ESCRITO POR KLEBER VIANA:
Quer um conselho? Nunca conte ao seus amigos sobre os seus dotes de marcenaria. Passei quatro dias trabalhando na construção de um palco para o noivado do Yuri e Zedu. Ainda levei Enzo e André para trabalharem comigo. Os desgraçados só toparam por que o Richard ia nos ajudar (esses tarados).
Montamos a estrutura próximo à piscina e usamos um modelo 4x4. O Santino e a Giovanna ficaram responsáveis pelos petiscos e música, mas, na verdade, eles aproveitaram para fazer trabalhos da faculdade.
— Esse irmão da Giovanna é muito gostoso. — disse André cochichando para Enzo.
— Eu ouvi isso. — falei assustando os dois. — Podem parar. Para começar, o garoto nem gay é. Segundo, que nojento. — os repreendi, porém, no fundo achando engraçado os dois nerds caçando.
— Kleber, nós sabemos que você curte ursos, o biótipo do Richard não te interessa. — afirmou Enzo arrumando os óculos de grau.
De repente, o Richard correu até uma mangueira, tirou a camisa e se molhou. Não vou mentir, ele tem um corpo bonito e definido, porém, não é algo que me chama atenção. Os meus amigos que adoraram o espetáculo, tenho certeza que o André tirou uma foto.
Nesse momento, o Enzo deixou o martelo cair no meu pé podre. Que raiva. Precisei segurar a língua para não soltar uns palavrões, afinal, eles estavam trabalhando de graça e mereciam uma diversão.
— Perdão, Kleber. — pediu Enzo pegando o martelo no chão com uma expressão de assustado, baixando e fazendo uma massagem no meu pé.
— Vou... vou perdoar só se garantir uma vaga para mim na tua empresa. — falei passando a mão no meu pé na esperança da dor diminuir.
— A gay perde até as forças quando vê homem bonito. — comentou André rindo e admirando a foto que tirou de Richard.
— Cala boca. — reclamou Enzo, bufando e continuando a massagem no meu pé, não reclamei, pois, realmente, foi muito bom.
— E aí, rapaziada. Vamos continuar o trabalho? — perguntou Richard assustando o André e Enzo.
Depois de cinco horas trabalhando, finalmente os refrescos. A mãe do Santino comprou pizzas para o jantar. A nossa relação estava melhorando aos poucos. Já não ficava com medo toda vez que ela chagava no ambiente.
Para a decoração da festa, o Yuri contratou uma empresa especializada. Eles até elogiaram a minha obra de arte, pois, trouxeram um tapete vermelho para cobrir o palco e ficou bonito demais.
— Pedir alguém em casamento dá tanto trabalho, né? — perguntei para Santino que comia uma fatia de pizza de tucumã.
— O coitado do Yuri parece uma barata tonta, apesar de todo o apoio que estamos dando. — ele falou mordendo a fatia. — Você prefere ser pedido em casamento ou pedir?
— Hum. Quer me pedir em casamento, é? — brinquei mordiscando a orelha do Santino que ficou vermelho e respondeu com o seu famoso "Hum". — Não fica tímido, amorzão. Depois da faculdade, quando eu conseguir um emprego descente, eu te peço. Pode ser?
— Calado. — ele resmungou ficando vermelho e devorando a pizza.
Como a versão tímida do Santino era linda. Eu adorava ficar abraçado com ele, ainda mais quando estávamos rodeados de pessoas que eram confiáveis.
Em menos de uma hora, a equipe da ornamentação conseguiu fazer um trabalho bonito. Eu achei que havia muitas plantas, mas de acordo com o Santino, a ideia era criar um ambiente convidativo e o verde faz esse trabalho.
No meio da tarde fiquei na piscina observando os preparativos para a festa. A mãe do Santino se assegurou que o clima não atrapalhasse os planos do Yuri, até entrou em contato com um amigo do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
Animada, a Dona Úrsula se aproximou e sentou à beira da piscina com os pés dentro da água. Ela usava um chapéu de palha enorme e olhava com cuidado para os detalhes da ornamentação.
— Você fez um ótimo trabalho, Kleber. — ela me parabenizou, antes de respirar fundo e abrir o coração. — Vou ser sincera. No início, fiquei preocupada por causa da sua relação com o Santino. Mas, nos últimos meses, eu percebi uma mudança no comportamento dele. Confesso que nunca fui uma mãe nota dez, falhei bastante e não preparei o Santino para o mundo. — comentou Úrsula balançando os pés na água.
— Dona Úrsula. — falei mergulhando para pegar impulso, emergindo e sentando ao lado dela. — O Santino é um garoto maravilhoso. Ele tem uma personalidade muito doce, desde a primeira vez que o conheci peguei para mim a missão de protegê-lo. Eu sei que não tenho a mesma classe social de vocês, porém, quero conquistar as coisas e dar muito orgulhoso para o seu filho.
— Fico feliz, meu filho. Eu sei que você achou que eu fosse difícil, porém, você ainda não conheceu o pai do Santino. — avisou Úrsula rindo alto e pedindo para eu preparar meu psicológico.
Quanto mais eu conheço a minha sogra, mais percebo que ela não era uma megera louca, apenas não sabia a forma certa de agir com o filho. Acho que a partir de agora, a relação entre eles vai melhorar.
O Santino decidiu dar um cochilo da tarde. Ele dormia tão bonitinho, de bruços e usando as mãos como travesseiro, apesar de ter vários em sua cama. Tomei uma ducha e deitei ao lado dele.
— Te amo tanto ursão. — me declarei, enquanto acariciava seus cabelos.
***
Yuri:
— Kleber, preciso de sua ajuda, por favor.
Kleber:
— Claro. Você está na casa do Santino?
Yuri:
— É o seguinte, os meus amigos vão segurar o Zedu em um jogo de futebol no dia da grande surpresa. Você e seus amigos podem participar?
Kleber:
— Claro.
***
Ótimo. Vou poder conhecer mais do Zedu. Temos muitas coisas em comum, principalmente, o fato de gostarmos de ursos. Os chasers (quem curte urso) devem se unir, uma vez que o universo ursino em Manaus é quase inexistente.
O Yuri enviou o contato do Brutus, um dos seus melhores amigos. Ele ficaria responsável de marcar a partida. Já no grupo da surpresa, o Hélder colocou uma contagem regressiva e faltavam apenas dois dias.
Preciso confessar uma coisa: me acostumei a dormir ao lado do Santino. Ele é o tipo de pessoa que tem o sono pesado, então, sempre aproveito para beijar e fazer carinho nele. A nossa relação só evoluía, um verdadeiro Pokémon.
Brincadeiras a parte, como a Dona Úrsula observou, o Santino continuava evoluindo como pessoa, de um garoto tímido para um homem decidido. Me orgulhava muito assistir esse crescimento de camarote.
No dia seguinte, recebi uma mensagem do Brutus. Pensei que iríamos jogar futsal, mas ele explicou que o Zedu curtia futebol society, ou seja, um jogo disputado em uma quadra de grama sintética.
***
Brutus:
Localização
— Vai ser nessa quadra. Você sabe onde fica?
Kleber:
— Sim, tranquilo. Vamos ter que cooperar?
Brutus:
— Não. O tio do Yuri conseguiu uma cortesia. Tá de boa. Só que precisamos de dois jogadores.
Kleber:
— Tenho as pessoas certas, vou levar dois amigos meus.
Brutus:
— Blz! Valeu irmão.
***
Pela foto no perfil, o Brutus é um cara hétero, mas que tem a mente aberta, pois, parece estar de boa com o melhor amigo ficando noivo de outro homem.
Ainda bem que todos os meus amigos mais próximos são gays. A única pessoa que ficaria contra o meu casamento seria o meu primo homofóbico, bem, ele que lute.
Passei em casa para pegar algumas roupas e minha chuteira. Para a festa de noivado, usaria um look parecido ao que vesti quando jantei na casa do meu namorado, parece que o Enzo era o louco do colete e me emprestou vários.
Cada dia que passava, a nossa casa ganhava uma novidade. Nos serviços de gari, a mamãe sempre descolava algum móvel para reformar. Entrei e me deparei com ela concertando uma mesinha de vidro.
— Filho, olha só esse achado. Ainda bem que o meu chefe me deu uma carona. — ela disse ainda concentrada na missão de tirar a ferrugem dos pés da mesa.
— Vim pegar umas roupas. Vou ajudar os meninos no pedido de casamento. A senhora não esquece que vai ser amanhã às 19h. — avisei indo em direção ao meu quarto e pegando as roupas que usaria na festa e futebol.
— Estou abandonada mesmo, né? — perguntou mamãe usando sua voz de sofredora.
— As mães criam os filhos para o mundo. — rebati, utilizando uma frase que mamãe usou com a Dona Úrsula.
— Essa doeu. — ela soltou rindo.
Enquanto guardava as roupas, o Santino passou no shopping com o Sérgio (eca). Na volta, eles me pegariam e iríamos passar na moça que estava responsável pelo bolo do noivado.
Os dois não demoraram muito. Como sempre, o insuportável do Sérgio criou problemas e não quis descer do carro, ou seja, tive que sentar no banco de trás.
— Confortável, baixa renda? — ele questionou colocando os óculos escuros e dando uma risada.
— Sérgio. — repreendeu Santino, mais parecendo um pai que amigo.
— Estou brincando. Vocês não conhecem a palavra ironia? — a voz de Sérgio conseguia ser tão chata quanto a sua expressão facial.
De repente, um odor começou a tomar de conta do carro. O Santino olhou para mim, através do retrovisor e fez uma careta engraçada. No momento, eu saquei. O Sérgio estava com problemas estomacais.
O coitado do Santino era tímido demais para perguntar, porém, eu não tinha problemas em trazer uma conversa desconfortável à tona, principalmente, para humilhar o Sérgio.
— Você peidou, Sérgio? — soltei sem qualquer tipo de pena.
— Eu, eu, eu não. O cheiro deve ter vindo desses igarapés poluídos. — apontando para um córrego, enquanto, o Santino aguardava o sinal abrir.
Encurralado, o Sérgio até tentou desconversar, entretanto, ele soltou outra flatulência e o Santino precisou abrir todas as janelas do carro.
Senhor do céu. Que cheiro de ovo podre com meia suja. Por causa dos peidos, o Sérgio afirmou que havia comido algo estragado e precisava ir ao banheiro com urgência.
Como um dos corredores da "Corrida Maluca", o Santino pisou no acelerador e chegamos na casa da moça responsável pelo bolo. A missão de pega-lo caiu no meu colo, uma vez que o Tino estava dirigindo e o Sérgio com diarreia (finalmente os refrescos).
— Está aqui moço. — disse a mulher entregando o bolo para mim. — É de geleia de frutas vermelhas com chantili. — ela informou sorrindo.
— Está lindo, obrigado. Você pode fechar a porta para mim? — pedi, antes de entrar no carro.
Nunca vi um bolo tão bonito. Por fora, eu nunca imaginaria que ele fosse de frutas vermelhas. A cobertura era de pasta americana branca com tinta dourada polvilhada, mais lembrava um quadro. No topo, ela decorou com flores e as iniciais dos meninos (Y e Z).
Eu nem preciso dizer que fiquei com o cool na mão, afinal, qualquer deslize poderia estragar a festa do Yuri e Zedu. Pedi para o mozão ir devagar, ainda mais em áreas esburacadas, algo comum na vida dos motoristas manauaras.
— Santino, eu preciso ir ao banheiro. — anunciou Sérgio ficando inquieto no banco da frente.
— Sér... Sérgio, você precisa aguentar. Ou podemos parar em algum lugar...
— Eu não vou usar um banheiro público, Santino. — soltou Sérgio ofegante e começando a suar.
— Isso não é momento de exigir. O quanto de preocupado devemos ficar? — quis saber Santino desesperado com a situação de Sérgio.
— 10 de 10. Isso é um 10 de 10, Santino! — gritou Sérgio fazendo respiração cachorrinho.
— Sérgio, você sabe que não está parindo, né? — questionei, tentando não rir do desespero do coleguinha.
Para chegar ao condomínio do Santino era necessário atravessar uma ponte, porém, um acidente deixou o trânsito parado. Os carros começaram a aglomerar na ponte e o Sérgio ficou ainda mais ofegante.
Tudo bem, eu fiquei com pena dele. Ainda mais do banco de couro do carro do Santino. Para se distrair, o Sérgio ligou o rádio e a música "Quando o sol se for", da banda Detonautas.
***
Penso no que faço
No que fiz e no que vou fazer
Hoje o seu retrato só me mostra
O que eu quero esquecer
Quando o sol se for, meu amor
Vou onde você for
Quando o sol se for
A luz indicará você pra mim
***
Alto! O Sérgio cantou alto. Como apoio moral, o Santino o acompanhou, apesar de não conhecer a letra direito. Eles pareciam dois malucos. Juro, essa cena foi surreal e um pouco angustiante.
— Pessoal. Não está funcionando. Socorro. — a voz do Sérgio foi sumindo.
— Não tem como a gente sair. Os carros não estão passando. Pelo amor de Deus, você precisa aguentar, Sérgio. — pediu Santino fazendo uma cara de nojo.
Olhei ao redor em busca de uma rota de fuga. Logo no início da ponte, havia uma área cheia de mato. Deixei o bolo em uma posição confortável, saí do carro e abri a porta do Sérgio.
Mesmo sem entender nada, o Sérgio me seguiu e fomos em direção ao matagal. Aparentemente, aquele lugar era uma espécie de guarita, mas as plantas invadiram e, com certeza, os galerosos (marginais) usavam o local para usarem drogas.
— Eu não vou...
— Qual é, Sérgio. Você não vai cagar no carro do Santino. Baixa as calças e seja feliz. Vou ficar vigiando. — falei virando de costas.
— Como eu vou limpar?
— Aff. — resmunguei revirando os olhos, abrindo a mochila e entregando algumas folhas de anotações antigas para o Sérgio.
— Me leva Deus! — gritou o Sérgio choramingando e pegando as folhas.
***
AMORZÃO:
— Como está o cagão?
AMORZINHO:
— Dando o seu grito de liberdade. Não vou mentir, gostei.
AMORZÃO:
— Credo, amor. Tadinho do Sérgio. Eu não me imagino passando por isso.
AMORZINHO:
— Castigo. #ficaadica. Seja um menino bonzinho, Santino. Senão (emoji de coco)
AMORZÃO:
— Eu sou um bom menino. (emoji de anjo)
AMORZINHO:
— Eu sei disso, o melhor de todos. E o trânsito?
AMORZÃO:
— Tudo parado. Não sei o que aconteceu, qualquer coisa eu paro depois da ponte.
AMORZINHO:
— Toma cuidado com o bolo, pelo amor do menino Elvis.
***
Depois de um sufoco, o Sérgio conseguiu "aliviar" a barra ou a bosta (desculpa, não resisti). Ele saiu todo desconfiado do matagal e, pela primeira vez, me chamou pelo nome.
— Obrigado, Kleber. — limpando o suor da testa e arrumando a bermuda.
— Cara... eu vou te zoar muito por causa disso. — disse rindo alto do Sérgio.
— Calado. Isso nunca aconteceu. Cadê, o carro do Santino? — ele perguntou todo desconcertado.
— Ele parou depois da ponte. Vamos ter que andar um pouco. Você aguenta, né? — aproveitei a oportunidade para curtir com a cara do Sérgio.
— Vai se lascar, baixa renda.
À noite, fizemos panquecas para o jantar, na verdade, o Santino fez, eu apenas o direcionei. O Sérgio mal olhou na nossa cara, mas a partir daquele momento, eu teria prazer em recordar o dia de bosta que ele teve (literalmente).
Outra coisa inédita foi o filme maravilhoso que assistimos. A história de um homem que se apaixona pelo filho do seu melhor amigo. Eu pensei que ia terminar em tragédia, mas o casal principal conseguiu um final feliz.
— Amorzão, o pessoal quer foto do bolo. — falei olhando para a tela do celular.
— Vamos de ensaio? — ele perguntou levantando do sofá com preguiça.
Fizemos uma sessão fotográfica com o bolo e enviamos para o grupo "Missão Y & Z", cortesia da Giovanna que se revelou uma ótima planejadora de noivado. O pessoal do grupo ficou apaixonado pela decoração do bolo, principalmente, o Hélder que mandou um áudio de 10 minutos sobre ainda estar encalhado.
Para fechar o dia com chave de diamante, eu dei banho no urso mais lindo o universo. Eu adorava ensaboar o Santino, não me julguem, mas eu sinto prazer em fazer isso. É uma sensação de realização pessoal, sou estranho, eu sei.
— Amorzão, vou dormir. Amanhã vamos ter um dia cheio. — falei colocando uma cueca confortável.
Eu sou um cara friorento. 20 graus para mim é uma sentença de congelamento, porém, o amor da minha vida ama o frio e para compensar deixa que eu durma abraçadinho com ele.
— Você vai para o Ceará nas férias? — quis saber Santino fazendo carinho no meu cabelo.
— Não sei. Porquê?
— Nas férias, sei lá, poderíamos ir para o Ceará. Onde tudo começou.
— Podemos ver, bebê. Depende do meu trabalho, a Dona Heloísa é legal, mas já faltei muito naquela época da enchente.
— Verdade, mas vamos planejando. — me dando um beijo no rosto. — Vou dormir amor, boa noite.
Para a minha surpresa, o Santino acordou antes de mim. Ele estava uma pilha de nervos, mais nervoso que o Yuri. O coitadinho não estava acostumado a ser anfitrião de eventos grandes.
Fui até a cozinha e já havia uma movimentação diferenciada. Peguei os materiais para o meu suco verde, afinal, era dia de futebol e queria fortalecer o meu corpo para não fazer feio.
— Bom dia, baixa renda. — desejou Sérgio entrando na cozinha.
— Bom dia, cagão. — cochichei, colocando os ingredientes no liquidificador.
— O que você disse? — ele perguntou se aproximando, querendo confusão, porém, usei toda a ironia.
— Nada, Serginho. Nada. Inclusive, vou te dar um pouco do meu suco verde. Vai te fazer bem, juro. Nunca mais você vai cagar no mato. — expliquei falando sobre todos os benefícios do meu suco verde.
— Se eu aceitar você para de falar? — Sérgio revirou os olhos e colocou os cotovelos no balcão.
— Sim. — pegando mais ingredientes para completar o suco.
— Vou querer uma dose. Você também vai jogar futebol?
— Sim. Inclusive, não vou pegar leve com você. — ameacei o Sérgio.
Às 15h, o Sérgio e eu, seguimos para o campo de futebol sintético. Ao chegarmos lá, encontramos o Enzo e André. O Brutos, também, já nos aguardava com Zedu e os seus colegas.
Ficamos divididos em dois times: vermelho e azul. O Brutus fez um sorteio e eu fiquei no time azul. Graças a Deus, o Sérgio ficou no time adversário.
Cara, como eu sinto saudades de jogar futebol. Infelizmente, o meu pé podre não aguenta mais que três horas de corrida, por isso, preciso pegar leve na minha agitação.
Eu percebi que o Zedu não estava dando os seus 200%. Perdeu lances bobos, incluindo, para o Sérgio cagão. Em um dos momentos, eu fiquei livre e corri na direção do gol, mas um dos jogadores entrou na minha frente e no desespero chutei para o Zedu, que não conseguiu finalizar a jogada.
— Tá, brincando comigo? — perguntou Brutus visivelmente chateado.
— Vamos dar um tempo! — gritou Zedu correndo para os bancos e tomando água.
Não sou intimo do Zedu, entretanto, percebi que ele estava chateado por alguma coisa. Meu Deus, será que ele descobriu sobre a surpresa? Pensei na forma que o Santino agiria nesta situação, respirei fundo e andei na direção dele.
— E aí, parceiro. Tudo certo? — perguntei limpando o suor da minha testa.
— Sim.
— Quer conversar? Olha, eu sei que você e o Yuri deram maior força na minha relação com o Santino, então, sou grato por isso. Se você quiser conversar? Meio gay, eu sei, mas somos gays, então...
— Tudo bem. Respira, Kleber. Quer ir comprar um energético na cantina?
— Claro. — concordei.
Lado a lado com o Zedu, andamos parte do caminho em silêncio. Busquei o meu conselheiro interior para não fazer feio.
— Então? — perguntei olhando para cima, pois, o Zedu é um pouco alto.
— Acho que é mais fácil conversar com estranho. Espero que não leve esse comentário como uma ofensa. — soltou Zedu, sem ter coragem de olhar para mim.
— Não me senti ofendido. — garanti, querendo deixá-lo o mais confortável possível.
— O meu irmão nunca aceitou a minha sexualidade. Então, em um ato de desespero, ele tentou matar minha família e acabou sendo alvejado pela polícia. Eu meio que nunca superei esse fato. Quando me formei, prestei vestibular para uma universidade em São Paulo e consegui, o Yuri também. Eu sei que se fosse por ele, a gente estudaria na Ufam, mas eu não tinha condições de continuar morando aqui. São muitas dores. — percebia a dor do Zedu, através daquelas palavras e compreendi o motivo da chateação, ou seja, a cidade de Manaus, que lhe trazia gatilhos.
A gente chegou na cantina, mas andamos para uma área mais afastada. O Zedu continuou o relato e explicou que o Yuri segurou a barra durante os quatro anos, mesmo sentindo saudade de casa.
— Quando a gente ama, Zedu, fazemos alguns sacrifícios. — aconselhei ficando feliz pelo Zedu confiar em mim.
— Sim. Só que eu recebi uma proposta de emprego...
— Que bom. Isso é bom.
— No Rio Grande do Sul. É uma empresa de Marketing. O salário é bom, mas não sei como vou falar com o Yuri. — contou Zedu se encostando em uma mureta.
— Olha, Zedu. Eu tenho certeza que o Yuri vai decidir o que é melhor. Você não tem noção do quanto ele te ama. Acho que você deve conversar e explicar que ainda não está preparado para morar em Manaus. — encostei ao lado de Zedu e continuei a filosofar. — Alguém muito especial me disse: "entre todas as chances que eu tive na vida, a melhor de todas, foi a chance de ter escolhido você". Acho que esse deve ser o sentimento do Yuri por você. Só abre o teu coração e vai.
— Nossa, cara. Que coisa bonita. Você tem razão. Vou conversar com o Yuri.
— Isso! — celebrei, mentalmente, e sorrindo.
— Ei, vamos dar uma surra no time do Sérgio? — ele perguntou pegando no meu ombro.
— Ele é insuportável. — soltei, aliviado que outra pessoa pensasse a mesma coisa.
— Eu percebi, todos perceberam. — afirmou Zedu revirando os olhos.
Sim. Eu consegui ser útil e aconselhei alguém. Pelo visto, o pedido de casamento ia dar bão. Eles tem tudo para serem felizes, só basta uma boa comunicação. Eu espero conquistar toda essa felicidade ao lado do Santino.