Capítulo 29
Bruno vagava pelas ruas sem rumo. Chorava muito devido a preocupação com a mãe. Decidiu não retornar para casa. Não queria que Jonas o visse naquele estado.
Ao amanhecer, foi direto para o trabalho.
Jonas estranhou não vê Bruno e ficou preocupado ao lê o bilhete. Ligou para o namorado para saber o que havia acontecido.
Bruno pensou em ignorar a ligação, mas se deu conta que Jonas insistiria até que ele atendesse.
_ O que aconteceu, meu amor?
_ Tive um imprevisto aqui no trabalho. Nada demais.
_ Você me deixou preocupado. Vamos jantar hoje a noite? Eu venho pra cá depois da pizzaria.
_ Não. Eu vou lá na pizzaria e falo contigo.
_ Ok, então. Até mais tarde. Te amo.
_ Tchau.
Jonas estranhou a frieza de Bruno, mas imaginou que fosse por causa do trabalho.
Bruno passou o dia angustiado. Reunindo coragem para terminar com Jonas e encarar as suas indagações. Desta vez ele não poderia simplesmente fugir como fez antes. Ele não tinha dinheiro para ir embora, não tinha ninguém que o ajudasse e não poderia abandonar o emprego.
A noite, Bruno foi até a pizzaria. Ao vê-lo Jonas sorriu e o beijou.
_ E aí? Vamos de pizza? Vou aproveitar que o movimento está fraco e faço uma boquinha contigo.
_ Não. Eu estou sem fome. Vim mesmo conversar com você.
Betinho se aproximou fingindo está limpando a mesa com a intenção de ouvir a conversa.
_ Vamos para o seu escritório? A conversa é particular.
Jonas ficou muito preocupado.
Betinho foi atrás e ficou escondido atrás da porta.
Jonas abraçou Bruno. Sentia algo ruim no peito. Quase um presságio. Bruno se afastou.
_ Eu preciso falar com você. Andei refletindo e cheguei a conclusão que o que estamos fazendo não é certo. Eu não posso ficar com você depois de tudo que aconteceu.
_ Que porra é essa, Bruno?
_ O que fizemos foi errado. Não posso começar uma vida com erros. Eu vou te devolver o dinheiro que gastou no aluguel. Deposito todo mês na sua conta. É só você me dá o número.
_ Vai pro caralho o dinheiro do aluguel! Eu não acredito que você está terminando comigo. Isso é alguma brincadeira?
Bruno tentava conter o choro.
_ É melhor assim.
_ Melhor pra quem?
_ Pra todos nós. Eu não quero ficar mal com a minha tia e com o Matheus.
_ Pera aí, Bruno. Eu não sou idiota. Ontem mesmo você disse que me amava, que íamos ficar juntos, até agora não se importou com o Matheus e do nada você mudou?
Bruno permaneceu em silêncio. Jonas se aproximou e tocou nos seus ombros.
_ Está acontecendo alguma coisa. Eu sei disso. Meu amor, você pode me contar. Quem sabe eu posso te ajudar?
Bruno pedia socorro com o olhar.
_ É melhor não prologarmos esse assunto. Aceite e pronto.
_ Você é meu. Você me ama. A minha mãe ou meu pai tem alguma coisa a ver com isso?
_ Claro que não!
_ A minha mãe estave aqui no dia que Matheus nos flagrou. Com certeza, ela aprontou alguma coisa.
_ Já chega, Jonas. Não complique as coisas. Acabou. Você vai ter que aceitar isso.
_ Eu não vou aceitar nada! Se você não me contar a verdade, eu vou investigar e vou descobrir. Eu te amo. Eu não vou te perder de novo.
Bruno tentou sair, mas o Jonas o segurou.
_ Por favor, não me abandone. Eu já perdi o Matheus, eu não posso te perder.
_ Tchau.
Bruno o empurrou, queria fugir dali antes de começar a chorar. Abriu a porta e Betinho caiu no chão.
_ Eu estava limpando a porta e...
Bruno saiu correndo.
_ Bruno! Bruno, volte aqui!
Jonas saiu correndo atrás dele, mas não o alcançou, pois Bruno já havia pegando uma moto-taxi.
Entrou na pizzaria furioso atrás de Betinho e o encontrou no corredor.
_ Que porra é essa de você ficar escutando atrás da porta?
_ Eu..._ disse com a voz trêmula.
_ Eu não te pago para tomar conta da minha vida e sim para servir as mesas. Tá pensando o quê? Você não passa de um fofoqueiro. Daqui a pouco corre para contar pra todo mundo.
_ Eu não. Imagina...
_ Cala a boca! Você terá cinco dias de suspensão para repensar as suas atitudes e entender onde é o seu lugar aqui.
_ Jonas, pelo amor de deus não faça isso comigo.
_ E dê graças a deus que sou bonzinho. Porque a próxima gracinha que você aprontar vai para o olho da rua!
Entrou no escritório furioso. Ele não estava disposto a aceitar o fim do relacionamento com Bruno.
_ Com certeza tem dedo da minha mãe nisso aí.
Jonas saiu da pizzaria furioso. Foi até o apartamento da mãe e chegou lá com a respiração ofegante, invadindo a casa.
_ Jonas?! Aconteceu alguma coisa?
_ O que você fez para o Bruno? Não adianta mentir pra mim.
Lúcia sorriu, pois percebeu que finalmente estava livre de Bruno. O sorriso da mãe o deixou furioso.
_ Fala, porra!
_ Isso são modos de falar com a sua mãe?
_ Deixa de ser cínica! Eu não estou com paciência.
_ Eu não sei de nada, mas fico feliz desse tal de Bruno terminar com você. Onde se viu um homem dormindo com o outro? Isso é pecado!
_ Vai à merda com esse papo de pecado! Você traía o meu pai, roubava dinheiro da empregada, vive humilhando a Olívia porque ela é gorda, não ajuda ninguém e quer falar em pecado? Você é hipócrita! É safada!
Lúcia ergueu a mão para batê-lo, mas ele a segurou com força. Contudo, Lúcia puxou o braço, o libertando da mão de Jonas.
_ Não se atreve a tocar em mim. Você estragou a minha vida. Aprontou com o Bruno há oito anos atrás e agora novamente. Eu sei muito bem que foi você que disse para o Matheus que eu e o Bruno estávamos no escritório.
Acabou o Jonas otário. De mim você não vai ver um centavo.
Ela arregalou os olhos surpreendida.
_O meu pai tinha razão quando disse que eu não deveria te dar nada. Que você é uma desocupada. Eu só vou continuar pagando o aluguel deste apartamento porque a Olívia ainda mora aqui, mas o resto acabou. Se quiser empregada, cabeleireiro, roupas ou qualquer coisa vai ter que trabalhar pra isso.
_ Mas isso é um absurdo! Eu sou a sua mãe! Dediquei a minha vida a você e...
_ Foda-se! Eu não pedi pra nascer. Se você fez filho é obrigação sua cuidar. Eu não te devo nada. Eu amo o Bruno. Sim. Eu sou um homem e amo outro homem. Eu sou viado! Você aceitando ou não. E seja lá o que você fez, eu vou descobrir e vou ter o Bruno de volta. Você não vai vencer desta vez.
Jonas saiu a deixando furiosa.
Lúcia gritou arremessando um vaso na parede.
Renata observava a tela do celular insatisfeita. As notas das disciplinas de Matheus na faculdade eram muito baixas. O menino nunca foi um aluno que costumava tirar nota máxima na escola, mas suas notas eram medianas.
Era o primeiro ano de Matheus como universitário e ele não demonstrava nenhum interesse pela vida acadêmica. Só vivia de mau humor, chorando e esbravejando por causa de Jonas e Bruno.
Renata refletia do quão isso poderia ser prejudicial à saúde mental do filho. Subiu até o quarto e encontrou Matheus deitado assistindo TV. Ela ficou o observando da soleira da porta por alguns segundos até que ele notou a sua presença.
_ Por que você tá aí me olhando?
Renata observava o quanto o seu filho cresceu. Pensou nas vezes em que tentou protegê -lo do mundo, apagar as coisas ruins como se elas não existissem. Não o permitia assistir os telejornais, sempre ocultava fatos ruins que aconteciam na sua vida e toda essa rede de proteção amorosa o impediu de aprender a lidar com as adversidades da vida.
Sempre cedeu as vontades de Matheus. Quando criança, bastava Matheus fazer um escândalo e birras que conseguia o que queria, e ceder a isso só alimentou o seu mau gênio. Ela sofria ao vê-lo sofrer e não saber lidar com o sofrimento.
Sentiu- se envergonhada quando soube pela mãe de Nathalia o que Matheus havia feito no bar de Jonas.
Ela sorriu e se aproximou dele, sentando em frente a Matheus.
_ Filho, precisamos conversar.
Matheus a olhava em silêncio.
_ Eu soube o que aconteceu lá no bar do Jonas...
_ Quem te contou?
_ Isso não importa agora. O assunto aqui é você.
_ Importa sim! Gente fofoqueira.
_ Matheus, cala a boca e me escute. Você não está bem. O que você fez foi se sujeitar a uma situação humilhante e ainda levou o outro menino junto sem que ele ao menos fosse informado do que estava acontecendo. Ele foi agredido por sua culpa.
_ Minha culpa não, o Jonas que é um troglodita que partiu pra cima dele. Se achando com algum direito de ter ciúmes.
_ E com tantos bares pela cidade você foi justo lá para provocar? Você não tinha o direito de fazer o que fez com o Ivan. Você brincou com os sentimentos dele por causa de um homem que não te valorizou, mentiu pra você e te humilhou.
Matheus abaixou a cabeça. Pela primeira vez pensou no quão crápula foi com Ivan e sentiu vergonha por isso.
_ Não só isso. Já viu as suas notas? É o seu primeiro semestre na faculdade e olha o declínio. Olha o que você está fazendo com a sua vida. Fica aí amargurando ódio, esbravejando, brigando com todo mundo. Matheus, olha o que você está fazendo com a sua vida! Se continuar assim você vai acabar doente e sozinho. É isso que você quer?
Matheus sentiu uma tristeza imensa. As lágrimas escorreram pelo seu rosto.
_ Você já é um homem. E infelizmente eu não posso te tirar todas as dores do mundo. Eu queria muito fazer isso, mas não posso. Filho, você precisa aprender a lidar com elas. Assim é vida. Às vezes é dura, é cruel, machuca bem no fundo da alma. Mas há uma coisa chamada resiliência, que é você passar por uma ou mais situações ruins e conseguir se reerguer. Tirar algo de bom delas.
_ Eu tô sofrendo muito. Apesar de tudo eu gosto muito do Jonas. Nós fomos muito felizes juntos. Tive momentos maravilhosos com ele. Eu achei que seria pra sempre. Mas, eu sempre me senti inseguro. Ficava desesperado só de pensar que a nossa relação poderia acabar. E o Bruno? Puxa, ele é o meu primo! Eu sempre gostei dele e... isso foi uma puta traição!
_ Filho, você só tem dezoito anos. É muito jovem e inexperiente, mas eu vou te dizer uma coisa, que pode até ser clichê mas é a mais pura verdade. Antes de amar outra pessoa você precisa amar a si mesmo. O seu amor pelo Jonas ou por qualquer outro homem não pode ser maior do que a sua dignidade, do que o sua vida profissional, do que a sua felicidade. O Jonas foi o seu primeiro amor, mas não será o único. Você precisa entender que nem tudo na vida acontece do jeito que queremos.
Renata segurou na mão de Matheus e secou as lágrimas dele.
_ O seu relacionamento com Jonas não foi a sua vida, foi uma fase dela. Foi somente a primeira grande frustração, outras virão. Você terá boas fases com alegrias e vitórias e outras com tristezas, derrotas e decepções. Assim é a vida.
Matheus a abraçou.
_ Por que tem que ser desse jeito?
_ Eu não sei. Eu só quero que você reflita sobre o quanto você está se rebaixando por causa de um homem qualquer, que nunca te respeitou. O quanto você está se prejudicando e sofrendo por isso. Pense agora meu filho, antes que seja tarde demais. Se você se amar em primeiro lugar, não irá se permitir cair por causa de alguém que só te machucou.
_ Você tem razão. Mas eu sinto muita raiva e estou sofrendo muito. Eu não sei lidar com esses sentimentos. Isso dói muito, mãe . Me sinto perdido. Você me ajuda?
_Claro que sim. Infelizmente, eu não posso arrancar esses sentimentos de você. Você vai ter que aprender a lidar com eles e dá um jeito de sair por cima de tudo isso.
_ Como?
_ Você pode começar focando em si e não dando importância para o Jonas e o Bruno. Começando bloqueando os dois das suas redes sociais, ficar vendo fotos só vai te machucar. Se dedicar aos estudos, sair com o seus amigos para se divertir e não ficar falando do Jonas ou querer mostrar algo pra ele. Meu filho, mamãe sabe como há muitos boys lixos como o Jonas neste mundo. E nenhum deles devem ter tanta importância na nossa vida. Nós sofremos, choramos um pouquinho e depois levantamos e nos reerguemos. E sobre o fim do namoro não encare como perda e sim como um livramento.
Matheus sorriu.
_ Você está certa. Eu não posso me afundar por causa daqueles dois. Eu o amei, dei o meu melhor, se ele não valorizou o azar foi dele.
Renata sorriu.
_ Eu te amo muito. Vou marcar uma consulta com a doutora Verônica. Ela é uma ótima terapeuta. Tenho certeza que isso vai te ajudar. Mas, sobre as suas notas? O que pretende fazer?
_ Eu vou procurar o serviço de monitoria da faculdade. Creio que as aulas extras dos monitores poderão me ajudar. Pode ficar tranquila, eu vou me reerguer e focar nos estudos.
_ Como é bom ouvir isso, meu deus!_ Renata disse abraçando Matheus e o enchendo de beijos.
A popularidade de Ivan foi crucial para que os alunos da turma sentirem antipatia por Matheus depois do ocorrido no Espaço São Jorge. Muitos deixaram de falar com ele por solidariedade a Ivan por ter sido usado por Matheus e agredido por Jonas.
Matheus não estava acostumado a lidar com a solidão. Sempre teve amigos e estava acostumado a ser perdoado pelas suas atitudes estúpidas. Contudo, pela primeira vez na vida se viu arcando com as consequências dos seus atos e isso o amedrontava.
Tentou desculpar-se com Ivan para recuperar as amizades, mas não teve sucesso, o rapaz não o perdoou e exigiu que Matheus não o dirigisse mais a palavra.
Como as suas notas estavam muito baixas e não havia com quem conversar, decidiu correr atrás do prejuízo, se dedicando aos estudos. Devido, as dificuldades, procurou a coordenadoria da instituição, que o conduziu a um monitor.
_ Então, Matheus, de segunda-feira a sábado você terá aulas com um monitor na biblioteca da faculdade. Espero que melhore, caso contrário poderá ser reprovado em todas as matérias. _ disse a coordenadora, o olhando por cima do óculos firmes na ponta do nariz.
Matheus não gostou das aulas extras. Queria ir para casa e ficar longe daquela faculdade. Contudo, sabia que não poderia fugir do problema.
No final, das aulas foi até á biblioteca, que tinha umas cabines reservadas para estudos. Entrou na única em que havia um rapaz o esperando. Como o vidro era embaçado, não conseguia ver nitidamente quem era.
Entrou sorrindo na tentativa de ser simpático e quem sabe assim fazer uma nova amizade, já que não tinha mais nenhuma.
Contudo, o seu sorriso desabou ao perceber que Patrick o aguardava sentado, com os livros e cadernos espalhados sobre a mesa redonda.
_ Que palhaçada é essa?
Patrick revirou os olhos para cima.
_ Eu não sabia que esta faculdade era tão mal frequentada. Que aceitam qualquer um como monitor.
_ Bom, as minhas notas são as melhores da minha turma, os professores e os alunos me adoram. Ninguém torce a cara quando eu passo, e ninguém teve o nariz quebrado por minha culpa. Já de você, não posso dizer o mesmo. Para te monitorar, tive acesso às suas notas e seu boletim parece ter sarampos.
Matheus sentiu-se envergonhado, mas não deixou transparecer. Ergueu a cabeça, empinando o nariz.
_ Eu não gosto de você. Não quero que me monitore.
_ Eu também não gosto de você, mas sou adulto o suficiente para cumprir com as minhas obrigações acadêmicas, pondo de lado os meus problemas pessoais. Eu sou o único monitor disponível pra você. Então, você tem duas opções: uma sai daqui como um moleque mimado e vai bater pé com a coordenadora dizendo que não me quer como monitor , mas já vou logo avisando que ela não é a sua mãe e que não paciência para chiliquinhos de menininho imaturo. Ou você pode sentar o rabo nesta cadeira, estudar e melhorar essas suas notas bundas para não perder o semestre. E agindo como um adulto, porque é o que você é, Peter Pan. Aqui não é a Terra do nunca. É vida real e ela costuma ser muito dura com homens que se recusam a crescer. E aí? Se decide logo, porque eu tenho mais o que fazer.
Matheus sentou apoiando a mochila na mesa.
_ Muito bem. Hoje vamos ter aulas sobre Teoria da Comunicação um, mas antes eu preciso que você me diga quais são as suas dificuldades, para que possamos trabalhar em cima delas.
A princípio, Matheus não prestava atenção nas explicações de Patrick. Recordava-se das vezes em que sentiu ciúmes de Jonas e das brigas que teve com o monitor por causa do ex-namorado.
Contudo, à medida em que Patrick falava da matéria com tanta paixão que Matheus foi se esquecendo de Jonas e se concentrou nos estudos. Passou a vê a matéria de outra perspectiva. Pelo modo em que Patrick a abordava, não parecia ser um simples conteúdo acadêmico e sim algo interessante.
Começou a fazer perguntas e ter curiosidades. Fez muitas anotações no caderno e grifou trechos do livro.
O tempo passou tão rápido que Matheus não percebeu que estava no fim da aula.
_ Bom, por hoje é só. Caso tenha alguma dúvida durantes as aulas, não tenha vergonha de perguntar ao professor. E se não for o suficiente, pergunte a mim.
_ Mas já acabou?! Passou tão rápido!
Patrick encolheu os ombros.
_ Só temos uma hora por dia.
_ Você fala de um jeito tão legal. Muito diferente do chato do professor. Ele pode ser muito inteligente, mas é monótono. Dar até vontade de dormir na aula dele. Contigo não. Foi bem mais interessante.
_ Obrigado pela parte que me toca. Aliás, eu estou muito chateado por não ter trazido o guarda-chuva. Você sendo gentil comigo é sinal de que uma tempestade está por vir.
_ Ah, você sempre tem que estragar as coisas?
_ Eu tenho que ir. Estou com fome e ainda tenho que ir trabalhar.
_ Você trabalha?!
_ Claro. É o que os adultos fazem para se sustentarem. Ou você acha que vivo nas costas da dona Chiquinha?
_ Sim. Eu pensava que você vivia as custas dela.
Patrick balançou a cabeça negativamente e começou a arrumar as coisas na mochila.
_ Espere! Vamos almoçar juntos? A minha avó teve que sair para resolver algumas coisas e ela é quem cozinha quando a minha mãe não está em casa. A minha mãe deixou o cartão de crédito dela comigo para que eu comesse alguma coisa na rua. Podemos ir àquele restaurante aqui do lado. Geral diz que a comida é ótima.
_ Ali costuma ser caro e eu não tenho dinheiro para isso. E...
Matheus o interrompeu.
_ Eu pago. Sem problemas.
_ Nem fodendo! Pra depois você jogar na minha cara?
_ Eu não sou tão babaca assim!
_ É sim. Já se esqueceu das vezes que jogou na minha cara que eu era um sem teto?
_ Por que você me provocava dando em cima do Jonas na minha frente.
_ Tchau, Matheus. Eu tenho mais o que fazer.
Matheus se pôs na frente de Patrick.
_ Almoça comigo? Eu prometo que não vou jogar na sua cara depois. Por favor?
_ Por que você está fazendo tanta questão da minha presença?_ perguntou Patrick desconfiado.
_ Eu odeio comer sozinho.
_ E os seus amigos?
Matheus abaixou a cabeça.
_ Eu não tenho amigos aqui. Você sabe disso. A faculdade inteira sabe o que aconteceu com o Ivan e me odeiam por isso. Satisfeito agora?
E além do mais, eu vou ter que olhar para a sua cara todo dia mesmo. Então, o que não há jeito, o melhor a fazer é remediar.
_ Filósofa ela.
_ Matheus Ferraz, a bicha filósofa da idade contemporânea.
Ambos sorriram.
_ Vamos?
_ Olha, Matheus, eu até vou, mas se você começar a falar em Jonas eu me levanto e te deixo lá sozinho.
_ Que mané, Jonas! Eu não vou mais perder o meu tempo falando naquele safado. Há coisas mais importantes para falarmos, como por exemplo uns conselhos de moda porque essa sua blusa é horrorosa.
_ Falou a pessoa que usa chinelo com meias.
_ Chinelos com meia é vida. Confortável e estiloso.
_ Você é louca!
Durante o almoço, eles conversaram sobre vários assuntos e descobriram que tinham algumas coisas em comum, como o gosto pelo filme Toy Story e Patrick achou engraçado o fato dr Matheus se revoltar com o Andy por ter deixado os brinquedos para ir para a faculdade.
_ Você é muito infantil mesmo. O que você queria? Que ele ficasse em casa com os brinquedos?
_ Claro que não! Que os levassem com ele ora! Não são só brinquedos, são memórias afetivas!
_Sério mesmo?
_ Sim. E sem contar que poderia render outras animações e...
A conversa foi tomando outros rumos. E eles acabaram gargalhando quando Matheus contou de um episódio engraçado de Friends, que eles recordaram.
_ Fala mais sobre você, trabalha com quê? Aliás, me desculpe perguntar, como você paga a faculdade se nem tem onde morar?
_ Invasiva a senhora. Vamos lá. Eu trabalho numa farmácia como balconista. E sou bolsista na faculdade. A minha bolsa é integral, é por isso que tenho que manter as minhas notas altas e te aturar como "aluno".
_ Mas você é muito inteligente para trabalhar como balconista.
_ Hum! Primeiro me convida para almoçar e agora me elogia! Qual é o próximo passo? Espero que não seja me pedir em casamento. Porque já vou logo avisando que você não faz meu tipo.
_ E por que não? Eu faço o tipo até das lésbicas e dos homens héteros. Sou o homem mais bonito de Bento.
Os dois gargalharam.
_ Menino, você viu que cara babaca? _ perguntou Patrick.
_ Homem hétero ama uma vergonha. Quando avista uma já vem logo com o ferro querendo passar.
_ Hétero fazendo hetezices.
Depois de muito conversarem e rirem, Patrick se despediu de Matheus agradecendo pela refeição.
_ Eu que te agradeço. Você me ajudou muito com a matéria hoje.
Matheus ficou observando Patrick sair e percebeu que estava mais leve e feliz como não ficava há tempos. Como se nada relacionado a Jonas e Bruno nunca tivesse acontecido.
Deu-se conta que era bom está feliz. E percebeu que era o que merecia.
O som do interfone fez com que Jonas se levantasse da cama aborrecido. Depois da briga com Bruno, ele não queria ser perturbado por ninguém. Pensou em dispensar quem fosse o visitante.
O porteiro anunciou que Patrick queria vê-lo. A princípio, Jonas pensou em mandá-lo embora, contudo estava com raiva de Bruno e sabia que Patrick nutria uma paixão por ele e que o rapaz era bom de cama. Transar com Patrick seria o alívio que estava precisando e uma forma estúpida de se vingar de Bruno.
Autorizou a entrada do rapaz. Recebeu-o do jeito que estava, de cueca, isso facilitaria o sexo. Patrick entrou com um sorriso simpático. Jonas notou que ele estava mais corado e aparentemente feliz. Presumiu que Patrick sabia do término dos seus namoros com Bruno e Matheus e que esses eram os motivos da sua felicidade e isso o irritou.
_ Entre! A que devo a honra da sua visita, já que faz tempo que você não aparece por aqui?
Patrick o cumprimentou com um abraço e três beijos no rosto.
_ Eu não vinha mais aqui porque não era convidado. Está certo que hoje eu também não fui, mas precisava muito falar com você e não poderia te perturbar com esse assunto no seu ambiente de trabalho.
_ É algo grave?
Patrick sorriu.
_ Não. De jeito nenhum. Posso sentar?
Jonas passou a mão no pau.
_ Claro._ disse piscando o olho.
Patrick sorriu balançando a cabeça negativamente.
_ No sofá e não em você.
Jonas ficou um pouco envergonhado e sorriu para não demonstrar.
Patrick sentou no sofá e Jonas sentou ao seu lado.
_ Então, eu vou direto ao ponto. Em primeiro lugar, quero te agradecer por tudo que fez por mim. Por ter me salvado das garras do meu pai, por ter pedido a sua avó que me abrigasse e por todo carinho que recebi de vocês. Eu serei eternamente grato por tudo isso. Durante, esse tempo que fiquei na casa da sua avó, eu consegui juntar uma grana com o meu salário para poder alugar um cantinho pra mim. Não posso ficar o resto da vida na casa da sua avó. Ela é maravilhosa e me tratou muito bem, mas eu preciso do meu canto, do meu espaço. Eu encontrei uma casinha que me agradou muito e o preço é ótimo. Sem contar que é bem localizada, fica perto da faculdade. Contudo, vou precisar de um fiador. Eu gostaria de te pedir se você poderia ser o meu fiador. Me quebra esse galho?
Jonas ficou decepcionado ao vê que não era sexo que Patrick queria.
_ Tudo bem. Sem problemas. Mas a minha avó gosta tanto de você e da sua companhia. Ela vai ficar um pouco chateada.
_ Ela ficou sim.
_ Ela já sabe?
_ É lógico, Jonas! Não seria justo se ela não fosse a primeira a saber. Ela ficou um pouquinho chateada no início, mas depois entendeu o meu lado e me deu o maior apoio. A sua avó é uma pessoa maravilhosa.
_ Ela é sim.
_ Bom, mais uma vez, obrigado. Eu vou falar com o corretor e depois marcamos para assinar a papelada._ Patrick disse levantando e abraçando Jonas se despedindo.
_ Você já vai?!_ perguntou Jonas espantado.
_ Sim. Eu não quero tomar o seu tempo.
_ Imagina. Fique mais um pouquinho.
Jonas se aproximou de Patrick, puxando-o para si, segurando pelas nádegas. Pôs a mão no rosto de Patrick e tentou beijá-lo, porém Patrick desviou o rosto e se afastou de Jonas sorrindo.
_ O que houve? Vai dizer que você não quer?
_ Por que você é tão cruel?
Jonas arregalou os olhos diante da pergunta inesperada de Patrick.
_ Como assim cruel ?
_ É, cara. Você sabe que eu gosto de você e me usa desse jeito, sem se importar com os meus sentimentos. Você só quer transar comigo porque o Matheus terminou com você. Aí você usa o meu corpo, se satisfaz e depois me dispensa como um serviço que você alugou sem importar que vou chorar depois da rejeição, que vou me perguntar o que fiz de errado por não merecer o seu amor. Eu não vim aqui atrás de migalhas. Eu pensei que apesar de tudo, éramos amigos e que você não usaria a minha situação para se aproveitar de mim.
Jonas sentiu-se extremamente envergonhado.
_ Me desculpe. Eu não quero te ofender. Não foi a minha intenção. E muito menos me aproveitar de você.
_ Não queria, mas fez.
_ Patrick, me desculpe. Eu fui muito babaca contigo. Sério, mesmo. Eu pensei que você gostasse de mim e...
_ Eu gosto de você. Mas aprendi a gostar mais de mim. Sabe, Jonas, a minha terapeuta me fez enxergar que o meu problema era não aceitar o não. Eu insistia em me rastejar pra você porque me recusava a aceitar que não era correspondido. Eu inventei que poderia haver, um dia, uma possibilidade de ter o seu amor. Mas depois que eu aceitei que isso não vai acontecer e que a minha vida não pode girar em torno disso, eu me senti bem melhor. Eu aceitei que o seu amor não é meu, é do Bruno e percebi que está tudo bem. A vida não é só feita de sim. Não deu certo dessa vez. Quem sabe dê no meu
próximo relacionamento? Se der não der tudo bem também.
Jonas o olhava sem esboçar reação. Era a primeira vez que via Patrick tão firme nas atitudes e palavras.
_ Eu fui mesmo um babaca contigo. Acho que a minha vida seria muito mais fácil se eu tivesse me apaixonado por você ao invés de ter me apaixonado pelo Matheus e pelo Bruno.
Patrick balançou a cabeça negativamente sorrindo.
_ Matheus, tão bobo, se acha demais, tão arrogante, mas não passa de um idiota ingênuo. Você nunca o amou. Você usou o Matheus para esquecer o Bruno e depois manteve o relacionamento com ele para satisfazer as suas taras sexuais. Era excitante para você ter dois homens a sua disposição, brigando por você. Mas você não queria admitir para si mesmo que estava sendo um cafajeste e mentiu para si mesmo que o amava. Sendo que na verdade o seu grande e único amor é o Bruno.
_ Uau! Temos um psicólogo aqui. E olha que eu pensei que você cursasse publicidade, trocou por psicologia e não me disse nada? E quanto é a consulta? Não quero ficar te devendo.
_ Pra você é de graça. Afinal, somos amigos. Bom, eu vou indo. E mais uma vez obrigado por tudo.
Patrick se despediu abraçando e beijando Jonas no rosto.
Ao fechar a porta, Jonas sentou no sofá e penetrou os dedos entre os cabelos, encostando os cotovelos nos joelhos. Era a primeira vez que tomava um fora de Patrick e a situação foi inesperada por ele. Sentia-se mal por ser confrontado com os próprios sentimentos.
O término de Bruno, que o motivo era um mistério, o acontecido com Matheus e a rejeição de Patrick o fez imaginar Rafael do seu lado dizendo : "Eu te avisei que você iria acabar sozinho."
_ Puta que pariu !_ disse inclinando a cabeça para trás, apoiando-a nas costas do sofá.