Era o fim de tarde de uma quinta-feira quente como o inferno, e o céu era uma explosão de púrpura que se sobrepôs ao seu habitual vermelho-esbraseante. Como os deuses costumavam ser vaidosos, o céu, que a bem da verdade era a perfeita imagem de Urano, talvez buscava competir em beleza com uma gema de ametista garimpada e lapidada naquela terra de minérios e pedras preciosas inscrita nos mapas, na História e nos corações pulsantes como Minas Gerais.
Uma representação metalinguística, o céu, acima das torres da velha Igreja de São José, era uma tela pintada por um artista impressionista que ganha o santo pão de cada dia vendendo seus quadros na Avenida Afonso Pena, em frente ao Palácio das Artes. E ao ver o quadro e depois olhar para o alto, focando as nuvens e o poente embebedado por sua cor favorita, aquele roxo especial tão difundido por Prince e Alice Walker, Carlos sorriu e quase sucumbiu à vontade de comprá-lo. Quase... Chegou mesmo a parar e a colocar a mão na carteira (o que muito agradou o vendedor), mas logo voltou a correr pela calçada feito um desesperado.
De fato, ele estava miseravelmente atrasado. “Sou uma vergonha para os virginianos”, brincava consigo mesmo. “Só espero que ele ainda esteja lá...”
Carlos temia olhar para o relógio, mas o fez com um aperto no peito. Constatou o óbvio: estava quase uma hora atrasado. Ao parar em um cruzamento, aguardando que o semáforo indicasse que pudesse atravessar, sentiu o celular vibrar em seu bolso. Respirando com dificuldade, o pegou e leu a mensagem:
“Você vem ou não???”
Pensou em responder, chegou até a digitar as palavras, mas já havia feito isso outras três vezes e, em todas as ocasiões, informou que estava próximo, o que era uma terrível mentira. Portanto, não quis comprometer a sua imagem já absolutamente desacreditada. Quando chegasse, revelaria o motivo de seu atraso, tomariam dois bons cappuccinos e depois iriam ao cinema. E tudo isso regado a muitos beijos.
Carlos morava em uma quitinete no centro da cidade, não muito distante do café em que pretendia se encontrar com o carinha que vinha paquerando há alguns dias por um aplicativo. No entanto, exatamente naquele dia, precisou ficar mais tempo na escola em que lecionava, tudo porque a mãe furiosa de um de seus alunos apareceu indagando-sobre sua suposta intenção comunista em fazer seu filho ler “O operário em construção”, de Vinícius de Morais. Nas palavras da própria mulher, era uma espécie de doutrinação a qual submetia seu filho. Carlos achou graça, mas, para evitar um transtorno maior, não hesitou em ceder o tempo que fosse necessário para explicá-la seu intuito didático-pedagógico em trabalhar com aquele poema.
No entanto, como tudo que está difícil tende a piorar graças a conhecidíssima lei de Murphy, para complicar a situação de Carlos houve um acidente em uma importante via que levava ao centro da cidade, de modo que os veículos só poderiam trafegar por apenas uma das faixas. Dentro do ônibus, observando a fila interminável de carros, ele recostou a cabeça na janela e tentou pensar em coisas tranquilas, apesar da conjuntura frustrante.
Assim que as luzes do semáforo ficaram verdes, como uma flecha em disparada ele voltou a correr. Amava perdidamente Belo Horizonte, mas, ao menos naquele dia, praguejou o relevo da capital e suas ladeiras sufocantes. “Deus é brasileiro e o diabo é de Minas...” Esbarrou em algumas pessoas, que responderam com xingamentos e palavrões. E quase foi atropelado por uma moto quando atravessou outro cruzamento.
Quatro quarteirões depois, uma eminente parada cardíaca e um pouco de dignidade deixada para trás, Carlos, pois bem, finalmente chegou ao local combinado. Contudo, foi antes preciso conferir seu nível de desleixo: suava bastante e a camisa estava completamente amarrotada. “Poderia estar pior”, pensou, mas, apesar de se esforçar para ser sempre otimista e enxergar o mundo com cores bonitas, isso em nada configurava um alívio. Passou a mão nos cabelos ruivos-acobreados, ondulados tal e qual os de um anjinho barroco de sua terra, e secou o suor do rosto com alguns guardanapos que pegou de um bar que entrou para tragar um pouco de coragem.
Carlos era um jovem muito bonito. Tinha vinte e três anos e seus olhos pareciam ter sido derramados em mel em razão da tonalidade das íris. Era mais baixo do que gostaria, embora tivesse um perfil atlético devido aos muitos anos de natação que praticou. Dava aulas de literatura em um colégio tradicional da cidade, mas também trabalhava como freelancer e escrevia resenhas e artigos de opinião para sites e algumas revistas que eram publicadas na internet.
– Deseja alguma coisa, senhor? – Questionou uma garçonete com um bloco de anotações em mãos.
– Não, nada – ele disse em resposta, evasivo. – Se bem que, na verdade, estou procurando um bom motivo para não me jogar do Viaduto Santa Tereza para assim evitar a maior vergonha de todas.
Bastante séria, ela não fez nada a não ser encará-lo. Em virtude disso, Carlos se sentiu obrigado a explicar:
– Foi apenas uma piada. Não leve tão a sério. Digo, um suicida não iria revelar assim seus planos, não acha? Ou revelaria?
– Sei bem que foi uma piada. Mas não muito boa – ela refutou e piscou um olho. Em seguida foi atender ao pedido de um cliente que lhe chamava.
Tentando irradiar confiança, Carlos retirou-se do bar e caminhou até o café ao lado. Era um estabelecimento pequeno, contudo possuía um segundo andar no qual havia mais mesas. E justamente pelo fato de não reconhecer ninguém sentado do lado de fora que se parecesse com o Ricardo, o gostosão que lhe aguardava, resolveu subir a escada em espiral e ir até o pavimento superior, onde certamente o encontraria. Mas no último degrau, sentiu outra vez a vibração de seu celular.
“O mundo já está cheio de idiotas. Cansei de esperar.”
Antes de pegar o celular e ler a mensagem, Carlos já imaginava qual seria seu conteúdo. Puxou uma cadeira e se sentou. Tentou não ficar chateado, mas não obteve sucesso. Sabia que não poderia culpar Ricardo, logo a quem acreditou piamente ser o cara certo para ele, talvez até o amor de sua vida. Depois de dois namoros fracassados e muitos encontros igualmente malsucedidos com todos os tipos de físicos, personalidades e temperamentos, Carlos finalmente havia encontrado alguém que se identificava a tal ponto de reacender aquela sua velha chama da esperança. Miguel, um de seus melhores amigos, dizia ser apenas fogo no rabo. Mas não era, quem dera se assim o fosse. E a verdade era que Carlos já estava cansado e se sentindo cada vez mais solitário. Para ele, aquele dia não poderia ficar pior...
Quando um atendente passou para limpar a mesa ao lado, Carlos oportunamente perguntou:
– Moço, vem cá, me responda uma coisa: você viu aqui um homem forte, negro, de cavanhaque e provavelmente com uma cara de bravo?
– Vi, sim. Pediu um café, apenas. Ficou aqui por um tempo, mas acho que foi embora não faz muito tempo.
– Tá certo, obrigado.
Carlos pediu um cafezinho sem açúcar e se espalhou pela cadeira. Cogitou em enviar uma mensagem com um sincero pedido de desculpas, mas já não valia mais a pena. “Não era pra ser”, pensou tentando se conformar. Ele, de modo indubitável, se orgulhava em ser reconhecido por sua visão esperançosa e por ser um incorrigível sonhador, mas, por outro lado, vinha acreditando que esses mecanismos da emoção acionados para que pudesse sobreviver neste mundo hostil talvez já não funcionassem bem. Não como antes. Talvez, com efeito, tenham sempre sido inúteis.
Assim que bebeu e pagou o café, Carlos decidiu ir até o Conservatório de Música, não muito distante dali, local em que trabalhava um de seus amigos. Lá encontrou Gil, convertido numa pilha de nervos, mas nada diferente do que o habitual. Havia acabado de dar ordens a algumas pessoas que trabalhavam para ele e, assim que viu o amigo de cabelos ruivos e de ondas suaves passar pelo portal de entrada, sorriu largamente.
– Acho que sei qual é o motivo dessa sua calvície – Carlos disse. – Deve ter surgido depois de tanto arrancar os cabelos sempre que está às vésperas de uma apresentação – declarou em seguida, atravessando o grande salão daquele prédio antigo e imponente e puxando o amigo para um abraço forte.
– Mas agora tenho um motivo muito, muito sério: se a casa não ocupar ao menos a metade dos assentos, corremos o risco de perder o patrocínio – respondeu amargamente Gil. Ele era um jovem de vinte e quatro anos, negro, magro e frequentemente trajava um macacão jeans de sua imensa coleção, a qual, segundo o próprio, projetava sua identidade. Com entradas profundas de careca, tinha um rosto aquilino e melancólico.
– Está tão mal desse jeito?
– Você não faz ideia! – Afirmou Gil. Na companhia de Carlos, sentou-se em um puff numa sala com um belo piano de calda. Três músicos também descansavam próximos deles, mas estavam envolvidos em suas próprias conversas. – Cada vez pior. Nem com entrada franca estamos garantindo público. Nunca pensei que fosse concordar com isso, mas as pessoas desse país realmente não se interessam por arte! Ao menos não a que fazemos...
– Tenha calma, amigo – Carlos tentou acalmá-lo. – Sabe que a questão é mais complexa do que isso.
– Sim, sim. Sei bem. Só estou desesperado com essa situação toda. Vou tentar me controlar, mas é difícil tendo em vista que logo posso estar desempregado. Mas, mudando de assunto, o que o senhor faz aqui, hein? Pensei que teria um encontro com o dentista gostosão do Lourdes.
– E tive. Só não apareci. Aliás, cheguei quase uma hora atrasado, então lá vai mais um para o arquivo dos casamentos que só ocorreram em minha cabeça.
– Sinto muito. Mas talvez não fosse para ser...
– Pois é, falei isso para mim mesmo. Só que até quando, hein? – Carlos respondeu com outra pergunta, o tom de voz baixo.
– Se serve de consolo: acho que nós dois estamos oficialmente presos no tempo das vacas magras do amor.
– Amigo, isso não é um consolo não – Carlos disse e riu do comentário. – Mas talvez sejamos um a alma gêmea do outro. Mas sem chance de penetração, é claro.
– Com a mais absoluta certeza – Gil respondeu e ambos riram.
– Mas acho que seríamos um casal da porra! – Afirmou Carlos com um sorriso faiscante.
– Já somos, meu bem.
Os dois ficaram conversando por algum tempo, o suficiente para que Carlos se sentisse melhor. Como a noite já se anunciava, decidiram ir até o bar favorito dos dois, onde se conheceram há três anos, época em que Gil tinha mais cabelo e Carlos havia acabado de chegar em Belo Horizonte, vindo de Tiradentes, com suas coisas reunidas em duas malas e todos os sonhos do mundo no peito. Ali, naquele recinto tumultuado e com uma banda tocando alto Alanis Morissette, tomaram drinques cosmopolitans e um shot de tequila cada um.
– Quando Miguel volta mesmo? – Gil perguntou ao amigo, gritando em seu ouvido para ser compreendido.
– Amanhã, eu acho – respondeu Carlos. – Deve querer contar sobre todos os caras que transou nesse tal congresso de São Paulo. Lembre-se que precisamos escutar atentamente, pois ele vem reclamando que não estamos dando atenção para seus casos como antes. Acho melhor evitarmos todo esse drama queen para o bem de nossas sanidades.
– Como se fosse da nossa conta saber que precisou costurar o cu depois de uma noitada de gangbang...
E riram antes de tomarem outro shot de tequila. Miguel era o amigo que completava o trio. Dado aos excessos, distinguia-se de Carlos e Gil apenas por sua vida sexual que ia além do intenso e gosto demasiado por se envolver em confusões, pois a relação entre os três era de absoluta afinidade e companheirismo. Consideravam-se os irmãos um do outro que jamais tiveram.
– Lembra quando o conhecemos? – Carlos perguntou se esforçando para conter o riso.
– E como posso esquecer? – Respondeu Gil retoricamente – Foi há dois anos, mas parece até que foi ontem! Nós dois voltávamos do Belas Artes quando o vimos na rua se escondendo atrás da minha Brasília. Estava sendo procurado pelo segurança de um bar que o flagrou chupando um cara no banheiro.
– Bons tempos, aqueles – Carlos rememorou propondo um brinde com seus copos vazios. – Preciso ir ao banheiro, não demoro.
Consideravelmente bêbado, mas ainda condutor de sua coordenação motora, ele seguiu até os fundos do bar com a inequívoca sensação que estava a bordo de um navio. O bar estava realmente mais cheio do que o normal, mas não havia fila para os banheiros, algo que Carlos detestava absolutamente. Depois de mijar e lavar as mãos, ele saiu do banheiro disposto a tomar outro drinque, contudo sentiu-se subitamente tonto. Sua visão ficou escura e, por um instante, ele achou que fosse desmaiar. No dia seguinte precisaria se levantar cedo. E tão dado às desconfianças, talvez isso se tratasse de um claríssimo aviso de seu próprio corpo para ir embora. Receando que o estômago se embrulhasse, resolveu não ignorar a mensagem.
Entretanto, por ver tudo girando e girando ao seu redor em um vórtice escuro, não pôde evitar de se chocar com alguém que passava pelo estreito corredor que levava aos banheiros.
– Seu idiota! Olha só o que você fez, imbecil!
Quando finalmente recompôs seus sentidos, Carlos contemplou à sua frente, na casa dos trinta anos, um homem cuspindo ódio. Tinha uma fisionomia realmente agressiva, o que se acentuava devido à sua altura: possivelmente chegava próximo dos dois metros. Tinha os cabelos negros e lisos, a barba impecavelmente aparada, já os olhos eram de um azul-safira hipnotizante. Forte como um instrutor de academia, os braços exibiam músculos proeminentes, de tal maneira que não seria uma boa ideia chamá-lo para uma briga. Vestia terno, mas sem paletó, e a camisa branca que trajava estava completamente manchada por alguma bebida de coloração vermelha. Ao ver o copo vazio nas mãos dele, Carlos sabia que era o responsável por isso.
– Ah... me desculpe. Juro que não fiz por mal...
– Não me interessam as suas desculpas – arrojou com sua voz grave de trovão. – Agora vê se some da minha frente!
– Mas... eu realmente não fiz isso por querer. Se me permitir...
– Você é surdo ou o quê? – O homem lançou um olhar demorado para Carlos. Havia muito ódio incrustado naquele azul oceânico de seus olhos, mas, também, algo a mais, já que encarou Carlos por mais tempo do que realmente era necessário. Por fim, sem falar mais nada se dirigiu até o banheiro masculino.
– Mas eu... – Carlos ainda se empenhou em tentar resolver de modo amigável a situação, mas seu interlocutor decididamente não queria saber disso. Realmente, aquele dia estava sendo um tremendo desastre.
Ele retornou até a mesa em que se sentava com Gil, se sentindo bastante nervoso. Contou ao amigo o que havia acontecido e este, longe de demonstrar qualquer traço de apreensão, começou a rir.
– Ai, amigo – expressou Gil, ainda rindo. – Você ficou mais nervoso pelo estado em que deixou o cara do que propriamente pelo perigo de levar um soco. Só você mesmo pra se preocupar mais com os outros do que com a própria pele! Por falar nisso, é aquele ali o Don Juan?
E lá estava ele, com aquela sua postura que emanava imponência, andando de volta até uma mesa mais afastada e mergulhada pela penumbra. Sentou-se sozinho e começou a mexer no celular de um jeito que denunciava sua impaciência com alguma coisa.
– Ele é muito bonito – comentou Gil. – Aposto até que você fez aquilo de propósito.
– Não, jamais faria uma coisa dessas! Pra ser bem sincero, juro que nem o vi. Tive uma queda súbita de pressão quando voltava do banheiro – ainda encarando o cara, Carlos questionou ao amigo: – Acha que ele deve estar muito bravo?
– O que eu acho é que você deve se esquecer disso de uma vez por todas – respondeu categoricamente Gil. – Não foi sua culpa. Deixe esse cara pra lá, provavelmente nunca mais irá vê-lo na vida. Agora, mudando de assunto, vai querer dormir lá em casa essa noite?
– Não posso – negou Carlos e sua resposta foi secundada por um longo suspiro. – Levanto bem cedo amanhã. Consegui um trabalho temporário que vai me pagar bem nas próximas quatro semanas. Vou dar aulas de francês para um grupo de executivos que serão enviados para Paris. Acho que é uma construtora, se não me engano.
– Tá certo. Bom, meu querido, então vou nessa. O Barreiro não se chegará sozinho, já sabe que esse é meu lema. Quer que eu te deixe no seu prédio?
– Não, tá tudo bem – negou Carlos enquanto pedia a conta a um garçom. – Vou daqui a pouquinho. Chamo um Uber, qualquer coisa.
Os dois se despediram com um abraço apertado. Carlos acompanhou o amigo se retirar e então fechou os olhos para sentir melhor a música que era tocava pela banda: It must have been love, da Roxette. Como ele amava aquela canção! E inspirado por ela, ao fim dos últimos versos, quando voltou a enxergar o ambiente em que se encontrava, sua visão de forma inevitável se voltou para o homem solitário na mesa afastada. Poderia se arrepender depois, poderia amargamente se arrepender depois, mas inflou o peito com um impulso de coragem e foi até ele.
– Tome – disse retirando a camisa xadrez vermelha que vestia sobre uma regata. – Mais uma vez peço desculpas. Realmente não quis fazer aquilo.
Para evitar o constrangimento de ouvir outra grosseria, Carlos deixou a camisa sobre a mesa e se retirou. Ou ao menos tentou, já que, quando havia se afastado alguns passos, ouviu aquela voz genuinamente grave assim dizer:
– Espere.
Carlos foi tomado por espanto, mas tentou conter qualquer traço que revelasse isso. Assim que se virou, o cara prosseguiu:
– Vamos esquecer o que aconteceu. Eu não deveria ter agido daquele jeito. Pode se sentar um pouco?
Realizado o convite, Carlos se sentou na companhia dele. Porém, já não sabia se conseguiria conter seu espanto diante do que estava acontecendo.
– Vai mesmo dar sua camisa para um estranho? – O homem indagou. Já não havia qualquer raiva naqueles olhos de um azul profundo.
– É só pano costurado – Carlos respondeu. – Depois compro outra.
O homem balançou a cabeça em sinal positivo, sorrindo com a resposta.
– Sou Bernardo. E você?
– Carlos...
– Então escute, Carlos: não acha mesmo que ela vai servir em mim, né?
Carlos, na sua disparatada preocupação em consertar o que considerava seu grave erro, não havia pensado nisso.
– Pode vesti-la de volta, creio que vai ficar melhor em você – solicitou Bernardo ao passo que devolvia a camisa. Tão logo Carlos a vestiu, continuou a dizer – Sabe, não tive um dia muito bom. E preciso dizer que não ajo sempre daquela forma.
– Está tudo bem – Carlos relevou, admirando o semblante de Bernardo como se isso não fosse algo constrangedor a se fazer. – Pra ser sincero, meu dia também não foi dos melhores. Podemos brindar a isso.
– Se você quiser.
– Foi uma brincadeira, desculpe. Se eu beber mais qualquer coisa você terá que me levar no colo pra casa.
– Nesse caso, garçom...
É muito evidente que Bernardo pretendia pedir algo para os dois beberem, mas Carlos imediatamente interpôs:
– Não, é sério. Realmente pra mim chega por hoje. Preciso levantar cedo amanhã. Aliás, já estava de partida. Vou descendo a pé pro centro. Se ficar tarde vai ser mais perigoso.
– Certo. Posso acompanhá-lo para casa, pelo menos? Assim me desculpo por aquele show de descortesia.
– Tá bem, então...
Carlos há pouco havia dispensado a companhia do amigo no qual confiava infinitamente, no entanto se surpreendeu consigo mesmo ao aceitar rumar para sua casa ao lado daquele estranho que somente sabia o nome, apesar de assumir que não poderia nem garantir que isso fosse verdade. De todo modo, alguns minutos depois, enquanto caminhavam pelas ruas do centro da cidade, Carlos pôde observar que Bernardo não deveria ter dificuldades em pagar o aluguel do mês, tal e qual a ele, especialmente devido ao Rolex cravejado de diamantes que tinha no braço e sua insistência em pegar um táxi, já que seu carro estava em uma oficina mecânica.
Conversaram pouco, e o pouco que foi dito se resumia a assuntos pontuais como o calor que havia feito durante todo o dia. Carlos olhava de esguelha, impressionado mais pelo ar enigmático que exalava de Bernardo junto ao seu perfume amadeirado do que propriamente por sua beleza – essa que era, a bem de toda a verdade, inegavelmente avassaladora. E Bernardo, por sua vez, em nenhum momento retribuiu as olhadelas admiradas de Carlos. Seu olhar, sério e intimidador, mantinha-se sempre voltado para a frente.
Sentindo-se desconfortável, Carlos ficou feliz em ver o edifício em que vivia se erguer a apenas alguns passos de onde estava, do outro lado da rua.
– É aqui. Então... obrigado pela companhia!
Bernardo olhou o prédio e depois encarou Carlos. O rosto franzido, algo parecia preocupá-lo.
– Carlos...
Parecia inacreditável, mas, antes que pudessem falar mais qualquer coisa, um raio riscou sinuosamente o céu e um temporal desabou com força. E afinal de contas, todo aquele mormaço primaveril somente poderia resultar em uma tromba d’água violenta. Só que não havia tempo para pensarem em nada diante do perigo que se expunham em ficarem ali. Em vista disso, o único a se fazer era evidentemente se abrigarem. Carlos então instigou que Bernardo lhe acompanhasse; atravessaram rapidamente a rua e ingressaram no hall do edifício, mas já estavam muito molhados quando passaram pela porta de entrada.
– Poxa, isso foi mesmo muito estra...
Antes de poder completar o que dizia, Carlos escorregou na poça formada pela água que escorria de seu próprio corpo, mas em tempo Bernardo lhe segurou com firmeza antes que se estatelasse contra o chão.
– Obri...
Carlos foi censurado mais uma vez antes de poder terminar sua fala. Porém, dessa vez, foi pelos lábios de Bernardo que se chocaram intensamente com os seus. Contudo, apesar do ato abrupto, nem por um segundo buscou relutar. Em seu íntimo queria aquilo, como queria, mas não poderia imaginar que isso se daria em tal situação.
– ... gado.
O beijo era intenso, Bernardo tinha uma pegada forte. E quando ele indicou que iria parar, foi Carlos que conduziu sua língua na boca daquele homem descomedidamente forte.
– Vamos subir.
Aquilo era uma ordem, mesmo para a voz de Carlos cujo tom geralmente era gentil e calmo. De maneira incontestável, Bernardo obedeceu e sorriu com muita malícia. Também ansiava por aquilo. Entraram no elevador com seus corpos colados um no outro e, vários andares depois, se jogaram na cama de Carlos com o tesão queimando seus corpos em ondas copiosas de suor.
– Você tem mais livros do que móveis – Bernardo expressou muito admirado, desgrudando sua boca da de Carlos por um brevíssimo instante para olhar o espaço ao seu redor.
Realmente, naquele minúsculo apartamento de Carlos, várias pilhas de livros se erguiam pelos cantos e se espalhavam sobre os móveis. Havia livros até mesmo no banheiro, para muito além das duas estantes abarrotadas que ameaçavam ceder devido ao peso.
– Porra, você é uma delícia! – Bernardo disse por entre gemidos.
Os beijos dos dois revelavam em toda amplitude o tesão que sentia. Com Bernardo sobre si, Carlos sentia algo rijo feito pedra encostar em seu próprio pau endurecido. Ávidos de extrema excitação, retiraram as roupas quase as rasgando. Logo que viu aquele homem de quase dois metros de altura e seu imenso mastro semi-gozado que facilmente passava dos vinte centímetros, Carlos achou que fosse explodir de tesão.
– Puta que pariu!
Carlos só queria por aquilo na boca. E o fez desejosamente. Teve dificuldades em chupar aquela pica grossa como merecia, mas fez o melhor de si – e sabia que seu trabalho estava sendo um sucesso ao olhar para cima e testemunhar aquele soldado espartano revirar os olhos.
– Tem camisinha?
Carlos confirmou, indicando a gaveta da mesinha ao lado da cama em que havia um estoque de camisinhas e lubrificante. Assim que encapou aquele tronco grosso e repleto de veias, Bernardo virou ele de bruços e penetrou a língua em seu rabo. E sua língua áspera e voraz quase levou o rapaz de cabelos cor de fogo a loucura! Carlos tinha uma bunda realmente linda, um cuzinho apetitoso e sem pelos, e Bernardo se deliciou satisfatoriamente com ele. De frango assado ou de quatro com a bunda bem empinada, não importava a posição, Bernardo fodeu o cu de Carlos com sua língua.
– Por favor, vá com calma – Carlos rogou, mas seus olhos pareciam dizer o contrário, tamanha era a libido que lhe dominava.
Cheiro de sexo se dissipou pelo ar. Ali, naquela cama que mal cabiam os dois em razão do tamanho de Bernardo, transaram como se fosse o último dia de suas vidas. Carlos aguentou todas as bombadas, mesmo as mais dolorosas, sem ousar reclamar. Enquanto Bernardo montava nele como um cavalo, Carlos chegou ao determinado ponto em que achou que fosse explodir num rio de porra, mas também suportou tudo em função daquela foda que se situava ao nível das melhores que já teve. Bernardo, por sua vez, parecia insaciável, haja vista seus gemidos guturais e demora em gozar como se adiantasse o evento para aproveitar cada segundo da deliciosa bunda de Carlos.
– Você é uma delícia! – Bernardo repetiu mais uma vez por entre gemidos.
Seu celular chegou a tocar enquanto comia Carlos de frango assado sobre a mesa em que ele fazia suas refeições, mas não quis atendê-lo. Que a realidade implacável em companhia de todos os problemas fossem para o inferno! Afinal, apenas aquele garoto de olhos derramados em mel e cabelos tocados pelo fogo importava para ele. E se Carlos experimentava uma de suas melhores fodas, Bernardo, enquanto encarava seu imenso pau invadindo aquele cuzinho guloso, se deleitava com a melhor trepada de sua vida. E isso era um fato incontestável que jamais esqueceria.