Capítulo 57
Ivan acordou sentindo uma forte dor na cabeça e ânsia de vômito. Correu para o banheiro, despejando tudo que ingeriu no vaso sanitário.
Ao terminar, puxou a descarga e molhou o rosto na pia. Quando olhou a sua imagem no espelho, reparou que estava muito magro e abatido como um enfermo.
Aos poucos, percebeu que não estava em casa e reconheceu o banheiro da suíte de Gael. Ficou por alguns segundos tentando se lembrar de como foi parar lá e quando recuperou a memória, sentiu-se envergonhado.
Reparou que não estava vestido com as suas roupas e sim com um conjunto do pijama do primo.
Ouviu as vozes de Luiza e Gael vindo da cozinha e foi até lá para pedir as suas roupas, carteira e as chaves do carro para ir embora.
Como percebeu que era o assunto em pauta, ficou atrás da porta ouvindo a conversa.
Os irmãos estavam sentados à mesa, tomando café da manhã.
_ Você deveria ter deixado ele se afogar.
_ Que isso, Luíza?!
_ É verdade, ora! Depois de todo mal que ele causou as pessoas, se morresse faria um favor ao mundo. Olha o que ele fez com o Víctor! Ele quase matou o menino! É um monstro!
_ Ele é o monstro, mas eu não sou. Por mais que não preste, é uma vida humana! Eu não poderia vê-lo se matar e não fazer nada. Ivan, não estava agindo por si. O cara tá mal. Tá na fossa mesmo! E ainda estava muito chapado.
_ Problema dele! Gael, ele acabou com a sua vida! Te fez perder o emprego e não duvido nada que mexeu os pauzinhos para que você não consiga mais arranjar trabalho em lugar nenhum. Ele fez isso com o Ítalo! Com certeza, fez contigo. E sem contar, que eu testemunhei o seu sofrimento durante todo esse tempo por acreditar que era o culpado pelo que aconteceu com o Victor, sendo que o verdadeiro culpado era ele.
'Ele é um crápula! A minha mãe fica toda se querendo pra ele e isso me dá um ódio! Esse papinho de dar emprego para a minha mãe e me dá a cafeteria era para enganar o Victor e bancar o bom moço.'
_ Eu sei de tudo isso. Não estou dizendo que ele é um santo. Eu o conheço, mas eu não poderia deixar que morresse. Espero que Ivan fique bem e feliz.
_ Gael, eu te amo muito, mas você é muito otário de desejar felicidade para alguém que te fez tão mal.
_ Desejo sim, porque gente feliz não inferniza a vida dos outros. Se o Ivan fosse feliz não teria nos prejudicado e nem feito o que fez com o Victor. Se ele não fosse filho da assassina e do maquiavélico do Raúl não teria se tornado esse monstro. O fruto sempre cai perto da árvore
'E também vamos combinar que ter uma mãe que planeja matá-lo para ficar com a sua herança é de pirar a cabeça de qualquer um.'
_ É...olhando por esse lado, você até que tem razão...mas, nada disso justifica as maldades que ele fez. Que procurasse um tratamento psicológico...que se internasse num hospício...sei lá. Agora destruir a sua vida e tentar matar o Victor por não aceitar a sua rejeição isso é demais. Eu nunca vou perdoar!
_ Eu vou lá levar café amargo para a bela adormecida. Deve tá com uma ressaca do caralho.
_ Você e o Victor são muito bons. Com certeza, a cobra do Ivan vai querer se aproveitar de vocês.
Ivan correu para o quarto. Não queria que Gael e Luíza soubessem que ele ouviu a conversa.
Quando Gael entrou no quarto, levando um copo com café, encontrou Ivan sentado na beira da cama.
Sentiu-se envergonhado diante da solidariedade do primo, o qual havia prejudicado. A bondade de Gael o causava incômodo.
_ Tome, vai ajudar na ressaca.
Ivan ficou por alguns segundos olhando o copo na mão de Gael com a intenção de negar, mas acabou aceitando. Bebeu fazendo careta. A vergonha não o deixou encarar o primo. E por isso, passou a maior parte do tempo com a cabeça abaixada.
_ Você está melhor?
Ivan fez um sinal positivo com a cabeça.
_ Cara, eu não tenho nada a ver com a sua vida, mas você tá se matando. Olha o seu estado! Você sempre foi bonito, elegante e atraente e agora tá um bagaço.
'E sempre foi equilibrado e agora tá aí fazendo barracos, agrediu o menino inocente. Você quase o matou! Cadê aquele Ivan que brincava comigo na infância? Aquele garoto doce e gentil que eu me apaixonei? Olha o homem que você se tornou! Cruel, sádico, louco, arrogante e obsessivo! O Raúl e a Sônia acabaram com você, cara! Mas, nem tudo tá perdido. Você pode melhorar.
'Você tem grana e muita! Pode fazer um tratamento psicológico foda! Pode ir a algum retiro espiritual...sei lá. Há solução para ti. Você não é os seus pais. Você pode ser melhor.'
Cada palavra dita por Gael batia nele como um golpe de chicote. Ivan se sentia péssimo por ter prejudicado a vida daquele homem, que apesar de ter sofrido com as suas maldades, estava preocupado com ele.
Quis chorar. Desejou se atirar nos pés de Gael e implorar pelo seu perdão, mas ainda havia nele um pouco de um estúpido orgulho, que o impedia de sair do lugar.
_ Cadê as minhas coisas?_ perguntou sério, sem olhar para o primo.
_ Estão na área de serviços. Como você se atirou no mar, eu tive que lavar e por para secar. Eu vou buscar.
Gael saiu e voltou alguns minutos depois, trazendo as roupas limpas e passadas. Junto delas, entregou a Ivan a carteira e as chaves.
Ivan trocou de roupas no banheiro.
_ Você tá legal para dirigir? Não é melhor chamar um táxi? Você pode voltar depois para pegar o seu carro.
Ivan fez um sinal negativo com a cabeça.
Quando entrou na sala, encontrou Luíza sentada no sofá assistindo TV. Ela estava séria, demonstrando insatisfação em vê-lo.
Ele a cumprimentou com um "bom dia" e ela o ignorou, o que o deixou ainda mais envergonhado.
Antes de sair, quando estava na soleira da porta, olhou para trás e disse:
_Obrigado, Gael.
Durante alguns dias, as atitudes de Gael o incomodavam cada vez mais. Teve que confrontar o peso da sua consciência, lembrando do quanto o prejudicou. Do injusto que foi com o primo quando o acusava Gael de ser o responsável pelo que fez a Victor.
Pensou que deveria ter aceitado o não de Gael e seguido a vida, que até poderia ter investido em Victor naquela parada LGBT, assim a história deles teria sido diferente. Ele não teria agredido o menino e estaria feliz com seu Solzinho.
Olhando para a cicatriz em sua mão, lembrou-se da infância. Do quanto era feliz quando brincava com Gael no sítio da sua avó. Lembrou dos banhos no rio e das brincadeiras eróticas e toques debaixo d'água e na hora de dormir. Sorriu recordando das ridículas cartas de amor que um escrevia para o outro, das promessas infantis que faziam promentendo amor eterno e se casarem no futuro.
Entrou em contato com um dono de uma agência de publicidade e pediu que contratasse o seu primo, mas que não revelasse a Gael que ele quem pedia.
Essa foi uma das exigências que Ivan fez para poder fechar um contrato milionário com a empresa.
Gael chegou em casa festejando anunciando para a família que finalmente havia conseguido um emprego. Sentia-se feliz por não ser mais sustentado pela irmã e a mãe.
Eles foram a uma pizzaria para o comemorar. Estava irradiante de felicidade.
_ Eu estou perdido. Me sinto sem rumo...sabe? Eu ando desapontado. Troco os pés pelas mãos. A dor da saudade do Víctor é muito forte. Mas, ao mesmo tempo, me sinto consumido por um ódio devastador.
_ Ódio de quê?
Perguntou a psicóloga, sentada enfrente a Ivan.
_ De tudo e todos...principalmente de mim. Do rumo que a minha vida tomou. Eu estraguei tudo... Eu não sei o que faço! É por isso que estou aqui. Você precisa me ajudar!
_ Então, Ivan, como você sabe não dá para resolver todos os seus problemas do dia para noite. Vamos ter que trabalhar alguns pontos que estão te prejudicando. E vamos fazer isso com o decorrer das sessões.
'Para começar, você necessita cortar o cordão umbilical. '
_ Isso é algum tipo de clichê que vocês repetem para todos os pacientes?_ perguntou com um ar de ironia. _ Eu tô pouco me fodendo para aquela sociopata. Não tenho nenhum laço afetivo com ela.
_ É aí que você se engana. O ódio pode ser tão conectivo com alguém como o amor. A diferença é que o ódio é destrutivo. Você amargurou durante anos dentro de si o ódio pelos seus pais, pela violência física e emocional por não aceitarem a sua sexualidade. Você ainda tem rancor por não ter recebido deles um amor, que você julga merecedor, por achar que todos os pais devem amar os filhos. Você reprimiu essa raiva durante anos, porque dependia deles financeiramente. E sempre que se vê diante de uma situação a qual não tem controle, canaliza esse ódio cometendo atitudes que se arrepende amargamente.
Ivan abaixou a cabeça envergonhado.
_ Ivan, os seus pais substituíram amor e afetos com a satisfação de todos os seus desejos materiais. E muitos a sua volta se submetiam as suas vontades em troca de vantagens financeiras, isso criou em você a ilusão de que pode controlar todas as pessoas e ter tudo que quiser. Quando sofreu uma rejeição do seu primo e agora do seu companheiro, você não soube lidar no passado e não está sabendo lidar agora também.
'Você precisa dissipar esse ódio destrutivo que tem dos seus pais. O passado já aconteceu. Você não pode mudá-lo, mas pode escolher como lidar com ele. Ou você continua permitindo que ele continue te destruindo, ou poderá transformá-lo em algo que ficou no passado e não influencia a sua vida em nada. Se quiser melhorar, como você diz que quer, a segunda opção é mais viável. Por isso, a importância de cortar esse laço de ódio que tem com os seus pais.'
_ E o Victor? O que eu faço? Eu o amo!
_ Primeiro, você precisa aceitar que não pode controlar as decisões dele, que Victor não é uma das suas propriedades.
'Você pode até tentar reconquistá-lo, mas que há chances de receber um não e tudo bem. Que isso é um direito dele. Que não tem o direito de agir com violência.'
_ Eu sei que ele também me ama. E quero lutar por ele.
_ Você pode lutar por ele, mas lute com respeito. Entenda que Victor tem o direito de decidir se quer ou não reatar a relação. Dê a ele o espaço que pediu.
_ A senhora tem razão em tudo. Mas, eu não confio em mim. Eu vou sair daqui sabendo tudo que tenho que fazer, mas tenho medo de ter uma recaída e fazer merda novamente.
_ Ivan, eu não estou te dando um guia de autoajuda. Se você está aqui é porque precisa de ajuda e reconhece isso. Você deu um passo muito importante para a sua recuperação.
Eu apresentei os pontos que vamos trabalhar juntos durante as sessões de terapia que faremos. Um dia de cada vez. Tenha paciência e carinho consigo. Sem autocobranças.
_ Sabe que eu me sinto seguro com a senhora? É a primeira vez que me sinto assim.
_ Eu fico feliz por isso.
_ Eu decidi que vou fazer uma especialização em gestão empresarial nos Estados Unidos. Eu preciso desse tempo para pôr a minha cabeça no lugar e dar um pouco de paz para Víctor. Mas, quero continuar com o meu tratamento com a senhora. Podemos fazer as sessões online?
_ Sim. Também trabalho dessa forma.
Ivan olhou para o relógio no pulso e se levantou.
_ Obrigado, doutora. Até a próxima. _ Ele esticou a mão para cumprimentá-la e foi retribuído com um aperto de mão e um sorriso, que o deixou mais calmo.
Ivan comunicou aos funcionários sobre a sua partida. Disse que continuaria administrando a empresa dos Estados Unidos, por e-mails e reuniões via Zoom. Instruiu a Fernanda que o mantém informado sobre tudo e pediu a ela que ficasse responsável pelo pagamento dos salários dos empregados da sua casa.
Em casa, demitiu algumas empregadas, as substituindo por serviços de uma equipe de limpeza que fariam o trabalho três vez por semana. Manteve os seguranças e promoveu Walace como chefe da equipe, triplicando o valor do seu salário como forma de gratidão pela fidelidade do capanga.
Como não necessitaria de uma cozinheira e não queria demitir Maria, a deixou como administradora da casa. Responsável pela fiscalização dos serviços de limpeza, jardinagem e limpeza da piscina.
_ Eu me sinto aliviada em saber disso. Eu tive medo de ser demitida, já que o senhor não vai mais precisar de uma cozinheira.
_ Eu não sou louco de te demitir. Victor te adora. Ele ficaria louco de voltar e não te ver mais aqui.
_ Eu fico feliz por o senhor não ter desistido do seu casamento, seu Ivan. Eu sinto que o amor de vocês é muito forte. Esse casamento não acabou e nem vai acabar. Eu confio muito no meu santinho. Fiz até promessa.
_ Santos abençoam relacionamentos gays?_ Ivan perguntou com tom de deboche.
_ Se Jesus ama a todos, quem são os santos para não amar? O preconceito é criação humana, seu Ivan. Deus não odeia as suas criaturas. Eu creio que Deus pôs o Victor na vida do senhor com algum propósito bom. De torná-lo uma pessoa bem melhor do que já é.
Apesar de não acreditar nas crenças da mulher, Ivan a admirou por ser uma religiosa e não se deixou contaminar pelo preconceito propagado pelas igrejas cristãs. E com isso, passou a admirar e a respeitar a cozinheira.
_ Obrigado, Maria. Os seus filhos têm muita sorte de ter uma mãe tão decente quanto você. _ disse Ivan, lamentando internamente por não ter tido uma mãe como ela.
_ Eu também tenho sorte de tê-los como filhos. São duas crianças maravilhosas.
_ Eu não duvido que sejam.
Ivan partiu no dia seguinte. No avião, olhava a fotografia de Víctor sorrindo no trem, na Suíça.
_ Eu vou me tornar digno do seu perdão, meu amor. Vou te fazer muito feliz.
Como estava preocupado com a saúde de Ivan, Victor ligou para Maria.
Recebeu com tristeza a notícia que Ivan havia partido para os Estados Unidos para fazer um curso de especialização e que só voltaria dali a um ano.
Renato bateu na porta do quarto de Victor levando um prato com algumas carnes de churrasco e um copo com refrigerante.
Victor enxuga as lágrimas.
_ Entre.
Renato entrou sorrindo amigavelmente.
_ Eu trouxe para você. Te garanto que estão deliciosas. Modesta parte, eu sou um bom churrasqueiro.
Victor estica os braços e pega o prato e o copo agradecendo o padrasto. Comeu uma tira de carne, fechando os olhos, gemendo demonstrando agrado.
_ Hum! Está deliciosa. Muito macia. Você é bom mesmo.
Renato sentou ao lado de Victor na cama.
_ A sua mãe está preocupada contigo. A sua presença está fazendo falta lá fora.
_ Eu sei._ Victor disse abaixando a cabeça. _ Eu não estou bem. A única coisa que vou fazer lá fora é contagiar os outros com a minha tristeza.
_ Bom, eu não quero ser intrometido, mas se me permitir gostaria de te dizer algumas coisas. Eu te entendo. Sei que está sofrendo, está triste, assustado e confuso. Você passou por muitas turbulências. A sua vida estava indo por um rumo, aí do nada veio um furacão e destruiu tudo.
Victor não conseguiu conter as lágrimas.
_ Eu sei que tenho idade para ser o seu avô, mas quero ser o seu amigo. Te apoiar no que você precisar.
Victor sorriu secando as lágrimas.
_ Avô, Renato?! Você é a alma gêmea da minha mãe mesmo. Dois exagerados.
_ É verdade! Eu sou vinte quatro anos mais velho que a Andréia. Tenho cinquenta e quatro e ela trinta e dois. Se tenho idade para ser o pai dela, logo tenho idade para ser o seu avô.
_Diante da sua aparência jovem, soa exagero sim.
Renato sorriu arqueando as sobrancelhas.
_ Quanta gentileza! Vou fingir que acredito.
_ Mas, é verdade!
_ Victor, eu gosto muito de você. De verdade. Eu me deixo a sua disposição para o que precisar. Se quiser desabafar, eu prometo te ouvir sem julgamentos. Percebo que você se sente sufocado. Que quer dizer algo, mas tem medo de ser criticado.
O loiro o olhou tristonho. Renato tinha razão. Ele estava sim querendo desabafar, mas temia ser tido como tolo por todos a sua volta.
A gentileza do padrasto o transmitiu segurança.
_ Você promete que não conta para a minha mãe?
_ Claro! Este é o nosso assunto.
_ Eu soube pela Maria, a cozinheira da casa do Ivan, . Ele foi embora. Foi para os Estados Unidos. Vai ficar lá por um ano.
_ E você vai sentir saudades?
Victor abaixou a cabeça e começou a chorar.
_ Ele vai voltar.
_ Será, Renato?
_ Vai sim. Eu conheço o Ivan. Ele te ama muito
Se está indo é porque não quer continuar te machucando. Ivan é do tipo que se sacrifica pelas pessoas amadas. Essa partida tá doendo muito nele, mas para ele a sua felicidade é muito mais importante.
_ Ele nunca me amou. Não é possível amar alguém e fazer tudo que ele fez. O que mais me dói é que eu o am..._ Victor se calou antes de completar a palavra.
_ Você o ama. Não é vergonha nenhuma amar alguém.
_ Não é o que todos acham.
_ Você não tem que se importar tanto com a opinião dos outros. Está certo que eles se preocupam contigo, mas como um homem adulto você deve tomar as suas próprias decisões.
'Sobre Ivan, o amor toma a forma do amante. Ele te ama muito, mas ama do jeito dele, que é diferente do seu. Ivan teve uma educação familiar muito diferente da sua. Aprendeu que como um homem milionário e poderoso poderia ter o mundo aos seus pés. Está acostumado a lidar com pessoas que se vendem para ele, cedendo as suas vontades.
'Ivan não recebeu amor dos pais e por isso não sabe lidar com o amor.
'Mas foi contigo que ele descobriu o que é amar. Ele falava de você com brilho nos olhos, sorria como nunca sorriu antes, sentia paz ao seu lado. Sempre se preocupou com o seu bem estar. Dizia aos quatro ventos que o que sentia por você era leve, bom e que despertava o melhor dele.'
_ Será que tudo isso era verdade? Ele me agrediu por ciúmes do Gael. Amor de primo é pra sempre.
_ Não. Um amor de verdade é para sempre, e isso ele sentiu por você. Nunca houve amor entre Gael e Ivan. À princípio, era namorico de crianças. Mas, Ivan sofreu muito com a violência do Raúl, que o agrediu com palavras e pancadas quando descobriu o namoro dos dois. Ivan é rancoroso. Amargurou a raiva durante anos e para fazer birra com a vida, pôs na cabeça que ficaria com Gael.
'Mas aí o Gael já havia crescido e mudou muito. Ivan, mimado, acostumados a ter as suas vontades atendidas, não se conformou com uma rejeição. Agiu por impulso e fez o que fez contigo. Mas, pelo sofrimento dele dá pra vê que está muito arrependido. Ele está definhando, age com desespero, chora com frequência. O nome disso é remorso.'
O menino ficou pensativo, vendo sentido nas palavras de Renato.
_ E além de tudo isso, Ivan te fez o seu único herdeiro e se casou com comunhão total de bens. E vamos combinar, que ninguém colocaria a sua fortuna a disposição do outro só para afrontar o primo. Pra você a questão do dinheiro não tem tanta importância, mas para um capitalista, isso pesa muito.
_ Às vezes, eu sinto muita raiva dele. Sinto um ódio por ter me agredido daquela forma brutal e sem nenhum motivo. Mas, por outro lado, eu sinto falta dele. Eu me preocupo com o seu estado emocional e físico. Aí, me acho um imbecil por me importar com o meu agressor.
_ Você está muito confuso. Isso é normal.
_ Ainda bem que você me entende.
_ Víctor, você ainda é muito jovem. E nessa idade vocês se preocupam muito em agradar aos outros. Mas, há decisões na vida que temos que tomar com muita cautela e reflexão.
'Você precisa de espaço para organizar as coisas na sua mente e de tempo.
'Não se envergonhe por amar. Não há nada de tolo em se preocupar com quem se ama, assim como você está preocupado com Ivan. Amar não é motivos de vergonha. Você tem esse direito.'
_ Oh, Renato! Você não sabe o quão bom pra mim é ouvir isso. Eu me sinto muito melhor.
_ Eu fico feliz por isso.
_ Se o Ivan me ama como você diz, será que esse amor vai resistir a todo esse tempo e distância? Será que ele não vai me esquecer? Sei lá, conhecer uma outra pessoa e se apaixonar?
_ Eu garanto que não. O que o Ivan sente por você ele nunca sentiu por ninguém. Nem pelo Gael e nem mesmo pela Carla, com quem ele teve um longo relacionamento. Contigo é amor de verdade. Do tipo que se sente uma vez na vida.
_ Eu ainda estou muito magoado. Ainda me dói muito tudo que ele fez.
_ Eu sei. Qualquer um no seu lugar, se sentiria assim. Mas, eu te conheço. Você é uma pessoa muito boa. Eu creio que a sua raiva vai passar. Mas, o amor não. Esse é muito forte, principalmente em pessoas boas como você.
Renato pôs a mão no ombro do enteado.
_ Não se cobre nada agora. Viva um dia após o outro. Tudo vai ficar bem.
_ Você é uma pessoa incrível! Transmite uma paz. Obrigado por me ouvir sem me julgar, por me entender e me esclarecer as coisas.
_ Pode contar comigo sempre.
_ Posso te dá um abraço, Renato?
Renato abriu os braços e Victor o abraçou.
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