Pense em alguém irritante ao extremo. Pensou? Esse garoto era ele! Falava várias bostas, perturbava na sala e só vivia passeando pelos corredores. Em seis dias de aulas que tive naquela escola, ele arrumou duas brigas com dois garotos diferentes.
Uma aconteceu quando estávamos na quadra. Eu estava junto de duas colegas da antiga escola, que descobri na segunda-feira que elas também haviam se transferido para lá.
E admito, o garoto batia demais. Por ele ser mais alto, ele saia em vantagem contra os demais. O diretor chegou e o resultado foi o mesmo das outras vezes.
Só foi mandado para casa, e nada mais aconteceu.
No outro dia na escola, tinha saído para beber água. O bebedouro ficava perto da cantina. Ao chegar lá me deparo com ele conversando com seus amigos na fila da merenda esperando o sinal tocar. Detalhe, só tinham eles, e ainda faltavam quase 10 minutos para distribuição do lanche. Pude ouvir eles conversando:
— A novata mexeu com meu coração! - disse ele sorrindo
— Qual delas? - Perguntou um de seus amigos
— A de cabelo cacheado! - Respondeu ele.
Quando ele disse isso já sabia de quem se tratava. Da Renata. Uma das minhas colegas que tinham se transferido para cá.
Renata, junto com Vitória eram da mesma turma que eu na escola de referência (da qual nós saímos), e por coincidência paramos na mesma sala de novo. Elas vieram logo depois de mim. Não éramos muito íntimos, mas por não conhecermos muita gente aqui, decidimos andar juntos.
Ao voltar para sala, só deu tempo de guardar meus materiais na bolsa, e o sinal para o recreio tocou. Subimos para o térreo, ficamos eu, Renata, Vitória, e duas outras garotas, Michele e Rogéria.
Contei para Renata o que havia escutado. E ela disse que já suspeitava. A aconselhei a se manter longe dele, e ela concordou, disse que também achava ele um babaca.
Os dias foram passando, conheci outras pessoas, e aos poucos fui me afastando da Renata e da Vitória. Por conta de um rolo que eu não lembro, tinha parado até de falar com elas.
Já estava enturmado em um grupo de meninas. Tinham dois garotos também, o Nelson e o Daniel.
Sentava-me sempre junto à eles. A Rogéria, também começou a sentar onde estávamos e eu conversava mais com ela e o Daniel.
Daniel desconfiou que eu curtisse garotos, e pediu meu número do WhatsApp. Fazia poucos dias que havíamos nos conhecido, mas já estávamos bem próximos.
Ao chegar em casa à noite, vejo uma mensagem de um número não salvo. Era ele, o Daniel. Conversamos um pouco até que ele me manda a seguinte mensagem.
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[Daniel] - Mano, posso te perguntar uma coisa?
[Eu] - Pode rs
[Daniel] - Você é gay?
[Eu] - Não
- Sou bi kkkk
[Daniel] - Bem que eu desconfiei kkkkk
[Eu] - Por que? Eu dou pinta?
Não que eu ligasse para isso, mas queria saber o que o levou aquela conclusão.
[Daniel] - Não mano. É só que tu fala muito sobre rola kkkkkkkkkk
-
Conversamos até quase 1h da manhã. E nos tornamos mais próximos ainda. O Daniel todas as noites me chamava no WhatsApp, me pedia nudes, dizia que eu era gostoso e que queria me pegar, só que, ele era evangélico.
Quando eu o questionava se ele era gay, ele se esquivava, dizia que aquilo era normal, "coisas de amigos", me chamava para ir para a casa dele, e eu sempre inventava desculpas. Nunca sequer mandei nudes para ele, dizia que tal dia mandaria, mas nunca esse dia chegou.
Na escola conversávamos sobre tudo. Sobre quem eram os garotos mais bonitos da nossa sala. Quem nós pegariámos dali, quem era e quem não era LGBT da nossa turma, entre outras coisas.
Com o tempo nossa amizade esfriou. Ele se afastou, mas não parou de falar comigo, apenas com menos frequência. No fundo entendia, acho que ele se afastou, pois estava gostando de mim de uma maneira diferente, e para não sofrer, quis ficar longe.
Neste mesmo período me tornei mais íntimo do grupo das meninas. Eram quatro, a Manuela, a Suelen, a Glória e a Joana. Assim que comecei a andar com elas alguns conhecidos meus vieram falar comigo. Em especial uma garota que eu havia estudado no jardim de infância, a Luana.
Na sala em que eu caí, tinham 2 conhecidos antigos, que era ela, e aquele outro garoto que citei no início. Estava perto de eu ir embora quando ela me chamou.
— Enzo! Espera!
Tinha esquecido de dizer, mas esse é meu nome. (Fictício, claro)
— E aí? - Respondi
— Vai descer agora é?
Morávamos na mesma direção. Ela ás vezes tinha costume de descer com minha prima, que já tinha sido amiga da prima dela. Nesse dia fomos para casa os três juntos.
— Olha, tu toma cuidado com aquela Suelen, aquilo ali é uma cobra!
Disse já me contando todo o rolo entre elas duas. Apesar de ficar chocado, não desfiz minha amizade com nenhuma delas, afinal, o problema não me pertencia e eu nunca fui de me levar por fofoca.
No final, descobri que a Luana estava era certa.
Fazia uns dias que não via o garoto babaca. Tinha descoberto que o nome dele era Ivson. Até que em uma manhã qualquer, estava na sala com as meninas, era hora do intervalo e não tinha quase ninguém lá, apenas nós e um grupo de nerds no canto, até que o ambiente é invadido pela voz deleEu ia pegar ele. Só não dei nele por causa dos boys.
Esbravejou, entrando com um dos seus comparsas. Ele sentou-se em uma cadeira que estava bem na entrada da sala, e seu coleguinha ficou do lado dele, só que em pé, parado na porta.
Estávamos bem próximos a ele, e uma das minhas novas amigas, a Manuela, que era evangélica, porém muito evoluída, entrou na conversa deles. Ela já o conhecia.
— O que foi Ivson, que tu tá assim estressado? - Perguntou
— Aquele arrombado do Ricardo que ficou com minha boyzinha...
Ele começou a contar a história mas eu não prestei atenção. Apenas fechei a cara, queria que ele soubesse que eu não suportava ele. Percebi que em alguns momentos ele ficava me encarando.
O encarei de volta, e apesar dele ter aquela marra e ser um idiota, percebi que seu olhar transmitia alguma coisa. Parecia ser serenidade e... inocência? Eram como os de uma criança triste por não ter ganhado um brinquedo. Aquilo me acertou em cheio. Parece que por trás daquele lixo, existia alguém com sentimentos. No fundo já sabia, AQUILO NÃO IA PRESTAR!