Os Verões Roubados de Nós
Capítulo 41
Narrado por Gabriel
Após passarmos a manhã a três na cama (eu, Eno e Tati), os dois descem para dar início ao almoço enquanto eu resolvo tomar um banho. Enzo vai relutante, pois como ele mesmo diz: “Tenho que cuidar do meu homem! ”, porém eu preciso de um tempo só para entender o que está acontecendo comigo. Estou me sentido frágil, com medo da própria sombra e temendo que pudéssemos ter sido seguidos. E fora o pesadelo que tive que me deixou mais apavorado ainda. Enfim, não estou me reconhecendo. Flashes pós acidente estão começando a vir na memória e o fato de eu não ter reagido me faz mal, me faz sentir menos homem.
Não sei se Enzo percebeu porque estou fazendo o máximo para parecer normal, mas as barreiras estão ruindo e sinto que posso desmoronar a qualquer momento. Ainda não consigo acreditar que Ítalo é nosso irmão e que está sendo movido por vingança. E eu nutria por ele um sentimento de irmandade sincero, mesmo sem saber da verdade.
“Meu Deus, que loucura! Ajude-me a ser forte ” peço enquanto a água escorre pelas minhas costas. Termino meu banho e me seco da melhor forma possível. Tiro os plásticos que envolvem meu gesso e vou para o quarto colocar a roupa. Outra dificuldade, pois com o braço e costelas quebrados quase não dá para me movimentar direito e então, decido colocar um blusão e a calça de moletom.
— Droga! – resmungo ao tentar colocar a meia. Estou quase gritando por Enzo quando batem à porta. – Entre.
Diego aparece com uma expressão séria que lhe é muito peculiar. Suspiro.
— Bom dia, dormiu bem? – ele pergunta.
— Sim – respondo – O chá conseguiu me relaxar.
— Que bom! – ele suspira – Podemos conversar em particular? Apenas nós dois?
Fico curioso com o pedido, mas sei que ele tem me observado e sabe o que está acontecendo comigo.
— Claro. – respondo tentando aparentar uma calma que não sinto – Vamos para a praia, pode ser?
— Sim... Acho melhor.
— Ok. Espere eu terminar de me arrumar – digo e penso um instante – Ou melhor, espere no portão de acesso, por favor.
— Ok.
Ele sai e volto a tentar colocar a meia quando a porta se abre novamente.
— Quer ajuda? – Eno oferece sorrindo quando me vê fracassando na tentativa.
— Sim, amor... Por favor. – não devolvo seu sorriso.
— Está tudo bem? – ele pergunta enquanto calça meus tênis. Ele não me olha.
— Está tudo bem. – feito isso me levanto e completo – Apenas com vontade de gritar, descabelar e ficar histérico...
Rimos.
— Ei... Esse sou eu! – ele diz fingindo indignação.
— Mas não parece. – me aproximo colando nossas testas – Quero meu Eno de volta...
Ele suspira e fecha os olhos.
— Eu não sei se isto é possível no momento. – ele me olha e seus olhar é triste – Você não imagina a dor que senti ao receber a notícia do acidente e que você não voltaria para mim... – uma lágrima rola – Eu quis morrer junto...
Eu o abraço apertado e sussurro:
— Mas eu voltei, amor! E sempre vou voltar para você. – engulo o choro – Vamos fazer um trato?
Ele me olha curioso.
— Assim que tudo passar, vamos tirar umas férias. – sorrio – Vamos para Espanha, maassss...
— Maassss???
— Apenas quando voltarmos ao que éramos. – dou um selinho – Eu, o ogro e você a lady da relação?
Ele me olha inseguro e fica calado pensando. Seus olhos parecem gritar o que se passa em sua cabeça.
— E se não conseguirmos? – ele pergunta e sua voz denota medo.
— Não tem fé no que temos, Enzo Maia Mancinni?! – pergunto fingindo choque. Ele ri. Ponto para mim. – Não tem fé no nosso amor?!
— Sim! Eu tenho, Gabe! – ele me abraça – Eu prometo voltar a ser eu mesmo... Você promete também?
—Sim, vida! Prometo! – eu preciso disso, digo a mim mesmo – E depois vamos para Espanha!
— Por que a Espanha?! – ele pergunta curioso.
— Porque o último postal que você respondeu foi quando eu estava em Madrid... – respondo – E depois não respondeu os outros.
— Eu estava chateado com você. – ele fica vermelho – Achei que tinha perdido meu amigo...
— Você nunca vai me perder... – digo acariciando seu rosto – Nem ouse dizer mais isso.
Ele suspira e me beija.
— Eu te amo pra sempre, Gabe!
— E eu te amo pra toda eternidade, Eno! – enfim nos beijamos com mais intensidade.
— Você precisa descer porque Diego está te esperando para conversar. – ele anuncia e o olho surpreso – Ele me disse quando desceu... – sorri – E também disse que você estava com certa dificuldade em se vestir.
Ele passa a mão pelo meu corpo até chegar no meu pau. Safado!
— Sabia que você estava sem cueca! – ele me olha enciumado – Anda... Pode tirar os tênis e a calça que vou pegar uma... – e sai reclamando procurando por uma cueca – E pode tirar o blusão também! Onde já se viu sair apenas com isso?! Quer pegar uma gripe ou uma pneumonia?!
O velho Enzo está voltando. Dou uma gargalhada.
— Está rindo do quê?! – ele volta e me ajuda com as roupas. Realmente é mais fácil com ajuda.
— Eu te amo, bebê! – digo tentando beija-lo, mas ele se esquiva.
— Aaahhh... Ama sim! Estou vendo! Nem bem voltou e já quer me deixar viúvo de novo... – ele ralha, mas ri – Também te amo, meu loirão gostoso!
Ele termina de me arrumar e descemos.
— Até que enfim voltou! – Tati reclama com Enzo – Nem pense em voltar a ser o come de dorme de antes, palhaço! Anda... Pode vir me ajudar com o almoço!
Naide também está na cozinha e ri.
— Aaafff... Estou indo, demônia! – Eno reclama revirando os olhos – Você me paga, Tatiana! Vou ensinar o Diego a te educar rapidinho... Pode esperar!
E assim os dois continuam discutindo e se juntam com Naide para preparar nosso almoço. Saio em busca de Diego e o encontro na praia. Ainda bem que Eno me ajudou com as roupas, pois um vento frio me atinge assim que piso na areia.
— Detesto inverno! – reclamo me aproximando de Diego.
— Eu nem ligo... – ele responde e ri – Vamos caminhar um pouco? Você consegue?
Reviro os olhos para ele.
— Diego, eu quebrei o braço e não a perna... Vamos caminhar!
Após alguns minutos de silêncio, ele resolve falar.
— Seu pai me ligou mais cedo, enquanto vocês estavam no quarto. – ele começa – Ele contratou seguranças e enviou alguns para cá. Pode ficar tranquilo.
Paro de caminhar e olho para o mar. Resolvo ser sincero com ele:
— Não consigo. – suspiro – Eu não sei o que está acontecendo comigo, Diego, mas eu estou amedrontado, flashes do acidente estão voltando à minha memória. Eu não sou mais o Gabriel de antes, o ogro que bateria e depois perguntaria o que houve. – começo a chorar. – Eu estou com medo. Medo pelo o que Ítalo está planejando, por Enzo, pela Tati, meu pai, meus tios e primos...
Ele me abraça.
— Estamos aqui, Gabriel! – ele diz – Eu vou ficar com vocês porque Ítalo não sabe do meu envolvimento. Eu sou o elemento surpresa que ele não contava.
Choro sentido e suas palavras de alguma forma me fortalecem.
— Quero que ele morra, Diego! Prisão para ele não irá funcionar. – falo com raiva. – Ele é um psicopata e não vai parar até nos matar.
— Podemos pará-lo, sim! Vargas, que é o delegado do caso o quer preso, mas com a nossa justiça em pouco tempo ele estará livre. – seu olhar se torna sombrio – Mas concordo com você, cunhado. Eu o quero morto também por causa da ameaça que ele é para minha mulher e a vocês!
Olhamo-nos em concordância.
— Quero que você saiba que Enzo me pediu uma arma. – ele fala calmo.
— O quê?! – pergunto surpreso – Que porra ele está pensando em fazer com uma arma?!
— Calma, Gabriel! – ele diz – Eu acho válido e até disse isso para ele, desde que ele tenha porte de arma. Então, pode ficar sossegado... Não darei nada a ele!
Por incrível que pareça ele ri e continua:
— Seu namorado está com sangue nos olhos. – ele me encara – E passe a dar valor a intuição dele. O Enzo é foda e tenho certeza que matará o Ítalo ou quem quer que seja que tente ou pense em lhe fazer mal sem pestanejar. Ele é leal ao extremo e pela minha pequena conversa com ele agora pouco percebi que ele também está com medo. – pausa – e me causa um certo receio também pela segurança dele. Geralmente, pessoas com raiva são imprudentes em suas atitudes.
Esta última informação me surpreende.
— Gabriel, enquanto tudo isso não acabar não teremos paz, mas eu peço a vocês que confiem em mim e na equipe que está trabalhando para pegar o Ítalo. Confie no Vargas e no Antônio. – ele suspira – Vocês precisam se unir e não esconder nada um do outro. Eu não conheci o Enzo antes, mas Tati disse que ele está diferente. Mais sério e introspectivo... – pausa – E você... Atrevo-me a dizer que está sofrendo de transtorno de estresse pós traumático*, acho que é esse e o termo certo e também acho legal você procurar ajuda profissional antes que prejudique seu relacionamento com Enzo e outras pessoas. Eu estou de fora e percebi logo de cara por conta do seu comportamento.
— Eu sei, Diego... Enzo já me disse algo parecido hoje pela manhã. – observo que começo a garoar.
Caminhamos de volta em silêncio e antes de entrarmos Diego diz:
— Seu pai também me disse que precisa da carta.
— Oi?!
— Sua irmã ficou com ela, lembra?
— Verdade. – fico curioso com o motivo – Por que ele quer a carta?
Diego fecha o semblante e diz muito sério:
— Eles acham que podem usar a carta para fazer Vera falar o paradeiro de Ítalo e por conta disso, talvez tenhamos que ir embora antes de vocês.
— Nada disso! – falo exasperado – É perigoso demais! Aquele filho da puta pode estar à espreita esperando para atacar...
— Sabemos disso, Gabriel! – ele me corta – mas eu vou com Tati e a trago de volta. Como tem seguranças para vocês aqui ficamos mais tranquilos.
— Vamos voltar com vocês! – falo
— Nem pensar! – ele retruca – Não podemos facilitar a vida daquele psicopata!
Paro na frente dele e o encaro com raiva:
— Foda-se o que você acha! Eu quero ajudar a pegar aquele filho da puta e eu sei que ele vai aparecer se souber que estamos por lá.
Diego passa a mão pelos cabelos irritado.
— Gabriel...
— Nada de Gabriel... – corto – Vamos juntos, Diego! E não se fala mais nisso.
E caminho para casa pisando duro na medida em consigo.
— Gabriel. – ele me chama e se aproxima – Vou avisar que “se” formos juntos será do nosso jeito, entendeu?!
Ele aponta o dedo para mim. Odeio isso, mas acato:
— Entendi... – digo – mas tente entender também, Diego, se ele souber que estamos lá acho que será mais fácil pega-lo.
— Ou não. – Diego devolve – Você tem que entender uma coisa importante: ele é perigoso e tem motivo. É um psicopata dissimulado e muito... Muito escorregadio, pois escapou do meu detetive. – fico surpreso – Sabemos que seu restaurante e a casa de praia da sua mãe já foram vendidos... Juro, Gabriel, ele tem grana o suficiente para fugir e desaparecer para sempre e talvez até já tenha feito isso, mas...
Ele faz uma pausa.
— Mas? – pergunto.
— Acho que ele tentará levar sua mãe e por isso precisamos da carta. Achamos que ela pode nos ajudar indiretamente já que ela não sabe que você está vivo. Queremos usar o emocional dela para nos ajudar.
Raciocino sobre o que ele diz e admito que está certo.
— Ok, Diego – suspiro concordando – Façamos ao seu modo. Contudo, acho difícil vocês conseguirem apelar para o lado maternal e emocional da Vera porque ela não possui. Simples assim. E outra, iremos com você. Sem discussão quanto a isso.
Ele concorda sem jeito.
— Diego... Eu não me importo com o restaurante. – digo enquanto caminhamos – Apenas quero paz. Posso trabalhar com qualquer outra coisa, pois sou jovem e disposto, mas ter um negócio próprio – pausa – Não mais.
— Quem sabe dia, cunhado... – ele bate em meu ombro e sorri – Estaremos aqui para o que precisar.
Sorrio de volta e finamente caminhamos para casa.
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Narrado por Enzo
Deixei Gabe no quarto e desci com Tati para começarmos a preparar o almoço. Eu estava inquieto por tê-lo deixado, mas sei que ele queria um tempo só. Estava em seus olhos.
— Relaxa, Eno... – Tati parece ler meus pensamentos – Ele precisa de alguns momentos sozinho. Fará bem.
— Eu sei, Tati, mas depois do que passei não quero perde-lo de vista, entende? – minha voz treme – Eu também estou com medo.
— Todos nós estamos, gatão e isso é natural, afinal tem um louco varrido atrás dele... Ou de nós. – sua voz fica triste.
— Ele não virá atrás de ninguém e nem chegará perto, amor. – Diego diz entrando na cozinha e abraça Tati – Eu não vou deixar nem ele nem ninguém se aproximar e te fazer mal. E nem aos meninos.
Vejo Tati se agarrar a ele e fico feliz por ela ter alguém para protege-la além de mim e do Gabe. Pensando nisso resolvo conversar com Diego a sós, mas antes pergunto outra coisa:
— Fernando já foi, Diego?
— Sim, Enzo. Faz uns 30 minutos. – ele responde.
— Fernando foi embora? – Tati pergunta surpresa – Por quê?
— Porque ele só veio para me trazer e acabou por ficar fazendo companhia a mim. – respondo triste – Nos tornamos bons amigos e em breve pretendo ajuda-lo.
Tati me olha confusa, mas nada explico.
— Diego, podemos conversar um instante, por favor? – peço.
— Claro, Enzo. – ele beija Tati e sorri terno – Preciso mesmo conversar com você.
Vamos para a área da piscina e nos sentamos nas espreguiçadeiras.
— Quero uma arma! – sou direto e observo sua reação.
Primeiro ele me encara; segundo sorri de forma cínica.
— Ok, Enzo. – ele diz – Responda-me 3 perguntas e se forem satisfatórias eu mesmo treino e lhe dou uma arma. Entendido?
Concordo com um aceno.
— Ótimo. Primeira pergunta: você sabe atirar?
— Não.
— Segunda pergunta: você já pegou numa arma?
— Não.
— Terceira pergunta: você ao menos já viu alguma arma de perto?
— Não.
— Então... Por que você quer uma arma?!
— Para nos defender é óbvio! – reviro os olhos.
— E você acha que eu simplesmente vou entregar uma arma com toda essa sua inexperiência?
— Diego, eu não sei se você sabe, mas o Chatítalo maníaco e psicopata está querendo nos matar! – digo com cinismo e desprezo.
— Chat... O quê?!
— Chatítalo – repito irritado – Eu o apelidei.
Ele solta uma gargalhada.
— Nossa... – seus olhos lacrimejam – Bem que Antônio disse que vocês são fogo!
— O quê?!
— Esquece... – ele faz um gesto com a mão e volta a ficar sério – Sabe quando vou lhe dar uma arma?
— Quando voltarmos? – pergunto ansioso.
— Nunca. – ele responde sério – Pelo menos não nesta vida, Enzo. Armas são utilizadas por quem tem licença e sabe manuseá-las corretamente, o que não é o seu caso.
“Mas que filho da puta! ” penso irritado. E minha irritação fica mais evidente quando num rompante chuto a espreguiçadeira.
— Fica calmo, bad boy! – ele ri – Ou vai acabar quebrando seu pé.
— Vai tomar no cú, Diego! – xingo – E se aquele desgraçado nos pegar desprevenidos hein, espertão?! O que vocês irão fazer?!
Diego levanta e caminha até onde estou e fala calmamente:
— Enzo, vocês estão protegidos. Confie em mim.
Meus olhos ardem e lágrimas grossas descem.
— Eu estou com medo. – minha voz embarga – Você não tem ideia do olhar de medo dele quando o despertei do pesadelo. Eu me senti impotente, menos homem. Meu amor foi machucado, Diego... Não apenas física, mas também emocional e psicologicamente e eu estou impotente porque não sei como lidar com isto. – eu o olho – Eu tenho apenas 18 anos. – ri sem humor – E achei que a vida seria leve e fácil de conduzir... Contudo, o que aconteceu me mostrou que não se pode controlar o destino e não se pode confiar em todos. Por isso sigo minha intuição... – pausa longa – Onde está o manual de “como lidar com as tragédias da vida? ”
Ele ri e me abraça pelos ombros:
— Não há nenhum manual, cunhado! Mas, se serve de consolo, siga sua intuição. – ele me olha – Você sabe que pode confiar nela.
— Minha intuição diz que você deve me dar uma arma. – E faço minha melhor carinha de pidão. Sempre funciona.
Diego arqueia as sobrancelhas.
— Esta sua carinha de pidão funciona com seu namorado e com Tati. – ele zomba – Nem vem...
— Aaafff... Chato! – e rimos.
— Acho que o Gabriel pode estar sofrendo algum estresse pós trauma* - ele fica sério – Ajude-o... Siga seu coração porque você o conhece melhor do que ninguém – pausa – Seja firme e forte. E demonstre isto, não apenas com palavras, mas também com atitudes. Ele espera por isto.
Olho para ele surpreso. Jamais imaginei ver Diego falando assim.
— O quê? – ele pergunta – Eu sei ser sensível também, sabia?
Sorrio.
— Sabe... Antes disso tudo acontecer eu era o histérico, chorão, barraqueiro e infantil. – ele apenas me olha – e ele o ogro, o resmungão, o racional e adulto. Sinto que após saber da “morte” dele, aquele Enzo morreu e outro nasceu daquela dor intensa. Acho que é por isso que me sinto impotente, Diego. Porque este novo Enzo não soube reagir ao primeiro sinal de fragilidade dele. Eu fui frio, sabe? – confesso e me sinto incomodado com isso.
Ele olha para frente analisando minhas palavras e diz:
— O velho Enzo está aí escondido. É só você procurar e deixa-lo sair. Assim como o velho Gabriel está lá também. Vocês estão apenas sofrendo pelo que aconteceu e criando expectativas por coisas que nem aconteceram. – ele torna a me olhar – Não sofra por antecipação, ok? – e suspira – Vou subir para falar com ele um instante, tudo bem? Preciso esclarecer umas coisas.
— Tudo bem. – respondo – Eu serei forte porque ele precisa de mim... Ou melhor, ele precisa de nós. – caminhamos para a cozinha e ele segue para o quarto – Diego, veja se ele precisa de ajuda e me chame, por favor?
Ele assente e eu agradeço. Nisso, Tati sai da despensa e fica surpresa quando falo:
— Ele é um bom homem, gata! Digno de você. – dou uma piscada e uma bitoca na ponta do seu nariz – Eu aprovo!
— Ok... – ela diz lentamente – Eu agradeço.
— Beleza... Agora vamos ver o que preparar para o almoço! – digo apontando para sua mão cheia de coisas fora as que Naide já estava cortando sobre a pia.
— Com certeza, Eno! – ela vai até a pia – E você pode me contar tudo sobre a partida de Fernando e esta história de ajuda-lo.
Reviro os olhos.
— Além de empata foda é curiosa! Oooo mulherzinha! – rimos – eu vou te contar.... Apenas algumas partes.
E assim, conto o que acho relevante ela saber e ganho mais uma aliada na saga Fernando e Vítor.
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Narrado por Antônio
Chegamos a casa de Vera sob uma forte garoa e somos atendidos pela empregada chamada Judite. E enquanto ela vai chamar a patroa, Vargas e eu observamos todo o ambiente procurando por algum sinal de que Ítalo estivesse ou tenha passado por lá. Ficamos esperando por quase meia hora até que sons de salto ecoam pelo piso.
Ela adentra a sala com um ar cansado e de choro e com certeza está alcoolizada. Sinto pena porque é uma mulher bonita se degradando dentro da própria armadilha que criou.
— Sra. Vera, boa tarde. – Vargas a cumprimenta – Sou o delegado Saulo Vargas e este é o detetive Antônio. Tudo bem?
Ela nos olha meio aturdida e tenta manter a pose.
— Boa tarde, senhores. Eu estou bem. – ela diz – Sentem-se, por favor.
Enquanto nos acomodamos Vargas observa todos os seus movimentos. Não demora muito e a empregada volta com café para todos. Esperamos ela nos servir e somente quando ela sai Vargas fala:
— Sra. Vera, precisamos conversar a respeito de Gabriel. – a voz dele é calma e indutiva.
— O que vocês precisam saber? – ela pergunta calma, mas seu olhar revela confusão.
— Se ele possuía algum inimigo, se teve alguma desavença com algum amigo, cliente nos últimos tempos? – ele estreita os olhos e ela estremece visivelmente.
— Ah.. E-e-eu não sei, senhor. – ela parece confusa – Foi tudo um engano...
Sua voz sai apenas num sussurro e Vargas aproveita:
— O que foi um engano?
— O acidente. – ela fala sem pensar com os olhos fixados em algum ponto da parede. – Mas eu vou consertar isso... Juro...
E as lágrimas começam a rolar. Fico com pena, mas precisamos aperta-la.
— A senhora sabe onde Ítalo está? – pergunto descaradamente.
— Não. – ela responde e toma um gole do café – Ele não me disse.
Bingo! Melhor que isso, só se ela estivesse muito mais bêbada.
— Ele matou o Gabriel? – pergunto e as lágrimas correm ainda mais.
— Não! Fui eu... – e solta a xícara fazendo-a espatifar no chão – Eu fui uma péssima mãe e Deus está me castigando.
Seu choro se torna convulsivo e Vargas me olha feio.
— Senhora? – a empregada entra na sala.
— Judite... – ela chama chorando – Chama o Gabriel para eles... Por favor...
Seu olhar está vidrado agora. Céus, ela está insana.
— O Gabriel... Meu Deus! Meu filho... – ela chora e a empregada nos olha séria.
— Senhores... Por favor! Ela não está em condições.
Vargas me olha irritado. Ok, fui muito direto, mas eu sou assim. Odeio enrolação.
— Tudo bem, senhora. – Vargas diz conciliador – voltamos quando a senhora estive melhor e conversamos, ok?
— Pode ser, mas agora não. – a empregada responde.
Saímos da casa e Vargas me olha irritado:
— O que deu em você? Quer estragar tudo? – ele pergunta
— Ah... você mesmo viu que ela está alcoolizada... Nem vem! – respondo seco.
Ele me olha e apenas acena.
— Sabe o que isto significa, não é? – ele pergunta muito sério.
— Sim. Plano em ação.
Concordamos com um gesto e vamos embora. Agora vai começar.
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Nota*:
Estresse pós traumático: *na verdade, o termo correto é Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT) que Diego cita de forma sucinta porque ele não domina o assunto e pela data em que se passa o conto (década de 90) pode haver perguntas quanto a citação do termo, então deixo um artigo para quem tenha interesse em saber quando o termo teve sua introdução na área médica/psicológica: http://www.scielo.br/pdf/rbp/v25s1/a03v25s1.pdf
Boa noite, pessoal. Segue mais um capítulo!
Não vou responder aos comentários anteriores porque o conto está quase entrando na reta final. ainda tem muita água para rolar por debaixo da ponte, então aguentem firmes, rapazes!
abraços
D.