— Mas o que está acontecendo aqui? — perguntou Melissa, abrindo caminho no meio da roda de curiosos.
— Kevin? O que foi que fizeram com você? — perguntou ela novamente, enquanto o ajudava a se apoiar em seu ombro.
— Ah, relaxa, miga, eu tô bem... — disse Kevin, soluçando, visivelmente tonto. — Foi só uns go-golinhos...
— Ele parece estar sob efeito de alguma droga — comentou Ravel, aproximando-se com uma falsa expressão de preocupação.
— Ah, garoto! Para de falar besteira. Você sabe muito bem que o Kevin não usa drogas. Fica quieto e me ajuda a levá-lo até o carro — retrucou Melissa, irritada.
— Como você deixou isso acontecer? Vocês não estavam juntos? — ela questionou, ainda ajudando Kevin a caminhar.
— Eu... eu não sei. Ele disse que ia dançar, e eu fui ao banheiro. Quando voltei, vi a confusão e corri pra cá — respondeu Ravel, fingindo indignação.
— Quer ajuda com ele? — perguntou Marlon, dando de ombros, num tom quase indiferente.
A atitude de Marlon pegou todos de surpresa. Aquilo não era comum. Depois do acidente que o tornou frio e distante, ninguém esperava que ele se prontificasse a ajudar alguém como Kevin — efeminado, expansivo, tudo que ele costumava evitar.
— Se puder ajudar, será ótimo — respondeu Melissa.
Marlon se aproximou de Kevin. Assim que os olhos dos dois se encontraram, algo mudou no ar. Mesmo alterado, Kevin parou por um instante, como se voltasse à razão. Seus olhos percorreram o rosto de Marlon, como se tentassem decifrá-lo. O momento durou segundos, até que Marlon o pegou no colo com facilidade.
Durante o trajeto até o estacionamento, Kevin repousava a cabeça contra o peito de Marlon. Mesmo zonzo, tentava se soltar.
— Me larga, seu grosso! Não dou moral pra estranho! — disse, tentando se desvencilhar, sem sucesso.
— Porra, cara! Tu acha que eu queria estar aqui perdendo meu tempo contigo? — respondeu Marlon, segurando-o com mais firmeza. — Só tô fazendo isso porque tua amiga tá preocupada.
Kevin ficou em silêncio.
— E tu devia tomar mais cuidado com essas porcarias que te oferecem pra beber em festa — alertou Marlon, colocando Kevin no banco de trás do carro.
— Muito obrigada mesmo. Sua ajuda foi essencial — disse Melissa, estendendo a mão para um cumprimento.
Ravel, por sua vez, assistia à cena com a expressão séria. Por dentro, fervia de ódio. Ele havia fracassado em seu plano de humilhar Kevin.
— Vai vir com a gente ou não, Ravel? — perguntou Melissa, revirando os olhos, já ao volante.
— Não. Pode ir. Vou ficar mais um pouco — respondeu, mantendo o olhar fixo em Marlon, que se afastava.
Logo que o carro saiu, Ravel caminhou apressado atrás de Marlon. Queria tentar algo. Queria conquistá-lo. O que não sabia era que Marlon odiava gays.
— Oi — disse Ravel, puxando conversa.
— E aí — respondeu Marlon secamente.
— Você vem muito aqui? — perguntou Ravel, piscando para ele.
— Às vezes — respondeu Marlon, sem sequer olhar em sua direção.
Percebendo que seu charme não surtia efeito, Ravel partiu para o ataque. Empurrou Marlon contra a parede do estacionamento e tentou beijá-lo.
— Tá maluco, cara!? — gritou Marlon, se esquivando.
— Tô sim... maluquinho por você, seu gostoso — insistiu Ravel, forçando um novo avanço.
Ele tentou apalpar Marlon, mas este o agarrou pelos braços e o empurrou com força para o chão.
— Tu nunca mais faz isso! Tá ouvindo, seu viadinho?! — gritou Marlon, tomado por lembranças dolorosas.
— Eu tenho nojo de gente como você! — bradou, cuspindo as palavras antes de caminhar até o carro e desistir da festa.
— Isso não vai ficar assim! — gritou Ravel, se levantando do chão, tomado pelo ódio.
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Enquanto isso...
Melissa chegou em casa e cuidou de Kevin. Deu-lhe banho e o colocou na cama.
Marlon, por sua vez, chegou em casa transtornado. Jogava objetos no chão, com raiva, lágrimas escorrendo. Entrou no quarto, abriu a gaveta da cômoda e tirou uma foto. Nela, ele e seu melhor amigo Kauã, sorrindo em uma selfie antiga.
— Por que, mano...? Por que tu fez aquilo comigo? — soluçou ele, abraçando a foto.
Mesmo cercado de dinheiro, mulheres e amigos, Marlon sentia-se incompleto. Desde que Kauã morrera no acidente de carro, ele nunca mais foi o mesmo.
— Filho, tá tudo bem aí? — perguntou sua mãe, Mirella, do outro lado da porta.
— Tá sim, mãe. Me deixa em paz — disse ele, limpando as lágrimas com as costas da mão.
— Só passei pra avisar que vou viajar amanhã a trabalho. Volto em uma semana — avisou ela, antes de se afastar.
— Tá bom, mãe... agora não enche! — retrucou Marlon, jogando-se na cama.
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No dia seguinte...
Kevin acordou com uma ressaca devastadora. Vomitou no banheiro, tomou um banho e se jogou no sofá.
— Pelo visto, ontem você saiu da casinha — brincou Melissa, sentando-se ao seu lado com uma tigela de pipoca.
— E o pior é que não lembro de nada... — disse ele, coçando a cabeça.
— Será que te deram alguma coisa?
— Não sei. É tudo um borrão. Juro que não lembro de nada.
— Tenta lembrar, Kevin. Eu nunca te vi daquele jeito. Era como se estivesse dopado.
— Eu juro que não sei...
Um flash cruzou a mente de Kevin: um homem bonito o carregando nos braços.
— Ei! Acho que me lembrei de uma coisa.
— O quê? Fala! — Melissa reagiu, ansiosa.
— Um homem... me carregando nos braços.
— Ah, esse? Fui eu que pedi ajuda a ele! Eu sozinha não ia conseguir te levar pro carro. Pedi ajuda a um deus grego que apareceu.
— E você conhece ele de onde? — perguntou Kevin, esboçando um sorriso.
— Nunca vi na vida, mas sei que o nome dele é...
Antes que ela completasse a frase, o celular de Kevin tocou. Era uma chamada de Mirella.
— Alô?
— Kevin? É Mirella. Preciso de um favor urgente.
— Claro, diga.
— Na verdade, dois. Um agora e outro quando você chegar à empresa. Preciso que vá até minha casa pegar meus documentos. Estão em cima da cama. Vou viajar daqui a uma hora e não posso sair daqui.
— Tudo bem. Mas como entro?
— Na entrada tem dois vasos. No da direita, atrás do fundo falso, tem uma chave reserva.
— Pode deixar comigo.
— Obrigada, querido. Liguei para o Marlon, mas ele não atende, e a empregada tá de folga.
— Já estou indo.
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Minutos depois...
Kevin chegou à casa de Mirella. Admirou o jardim impecável e seguiu as instruções. Ao entrar, ficou maravilhado com o luxo. A decoração era impecável, o tapete de veludo, os quadros, os porta-retratos...
Seguiu pelo corredor até o quarto de Mirella. Ao entrar, sem querer, esbarrou num vaso e o quebrou.
— Ai, meu pai! Dona Mirella vai me matar — murmurou, pegando a bolsa em cima da cama e saindo.
Enquanto caminhava de volta para a sala...
— Parado aí!
Kevin congelou. Ao se virar, viu Marlon, armado, apontando uma pistola para ele.
— Quem é você? O que tá fazendo na minha casa?
Fim do Capítulo 3