavei a boca e fiquei até mais disposto a beber mais. Voltei ao baile e não encontrei o Fael no mesmo lugar onde estávamos, nem na mesa dOs Caras. Me senti um pouco cansado para procurá-lo, mas não teria motivo pra estar ali se não fosse por ele.
Um tiro. Correria. Mais dois. As pessoas começaram a gritar, perdidas. Pelo susto, me abaixei um pouco onde estava e procurei por uma parede para não ter que ficar bem no meio onde todos corriam. O coração agora estava disparado e só pensei onde estaria Fael. O som foi desligado e um homem disse alguma coisa enrolada no microfone, com uma arma enorme pendurada no peito. Algo como uma instrução e pedido de calma, mas nada adiantou. Em pouco tempo, eu já tava do lado de fora, mas ainda nem sinal do meu cafuçu. O fluxo de gente se dividiu por todas as ruelas próximas ao baile e cada vez mais a multidão se desfez. Num desses momentos de correria, avistei o Fael de relance, indo num dos sentidos opostos aos da multidão. Ele pareceu nervoso e gritou com alguns homens que o seguiram. Ao sair do meio do mar de gente, vi com nitidez uma arma longa que ele segurava nas mãos firmes e só aí percebi que sua blusa agora tinha um colete preto por cima. Não soube o que pensar e nem consegui sentir mais nada. Não gritei, não chamei e sequer tentei. Pensei que já era demais pra um aniversário só, pra uma pessoa só e corri no sentido da minha rua, que era um pouco distante dali. "Bosta....". Afinal de contas, não era uma surpresa, era? Eu tive sinais daquilo, de quem ele era, mas o desejo é negócio complicado. E no meu caso era muito mais que mero desejo. Eu queria o cafuçu! Mas sabia que querer não era poder, pelo menos naquele momento e situação. Mais uma vez cheguei em casa ensopado de chuva, mas dessa vez o tiro também comia solto.
Fui pro banho da lamentação. Aquele que dura "horas" e que na verdade sai mais água dos nossos olhos do que do chuveiro, sabe? Era esse. Chorei e chorei muito. Acho que foi pelo efeito descendente da bebida no organismo e o choque de realidade que tomara com tudo que vi e passei na ausência do Rafael e seu ressurgimento como outra pessoa. Não soquei nenhuma punheta. Não. Soquei os azulejos do boxe, feri meus punhos de tanta raiva que senti de tudo aquilo e de como tudo se desfechou de um jeito escroto. Me senti tão péssimo que comecei a concordar com a idéia dos meus pais terem se afastado de mim. Uma fossa mental absoluta. Não saí renovado, mas saí seco, sem lágrimas, quase uma hora depois de ter entrado e me lastimado horrores. Vesti uma cueca e me dirigi ao quarto. No caminho, percebi que os tiros haviam cessado, mas a chuva ainda era intensa e dava pra ouvir o barulho dos trovões explodindo sobre as nuvens. Eu falei sobre destino e sobre como o subconsciente é complicado. Acho que tudo isso se juntou naquela madrugada de natal e deu no que tinha que dar. Não tô falando do que aconteceu, mas sim do que estava prestes a acontecer dali em diante.
Quase quatro da manhã, sozinho em casa, indo pro quarto. Como sempre, tem que ter um susto: além dos raios caindo próximos, outro fenômeno da natureza se fez presente. Ensopado, ainda com um colete preto e velho, a blusa branca de basquete por dentro e uma bermuda jeans escura, descalço, o Fael tava sentado na poltroninha, no meio do escuro. Meu susto se deu porque não o esperei ali e o vi por causa do clarão de um relâmpago, já que tudo estava apagado. Acendi a luz mais rápido do que qualquer coisa e confirmei. Era ele. Seu olhar ainda era um simples ponto negro no meio do rosto. A cara de pancado não negava: a cocaína ainda estava no sangue. Senti algo de ameaçador no semblante e comecei a pensar que tudo acabaria muito mal. Já tinha até descoberto o porquê daquilo: veio se vingar por todas as minhas viadagens, pelo celular trincado e tudo mais. O silêncio pareceu mais torturante do que qualquer coisa que poderia dizer, então eu mesmo teria que abrir a boca.
- Como você... - tentei perguntar.
- Não mandei tu parar com as "pergunta", seu merdinha!? - mandou na minha lata, na minha fuça.
Gelei. Fiquei arrepiado na hora. Já tinha visto cocaína antes e, justamente por isso, era uma droga da qual tinha total repugnância (gente na minha família também já tinha a visto). Pior que a maconha, o álcool e o papel juntos, a cocaína te transforma num super herói absoluto. Ou no pior vilão, depende de você. A palavra era essa, depender.
- Des... culpa... - falei, já segurando o choro, mas preparado para dizer tudo que precisava, desde o começo. - Rafael...
Ele continuou parado onde estava, ainda me olhando com o olhar fixo e grande. O coração estava a mil, mas não tinha mais volta. Cheguei mais perto dele e, com muito custo, continuei falando.
- Preciso contar umas coisas.
Silêncio. Na minha mente, a palavra havia sido concedida. Mas só na minha mente.
- Tá com problema comigo, seu moleque?
Não soube onde enfiar a cara, mas já era tarde.
- Sim! - tentei ser firme.
- Tá me tirando de otário?
- Não!
- Explica essa merda então. - e tirou o celular trincado de dentro do bolso da bermuda, jogando em cima da cama.
Quando ele fez isso, não fiquei perplexo por ter que explicar a verdade. Fiquei em choque porque vi a coronha de um revolver pra fora da bermuda. Visivelmente mais nervoso do que ele, tentei acalmá-lo.
- Cara, eu explico! Mas tira essa arma, por favor!
- NÃO ME TOCA, VIADO!
- Me desculpa, de verdade! Só não me mata, por favor! - apelei.
Ele começou a andar de um lado pro outro do quarto, olhando na minha cara enquanto o fazia. Esfregou as mãos no rosto, na barba e nos cabelos, meio que se perguntando o que fazer. Num certo ponto, veio na minha direção e fechou a porta no trinco. Fechou também as janelas e cortinas e isso me deixou mais preocupado ainda. Não soube mais o que fazer e nem me vi saindo vivo dali. O silêncio foi perturbador, mas o olhar intenso sobre mim foi mais consumidor que qualquer outra coisa. Me senti culpado, queria falar tudo, mas o medo da reação drogada me cortava a voz, o ar.
- Abre a boca!
Não soube por onde começar, mas era agora ou nunca.
- Eu mexi algumas vezes... nas suas roupas. - a voz trêmula, chorosa.
- Tu é X9?
- Não, não, nada de x9.
- ENTÃO ABRE A BOCA, PORRA!
Era difícil.
- Tu é mais que um amigo pra mim.. - mandei, na esperança de que entendesse meu recado.
Não sei como essa informação chegou nele, mas fiz de tudo pra suavizar a mensagem principal. Ele ficou mudo, pensou um pouco e deu uma risada. Seus olhos ainda fixos em mim, senti o que sentira antes, quando fui encarado no portão: calor! Existia uma espécie de chama em seus olhos, bem no fundo. Quando eu entrei em contato visual com ele e a enxerguei, foi como se ela passasse para dentro de mim e queimasse tudo lá dentro, devastasse todo o interior. Me senti menos humanos e mais animalesco.
- Tu é viadinho, é?
Não quis dizer assim, dessa forma, quis ser menos direto pra não chocar. Antes mesmo de responder, a realidade quebrou. Ele parou na minha frente, segurou meu rosto com uma mão e, com a outra frente à minha face, me fez olhar pra cima, pra cara dele, diretamente naqueles olhos violentos.
- Tu tá vendo o tamanho dessa mão, sua bicha? - cada palavra foi dita silabicamente.
Ditador. Era uma ordem. A mão que segurou o meu rosto começou a me apertar. Olhos de ódio.
- ESSA MÃO VAI TE AMASSAR, SUA BICHINHA! - e me deu o primeiro tapa, que me fez cair pro chão.
Estava zonzo. O rosto ficou quente e precisei de levantar. Apesar da situação horrível, um certo alívio por ele não ter usado a arma, mas ainda assim estava em apuros e precisava de ajuda. Pensei em gritar, mas isso com certeza o faria usar de forças maiores e aí seria meu fim. Eis que algo novo surgiu. Ele veio em minha direção, me pegou pela gola da blusa e me encarou, de cima. O fogo no olhar mais uma vez incendiou tudo dentro de mim e foi aí que percebi o óbvio: era daquilo mesmo que precisava. O começo da comunhão entre dois homens.
- Vai ficar batendo? Por que não mata logo? - ousei.
- PODE ESPERAR QUE VAI CHEGAR, VIADO! - e cuspiu no meio da minha cara, me dando outro tapa e me arremessando em cima da cama, da qual caí pro lado e tomei impulso no chão.
Como disse, saí do banheiro só de cueca. Parado onde estava e ainda molhado da chuva, ele tirou o colete e a blusa de basquete que vestia, ficando só de bermuda e com a pistola na cintura. A cena de um macho de favela, bandidão, preparado pra me comer na porrada foi um deleite visual, por mais perigosa fosse. Antes de vir na minha direção, estalou os dedos das mãos e o pescoço pro lado, dando aquele sorriso de pura maldade e sadismo. Era o que eu queria, era o que mais precisava. Não pensem que sou um sadomasoquista. Precisava de sentir uma surra daquele macho e sobreviver a ela. Se conseguisse fazer isso, estaria apto pra qualquer coisa em relação a ele. Afinal de contas, por trás de todo grande homem existe um outro homem. Eu era homem, ainda que gay e não tinha dúvidas quanto a isso. Mas pra ele, pro meu macho, eu teria de ser o homem necessário que ele precisaria, então já estava decidido, era o que eu queria. Não que eu pense que tenha que apanhar, não mesmo. Mas pra mim não seria apanhar, seria uma forma de senti-lo, talvez aceitar sua dor e provocá-lo ainda mais a me usar, não numa intenção de agressão, mas sim no sentido de me ver ao seu lado e entender o porquê de querer continuar perto dele, mesmo depois de tantas contradições. Antes que ele pudesse me pegar novamente, levantei do chão firme e o encarei.
- Só isso? Meu pai já me bateu melhor! - gargalhei.
O próximo tapa quase veio, mas desviei e pulei de volta pra cama à esquerda. Mal tive tempo de cair e o puto já veio por cima, me imobilizando com as pernas grossas e molhadas. Já era!
Senti as mãos grossas do Fael me enforcarem. Senti também a cabeça ficando quente, latejando mais e mais, conforme o ar ia faltando e o estrangulamento seguiu. Apesar da sufocação, não tentei reagir com força bruta. Olhei em seus olhos de ira e ainda fui capaz de ver a mesma centelha que queimou todo o restante. Sua expressão era de raiva, rancor, algo pesado. Mas ao mesmo tempo também era vazia. Cocaína.
- D... De... - tentava falar.
- DEUS NÃO VAI TE SALVAR, VIADO!
- Dem... ônio. Eu... vi!
Nesse momento, a força cedeu e eu consegui me livrar daquele homem. Bom, em partes. Tentei sair pelo lado e o derrubei um pouco, mas ele era muito mais forte. O resultado foi que fiquei de bruços e ele com mais ódio, em cima de mim, apertando minha nuca e pescoço de forma dolorosa. Me mexi mais um pouco, como se fossem meus últimos movimentos possíveis, mas não adiantou muito. As mãos estavam presas pra trás e ele inclinado sobre mim. À essa altura, ambos já suávamos. Foi nessa hora que usei minha carta na manga: o porquê de estar ali. Tentei dizer algumas coisas, mas não deu. Mexi a cintura, que estava em contato com seu corpo, e levantei um pouco a bunda. Resmunguei mais coisas e ele recurvou-se sobre mim, chegando perto do meu ouvido por trás.
- Já era, viadinho!
Com a aproximação, senti o peitoral suado sobre minhas costas. Senti também o cordão de prata gelado, enquanto a voz no meu ouvido acabou por me excitar. Mexi ainda mais a bunda, sarrando descaradamente em sua púbis. O jogo ainda estava de pé.
- Tu acha que aguenta, é?. - sussurrou de novo no pé do meu ouvido.
Comecei a mexer o quadril pros lados, na intenção de roçá-lo ainda mais. Nessa hora, ele tentou me desacordar num mata leão muito mal feito, ainda sobre mim. Com o movimento, senti também o duro cano da pistola que estava em sua cintura. Aquilo era de matar? Era. Mas de tesão. Os limites entre a violência e o sexo já estavam se confundindo. A cocaína pode ser maléfica. Sim, ela é. Mas droga é droga, mexe com a psique humana. Sabem o que mais mexe com a psique humana? Violência. E sexo.
Tiro e queda. Com muito custo e ainda relutante, senti duas coisas rígidas sob a bermuda. Uma eu sabia que era o cano da pistola. A outra provavelmente era a arma que ele tava na cintura.
- Tá gostando, é? - debochei.
Em alguns momentos, virei o rosto para os lados na intenção de ficar próximo às axilas. Quando deu, cheirei na cara de pau. Falando em pau, o meu já pedindo arrego: duro, pulsando e pressionado contra o colchão, com nosso peso. Mas foda-se, eu tava instigando aquele puto, sabia que ele estava em seu duro processo de libertação. Moleque safado. Ele era um cafuçu, então só precisava de um impulso. Ali começou a perdição dos limites. Começaríamos a arte. Arte do cafuçu. A cafuçaria.
Parei de resistir. Já tinha chegado ao meu objetivo, então me entreguei de vez e deixei que ele percebesse isso. Cessei os movimentos, apesar da situação estar maravilhosa, mas sabendo que era necessário para o melhor. Ele ainda me manteve imobilizado, mas não fez mais força no mata-leão improvisado. Nossos corpos suavam e o esforço era tanto que ofegávamos. Agora, além de seu corpo e de seu cordão sobre minhas costas, também senti o fluído de suor escorrendo por entre nossas peles. Aquele cheiro era inebriante. Melhor do que senti-lo pingar e escorrer no meu próprio corpo, era saber que estava vindo diretamente da fonte, já que meu macho estava em cima de mim, montado no meu lombo. Eu estava submisso. Se ele estava passando por seu processo de libertação, agora começava o meu: o de submissão.
- Mexi nas tuas roupas porque queria sentir esse cheiro! - comecei.
Ele nada disse.
- Cheirei tua cueca depois do futebol pra sentir teu cheiro de homem!!
Silêncio.
- Menti pros meus pais pra continuar te vendo.
- Bicha! - um cuspe na cara.
Eu dei uma risada.
- Quebrei teu telefone porque tava sentindo o cheiro do teu suor na calça aquele dia. Um dia te alisei dormindo chapado. Tenho até uma cueca tua que roubei!
Pausa.
- Tudo isso só porque te quero como macho!
- Tá me tirando de viado, muleque? - um tapa na cara, em cima do cuspe.
- Não, Fael.... - sorri. - Tu já tá dando tudo que eu quero!
"BOOOM!". Trovões. Em algum canto, um raio caiu.. bem do céu de nossas cabeças. Mas aquele raio foi diferente. Era o tipo de energia que se alastra até debaixo de chuva forte, no asfalto ou no morro. O mesmo raio que deu fogo ao homem. Eu viajo, né?
O corpo do Fael tava mais quente que o meu. Com uma mão, ele me puxou pra trás, pelo cabelo e botou aquela barba sacana atrás da minha orelha. Com a outra, segurou meu queixo, dando uns tapas na minha cara e me fazendo abrir a boca. Seu tom de voz era baixo, porém ditatório. As palavras saíram sussurradas, porém rígidas. Firmes.
- Cachorra... filha da puta....
- Só?
Ainda bem que perguntei. Ele soltou minha boca e colocou a mão veiuda dentro da bermuda. Pegou a pistola, engatilhou e colocou na minha cara, enquanto sussurrava por trás da minha orelha.
- Quando eu terminar, tu nunca mais vai sentar!
- Já disseram isso antes, Rafaaa... - menti.
Eu era sujo, falei manhosamente. Tinha perdido a linha.
- OLHA PRA MIM, SUA PIRANHA! Vô te estragar! Vô te deixar de um jeito que ninguém vai querer!
O fogo nos olhos.
- Vô fazer contigo o que num fiz com nenhuma piranha dessa favela!!
Soltou meu cabelo e foi para a parte de baixo da cama, onde estavam minhas pernas. Puxou meu corpo um pouco pra baixo como se não fosse nada e ficou de cara pra minha bunda. Com o dedo, foi subindo lentamente o elástico da perna da cueca, pedacinho por pedacinho, me fazendo parecer de calcinha atolada no rego.
- Torce pra viver nessa porra!!
E me deu um tapa numa das bandas da bunda exposta. Gemi e automaticamente cheguei o corpo pra frente. Ele me puxou de volta fácil. Era um boneco na mão de um molecote... e ele ia brincar!
- Filha da puta!!
Mais tapas. Ele ficou dando umas esfregadas com a mão, cada vez mais apertando as partes internas do meu rabo. Eu estava enlouquecido. Meu cafuçu começou a me dominar e eu me deixei submeter, era sublime. Seu olhar veio de cima, as palavras em forma de ordens e as ofensas verbais e físicas constantes. No fim de tudo, ainda tinha uma arma pra me deixar na linha.
- Esse tempo todo tu só querendo pica no cu, né? Viado com cheiro de leite!
- Tá fechadinho pra você. Esperando por você e é só seu. - instiguei.
- Vô te fazer de casa! Vô morar dentro de tu, viado! De mim tu só vai ter piru, filha da puta! - e me batia.
Fael finalmente se libertara. Mordeu minha bunda a ponto de deixar marcas com os dentes, com bastante gosto na hora de segurar, apertar e fincar os dedos por entre as nádegas. Eu sentia a dor, mas procurara aquilo, então aguentava. Queria ser marcado por ele, que nem gado. Posse.
- "Invés" de cheirar cueca por que não veio cheirar meu caralho?
Me fiz a mesma pergunta.
- Podendo tomar leite direto da rola!
Sempre com o dedo, ele puxou pro lado a fenda da cueca que escondia meu cu virgem. À essa altura, já tinha contraído mil vezes, se bobear estava mais do que pronto pra dar entrada. Quando senti o ar frio e percebi que ele o desvendara, pisquei bem forte, deixando bem abertinho, cara a cara pro seu dono. Faltava pouco para que o finalmente desbravasse. Confesso que estava esperando aquela língua quente de cafuçu entrar, mas não foi bem isso que acontecera. Fael tirou a bermuda e ficou só de cueca, com um volume enorme de rola viva querendo sair. Estava doido pra me afogar nela, sentir o cheiro, tal como esperava desde muito tempo. Quantas punhetas já não bati pensando naquele membro, naquele homem? Ele pegou a pistola engatilhada e colocou na porta do meu rabo.
- Falei que ia estragar esse cu, num falei?
Não sabia se era real ou se era onda. Mas poderia morrer feliz, então desfiz o medo e mantive o nível.
- É todo seu. - e empinei mais ainda a bunda na direção dele.
- Pode estourar esse cuzinho, pode? - perguntou, forçando o cano da pistola na entrada.
- Não precisa nem pedir, Faeel... - quase me contorci.
E foi cada vez mais fundo. Não era muito grosso e ele cuspiu na ponta pra facilitar a entrada, até o ponto onde eu tava com quase metade de um cano de revolver atolado no rabo. Sem nem um aviso, ele fez o que jamais imaginara: disparou. Sim, dentro do meu cu. Colocou a rola, que eu nem cheguei a ver, o mais fundo possível no meu buraco pré-alargado pela pistola e puxou o gatilho do caralho. Ainda assim, ela não entrou toda. Foi tudo rápido, ele sequer tirou a cueca. Tinha passado a piroca por baixo da perna da boxer branca e estava ali, dentro de mim, enraizado e sem capa. Não tive um tempo de reação. No segundo anterior havia "apenas" o cano de uma arma de fogo, agora havia uma senhora caralha, pedindo mais passagem. Menos de um segundo. Apaguei.
Acordei. Não, acendi seria melhor. Não devia ter passado nem um minuto, acho que quase desmaiara, tamanho o susto. A visão estava turva e o corpo esquisito. Senti uma dor imensa um pouco abaixo da barriga, na parte de trás. Meus pés estavam duros, com os dedos dobrados, e eu estava recurvado sobre a cama. Ia recobrando o sentido aos poucos, saindo de uma dormência emergencial por conta da invasão sem aviso. Senti um fogo ao redor, como se o quarto estivesse em chamas. Ou a casa. Ou todo o morro. O mundo estava se desfazendo e se reconstruindo. Minha espinha estava arrepiada de baixo à cima, parecia se deslocar. Atrás de mim, havia um movimento lento e algo me prendendo, apesar de não ver correntes. Era ele. Meu homem. Estava trabalhando. Ou era meu moleque brincando? Mais sentidos foram retornando e o incômodo horrível que senti começou a passar. Enxerguei melhor e também ouvi. Dentro de mim, algo aconteceu.
- Cu apertadinho, parece até buceta!
Ainda não tive voz. O ardor de ter as pregas abertas à força ainda foi frenético, mas era como se no fundo do túnel houvesse uma espécie de luz. Era o prazer. Estava sendo cutucado intimamente pelo meu cafuçu. Mais que corpo, um entendimento de alma.
- Voltou, viadinho? Pra mim tu tinha morrido! - ele riu enquanto aumentou o ritmo do quadril.
Enquanto me comia, ainda que devagar, Fael segurava minhas duas mãos juntas pra trás. Não que eu fosse querer fugir, mas achei necessário, me senti ainda mais submisso sendo refém.
- Dei tempo nem de tu rezar, né? - debochou. - Depois disso aqui tu num entra no céu nem a caralho, viado!
Eu adorei. O vai e vem aumentou conforme a rola cabeçuda ganhou espaço dentro de mim. No início foi difícil, só contraí o cu e isso queimou um pouco. Senti cada centímetro da parede do reto sendo atritada contra aquela piroca dura que pulsou dentro de mim, na pele. Em pouco tempo, já estava acostumado e pronto pra aguentar o ritmo. Mas não se enganem, ainda senti dor. Me concentrei e dei umas risadas. Ele me cuspiu e colocou um dos pés na minha cara. Dar o cu sentindo aquela sola gostosa bem no meio da fuça foi outro nível, só que não me dei por vencido.
- Tá fazendo um pouco de cócega. - ri de novo.
Ele tirou a rola toda. Senti o maior vazio que já sentira desde sua ausência. "BOOOM!", mais trovões. Me perguntei o que havia acontecido, por que ele tinha tirado, mas nem tive tempo de reagir. Atolou a piroca em mim, até o fundo, de uma só vez. Dessa vez vi estrelas, ele foi até. o. talo. Na porta do meu cu, senti os pentelhos do saco que sempre quis cheirar ao vivo. Como se não bastasse tê-lo feito, ainda empurrou meu corpo contra a cama, usando às mãos para se prender às bordas laterais. Voltou a bombar. Agora eu ia ver. Além de dilacerado, estava imobilizado. Gemi com vontade.
- Come esse cu, Fael! Fode que ele é teu! SSSSs
Ele não respondeu mais. O corpo estava ensopado. Tecnicamente, ainda estávamos de cueca, porém nossos corpos estavam intensamente interligados. Minhas costas doendo com toda aquela pressão e peso, mas nada adiantou. Tentei virar pra ver seu rosto, mas o pé ainda estava na minha cara. Comecei a lambê-lo o máximo que pude, nos momentos em que não estava gemendo. Chupei, mordi, senti todo o suor do meu cafuçu. Estava tudo bem escorregadio por conta de todo o esforço e suor, mas de dentro de mim aquela rola não sairia por nada. Pura nata de homem bom. Meu cu pareceu pegar fogo, a cama batendo na parede e eu já não ligando pra nada. Se meus pais tivessem em casa, eu seria expulso hoje. Rapidamente, isso me fez lembrar que era natal. E eu era o brinquedo daquele moleque.
Fael parou. Me virou de frente pra ele, num frango assado, sem tirar o pau de dentro. Agora me encarou enquanto comeu. Quando eu fechei os olhos ele me deu um tapa.
- OLHA PRA MIM, CARALHO!
Eu só sabia chiar. Chiar do bem, é claro!
- É PRA OLHAR PRA MIM ENQUANTO EU COMO TEU CU!
Chegou ao ponto de ficar cara a cara comigo, me olhando fixo enquanto comia. Vez ou outra, ele forçava a barba na minha cara ou me colocava pra cheirar os sovacos suados. Às vezes até me prendia entre seus bíceps ou me enforcava, tudo isso sem parar de foder. Teve um momento em que ficou apertando meu peito e mordendo um dos mamilos, chupando.
- CHEIRA O SUOR DO TEU MACHO, SUA CADELA!
Abria minha boca, me encarando, e cuspia lá dentro.
- ENGOLE, FILHA DA PUTA!
Nossa primeira vez não foi mágica como poderia: graças a Orfeu! Ela foi violenta, do jeito que tinha que ser. Ele continuou me fodendo que nem um bicho, um selvagem, mas naquela mesma posição durante um tempo. Já me sentia esfolado, quando a piroca enrijeceu dentro de mim e despejou meio litro de leite quente. Ele, no entanto, continuou dentro e caiu, arfando de exausto e liberando todo o peso do corpo sobre o meu. Mas, até pra minha própria surpresa, ele era muito mais do que aquilo.
- Leitei teu cu e vou leitar de novo. - e fez.
Como sempre, apaguei, por conta de tanto esforço e sacrifício para chegar até aquele ponto. Acordei no dia seguinte sozinho, destruído. Pensei em como tudo tinha acontecido da forma que menos imaginaria e em quanta coisa ainda queria poder fazer junto ao meu homem. "Fiz nem 1%", mas me mantive orgulhoso. No relógio do celular eram 14h48. Ainda sentia a queimação no ânus e estava contente por ter o leite do meu macho ali dentro. "Orgulho do papai". Fui pro whatsapp. É claro que mandaria uma mensagem.
- Feliz natal!
Cinco minutos.
- Natal é meu pau, viado! - curto e grosso, como sempre.
Respondi com uma foto da minha cara destruída, depois de tapas, cuspes e pisões. Em menos de dois minutos a resposta.
- Qual foi, cria?.. - comecei a rir enquanto lia, ainda deitado. - Viu o demônio? kkk.
Tava só começando...
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