Aqueles quatro dias foram intensos; sexualmente intensos. Para mim, claro; não para Marcelo. Assim que acordei na sexta-feira, dia seguinte àquela primeira sessão de filmes, ouvi, como um eco infinito, suas palavras de macho, assumindo-se como o sujeito que come, que mete, que tem o desejo de possuir. E que saboreia o prazer da posse. Havia falado “cientificamente”, mas a partir de uma posição muito clara, e a havia deixado também muita clara para mim.
Não havia nada de surpreendente nisso, porque, afinal, ele era homem e hétero. Mas eu nunca o ouvira falar assim, se posicionar assim. Nem imaginava que um dia ele pusesse de lado suas reservas, mesmo falando “cientificamente”, e, sem rodeios, se apresentaria acima de tudo como um macho, um fudedor. Pois foi o que, no fim das contas, ele fez. Era algo comum em Rodrigo e, principalmente, em Otávio. Faziam mesmo fora do ambiente das fodas, e não só apenas comigo, a quem efetivamente fudiam. Mas Marcelo, até aquela noite, parecia se considerar em outro universo, distante da libidinagem dos rapazes.
Bom, ele estava tendo um caso com uma mulher. Desde que eu me mudara para lá, habituara-me com suas noitadas, até em dias de semana, sobre as quais nada falava. Naquele um ano e meio de convivência, volta e meia havia passado noites fora. Marcelo não comentava, mas evidentemente tinha uma vida sexual. E, ainda que por tabela, ela havia se tornado nítida, e colada à imagem que eu fazia dele, por conta das manchas de porra das quais eu cuidava com atenção. Mas ele, ele mesmo, nunca havia se mostrado como um sujeito sexual. Mesmo ao detalhar as razões da escolha das cuecas que usava, no nosso jantar, havia mantido a sobriedade, demonstrado reserva.
Ao falar do filme, sob a nuvem tênue da abordagem “científica”, ele havia involuntariamente mudado o tom. E fizera isso justamente quando eu assumia que o via tal qual agora se expunha, como um macho. Como um macho a ser levado a sério, não um detalhe que, embora evidentemente importante, não interferisse na relação que tínhamos. Para meu azar, ou sorte talvez, Marcelo o fizera quando eu admitia para mim mesmo o tesão por ele, numa rendição que fazia esse tesão estourar de modo avassalador.
Eu não tinha ilusões; em nenhum momento quis me enganar, achando que havia falado daquela forma com segundas intenções. Fora involuntário, natural, uma óbvia consequência por estarmos ficando mais próximos, mais íntimos dentro dos parâmetros que ele impunha. Afinal, tínhamos conversado sobre suas cuecas! Mesmo assim, mesmo aceitando como mera consequência da amizade, meu coração batia mais forte a cada vez que me lembrava da voz dele durante a interrupção do filme. E, naquela sexta-feira e até o fim do feriado, bateu forte muitas vezes. Eu estava diante de um cara que, a cada vez que via (e o vi praticamente sem parar), o ouvia dizer “sou comedor e penso como um comedor”. Ele não tinha falado assim, mas foi como se tivesse. E eu não parava de ouvir.
Pela primeira vez, fiz a higiene íntima, a primeira do dia, sem pensar em Rodrigo ou em Otávio. Pensei em Marcelo. Não que achasse objetivamente que estava me preparando para ele, ou que ao me amaciar com o frasco de plástico eu fantasiasse que fosse seu pau me penetrando. Simplesmente, pensava nele. Foi inevitável, como nas vezes seguintes também.
Quando lembro hoje daqueles dias, vejo o quão estava desesperado para que Marcelo tomasse conta de mim. Tão desesperado quanto endemoniado por ele. Fiz coisas, e pensei em outras tantas, que jamais faria numa situação normal. Estava como fora de mim, embora encenando um comportamento trivial. Ou, pelo menos, me convencia que conseguia encená-lo.
Talvez a iniciativa mais audaciosa, e toda vez que me lembro coro de vergonha por dentro, foi ter usado o short verde musgo durante o sábado inteiro, desfilando pela casa ou me mantendo o máximo possível de pé frente a Marcelo. Sem querer enganar a mim mesmo, sem inventar desculpas; consciente de que estava me exibindo para ele.
Não foi nada tão planejado. Foi de supetão. Como tantas outras vezes, eu vi o short numa prateleira do armário quando buscava algum para vestir-me após um banho. Nada demais; coisa de todo dia, embora, em geral, eu levasse um short para o banheiro para vestir-me lá, e não no quarto. Era um short que eu havia comprado há muito tempo e que só usara umas três vezes, deixando-o de lado no armário porque era desconfortável.
Era mais curto do que o usual, mas o comprei assim mesmo, porque tinha gostado da cor, estava num bom preço e, também, o próprio tecido tinha me parecido gostoso: meio molengo, confortável para ficar em casa. A primeira das duas surpresas foi quanto ao comprimento, que ficava um pouco acima da metade das minhas coxas. Nada tão chamativo assim, mas eu certamente não o teria levado se tivesse experimentado. Mas nenhum cara, nem eu, se dá ao trabalho de entrar num provador somente para experimentar shorts.
Bom, as mulheres sim, mas não sou uma mulher. Estava na seção masculina da loja, e a peça nada tinha de propriamente feminino. Na prateleira, junto com outros, nada de especial. Apenas um short de cadarço, feito de um tecido mole e com um bolso atrás, só que mais curto do que o habitual.
A segunda surpresa, definitiva para que eu acabasse por abandoná-lo, veio quando o usei: era incômodo. Ía entrando na bunda à medida que eu me movimentava; se encaixando no rego, mesmo com a cueca. Não só era desconfortável como embaraçoso na presença dos outros, porque eu precisava ficar puxando toda hora. Até insisti, quando sozinho em casa, porque tinha mesmo me amarrado nele; na cor, na maciez do pano, no próprio modelo, embora curto. Mas, na última vez, tirei-o nem bem se haviam passado quinze minutos. E o deixei de lado de vez.
Mas, quando o olhei naquela manhã de sábado, o fogo com o qual estava me fez encará-lo com outros olhos. O que ele tinha de inconveniente agora parecia oportuno. Imaginei-me pelo apê, sozinho com Marcelo, coberto apenas por aquele short molinho que mostrava minhas coxas. Não era ainda verão, mas estava calor, bem forte naqueles dias apesar do céu sempre nublado, o ar abafado. E, afinal, todo mundo ficava apenas de short em casa; ele mesmo ficou assim aqueles quatro dias comigo. Não estranharia eu usá-lo. Mas, a bem da verdade, nem usei isso como desculpa para vesti-lo, pois minha safadeza naqueles dias dispensava qualquer desculpa.
Tanto que me dei conta de uma propriedade do short para a qual não atentara antes. Aquela peça, tão inocente e masculina, provavelmente devia deixar minha bunda desenhadinha, até pela densidade fluída do tecido. Comprovei que estava certo ao me ver no espelho do banheiro grande. Não era nada extravagante, mas deixava as nádegas marcadas, ou, pelo menos, o suficiente para a minha fantasia. E, achava que talvez ficasse atraente para Marcelo, mesmo que ele preferisse ver aquelas formas no corpo de uma mulher. Por momentos, até ansiei acreditar na hipótese remota de ele ser gay, ou bi. E, se fosse, passivo é que não seria mesmo.
Não obtive resultado algum e, paradoxalmente, isso me aliiou, tranquilizou. Marcelo não teve qualquer reação. Ignorou. Comentar, eu não esperava que fizesse mesmo. O fato de falar mais do que o habitual, bem mais, quando estava a sós comigo, não significava que se tornara menos reservado no trato. Não me criticaria, como não faria com qualquer pessoa. Mas eu temia flagrar um olhar surpreso, impensado, que evidenciasse censura, ou até sarcasmo.
Com o passar do tempo, aquela indiferença foi me angustiando. E cada vez mais. Minha timidez precisava dessa indiferença, mas não minha agonia por seu sexo. Desejava pegá-lo numa apreciação mais interessada, até numa contemplação lasciva, quem sabe. Fazê-lo associar o que via àqueles passivos dos quais falara tanto, a propósito do filme; identificar-me como um deles. E, talvez, na total ausência de testemunhas, experimentar na prática o que descrevera em tom quase científico.
Então, conscientemente, voluntariamente, sabendo exatamente o que estava fazendo, embora hoje assumir me deixe perturbado, eu me exibi para ele. Queria que ao menos ele a apreciasse como uma simples bunda, mesmo não a desejando por eu ser homem. Ele era homem; todo homem gosta de olhar uma bunda, e a minha estava marcadinha. Queria que, pelo menos, a admirasse.
Mas, sendo realmente sincero, não só. Tinha esperança de que, ao notá-la, acabasse indo além. Estava voluntariamente me submetendo a sua avaliação com uma fantasia em mente. A sós, sem o peso de testemunhas, o macho poderia considerar a possibilidade de usar aquele corpo como de uma fêmea, notar que estava à mão para descarregar sua libido. Marcelo não havia estado com a casada pelo menos desde a noite de quarta-feira. Em nosso jantar no restaurante, falara sobre as ereções freqüentes. Eu sabia, pelas cuecas, do excesso de porra que vazava de seu falo. Era um macho com o sexo a flor da pele, orgulhoso e sempre disposto a realizar sua condição de comedor, como a definira ao falar do filme. Devia estar carente.
Não forcei situações, mas quando era cabível punha-me de costas. Não empinava, mas evidenciava a bunda. Eu era menor do que ele; ele mesmo havia dito isso. Ele me via como um acovardado, como também havia dito, com outras palavras, em várias situações. Era presa fácil! Aquele macho me tinha na palma da mão para usar meu canal nem que fosse para masturbar-se melhor, enquanto não pudesse comer a mulher. Bastaria me puxar para seu colo, rasgar aquele short, me encaixar em sua pica e movimentar-me para cima e para baixo segurando-me pelas ancas. Acabaria esporrando, pensando na casada, e ficaria mais aliviado.
Por que não fazer como Otávio e Rodrigo, desafogando em mim? Já tinha me visto nu; sabia que, sob o meu short, não restava muita virilidade. Devia pensar que, se eu não fosse gay, estava a um passo de ser. E se acreditava que o mundo era feito de ativos e passivos, e não de homens e mulheres, que diferença faria eu ter ou não entre as pernas o mesmo tipo de órgão que ele? Para outros podia ser um problema, mas para ele, se realmente acreditava naquela teoria esdrúxula, não era. Porra, ele era um futuro acadêmico que não acreditava na própria teoria?
À tarde, depois do almoço, ele se deitou no sofá, e imaginei que fosse cochilar. Em momentos como esse, eu aproveitava para admirá-lo. Naqueles dias, descaradamente mesmo. Olhava seu corpo de perto. Na madrugada de sexta para sábado, cheguei a levar o celular comigo para seu quarto, para iluminá-lo enquanto meus olhos passeassem por ele. Não podia tocá-lo. A situação era angustiante. Mas valia à pena. Ao menos, tinha como namorar o macho que descansava; fazê-lo com calma, sem mais ninguém no apê nem risco de ele saber.
Antes que ele caísse no cochilo, cruzei a sala, passando em frente ao sofá como se estivesse indo ao banheiro. Deitado, ele teria uma visão panorâmica de mim e, como eu acabaria andando alguns metros de costas, poderia analisar-me sem se sentir comprometido. A sala se tornava uma passarela para que o fudedor me examinasse e talvez decidisse me pegar. Era a situação ideal: sua posição, seu ângulo de visão, o caminho entre os móveis, a distância entre a porta da cozinha e a do corredor, que ficava do outro lado do cômodo. Sem saber, Marcelo havia se colocado na melhor condição possível para que eu me exibisse e pudesse despertá-lo.
Depois que passei a primeira vez por ele, apenas um pouco mais lento do habitualmente faria, aproveitei a ida ao banheiro para pincelar-me um pouquinho mais com a gordura vegetal que havia escondido lá. Queria conferir se estava tudo bem com meu sexo, no caso de acontecer o improvável. Além do mais, o ato em si mesmo me excitava; era uma forma de dar um mínimo de vazão a todo aquele tesão que parecia explodir. E, não menos importante, evitaria que ele estranhasse uma ida tão rápida ao banheiro.
Retornei, receoso que ele já tivesse fechado os olhos. Agora, devido ao percurso, Marcelo teria a chance de me ver de frente por mais tempo do que da outra vez. Porque também pensara nisso: a frente do short podia ser importante para atraí-lo. Eu não entendia bem, não era realmente clara a razão, mas me excitava e julgava importante mostrar não só a bunda mais marcadinha, mas também o tecido marcado na frente no tanto que poderia ser marcado. E esse tanto eu intuía que talvez para ele fosse decisivo, ou pelo menos animador.
Eu havia dispensado o uso da cueca com aquele short. O tecido mole diretamente sobre a pele desenharia ainda mais a fenda entre as nádegas; tornaria minha bunda mais suculenta. E, quando me observei no espelho grande, acabei percebendo que o efeito na frente era justo o oposto do que acontecia com Otávio: soava inofensivo. Eu não tinha um dote como o dele; sobressaía quase nada. Apenas um breve relevo, tênue, algo arredondado. Pela falta de peso, pouco se mexia: fazia apenas um breve tilintar, perceptível porém ligeiro. Era bem diferente do pulsar pesado de Otávio. Não chamaria atenção; não ficaria artificial. Mas se aquilo fosse importante para Marcelo, ele notaria.
Ele não cochilou, nem leu, nem mesmo pareceu ficar olhando detidamente para o nada, como lhe era tão peculiar. Pelo contrário: me deu até vontade de rir, porque na sua ingenuidade parecia estar posicionado ali justamente para que eu fizesse o que estava fazendo; para que eu me expusesse àquela situação e ele a testemunhasse da forma mais confortável possível. Fiquei uma hora, até um pouco mais, naquele ir-e-vir. Tinha prontas as desculpas que daria para estar cruzando a sala, mas não precisei usar, porque ele nada perguntou. Cheguei a pegar na área de serviço um lençol que nem lavado ainda estava, para fingir que trocaria o dele.
Às vezes, nossos olhares se cruzavam. Ele me presenteava com aquele seu sorriso insinuado. Eu correspondia, fazendo-me de inocente, louco para que ele baixasse os olhos e aferisse o que tinha a disposição. Mas o que consegui foi nada. Cada vez mais decepcionado, fui concluindo que ele apenas se concentrava num ócio gostoso. Simplesmente vivia o dolce far niente de um feriadão no qual tinha a disposição um passivo que ignorava, um serviçal que valorizava e um amigo de quem gostava.
Nem parecia propriamente pensativo, como seria de se esperar. Deixava-se lá, refestelado no sofá, com as pernas meio abertas. Uma hora ou outra, um dos braços sob a nuca, expondo os pelos das axilas, relativamente densos e para mim extremamente eróticos. Às vezes, o olhar pousava em algo, mas não demorava a voltar a passear pelos móveis, a televisão desligada, o sonzinho mudo, como se visitando sem muita atenção tudo aquilo que via diariamente, mas em realidade não os vendo. Piscava lentamente, de quando em quando deixando as pálpebras descansarem um pouco antes de tornar a abri-las. Era charmoso como sempre, e agora mais sensual do que nunca.
Nas minhas idas e vindas, eu discretamente me encantava com seu torso claro, os mamilos castanhos muito grandes, o abdômen que, naquela posição, formava pregas ligeiras pela ausência de gordura. Adorava aqueles ombros largos dele, típicos de quem praticara natação, decorado por um pomo de Adão saliente que enaltecia sua virilidade de maneira que, em certos momentos, eu julgava até obscena. Ele mantinha flexionadas ambas as pernas, um pouco mais peludas que o resto do corpo. Uma deixava na vertical, junto ao encosto do sofá, a outra na horizontal, apoiada no assento almofadado. Numa de minhas passagens, mirei o centro entre elas, buscando algum relevo no short. Em outra, confirmei o que identificara antes: algo se destacava. Havia uma massa considerável contida pelo tecido estampado, mas não o contorno de seu pau. Era um volume quase homogêneo, um pouco mais saltado à esquerda, mas que não chegava a insinuar o falo.
Há alguns dias pensava mais nisso, em como seria o cacete de Marcelo. Ele não era como Otávio, que na intimidade do apê primava por ostentar sua vantagem nas idas à cozinha em busca de café. Nem como Rodrigo, que volta e meia dava uma apalpada, quase ignorando onde ou com quem estava, para acomodar o membro que era maciço mesmo quando flácido. Por quase todo o tempo que havia convivido com Marcelo, eu buscava ignorar, sugestionado por seu comportamento discreto e cortês, que entre suas pernas pulsava o que eu tanto gostava.
Após as férias, a defesa que inconscientemente eu havia montado para deter qualquer desejo por aquele hétero foi perdendo sustentação. Não tinha mais como fingir que sua discrição era sinônimo de castidade, que ele era um assexuado por quem meu único interesse era cerebral. Quase do dia para a noite, tornara-se óbvio que eu vivia ao lado de um cara cuja sexualidade era forte em sua vida, quem sabe até estivesse no epicentro dela, muito mais presente do que a alardeada putaria de Otávio e Rodrigo nas previsíveis baladas de fim de semana.
À medida que as horas e os dias passavam, a conversa franca durante o filme, sob a manta de um enfoque pseudocientífico, me convencia que seu falo não estava na periferia, mas provavelmente no centro. Ele era, sim, um estudante aplicado, um homem objetivo e firme na conquista do que traçara, um jovem responsável, um amigo solícito. Mas era também um fudedor, e consciente desta condição.
E de modo tão acentuado que refletia sobre sua condição, que via os demais a partir dela. Marcelo olhava essencialmente do ponto de vista de um fudedor, e por isso não via homens ou mulheres, héteros ou gays, mas os que fudiam e os que não, quem era fudedor e quem era fudido. E não se constrangia em demonstrar o orgulho do lócus no qual se encaixava, sem parecer hostil ou arrogante. Como, aliás, era o modo como procedia com relação a tudo.
Eu então não mais resistia em pensar em seu cacete, que para mim havia se tornado símbolo maior do macho. Até começar a putaria com Otávio, eu não dava tanta importância à forma, ao tamanho dos membros dos caras. É algo comum entre homens, sejam hétero ou gays, ativos ou passivos, seja por curiosidade, competição ou desejo. Mas comigo não; talvez mesmo porque me acovardava diante da provável derrota e preferia ignorar o que seria um mero detalhe.
Foi o destaque que Otávio dava a seu membro que me liberou para colocar objetivamente, lucidamente, o órgão masculino no centro da minha libido. Havia a exposição que ele fazia de seu peso sob o short. Havia a adoração à qual ele me incitava nas longas mamadas para levar os culhões a uma produção maior de esperma. Mas a isso juntava-se seu modo de me comer. Ele tocava em meu corpo praticamente apenas o necessário para firmá-lo e com isso viabilizar boas penetrações, certeiras e mais fundas. Reduzia o coito à ação do pau. Não me fudia; era seu caralho bonito quem me fudia. E, assim, acostumei-me não exatamente a reduzir, mas a concentrar meu desejo naquilo que me fudia.
Depois, com Rodrigo, essa importância, antes inexistente ou talvez sublimada, acentuou-se. Era diferente do de Otávio, mas igualmente eficaz em me dar prazer. Eu me detinha em admirar essas diferenças: o aspecto grosso enfatizado pelo comprimento menor do que o do outro; o excesso da pele muito escura que o tornava suculento, gostoso de sentir na boca, e que se reatraía quando ele estava em ereção; a cabeça maciça, larga e quase quadrada.
E, agora com serenidade, admitia que gostava daqueles paus porque eram grandes, eram maiores do que o meu, eram mais grossos do que o meu, mais maciços do que tinha a maioria que eu conhecera, ou pelo menos que me lembrava. Eu tinha a disposição dois homens com membros privilegiados, bonitos e hiperdimensionados. Não só me acostumara com isso como valorizava essa distinção dos dois, a qual meses antes não daria maior valor do que ao olhar, à simpatia ou às afinidades.
Essa mudança na minha percepção dos machos eu havia notado já durante as férias, quando me peguei ostensivamente avaliando os homens pelo dote, coisa que, ao menos, antes não percebia fazer. Meu grau de exigência não apenas havia sido despertado, mas meio que posto nas alturas. O padrão pelo qual avaliava havia subido, e muito. Nunca tinha sido tão fudido assim, tão continuamente, por cara nenhum. Nem mesmo por Rai ou pelo meu outro namorado, e eles mesmos não tinham nada além de um dote médio. Nos últimos meses, era usado quase diariamente por dois caralhudos.
Agora, queria aplicar essa avaliação a Marcelo, e me dedicava a reunir dados para fazê-la. Cheguei a sugerir que fôssemos à praia, pois o veria de calção, quem sabe até de sunga. E, quem sabe mais ainda, que ao voltar de um mergulho ele me revelasse no caminho na areia todas as suas formas desenhadas pelo tecido que a água faria colar ao corpo. Os dias estavam nublados, e tive de concordar com ele que não seria um bom programa.
– Mas a gente fica aqui. Sem zueira de praia cheia de sol. Vai ser bom, só nós dois – disse sorrindo, e naquele momento esqueci de pensar no tamanho de seu cacete e quase quis dar-lhe um beijo.
A ausência de dados me angustiava e, numa irracional suposição de que um dia eu fosse dele, me trazia receios. Tinha medo de decepcionar-me, de perder o tesão ao descobrir que era pequeno. Não só por isso: pode parecer inicialmente estranho, mas atormentava-me o fato de ele ter a pele clara.
Eu sempre, desde cedo, tive atração por caras de pele mais morena. Gostava dos bronzeados, dos morenos, cafuzos, caboclos, mamelucos, mulatos, negros, mas não os que identificava como brancos. Questão de gosto; não se incluíam na minha prioridade. A sorte é que estava no Brasil, onde brancos quase que só existem na autodenominação de mestiços que preferem se ver assim, que gostam de dizer que são descendentes de europeus.
Marcelo estava sempre corado, por conta dos percursos de bicicleta à universidade e das corridas diárias que há tempos fazia no parque próximo, entre as aulas. Não era propriamente branco, porém mais claro do que nós; bem mais do que Otávio, mas mesmo mais do que eu. Tinha medo de não gostar do pau dele por causa disso: para mim, brancos têm paus feios. Tendem a ser rosados, a pele clara lanhada pelo azulado de veias mesmo quando flácidos, a glande de um vermelho que eu associava a carne viva. Há quem goste; eu não. E só resolveria essa angústia vendo-o nu, o que era impossível.
Uma vez eu havia visto Marcelo nu, ao barbear-se no banheiro, mas de costas, e aquela fora a exceção das exceções. Ele mesmo havia me visto pelado, dormindo. Mas foi por acidente, porque não era meu hábito deitar nu nem ele ir ao meu quarto. E Otávio e Rodrigo eu só vi pelados depois que passaram a me pegar. Embora fizesse parte de nosso dia-a-dia estarmos efetivamente seminus entre nós, sempre apenas de short ou de vez em quando cobertos apenas por uma toalha enrolada na cintura após um banho, a intimidade com nossos corpos acabava aí. Mesmo a porta do quarto de Rodrigo e Otávio, que ficava permanentemente aberta, era fechada quando eles mudavam de roupa. Aquela rápida visão de meu príncipe desnudo não ocorreria novamente.
Mas quase ocorreu. Ou poderia mesmo dizer que, de certa forma, tenha ocorrido porque, mesmo sem que eu alcançasse meu objetivo maior, que era conferir seu pau, foi numa situação que para mim transbordou sensualidade; foi como vê-lo nu, e por muito mais tempo do que quando de costas no banheiro.
Foi no domingo, nosso último dia juntos e quando, pela segunda vez, eu havia cuidado das roupas que ele usava nas corridas. Ir ao parque para correr foi uma das poucas coisas que o fez sair de casa, e ele o fez na quinta e na sexta. No fim de semana não, tanto porque não fazia parte de sua rotina quanto porque não simpatizava com a ideia de ter de trafegar entre pais, mães, criancinhas, avós e cachorros saltitantes. Nos dois dias em que foi, retornou comentando, embora sem perder muito tempo com isso, que a ciclovia estava tumultuada pela travessia de pedestres, com o parque mais cheio do que o habitual devido ao feriadão.
Naqueles outros dez dias juntos, ele estendera as férias da universidade também às corridas. Este feriadão era a primeira oportunidade que eu tinha de cuidar do short, da camiseta e das meias que usava para correr. Era como se me permitisse entrar numa parte de sua vida até então mantida à parte de mim, porque normalmente corria em intervalos entre as aulas, e por isso as mantinha na própria universidade.
Fora as meias, tudo era de tecido sintético, de secagem muito rápida, e bastava centrifugar na lavadora para que em pouco tempo secassem no varal, sem necessidade do uso da secadora, que temi deixar tudo em frangalhos. Então, estava exultante em levá-las para ele, para mostrar minha dedicação. Não me pedira, nem falara nisso; apenas a deixara sobre o tanque, sabendo que eu as veria e entenderia o que devia fazer.
Fui com elas, secas, cheirosas e dobradinhas, para colocá-las discretamente sobre sua cama, pois não sabia onde guardá-las no armário. Já há tempos ele me dera a liberdade de entrar em seu quarto a qualquer hora; entre nós não havia mais esse prurido, que com os demais ele conservava sem precisar dizê-lo.
Ele havia acabado de sair do banho, mas eu não sabia disso, pois estava já há algum tempo entretido com os afazeres na área de serviço. E imagino que iria se vestir quando, ouvindo-me chegar pelo corredor, enrolou-se na toalha. A agilidade necessária provavelmente fez com que a amarrasse displicentemente na cintura.
Estava baixa demais, o nó mal feito quase na direção do umbigo, e bem abaixo dele. E ali estava, diante de mim, aquele macho de 1,92m de altura, ombros largos e um torso que terminava delineado por duas depressões que partiam quase dos quadris ao púbis, e, nele, parte dos pelos à mostra. Não era nada tão escandaloso, embora a virilidade que a faixa estreita de pentelhos emanava quase o tornasse. Talvez apenas com a altura medindo a espessura de um dedo, mas uma massa estreita de fios escuros, que tomava algo como dois terços da largura de seu púbis. Eram mais escuros do que seu cabelo e dos pelos que exibia no tórax, que eram de um castanho que se aproximava do claro. O tom me pareceu semelhante aos que tinha sob as axilas, que eu já conhecia e admirava há tempos. Estavam ali, sob meus olhos, disponíveis para que eu os admirasse discretamente, mesmo que apenas pelos breves segundos em que me permaneceria no quarto.
Mas não foi assim. Marcelo agiu como qualquer rapaz agiria com outro nesta situação: com naturalidade. Afinal, fosse eu o que eu fosse, eu era um homem; não havia razão para constrangimentos. Se bem que, a essa altura eu nem sabia mais se para ele eu era um homem ou um ser cuja definição dependia do fato de fuder ou ser fudido.
Ao ver-me com as roupas dobradas, sorriu discretamente em agradecimento, como eu antevia. Mas, quando imediatamente as pus no canto da cama, me instruiu:
– Não, não... Não põe aí não; guarda logo no armário – me disse, de pé, com os pelos viris postos à minha admiração.
– Mas eu não sei... Nunca ficam aqui...
– Péra. – disse, dando dois passos e abrindo uma das portas do armário; a toalha balançando com o movimento – Deixa eu ver...
Ele estava a dois, quase três metros de mim. Meu campo de visão alcançava quase ele inteiro, sem precisar mexer meus olhos. Não quis me pôr ao seu lado, pois seria mais difícil de apreciar o espetáculo daquela impensável intimidade com seu corpo. Então, enquanto decidia onde guardar, virava-se para mim e de novo para o armário, avaliando as possibilidades.
– É que tem que ficar bem visível, Zeca, para eu me lembrar depois. Até segunda-feira e a gente fazendo tanta coisa, posso acabar esquecendo.
Não sei bem que tanta coisa era aquela, mas concordei. Até que ele simplesmente cruzou o quarto de um lado a outro, muito mais exposto do que coberto por aquela toalha, num desfile espontâneo diante de mim. O corpo quase inteiro, da cabeça aos pés, que perigava a qualquer momento desnudar-se pelo nó feito apressadamente.
Ele não olhou para mim ao tomar a direção da parede oposta ao armário, focando diretamente sua mochila. Pude admirá-lo quase sem riscos e por alguns valiosos segundos, até hoje eternos na minha lembrança. Marcelo, quase nu, o ligeiro trapézio de pele clara formada pelos ombros e a cintura, a amostra dos pelos, provavelmente ainda úmidos, que emolduravam o cacete que vazava porra nas cuecas que eu cuidava, que ele usava como macho que era e gostava de ser, que dava prazer a uma mulher casada que com sua juventude compensava a vida monótona com o marido... Aquilo tudo diante de mim. Inesperadamente, tão gratuitamente, tão generosamente.
– Nada de armário, Zeca. Põe logo dentro da minha mochila. Assim eu levo; não me esqueço.
Abriu o zíper da mochila e pôs-se ao lado dela, mantendo-a aberta com uma mão, à minha espera. Fui até ele, e, por sua posição, olhar a mochila sobre a cadeira era praticamente o mesmo que encarar o fino caminho de pelos que levava ao púbis e daí à tira de pentelhos que se elevavam displicentes da toalha. Eu estava hipnotizado por aquela visão.
Ele se afastou ligeiramente quando minhas mãos se aproximaram da abertura da mochila para guardar as roupas. Não havia risco de eu tocá-lo, exceto se voluntariamente, mas, mesmo assim, ele tomou alguma distância. Como se, instintivamente, avisasse que não cabia qualquer audácia. Era um homem que permitia as carícias naqueles pelos, não a mim, mas a mulheres. Eu era apenas um amigo, por mais querido que fosse.
O desfile ingênuo de Marcelo ainda prosseguiu por mais uns passos, enquanto eu arrumava as roupas na mochila. Ao andar, chacoalhava a toalha, e em vão tentei, no que a necessária discrição me permitia, identificar o volume do membro que agora tinha tanta gana em conhecer. Mas o nó mal feito na cintura formava gomos largos e irregulares na toalha. Eles tornavam impossível qualquer modelagem. E não era o tecido fino dos shorts de Otávio; mesmo que Marcelo dispusesse do mesmo calibre que ele, eu não poderia mesmo ver seus contornos. Embora me decepcionasse por uma oportunidade como aquela não ter chegado a ser tão generosa a ponto de eu poder avaliar o dote, não fiquei propriamente decepcionado. Para mim, inclusive pela ausência de uma morenice mais libidinosa, que Marcelo não devia ter aquela coisa toda. Só não queria que fosse pequeno, porque estragaria minhas fantasias.
Não estava suando quando fui embora apenas porque esta não é uma reação que eu tenha quando nervoso. Mas fui direto para meu quarto e sentei-me na cama, com taquicardia. No dia seguinte, viveria a mesma situação, por razão muito mais grave. Mas ainda não sabia disso.
A voluptuosidade encurralada que estava vivendo naqueles quatro dias pareceu-me insuportável, após a situação vivida no quarto. Mais de um ano convivendo com aqueles três caras seminus, acabando por ser comido por dois deles, não havia me mobilizado tanto. Mas, agora, o cara que, entre eles, havia me enfeitiçado apenas conversando e que se tornava o maior símbolo de masculinidade que meu sexo poderia querer, havia involuntariamente se exposto daquela forma. E numa distância suficientemente grande para que eu o admirasse quase de cima abaixo e, depois, suficientemente curta para que eu quase pudesse roçar-me nele. Não havia sido por um longo tempo, apenas alguns minutos, mas o suficiente para que minha libido se desesperasse.
Joguei-me embaixo do chuveiro, após passar pela porta agora fechada de Marcelo, que devia estar se vestindo. Precisava me acalmar, mas só o gelado da água não estava sendo o suficiente. Precisa descarregar de alguma forma o tesão reprimido e que sabia ser impossível ser devidamente suprido. Comecei uma masturbação, coisa que não fazia parte dos meus hábitos. Meus movimentos eram quase frenéticos, pela agonia em que estava, e não demorou para que se avizinhasse uma ardência no pau, pela pele friccionada sem medidas. Ensaboei, para que pudesse deslizar, mas tão excessivamente que acabava por perdê-lo na mão, atrapalhando o ritmo. Precisava gozar, precisava ejacular, e ao longe senti aproximando-se um peso na cabeça.
Eu sabia o que era aquilo, pois já a havia vivido algumas vezes e, preocupado, pesquisara na internet. Era a cefaleia pré-orgástica, que em mim sempre levava à cefaleia orgástica propriamente dita. E, algumas vezes, essa dor de cabeça me martelava por horas. Nada tão forte, mas muito incômoda. O preço a pagar por um orgasmo seria estragar as últimas horas a sós com Marcelo. À noite, Rodrigo e Otávio já estariam no apê.
Desisti. Ainda tínhamos pela frente uma última refeição a dois, que eu mesmo faria para ele. Já havia preparado o almoço da véspera, um macarrão com atum e hortelã que insisti em oferecer como pretexto para que desta vez não descêssemos para o restaurante a quilo. O short molengo não chamava tanta atenção assim mas, talvez mesmo por minhas más intenções ao usá-lo, me sentia constrangido em sair com ele na rua. Se o trocasse, poderia chamar a atenção de Marcelo, sinalizando-o que a modelagem da bunda que desfilei pelo apê não era casual. E, mesmo que decidisse ir assim mesmo, teria de necessariamente colocar uma cueca, o que ele também poderia perceber.
Eu já havia comprado o hortelã quando providenciei as cervejas no mercado, na manhã da quinta. Marcelo havia adorado aquele molho, facílimo de fazer (e por isso eu sabia fazê-lo), e não economizou elogios, quando o havia oferecido naqueles dez dias durante as férias. Então, não pareceu nada artificial que, repentinamente, propusesse de comermos em casa mesmo. E havia sido uma boa oportunidade para que eu, de costas, enquanto conversávamos com ele sentado à mesa da cozinha, exibisse distraidamente minha bunda marcada pelo short. De nada adiantou, mas havia sido uma tentativa.
Durante a refeição, pouco antes de ele sair para refestelar-se no sofá e então eu desfilar frente a ele, cruzando a sala repetidamente no ir e vir entre a cozinha e o corredor, Marcelo pediu que eu fizesse o jantar no dia seguinte, por mais simples que fosse. Queria comer um bife.
– Mas você não gosta de carne.
– Eu gosto. Só não como sempre.
– Mas meu bife nem é tão bom assim.
– Eu te falo quando estiver no ponto, para não ficar tão seco. É só isso.
– Mas, Marcelo... carne vermelha, você?
– É proteína animal. O organismo precisa. É bom para o corpo, na medida certa. E estou com saudade daquelas vezes que você fez pra mim.
Sorriu daquele jeito comedido tão sedutor para mim. Logo depois, seu rosto tomou seriedade, embora ele disfarçasse a óbvia voz de comando que se seguiu:
– Amanhã é nosso último jantar juntos e você vai fazer bife.
Eu concordei, alegre, porque, sem perceber, Marcelo dava um tom romântico a algo tão trivial. Agora, tínhamos um “nosso último jantar juntos”. E ele queria que esse nosso último jantar a dois lembrasse os nossos momentos a dois. Marcaria nossa segunda quase-lua-de-mel com uma referência a nossa primeira quase-lua-de-mel.
Não sabíamos ao certo a que horas Otávio e Rodrigo chegariam de viagem. Na dúvida, adiantei o jantar para pouco depois das sete da noite. Ele não disse nada sobre isso, assim como também não comentou sobre eu ter decidido que comeríamos na sala, e não na mesa da cozinha, como seria de costume. Já com a mesa posta, o arroz quase pronto na panela elétrica dada pelo pai dele e uma salada metida à besta à espera na geladeira, ele chegou à cozinha e sorriu para mim com uma garrafa de vinho trazida de seu quarto.
– Mas o senhor não vai exagerar não, viu, rapaz? Vou monitorar, porque você é mesmo bobinho pra beber.
Eu sorri, frente ao fogão, enquanto ele punha a garrafa para dar uma esfriada. Sentou ali atrás de mim, na mesa da cozinha, em silêncio. Sabia que, muito possivelmente, devia estar me observando, como há tanto tempo. A carne já chiava na frigideira.
– Está quase no ponto.
Virei-me rapidamente, rindo:
– Sei, mestre-cuca... Aí sentado você sabe mais do que eu se está no ponto...
– Posso te garantir. Está quase no ponto.
Não dei trela, rindo para mim mesmo, e o ouvi, de costas:
– Só mais um pouco e estará no ponto exato. Aí eu como.
Fez uma pausa.
– Devoro. Todo, até o fim, sem pena. Não vai sobrar nada. Quase no ponto.
Ele estava certo. Chegou ao ponto exato no dia seguinte, uma segunda-feira que mudaria a minha vida para sempre.
...
[continua]