CAPÍTULO 1
Eu não entendia direito o porquê, mas não me sentia feliz. Era médico, a profissão que eu sempre quis ter. Tinha um bom emprego num hospital que eu sempre sonhei em trabalhar. Tinha uma namorada que todo mundo queria, uma moça bonita, bem educada, que era o sonho de qualquer rapaz. Não passava por problemas financeiros. Mas por algum motivo eu não me sentia feliz. Pelo contrário, me sentia infeliz. Sempre angustiado, como se algo estivesse faltando na minha vida.
-Vamos Luan, você tem diversos pacientes marcados pra hoje, vai criar transtornos para eles. – meu amigo João batia a porta do meu apartamento. João era meu amigo desde a época da faculdade, e decidimos morar próximos um do outro depois que nos formamos
-Eu não quero ir pra aula hoje João. Assuma os meus pacientes, atenda eles e depois me passe os casos. Diga que eu adoeci.
-Tudo bem, você é quem sabe. Mas não venha reclamar depois.
Eu mesmo não me entendia. Será se era o trabalho ? Mas eu adorava Medicina... Era o que eu sempre quis fazer. Tinha tudo o que eu precisava. Tinha bons amigos. Mas mesmo assim, sentia que faltava algo. Aquele dia inteiro, eu fiquei em casa, a pensar em mim e na minha vida. Fiz coisas que eu sempre gostei de fazer. Corri pela vizinhança. Fiz algumas compras no shopping, enquanto pensava em mim mesmo.
-Será que estou doente ? - me perguntava, enquanto me olhava no espelho. Via o eu que eu sempre costumava ver. Normalmente já sou branco, alto, cabelos castanhos, praticamente pretos, lisos e repicados. Tenho um corpo atlético, porquê normalmente gosto de esportes e não sou de comer muita besteira. Eu parecia estar perfeitamente normal para a minha idade, 29 anos. Então ainda não entendia o porquê de tanta angústia. Basicamente nessa hora em que estava a me observar, recebi uma ligação de Flávia, a minha namorada.
-Luan ?
-Oi linda.
-Onde você está ? Vamos almoçar juntos ?
-Estou no shopping Flávia. Se você quiser podemos almoçar aqui...
-Você não foi pra o plantão hoje ?
-Não...
-Mas porquê ?
-Não sei, não estava com cabeça para ir.
-Entendi. Mas não vai criar problemas com os seus pacientes ?
-Não, o João vai atender eles por mim.
-Ok então... Nos vemos daqui a pouco
Eu desliguei o telefone, e continuei a me olhar no espelho, tentando me entender.
FLASHBACK
Não demorou muito para eu encontrar Flávia num restaurante em que a gente sempre costumava almoçar.
-Oi – a cumprimentei com um beijo como sempre fazia.
-Oi lindo... Estava preocupada com você, achando que você estava doente por não ter ido trabalhar, mas pelo que eu estou vendo você está parecendo bem até.
-Aparantemente eu estou bem Flávia... Mas eu não estou me sentindo bem na realidade. Não sei, parece que eu sinto falta de algo, uma angústia. Queria me entender...
-Porquê você não procura um psicólogo ?
-Acho que vou fazer isso mesmo...
-Você não quer que eu vá pro seu apartamento hoje a noite fazer companhia ?
-Não é necessário. Amanhã eu vou ter que sair cedo para ir pro Hospital.
-Ok então...
A minha vida as vezes parecia ser uma incógnita pra mim mesmo. Pois desde que eu sofri um acidente de carro quando tinha 17 anos, e perdi parte da memória que eu tinha antes daquilo, muita coisa que eu havia vivido, eu não conseguia mais lembrar... E uma das coisas que eu mais tentava me lembrar, e me frustrava, era com quem eu tinha namorado. Era meio como se eu tivesse perdido grande parte da minha vida e só conseguisse lembrar com nitidez do que aconteceu depois da minha maioridade.
-Mãe ? - me assustei ao ver a minha porta aberta e ela lá dentro do meu apartamento – o que a senhora veio fazer hoje aqui ?
-Fui procurar você no hospital hoje e o João me disse que você não havia ido trabalhar, então eu decidi vir ver o que aconteceu.
-Não aconteceu nada demais mãe... Eu só não estou muito bem hoje pra trabalhar. Preferi ficar em casa.
-Mas você não é de fazer isso meu filho... Tem certeza que tá tudo bem ?
-Tenho mãe – falei, a olhando – eu simplesmente não estava com vontade de ir trabalhar hoje... Estava pensando, pensando em mim, naquele acidente, nas coisas que eu esqueci, enfim. Hoje estava sem clima.
-Entendi... Mas olha, se tiver algo que você precise, não se esqueça que você pode sempre contar comigo meu filho.
-Eu sei mãe, obrigado – falei, sorrindo
As horas foram passando e logo a noite chegou. Eu estava no meu apartamento, sem nada pra fazer, apenas assistindo TV e lendo prontuário de paciente.
-Ai, já chega ! - falei, jogando tudo sobre a mesa de centro – eu preciso sair, espairecer... - disse, me levantando imediatamente e indo em direção ao meu quarto para me vestir.
MINUTOS DEPOIS
Não avisei a ninguém que iria sair, nem a Flávia. Queria fazer algo que eu não costumava fazer, sair só, curtir a noite, beber, enfim. Então simplesmente me arrumei, vesti uma camisa preta, uma calça jeans, e um sapato bonito. Arrumei o meu cabelo, e sai. Dirigi até uma boate que eu costumava ir, e coloquei o carro num estacionamento privado, pois pretendia voltar de táxi porque queria beber. Entrei na boate, naquela noite cheia de gente, de todos os tipos, a dançar e a se divertir. Eu caminhei para o bar, pedi um drink, e fiquei observando o movimento. Depois de algum tempo me dedicando bastante ao trabalho, eu até já tinha perdido o jeito na dança. Enquanto bebia o meu drink, começei a notar um rapaz, sentado próximo. Notei que parecia que ele estava me observando. Num primeiro momento fingi que não tinha percebido, mas não demorou muito para aquilo se tornar inevitável. Ele estava realmente me observando. Parecia que ele me conhecia de algum lugar. Então eu sai de onde estava e fui em direção a ele. Imediatamente quando ele viu que eu estava indo em direção a ele, fingiu.
-Ei ? - minha voz fez ele olhar pra mim.
-Falou comigo ?
-Humrum... Você me conhece de algum lugar ?
-Não que eu me lembre... Porquê ?
-Eu notei que você estava me observando, então vim ver se era algum conhecido – ao ouvir isso, ele sorriu.
-É, eu estava mesmo... Mas não te conheço, eu acho... - ri... Não demorou muito para eu entender o porquê ele estava me olhando. Era um rapaz bonito, pouca coisa mais baixo que eu, também encorpado, branco, olhos e cabelos pretos. Vestia uma camisa marrom de mangas compridas bem colada ao corpo, de modo que eu conseguia ver todo o corpo que ele portava. Eu sempre tive a noção de que me interessava por ambos os sexos, só não assumia isso pra muita gente.
-E o que você está fazendo aqui ? Sozinho numa noite como essa ?
-Te faço a mesma pergunta – foi a minha vez de rir.
-Eu vim só pra sair de casa mesmo. Estava tudo muito monótono então eu vim...
-Eu vim pra esquecer... Esquecer um relacionamento que acabou hoje...
-Ah é ? Porquê acabou ?
-Ela descubrou que eu gosto de homens também, e não conseguiu aceitar – falou, me olhando...
-Agora eu entendo porque você estava me olhando... - ele riu.
-Qual é o teu nome ?
-Luan, e o teu ?
-Miguel...
Pra falar a verdade eu nem dançei. Apenas fiquei ali, conversando com ele e bebendo.
-E você gostava muito da moça ? - perguntava eu.
-Pra falar a verdade já não estava mais gostando muito. Acho até que nunca gostei. Ela era uma boa moça, e quando começamos ela insistia muito. Além disso ela era bonita, e então eu acabei dando uma chance. Foi bom enquanto durou, mas agora acabou, e eu só tenho que esquecer...
-Entendi... - falei, sorrindo.
-E você ? Não dá pra acreditar que alguém bonito como você tenha uma vida monótona – ri.
-Na verdade não tenho... Não sei porquê, mas nos últimos tempos ando me sentindo angustiado. Como se precisasse recomeçar a minha vida. Como se tivesse faltando algo, que eu não entendo direito o que é...
-Que complicado... Sabe, eu sinto que eu já te vi em algum lugar... Só não lembro direito aonde foi...
-Engraçado que eu também estou tendo a mesma sensação...
Foi uma troca de olhares durante um bom tempo, enquanto aquela conversa fluia... Fui bebendo mais e mais, e quando fomos ver, já estávamos os dois completamente alterados e longe da sensatez... Eu não era de fazer isso, na verdade nunca tinha me embebedado na vida. Mas naquela noite eu não estava nem ai pra nada.
-Cuidado rapaz, você vai cair – ele dizia, enquanto nos dois se seguravamos um no outro para nos mantermos em pé.
-Você também oras... Se cairmos aqui não vamos levantar nunquinha hahaha – riamos como duas crianças.
-Como é que você vai voltar pra casa ein ?
-Acho que vou de táxi – falei, rindo.
-Você não quer ir pro meu apartamento ? A noite mal começou ainda... - olhei para ele com meu olhar meio turvo. Não sei o que foi que me deu, eu não era de fazer loucuras. Mas naquela noite eu fiz.
-Vamos... Não estou mesmo com vontade de ir pra casa... - ele riu...
E apoiando um no outro, acabamos chegando no ponto de táxi que ficava em frente a boate. Em meio aos risos e piadas, andamos até um prédio bem bonito num bairro nobre da cidade. Não demorou muito para entrarmos no apartamento dele. A aquela altura eu não estava nem pensando em nada, se era arriscado, se não era, se estava bêbado.
-É aqui que eu me escondo – falou ele, rindo, enquanto andava se escorando nos móveis, e se jogava no sofá da sala.
-Belo apartamento... - falei, me sentando ao lado dele. Ele riu...
-Mas a minha intenção não é deixar ele arrumado, hoje... - falou ele, se sentando do meu lado. Imediatamente eu olhei nos olhos dele, ele nos meus. Eu já havia entendido desde antes o que ele queria comigo.
-Eu sou bem bagunceiro – falei, rindo... Senti a mão dele pegando no meu ombro, e ele desceu lentamente, e começou a desabotoar a minha camisa. Quase que imediatamente aquele rapaz bonito avançou em mim e me beijou. Eu não sabia aonde estava a minha noção naquele momento. Só sei que aquele beijo, foi o melhor que eu já tinha recebido até ali. E me trouxe lembranças. Eu só não sabia de quê...
Continua
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