A semana de lançamento de uma revista como Celebrity é o caos total. Cada chefe de departamento fica à beira de um ataque de nervos. Escrivaninhas ficam lotadas, telefones indisponíveis e almoços são deixados de lado. O ar fica
saturado de uma sensação de pânico que cresce a cada hora. O bom humor desaparece e os pedidos beiram o ultraje. Na maioria dos departamentos, as luzes ficam acesas até tarde da noite. O forte aroma de café e a ardência da fumaça de cigarro estão sempre presentes. Caixas de antiácidos são devoradas e garrafinhas de colírio passam de mão em mão. Após cinco anos na equipe, Gabriel já considerava o pânico mensal parte do trabalho.
Celebrity era uma publicação fina e respeitável cujas vendas geravam milhões de dólares por ano. Além de histórias sobre os ricos e famosos, publicava
artigos de eminentes psicólogos e jornalistas, entrevistas com políticos e astros de rock. As fotos eram de excelente qualidade, assim como o texto era cuidadosamente pesquisado e redigido de uma maneira concisa e enxuta. Alguns de seus detratores talvez a considerassem apenas fofoca de qualidade, mas a palavra qualidade nunca era esquecida. Um anúncio em Celebrity era aposta certa para gerar vendas e interesse, e
seu preço era igualmente proporcional. Celebrity era, em um negócio competitivo ao extremo, uma das mais importantes publicações mensais do país. Gabriel Radcliffe não teria buscado algo menos importante.
— Como ficou o trabalho com as esculturas? Gabriel lançou um olhar para Bryan Mitchell, uma das principais fotógrafas da
Costa Oeste. Agradeceu o copo de café que Bryan lhe passou. Nos últimos quatro dias, não dormira mais do que 20 horas.
— Bom — disse ele.
— Já vi trabalhos melhores rabiscados em becos. Embora concordasse, Gabriel
apenas deu de ombros.
— Algumas pessoas gostam do que é sem valor e obscuro. Com um sorriso, Bryan balançou a cabeça.
— Quando me disseram para fotografar da melhor forma possível aquele emaranhado de fios pretos, quase pedi para eles apagarem a luz.
— Você fez o negócio parecer quase místico.
— Posso fazer um depósito de entulho parecer místico com uma iluminação adequada. — Deu um sorrisinho para Gabriel.
— Da mesma forma que
você pode fazer ele parecer fascinante. Um sorriso surgiu no rosto de Gabriel , mas sua cabeça já estava se dirigindo
para diversas outras direções.
— Tudo num dia de trabalho, certo?
— Falando de trabalho... — Bryan encostou os quadris bem feitos
acomodados numa calça jeans na organizada mesa de trabalho de Gabriel e bebeu o
café. — Ainda está tentando arrumar alguma coisa com Hunter Brown? As benfeitas sobrancelhas de Gabriel ergueram-se em conjunto. Hunter Brown estava se tornando uma odisseia pessoal e quase uma obsessão. Talvez por ele
ser tão completamente inacessível, ele estabelecera a meta de ser o primeiro a
romper a nuvem de mistério. Levara quase cinco anos até conseguir chegar à
função de repórter, e tinha a reputação de ser obstinado, meticuloso e
impassível. Gabriel sabia que merecia os adjetivos. Três meses dando de cara com paredes vazias à procura de Hunter Brown não arrefeceram seu ímpeto. De um jeito ou de outro, conseguiria a matéria.
— Até agora não fui além do nome do agente dele e do telefone do editor. — Talvez se percebesse um quê de frustração na sua voz, mas a expressão era
de determinação. — Nunca vi gente mais fechada.
— O último livro dele chegou às livrarias na semana passada. — Distraído,
Bryan pegou uma folha do alto de uma das várias pilhas de papéis com que Gabriel vinha sistematicamente trabalhando. — Você leu?
— Dei uma olhada, mas ainda não tive chance de começar. Bryan jogou para trás a longa trança cor de mel, que caiu sobre seu ombro.
— Não comece a ler numa noite escura. — Deu um gole no café e então soltou uma gargalhada. — Cara, acabei dormindo com todas as luzes de meu
apartamento acesas. Não sei como ele consegue fazer uma coisa assim. Gabriel levantou o olhar novamente, os olhos calmos e confiantes.
— Isso é algo que vou descobrir.
Bryan assentiu com a cabeça. Conhecia Gabriel fazia três anos, e não tinha dúvida que ele conseguiria.
— Por quê? — Seus olhos francos e amendoados pousaram sobre os de Gabriel.
— Porque... — Gabriel terminou o café e jogou o copinho na lixeira lotada — ninguém mais descobriu.
— A síndrome do Monte Everest — comentou Bryan, e deu um risinho espontâneo.
Um olhar de relance mostraria dois amigos atraentes numa conversa informal num escritório moderno e bem decorado. Um olhar mais de perto revelaria os contrastes. Bryan, de jeans e com uma camiseta confortável, era
totalmente descontraída. Tudo nele era informal e nem um pouco arrumado — dos tênis manchados às tranças soltas. Seu rosto encantador e de belas feições só recebera uma ligeira pincelada de rímel.
Lee, por outro lado, usava um elegante terninho azul-claro, e os nervos que a mantinham no ritmo eram evidentes nas mãos que nunca se aquietavam. Seu
cabelo tinha um corte perfeito num estilo curto e pendente que precisava de muito cuidado — o que, para ele, era tão importante quanto a boa aparência.
Sua pele tinha a delicadeza e a brancura que alguns ruivos adoram e outras odeiam. Sua maquiagem havia sido meticulosamente aplicada naquela manha, Possuía traços delicados e elegantes que compensavam a boca desmedida e obviamente teimosa.
Os dois amigos tinham estilos inteiramente diferentes e gostos
inteiramente diferentes, mas, por mais estranho que parecesse, a amizade começou no instante em que se conheceram. Embora Bryan nem sempre gostasse das táticas agressivas de Gabriel e este nem sempre aprovasse o jeito despojado demais de Bryan, a proximidade dos dois ficou inalterada nesses três
anos......