Perder e perder...
Narrado por Pedro:
Não tinha nenhuma noção de tempo, sentia todo meu corpo doer, ainda estava amarrado, de olhos vendados e com os braços e pernas imobilizados por cordas, ao longe ouvia conversas em tons altos e com diversas gargalhadas. As vozes eram ao longe porém ao menos uma eu poderia reconhecer com facilidade, era de Ângelo, eu poderia estar sendo leviano acusando alguém de algo, constantemente eu tentava me convencer que não era ele, não havia razão para isso, eu não podia mas tentar convencer do contrário aquele sotaque marcante era de Ângelo.
Novamente perdi a consciência, a noção de tempo era nula, senti alguém afrouxar as cordas e aos poucos fui recuperando os sentidos, ao abrir os olhos tive a confirmação do mais já desconfiava Ângelo estava de pé próximo à porta enquanto um outro rapaz me desamarrou, visivelmente Ângelo ero o chefe naquilo tudo, logo chegou mais um rapaz com uma bandeja com comida e água que deixou em uma mesa próxima a mim e saiu, em seguida o capanga que me livrou das cordas também saiu ficando apenas eu e Ângelo.
Minha cabeça era um turbilhão de sentimentos e pensamentos, não sabia o que pensar dele tudo que vinha a minha cabeça era a história dele, tudo que ele me contou sobre sua família, gostaria muito de ver que ele estava ali como seu salvador, como meu herói, como o príncipe que iria me resgatar daquilo tudo mas não, ele era meu algoz, era ele o culpado por estar ali amarrado, por ter apanhado sem poder me defender, sem ao menos saber aonde eu estava. Ele se aproximou e ao me tocar senti um arrepio por todo corpo, me encolhi de medo do que ele poderia fazer comigo, com uma voz cinicamente sutil ele me falou:
- Poderia ter sido tudo diferente, poderia ser tudo diferente… - repetia ele enquanto sacava um punhal do bolso e começou a acariciar meu rosto com o punhal - Será que o novinho branquelo vai gostar da marquinha que vou deixar nesse rosto lindo? Acho que vou filmar para ele assistir o que eu faço com quem me trai.
Ângelo carregava um olhar doentio e não apresentava o mínimo de sanidade. Tentei reagir mas o medo me dominava.
- Eu não te trai, nunca te trai me tira daqui por favor, só quero ir embora, só quero voltar para minha… (Pow)
Antes mesmo de poder completar minha frase fui golpeado com toda força em meu rosto do lado esquerdo, senti sangue escorrer por cima do meu olho é um inchaço imediato me tapar metade da visão, não satisfeito e mesmo me vendo ao chão sem forças para reagir a primeira agressão, Ângelo ainda me desferiu uma série de chutes na barriga e nas costelas que mal pude respirar. A sessão de chutes foi interrompida quando um dos capangas de Ângelo entrou na sala onde estávamos e de forma irônica disse:
- Começou a diversão sem os amigos? - disse se aproximando e também me golpeando com um chute na altura do estômago.
- Só estou amaciando a carne desse viado traidor, nossa diversão mesmo será mais tarde. - disse Ângelo esbarrando em cima de mim e saindo da sala.
Entrei em desespero, queria gritar mas não tinha forças, sem dúvidas daquela noite eu não passaria, senti uma forte pontada na cabeça e novamente vi tudo escurecer e meus sentidos sumirem. Ao acordar tive certeza que meu pior pesadelo estava apenas começando, estava novamente amarrado, comas mãos juntas aos pés e a boca amordaçada. Os três me olhavam como se apenas me aguardasse acordar para sentirem meu sofrimento mas vivido, mal abri os olhos e já recebi os primeiros golpes, sem medir força um dos capangas chutou minhas costelas que pude ouvir o barulho de uma delas quebrando, em certo momento desejava a morte com todas as forças, os golpes eram tão intensos que o gosto de sangue em minha boca era sufocante, sentia como se cada osso do meu corpo estivesse quebrado, respirar era uma difícil tarefa a essa altura já que o sangue vertia em grandes quantidades do mesmo. Aos poucos fui novamente perdendo meus sentidos, mas diferente das outras vezes não senti minhas vistas escureceram era como se estivesse caindo em um sono após tomar um forte sonífero. Aos poucos fui sentindo como se estivesse em um longo corredor que ao fim havia uma voz que ao longe me lembrava ser a voz do David, meu corpo já não respondia mas a nada e a voz de David me parecia mais próxima.
Narrado por David:
Não foi muito difícil encontrar os possíveis lugares onde Ângelo estaria escondido, de início achamos ser apenas ele mas seguindo seu rastro e fomos descobrindo que tinha mais dois em conjunto com ele, com sorte meu tio prendeu um holandês que fazia parte do grupo que traficava drogas e indicou quais lugares ele poderia estar escondido.
Nos dois primeiros locais encontramos apenas uma casa abandonada e péssimo estado que ficava nos arredores de Dublin, a última e terceira casa que poderíamos encontrar eles, era uma casa na divisa do condado, o local era uma fazenda abandonada que tinha poucos vizinhos, ao longe já notamos algumas luzes acesas o que despertou a atenção dos policiais. Não sabemos em quantos estavam e que tipo de armamento portavam, por mais que a vontade fosse de chegar já atirando para matar não poderíamos pôr a vida do Pedro em risco. A equipe policial liderada por meu tio estava a postos e seguiram uma abordagem de praxe pedindo que todos se entregassem, não demorou muito e a única resposta que veio foi uma saraivada de tiros, vendo que não iriam cooperar toda equipe resolveu invadir a casa.
Ao entrar dois capangas que estavam na sala levaram dois tiros e caíram mortos lá mesmo, meus olhos cruzaram com os de Ângelo e de imediato por instinto corri atrás dele que como um leopardo em meio à caça mas ele correu e fugiu pelos fundos. Por maior que fosse meu desejo de matar ele a cena seguinte me pôs em total desespero, Pedro estava amarrado pelos pés e pelas mãos deitado em meio a uma poça de sangue que ensopava suas roupas e seus lindos cabelos, um forte desespero se apoiou do meu coração, corri em sua direção.
- Pedro, Pedro o que fizeram com você, acorda Pedro!
Meu desespero foi ouvido pelo meu tio Henry e seus amigos que correram ao nosso encontro, eu sacudia o corpo desfalecido de Pedro mas ele não respondia. Minhas lágrimas na lavavam meu rosto e se misturava com o sangue de Pedro que mancham também as minhas roupas, tudo que eu queria era uma chance de viver um amor sem ter que perdê-lo de forma trágica.
A vida é cruel, sentia ali mais uma vez a dor de não poder viver um amor completo. Novamente passava a dor de perder, novamente sentia a dor da despedida sem saber o que era ser retribuído no amor, o pior é que enquanto tentávamos salvar o Pedro o mal elemento do Ângelo conseguiu se soltar e fugir.
Continua...
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