Assim que abri a porta, tive a infeliz surpresa de dar de cara com Olavo.
- oi. – disse ele.
Tentei fechar a porta de imediato, mas o rapaz colocou o pé impedindo.
- eu quero entrar. – disse ele com a voz firme. – é melhor você cooperar.
- o que tu quer aqui?
- quero entrar rapidão. Abre! – disse ele.
- minha mãe ta pra chegar.
Olavo sorriu.
- sei que tu ta sozinho. Abre logo, ou então vou meter o chutão.
- vai embora cara, por favor.
- eu não quero confusão não, velho. Sai logo da frente dessa porta. – disse ele empurrando com o pé.
Olavo empurrou com tanta força que me jogou pra trás.
- shiii. Tu é fraquinho assim? – zombou.
O rapaz fez um giro com o corpo observando toda a minha residência, acho que ele não estava acostumado a lugares simples.
- ta sozinho né!? – perguntou.
Confirmei com a cabeça.
- mas minha mãe ta chegando. – falei.
Ele não ouviu, ou fingiu não ouvir, fechou a porta na chave e se aproximou do sofá.
- posso sentar? – disse ele já se acomodando.
- eu não quero mais confusão. – falei me encostando na parede.
Meus olhos estavam vermelhos: Raiva, medo, nervoso... Sei lá o que era.
- eu também não quero mais encrenca, por isso to aqui. – disse ele. – senta aqui. - apontou para o seu lado no sofá.
- to de boa aqui! – falei afastado.
- tanto faz. – ele deu de ombros. – como é que você ta? – perguntou me fitando bem concentrado.
- fala da surra? – perguntei.
Envergonhado, Olavo virou o rosto.
- acho que eu estava possuído naquele dia. – disse calmamente.
- posso ser sincero contigo?
- claro.
- discordo quando você fala que estava possuído. Tu fez aquilo de caso pensado, arquitetou tudo. Possuído se tu tivesse agido pela emoção do momento, e não foi isso que aconteceu, ou foi?
Olavo me encarou em silencio.
- é... Pode ser que tu tenha razão. Eu fiquei chapadão contigo porque achei que tu tivesse avariado minha apostila de propósito.
- a gente já estuda no mesmo colégio há um tempão né!? E tu deve nunca ter reparado em mim pra achar que eu teria coragem de fazer isso. Eu não sou assim, cara.
- mas cumpade, raciocina comigo: Eu entro no banheiro e vejo minha apostila toda molhada dentro do vaso sanitário, o que tu pensaria se tivesse no meu lugar?
- ah, sei la po. Mas a ultima coisa que eu faria seria sair espancando alguém.
- nós somos diferentes. Você é calminho, já eu não sou. – disse ele.
- mas isso não justifica. – falei.
- eu não to querendo justificar. Sei que o que fiz é injustificável, mas eu queria que tu procurasse ver meu lado. – respondeu ele.
Eu estava escorado na parede da sala; Olavo, sentado no sofá.
- O Junior teve por aqui né!?
Confirmei com a cabeça.
- ele teve uma conversa séria comigo. To muito arrependido do que fiz, Eduardo. Sei lá cara, to mal de verdade.
- eu não acredito em teu arrependimento não, velho, mas eu quero paz pra minha vida. O Junior conversou comigo, e ficamos acordados que não iria falar nada do que aconteceu pra ninguém não.
- pô cara, não sei nem como te agradecer.
- mas eu sei.
- então fala.
- só queria terminar o ano letivo longe de confusão. Tava tudo numa boa antes de vocês aparecerem.
- eu não queria te meter em confusão não.
- mas meteu pô, e pior que isso, tu me fez mal pra caralho, me espancou gratuitamente.
Olavo levantou e veio caminhando em minha direção. Por um lapso de segundo eu achei que ele fosse me bater outra vez. Encolhi-me contra a porta esperando a pancada, mas ele parou em minha frente e falou olhando em meus olhos.
- eu to extremamente arrependido de ter feito isso com você. Foi molecagem da minha parte.
Meus olhos foram se abrindo aos poucos, e Olavo, naquele momento, não aparentava que fosse me bater.
- pode ate ser que tu esteja arrependido mesmo, mas isso não muda em nada. – falei.
- e não tem como você me perdoar?
- hoje não. Tudo ainda ta muito fresco em minha cabeça.
- eu te entendo, mas você acredita que eu to arrependido não acredita? – perguntou.
O olhar do Olavo era indecifrável. Eu não sabia o que passava em sua cabeça, e nem se ele era sincero em suas palavras.
- pra falar a verdade, eu não acredito. Acho que tu só quer me convencer a esquecer de tudo e não tem entregar.
Ele soltou um sorriso tímido.
- eu não vou mentir pra você, claro que tenho esse medo, mas não é por isso que to arrependido. To arrependido porque realmente caiu a ficha de que eu fiz merda com você. Eu quero fazer algo por você pra poder me redimir.
- Fazer algo por mim? Como assim?
- ué. É uma forma de tentar diminuir meu erro. Sei lá. – disse ele coçando a cabeça e virando o rosto. – medicamentos? – perguntou olhando novamente para mim.
- já tenho o suficiente.
- livros? Você gosta tanto de estudar. – sorriu.
- no momento to dando uma pausa nas leituras.
- então me diz, você. O que eu posso fazer pra te ajudar?
- nada. – falei seco.
- nada? – ele se surpreendeu.
- por enquanto eu to de boa.
- tem certeza? – insistiu.
- tenho sim.
- certo, mas e como a gente fica? Você não ta pensando mesmo em contar nada pra ninguém?
- não cara. Já decidi: Não vou comentar nada do que aconteceu no banheiro.
O rapaz pareceu aliviado.
- de qualquer forma você pode contar comigo, se precisar. A gente vai ta sempre se topando mesmo.
- beleza.
- eu vou ter que ir nessa. Ainda vou participar de um campeonato de sinuca.
- tranquilo.
Afastei-me da porta para que Olavo pudesse sair. Ele ficou um tempo em pé ali parado, com o sol penetrando em seu olhar. Repentinamente virou-se para mim e tornou a agradecer. Sua mão, macia, tocou a minha e em seguida ele foi caminhando para o carro.
Fechei a porta e senti meu coração acelerar. Agora eu estava definitivamente me livrando do Olavo, e até o natal, me livraria do Junior. Enfim, aquele inferno chegaria ao fim.
Ainda com as pernas falhas, sentei no sofá e voltei a assistir. Senti um volume por baixo da roupa, passei a mão e topei uma carteira.
- caralho! – exclamei alto. – Aquele bicho esqueceu a carteira.
Corri na direção da porta, mas já era previsível que naquele momento ele estivesse longe. Guardei a carteira dentro da minha mochila e fiquei esperando o Olavo retornar.
A quinta ,passou a sexta também, e eu estranhei o Olavo não ter aparecido pra buscar a carteira dele. No sábado pela manhã recebi uma ligação de um número estranho.
****
- Oi. – falei ainda meio sonolento.
- te acordei?
- não. Já tava acordado.
- sabe quem ta falando?
- o Olavo né!?
- eu mesmo. – senti o rapaz sorrir do outro lado da linha.
- tava esperando tu ligar. Naquele dia tu esqueceu tua carteira e não voltou mais.
- tava na correria, mas vou dar uma passada ai pra buscar. Ta em casa né!?
- to sim.
- posso ir ai agora?
- pode.
- beleza.
- falou.
****
Mal desliguei a ligação, e o Olavo tocou na porta.
- tu já tava aí na frente? – perguntei.
- não! É que sou mutante.
Ele me fez rir.
- teu cu. – falei no impulso. – foi mal, cara, não quis falar isso. – disse me retratando.
Olavo riu da minha cara.
- relaxa! – disse ainda sorrindo. – ta sozin em casa?
- eu acho que sim. Acabei de sair do quarto, e não vi ninguém.
- ah sim.
- tu espera um pouco que vou buscar tua carteira.
- tranquilo.
Fui ao quarto pegar a carteira, e ao retornar, encontrei Olavo sentado no sofá com o controle nas mãos mudando os canais da tv.
- aqui. – falei lhe devolvendo a carteira.
- ah, beleza. – disse ele estendendo o braço e pegando o objeto.
Olavo não desgrudou os olhos da tv, e ao me ver, espreguiçou-se mais ainda no sofá. Era incrível como ele e Junior se pareciam tanto. Os dois eram folgados ao extremo.
Sentei ao seu lado, e fiquei esperando que ele fosse embora, mas longe disso. O rapaz assistia, e se envolvia cada vez mais com o programa esportivo que estava no ar. Repentinamente, o celular de Olavo tocou, e ele falou algumas coisas que não entendi. Ao desligar o celular, o rapaz se despediu de mim.
- vou ter que ir nessa. – disse ele.
- beleza.
- ah! – disse ele chegando à porta. – ta sabendo da excursão que vai ter na próxima semana?
- o Pádua falou alguma coisa sobre isso. Vai ser da disciplina de biologia né!?
- historia e educação física também.
- não sabia. Tava sabendo só de biologia mesmo.
- mas os outros também vão ta la nos avaliando. Tu vai?
- se eu tiver melhor, vou sim.
- ta certo, então espero que você melhore.
- valeu.
- a gente se ver na aula.
- beleza.
O rapaz me deu uma ultima encarada, e saiu. Passei a chave na porta, e sentei no sofá. A almofada onde Olavo estava apoiado, ainda estava quentinha. O forte cheiro do perfume ainda pairava no ar.
- Que cheiro bom. – pensei.
Estiquei-me no sofá e voltei a dormir. A tardinha, minha mãe chegou com meus irmãos mais novos, e logo em seguida, Pádua e Ana apareceram lá por casa me convidando para ir pra um barzinho que ficava no centro da cidade. Tomei um banho rápido, disse à minha mãe que iria a uma sorveteria e saí com meus amigos.
Assim que entramos no carro, Pádua foi logo acendendo um cigarro.
- porra. Já vai fuder meu pumão né viado? – falei.
- a senhora vai viver pra vida toda?
- quero chegar pelo menos aos oitenta né!?
- deixa de ser fresca né mulher!? Pra que chegar aos oitenta, velha, raquítica, cheia de osteoporose, espregueada e sozinha na vida?
- uai, quem ti garante que meus oitenta anos será assim? Virou mãe diná agora foi?
Ana, ao volante, apenas ria.
- vê se não vai tragar aqui dentro do meu carro, Pádua. Solta essa fumaça ao menos lá fora. – disse ela partindo para o centro.
- vocês são uns porres hen!? – resmungou Pádua.
- dois contra um seu otário. – sorri.
- amigo, nem te conto. – disse Ana me olhando pelo retrovisor central.
- o que aconteceu?
- tu tem concorrente la na escola. – ela sorriu.
- verdade. – Pádua gargalhou.
- não entendi. – falei apoiado entre os dois assentos da frente.
- chegou um novato la na escola pra tomar teu lugar. – disse Ana.
- ainda não entendi. – falei.
- amigo presta atenção: Ontem chegou um aluno novo que é a tua cara. – disse Pádua.
- serio? – perguntei.
- serio. – confirmou Pádua.
- não! – negou Ana. – né tua cara não. Fisicamente, vocês são bem distintos.
- é... Fisicamente ele é bem mais gato que você. – do banco da frente, Pádua sorria.
- nada a ver. – discordou Ana. – os dois são lindos.
- to confuso. Ele se parece comigo ou não?
- parece. – os dois falaram ao mesmo tempo.
- eita. Simone e Simaria é? – sorri. Vocês tão me deixando confuso. Afinal o que tem a ver esse cara comigo?
- vou te explicar amigo, a Ana é muito burra pra isso. – disse Pádua tirando sarro da cara de Ana. - Ele se parece contigo, mas não fisicamente, e sim interiormente. Ele é nerd, nerd, nerd igual a você. – Disse Pádua.
- ahhh! Agora entendi, mas por que ele iria roubar meu lugar?
- agora ele é o mais inteligente da sala né amigo!? Tu perdeu a posição. – falou meu amigo.
- ah po, que ele faça bom proveito. – falei sorrindo. – cansei de ser o nerd certinho.
- oi? Como assim Brasil? – indagou Ana.
Minha amiga olhou-me e sorriu.
- quer dizer que agora tu vai pro crime? – brincou Pádua.
- vou! Agora liguei o foda-se. – sorri.
- então bate amigo, estamos juntos. – disse ele do banco da frente.
- mudando de assunto quando tu volta pra aula mesmo? – perguntou Ana.
- segunda eu to de volta.
- mas já encerrou teu atestado? – perguntou
- já mermo. Era pra eu ter retornado essa semana. – falei.
- entendi amigo, mas tu se sente melhor pra retornar?
- meio capenga, mas bem. – sorri.
- olha amigo, se precisar de qualquer coisa pode contar comigo ta!? Pra qualquer coisa mesmo. – disse Ana.
- obrigado, amiga. Sei que posso contar sim.
Passamos mais um tempo na estrada, até que chegamos ao famoso bar. O sol já começava a se esconder, e o calor pedia uma cerveja estupidamente gelada.
O bar ficava de frente para o rio que banhava a cidade. Pegamos uma mesa que ficava ao lado do porto, logo, bebíamos e assistíamos pessoas chegando e partindo de barcos e navios com frequência. Naquela noite, tocava uns sertanejos cover, a gente estava bebendo e se divertindo bastante. O Pádua estava relatando sua semana e um envolvimento que estava surgindo com o padrasto. Ana contou da aventura que estava tendo com o primo mais velho, com direito a tentativa de sexo anal.
- tudo isso pra segurar o boy? – perguntou Pádua tomando de sua caipirinha.
- como coisa que tu nunca deu o cu né!? – disse a garota.
- é diferente né amiga!? Muito diferente por sinal. Eu não tenho uma rachada no meio das pernas igual a você, então eu só posso dar o meu edy. – disse ele gargalhando.
- agora o defeito é minha rachada? Não tenho culpa ta querida se você só tem uma opção. Eu tenho duas, na frente e atrás. Ta bom pra você? – disse ela batendo o cabelo no rosto do Pádua.
Eu ri dos dois. Era bom, depois de tantos problemas, sair um pouco pra espairecer. Abri uma longnet, e tomei no gargalo. Um pouco a frente da nossa mesa eu avistei alguém conhecido. Meus olhos bateram na mesa dele sem querer. Nunca imaginei que ele fosse estar ali àquela noite.
Junior me olhou, e disfarçadamente acenou com os olhos. Retribui o aceno e tirei a visão da mesa dele. O cara estava acompanhado de uma morena e outro casalzinho de playboys de merda. Fiquei com um sentimento estranho ao vê-lo ali. Senti raiva, raiva de vê-lo e raiva de sentir aquilo por ele.
- hey psiu! – disse Pádua estralando os dedos na minha frente.
- hã! Oi!. – respondi ainda com a garrafa de cerveja nas mãos.
- ta viajando hen!? Estamos falando contigo faz um tempão.
- desculpa. Tava pensando numas coisas aqui. O que foi?
- vamos pedir algo pra beliscar. Tu quer o que?
- há, o que vocês pedirem eu como.
- pode ser frango à passarinha e batata frita com molho de alho.
- ahan. – respondi.
- ta tudo bem? – perguntou Ana.
- comigo tudo, por que? – perguntou a garota.
- ah, sei lá. Tu está pálido. – disse ela revezando o olhar entre mim e o cardápio.
- impressão tua, eu to ótimo. Vou ao banheiro rapidão. – falei.
- também vou. – levantou Pádua.
- visheee, vão retocar a maquiagem é? – brincou Ana.
Sorri e joguei um guardanapo nos peitos da minha amiga.
Levante-me e segui Pádua ate o banheiro. Enquanto eu entrei em uma das cabines para urinar, meu amigo ficou mexendo no cabelo na frente do espelho.
- viu quem ta aí? - ele perguntou.
- não! Quem? – fingi não ter notado a presença do Junior.
- o Junior.
- ah é?
- ahan. Ta com uma piranhuda lá do segundo c’’.
- que bom né!? – falei fechando meu zíper e saindo da cabine indo em direção ao espelho.
- acha mesmo? – perguntou me encarando pelo espelho.
- o que?
- isso aí que tu acabou de falar.
- Tu não gosta não de namorar?
- gosto sim, mas não gosto de ver quem eu gosto com outras pessoas.
- shiii. Ta viajando hen!? – sorri nervoso.
- amigo. – disse ele tocando em meu ombro. – eu sei de tudo... Sei que você gosta desse cara. Eu vi tua reação ao ver ele chegar acompanhado.
- pra ti ter ideia eu nem vi esse cara aqui. Se tu não tivesse me falando, talvez fosse pra casa sem vê-lo.
Pádua sorriu indiscretamente.
- pra cima de mim? A Ana pode ate ser uma rachada burra, mas eu pego as coisas antes delas acontecerem.
- ta vendo coisa demais.
- ele também ta na tua, escreve o que eu to falando.
- tu mistura cerveja com vodka e fica viajando na Disney né!?
- eu sei o que eu to falando amigo. – disse ele exalando álcool. – eu tenho experiências nessas coisas, e te garanto que se ele não tiver na tua, mas ele vai ficar.
Pádua me deixou sem reação. Eu não conseguia nem imaginar Junior na minha.
- esses dias que tu não tava indo pra aula, ele sempre perguntava por ti.
- sério? – falei eufórico.
- deveria eu nem ti falar isso né!? – sorriu.
- o que ele perguntava?
- se tu tava namorando alguém.
- hã? Jura? – perguntei curioso.
- claro que não né!? – Pádua riu. – ele sempre perguntava como tava tua recuperação.
- to ligado.
- mas já é alguma coisa né!? Se ele ta preocupado, é porque tu interessa a ele.
- nada a ver.
- uai. E por que ele perguntaria então?
- ah, sei lá.
- sei não, mas ainda acho que ele tem coisa aí.
- ah, não viaj...
Surpreendentemente, Junior entrou no banheiro justamente no momento em que falávamos sobre ele.
Ele nos cumprimentou com um ‘’oi’’ frio e depois entrou em uma das cabines.
- será que ele ouviu alguma coisa? – perguntei num fio de voz, arrastando o Pádua para fora do banheiro.
- claro que não, estávamos falando baixo.
- será? – perguntei caminhando de volta à nossa mesa.
- lógico. A não ser que ele estivesse ouvindo atrás da porta, mas isso não parece ser a cara dele. – disse meu amigo.
Finalizamos a conversa ao sentar à mesa.
- caganeira nos dois? – perguntou Ana olhando as horas no celular. – quase não voltam, já estava agoniada. Já viram quem ta aqui?
- O Junior? – perguntei.
- e o Olavo. – respondeu a moça.
- Olavo ta aonde? – perguntou Pádua.
- não olha, mas ele ta em uma mesa atrás da gente.
- a escola toda ta aqui hoje? – perguntei.
- parece que sim. – respondeu Ana.
- ta sem opção na cidade né!? – falou Pádua.
- acho que é prova de matemática. – disse Ana.
- só pode né!? – completei sorrindo.
Mal tínhamos terminado um balde de cerveja, e o garçom trouxe outro.
- eu não sei se vocês sabem, mas eu estou desprevenido de grana ta!? – falei abrindo outra ‘’longnet’’.
- tu vive desprevenido de grana amigo. – Pádua tirou onda.
- isso aí amigo, continua humilhando.
- mas tu sabe que eu te amo né!? Com dinheiro ou sem dinheiro, eu adoro tua companhia. – disse ele levantando sua garrafa e ofertando um brinde.
- sei sim. – falei encostando a minha garrafa de cerveja na do meu amigo.
- meninos, vou retocar minha maquiagem, comportem-se viu!? – disse Ana levantando com sua bolsa.
- pode deixar mamãe. – respondi.
- e nada de marcar esquemas sem minha anuência.
- jamais, só saiu com alguém sobre sua autorização. – brinquei.
- bom menino. – disse ela dando um beijo em minha testa.
- santo Deus. Que homem é esse? – disse Pádua ao ver Junior retornar à sua mesa.
O rapaz tinha passado ao lado da gente com seu perfume entrando completamente em minha narina, sua roupa combinando com seu corpo esbranquiçado, seu cabelo incrivelmente bagunçado, a camiseta realçando seus braços... Tudo nele era perfeito.
- tu acha que ele fode bem amigo?
- ahan. – falei ainda de olho no rapaz. – hã? Há, sei la Pádua. Que pergunta doida é essa?
Pádua gargalhou.
- Olhando pra ele assim tu acha que ele tem quantos centímetros?
- uns 18?
- acho que tem mais hen!? Ele tem cara de ter uns 20 centímetros.
- caralho. – sorri. – ele num é um cavalo não.
- se ele não tiver isso, mas chega perto. Eu sei só no olhar.
- pelo tamanho do pé? – perguntei.
- não! Eu já vi ele mijando la atrás da quadra.
- da escola?
- sim.
- como foi isso?
- foi na saída da aula de educação física. Ele estava com preguiça de ir ao banheiro, tirou o pinto pela parte debaixo do short e mijou no muro da quadra. Amigo, vou ser bem realista contigo, ele te arrebentaria em dois tempos.
- saí daí Pádua. – sorri. – Tu é muito otario cara. – falei abrindo outra cerveja, e acertando a tampinha na testa do meu amigo.
- eu falo sério. A rola dele é muito grande, e acho que ele deve saber usa-la muito bem. – meu amigo passou a língua nos lábios como se tivesse sentindo muito tesão.
Eu apenas sorri, mas no fundo acabei tentando imaginar como deveria ser a pica do Junior.
Minha amiga retornou do banheiro, e emborcamos mais alguns baldes de cerveja.
O local foi ficando cada vez mais lotado, e eu cada vez mais calibrado.
- gente, vocês conhecem o Alysson?
- Alysson... Alysson? Eu não conheço. – falei.
- O Alysson que tu ta falando era um lourinho que formou ano passado? – perguntou Pádua.
- isso. Um que ta cursando agronomia. – respondeu Ana.
- sei, o que tem ele?
- ele acabou de me mandar uma mensagem dizendo que ta la no casarão, e que ta rolando um pagodinho com open bar há trinta e nove reais, vamos?
- até que horas? – perguntei.
- deixa eu perguntar aqui pra ele. – disse ela mandando uma mensagem pelo zap.
O rapaz não demorou muito a responder.
- olha só, vai ate as quatro. – disse ela lendo a mensagem na tela do celular. – o que vocês acham?
- rapaz, eu topo ir, mas eu não tenho esse dinheiro. Num vou mentir não.
- eu pago a tua amigo. – ofereceu Ana.
- então fechou. – falei.
Minha amiga não perdeu tempo e foi logo pedindo a conta.
Saímos do bar e não demoramos a chegar ao casarão. Ana foi ate a bilheteria e comprou 3 entradas.
- seria coincidência se o Junior viesse pra mesma festa que a gente? - perguntou Pádua.
- coincidência demais né!?
- então segura essa, por que ele acabou de descer do carro.
- ele ta aqui? – perguntei.
- não olha pra trás agora não, mas ele ta la no estacionamento conversando com o Olavo.
- o Olavo veio também?
- ahan. – disse ele.
- puta merda! – exclamei.
- o que foi? Tu disse que não sentia nada por ele, que eu estava vendo coisa onde não tinha, e por que essa reação agora?
- é que eu não curto frequentar os mesmos lugares que o pessoal la da escola. – menti.
- ahan, sei. – sorriu.
- falo sério.
- eu acredito. – riu mais ainda.
Finalmente a Ana chegou e adentramos a boate. Minha amiga trocou algumas mensagens e tentou conseguir umas pulseirinhas pra gente poder usar o camarote.
- está oferecendo teu corpo né mona!? – disse Pádua.
- ela não trabalha com o corpo, amigo, agora ela só da o cu. – falei.
Pádua gargalhou.
- hahaha. Muito engraçadinho vocês dois né!? Eu não trabalho com corpo, e muito menos dou meu cu pra qualquer um.
- só pros primos. – falei.
- teu cu. – disse Ana sorrindo.
A menina foi na frente e nós a acompanhamos. Ana subiu uma escadinha, e veio um rapaz ao seu encontro trazendo algumas pulseiras. Ela acenou com o braço e subimos.
- aqui. – disse ela nos entregando umas pulseiras de cor verde limão.
Colocamos os objetos nos pulsos e subimos para o segundo andar. Logo de cara, Ana nos apresentou a alguns amigos que estavam no local, entre eles o tal do Alysson. Lembrei-me dele da época do colégio. Parecia ser um cara de boa, mas que eu nunca tive afinidade.
O cara nos deixou muito bem à vontade. No camarote era servido vodka com suco, evitei tomar, pois eu já havia bebido muitas cervejas, e a combinação poderia ser fatal.
- não vai querer por que? – perguntou Pádua.
- eu não quero dar pt hoje não. – falei.
- voltou a ser certinho? Tu num disse que ia ligar o foda-se?
- uma coisa não tem nada a ver com a outra. Quis deixar de ser besta, e não que vou sair por aí perdendo a dignidade.
- deixa de se cobrar tanto, Dudu. Isso aqui é uma festa, e todo mundo vem aqui pra perder a dignidade mesmo. – devido o som muito alto, Pádua falava ao pé do meu ouvido.
- todo mundo, menos eu né!? Se eu perder minha dignidade, nunca mais eu recupero.
- deixa de ser besta, amigo. Nós somos novos e temos que curtir isso aqui mesmo. Daqui há uma semana ninguém nem lembra mais o que aconteceu nessa festa, só resta os momentos bons.
Pra encurtar conversa, eu acabei cedendo. Só tinha vodka, então era vodka mesmo que eu ia emborcar. Comecei maneirando, mas depois fui aumentando a dose. Minha cabeça começou a revirar, mas eu estava plenamente consciente de tudo.
- ta tudo bem amigo? Ta tonto? – perguntou Ana colando em meu corpo.
- ta sim. Só a cabeça que ta doendo forte. – falei a abraçando.
Ana me fez um cafuné gostoso.
- vou pegar uma coca bem gelada pra ti. – disse ela.
- ta bom. – falei.
- me espera aqui.
- beleza. – respondi.
Mal, minha amiga saiu, e o Alysson encheu meu copo. Senti a bebida arder na goela e uma pontada forte no estomago. Fiz uma careta, mas permaneci firme.
- mais uma? – perguntou o rapaz com a garrafa de bebida nas mãos.
- pode por. – falei erguendo meu copo de acrílico.
Voltei a tomar a bebida, e minhas pernas foram ficando tropeiras. Alysson me deu uma mão pra eu permanecer em pé.
- Ooopa. Força guerreiro. – disse ele sorrindo.
Retribui o sorriso.
- coloca um pouco mais. – falei.
- tem certeza? – perguntou ele.
- tenho sim.
- você é dos meus. – disse ele mantendo meu copo cheio.
- como é o nome dessa mistura de vodka com suco? É gin? Ginny? Como é mesmo? – falei um tanto animado.
- Gummy. – respondeu o rapaz.
- isso, gummy. É muito bom.
- uma delicia não é? Só tem que ir com calma, pro álcool não te derrubar. – sorriu.
- ta tudo sobre controle. Quando eu ver que não estou aguentando mais, eu dou uma parada.
- pode crer.
- tu viu o Pádua?
- Pádua é o teu amigo?
- isso.
- não oh, faz um tempinho que não o vejo por aqui.
- certo. Se ele ou a Ana retornarem, tu avisa que eu fui ao banheiro?
- aviso sim.
- valeu. – falei saindo daquele setor.
Desci as escadas, me segurando pra não cair de cara no chão. No andar debaixo, tive a impressão de ter visto Pádua. Corri ate ele, e lhe dei um tapa de leve na nuca.
- Tava bem dando o cu né seu viado? – gargalhei.
O cara, que não era o Pádua, virou-se na minha direção e perguntou se eu tava ficando doido.
- desculpa fera, eu te confundi com um amigo.
- de boa! – ele respondeu ainda com a cara fechada.
Acelerei a passada, e cheguei ate o banheiro. Tratei logo de passar uma água no rosto pra ver se diminuía aquela dor na cabeça. Senti a bebida querendo voltar, e não me intimidei. Mesmo com o banheiro lotado, eu vomitei tudo ali no mictório mesmo.
- Ta tudo bem? – alguém perguntou tocando nas minhas costas.
Continuei vomitando, e não olhei para trás, apenas levantei o dedo indicando positivo.
- Pode deixar que ele ta comigo, parceiro. – alguém falou entrando no banheiro.
Ainda de cabeça baixa tentando por tudo pra fora, não virei para ver quem era, mas aquela voz era irreconhecível. Sim, era o Junior. Vomitei tanto, que senti a barriga esvaziar. Retornei ao lavatório e joguei mais um tanto de água na cara. Dessa vez queria tirar os requisitos de vomito que provavelmente estavam deixando meu rosto sujo.
- deu uma exagerada né!? – perguntou Junior parado por trás de mim.
- bebi um pouco mais que o normal.
- ta tudo bem?
- agora ta.
- evita continuar bebendo, e procura tomar bastante água.
- ta bom. – confirmei ainda me limpando de frente para o espelho.
Junior entrou em uma das cabines para urinar, e eu voltei a vomitar. Dessa vez a quantidade foi muito maior.
Junior saiu da cabine, lavou as mãos e se abaixou ao meu lado.
- ta com quem aí? – perguntou.
- o Pádua e a Ana.
- então pede pra eles levarem você em casa. Não tem condição de tu continuar aqui nesse estado.
- eu sei, mas eles estão se divertindo. Eu seria um cuzão se tirasse eles no melhor da festa.
- e tu prefere ficar assim? Tu ta sem cor nenhuma.
- eu vou chamar um uber e já vou pra casa.
- tu consegue dar o endereço certinho desse jeito que tu ta?
- eu to de boa, Junior. Só a cabeça que ta doendo muito.
Junior me conduziu pelo braço até o lavatório, e jogou na água na minha cara. Pelo espelho eu vi seu reflexo sorrindo.
- tu não nasceu pra beber não, Eduardo. – disse ele.
- to ligado.
- você é de outro mundo. – disse passando a mão e tentando limpar meu rosto.
- não entendi. O que isso significa?
- você é um cara com um dom especial. Teu Q.I é muito grande pra ta numa festa dessas. Tu tem cara de algo mais cultural.
Fui obrigado a sorrir.
- isso foi um elogio?
- foi sim. Acredite. – disse rindo.
Repentinamente, fechei meus olhos e senti tudo girar. Segurei firme na parede do banheiro pra não desabar.
- o que foi? – perguntou Junior.
- ta tudo girando. – falei ainda com os olhos fechados.
Aquela dor era insuportável. Eu daria tudo pra estar na minha casa, deitado na cama e debaixo de um cobertor quentinho.
- é o efeito do álcool. – falou o rapaz. – acho que não tem chances de tu ir de uber não, eu vou te levar em casa.
- de boa Junior, precisa se preocupar não. Curti a festa aí que eu consigo chegar em casa só.
- eu também já to querendo sair fora. Já ta tarde e amanha cedo eu vou pescar com meu pai.
- então de qualquer forma tu já ia pra casa?
- sim. – disse ele me fitando.
- então eu vou aceitar uma carona, mas e tua namorada?
- a Lorena? Ela não é minha namorada não.
- menos mau cara. Eu iria me sentir péssimo se estivesse atrapalhando alguma coisa.
- atrapalha nada não, relaxa! Me espera na saída, que vou só me despedir de algumas pessoas.
- vai lá. – falei.
Não encontrei meus amigos em lugar algum, então apenas passei uma mensagem para cada um, dizendo que já estava indo.
Conforme combinado, encontrei com Junior na saída.
- vamos? – disse ele tirando a chave do bolso.
- bora. – respondi.
Junior ligou o som do carro, e foi o caminho todo puxando conversa pra evitar que eu dormisse.
Ao estacionar o carro em frente a minha casa, ele saiu do veículo e me ajudou a descer. O rapaz apoiou sua mão nas minhas costas e foi me conduzindo ate o portão.
- cadê a chave? – perguntou ele.
- ta aqui no bolso da calça.
- me da aí. – pediu.
- depois eu abro.
- e por que não agora?
- Junior? – falei meio tropo coçando a cabeça.
- fala. – disse ele me fitando.
- eu não posso entrar em casa.
- por que não pode?
- minha mãe não gosta de bebida. Se eu entrar assim, vai causar o maior climão.
Junior sorriu.
- o que foi? – perguntei.
- lembrei-me do dia que teus irmãos encontraram a arma do meu pai dentro do carro. Achei que tua mãe fosse me fuzilar com os olhos.
Eu ri.
- ela é assim mesmo. Ela educou a gente de uma forma toda certinha, e não gosta muito quando a gente foge da linha.
- ela ainda te bate?
- não cara, mas eu preferia que batesse. Quando ela ta chateada com alguma coisa, é muito pior que umas cintadas.
- to entendendo. Com meu pai é a mesma coisa. Se eu não seguir as normas dele, ele me caga todinho.
- minha mãe é desse jeito. – sorri.
Junior riu.
- mas e como tu vai fazer? Vai passa a noite aqui fora?
- até sair um pouco esse cheiro de cachaça.
- ce ta maluco? Eu não vou deixar você fica aqui no relento não. Bora, vou te levar pra dormir na minha casa.
- não po, ta de boa. Eu to todo sujo e fedido.
- e o que tem demais? Tu toma um banho, coloca uma roupa limpa, come alguma coisa e tira um cochilo. Amanhã tu volta.
- eu num quero dar trabalho não.
- né trabalho nenhum. E bora logo que aqui ta fazendo frio.
Junior, confiante que eu iria, saiu na frente e já foi destravando o carro.
- vem. – chamou ele já dentro do veículo.
Apenas sorri, e o acompanhei.
Continua...
Flynnagin, eu já ouvi falar no o wattpad, mas eu não sei como funciona pra postar la.