Olá, será um prazer repartir com vocês esta história!
Estávamos eu e minha irmã que somos gêmeas, terminando de arrumar nossas coisas, na semana seguinte já estaríamos uma em cada cidade, estudando na Universidade que escolhemos pelos ranking do ENEM, infelizmente não conseguimos ir para a mesma cidade, mas era mais próximo do que a casa de nossa mãe, seria a primeira vez nossas longe dela, já tivemos escolhas mais difíceis, vou lhes contar, alguns relatos vem da narrativa de mamãe, que muitas vezes nos repetiu esta história, a nossa primeira história de superação. Peço paciência, mas neste início tem realmente o gatilho para todo o conto. Nossos avós maternos são mexicanos, vieram aqui em busca de montar uma distribuidora de medicamentos. Meus avós paternos eram de origem Espanhola.
Este inicio de relato foi nos passado por mamãe quando eu tinha 10 anos, acontecera uma década antes. Era a virada do Milênio, 30 de dezembro de 1999, nossa mãe e pai, haviam decidido passar o Revelion na praia, já estávamos a 2 horas no transito praticamente parado e nada de chegar os últimos 200km, papai estava impaciente uma viagem de 4 horas e já estávamos a 5 horas entre bloqueios, acidentes, engarrafamento e operações para controlar o fluxo de veículos, transtornado que ainda estávamos ali, tínhamos horário pra pegar as chaves na imobiliária, nos arrumarmos e no irmos no dia seguinte para a festa de revelion no Graciosa Club do Litoral.
Não sei se o calor, demora, estar sentada todo este tempo, com aquele enorme barrigão, deixava mamãe mais ofegante e incomodada com a impaciência de papai. Nós duas, estávamos tranquilas, afinal estávamos na barriga dela, 6 meses completos de tranquilidade, usufruindo de tudo de bom que a barriga de mamãe proporcionara.
Conta ela que assim que liberaram a pista, tanto o papai, como alguns outros saíram em disparada pela pisa dupla, queriam tirar o atraso, não bastou as inúmeras chamadas de atenção de mamãe, já estavam a uns 30 minutos andando em alta velocidade, ultrapassando todos pela frente, alternando com outros 2 carros importados que estavam junto de nós lá no ultimo congestionamento. Mamãe lembra como se fosse hoje, logo após papai ultrapassar 3 caminhões, precisou frear bruscamente pois um 4 caminhão saiu da pista lenta entrando a sua frente, para não bater papai tentou entrar à direita, estava se deslocando para a pista da direita, quando não percebeu que a BMW, já estava tentando a mesma manobra, papai por descuido não olhou para trás ou ao lado, seu foco era não bater na traseira do caminhão, e no tal ponto cego estava a BMW, resultado foi fatal.
Ambos os carros perderam seu controle, a BMW, foi pelo acostamento, arrancando placas, grama, capotando, de nada serviu ABS, em um acostamento precário, nosso carro por mais que papai tentasse, estava agora com uma velocidade menor, mas desgovernado, acabou por ser atingido pela BMW e o carro atrás de nós.
Depois disto mamãe não lembra mais de nada, apenas acordar, 1 semana depois no hospital, sua primeira reação foi pegar em sua barriga, entrou em pânico, não restava nada a não ser um corte profundo, pontos e todo seu corpo com ferimentos em fase de cicatrização. Nossa avó estava ao lado, rapidamente falou.
— Calma, não se mexa, você está frágil ainda, calma! E apertando um interruptor chamaram alguém da equipe de enfermagem.
— Pois, não! Instantaneamente veio uma enfermeira, já estávamos a caminho os monitores na controladoria indicavam uma súbita mudança nos índices cardíacos e de pressão da paciente.
— Minha filha, acabou de acordar, vocês podem chamar o médico por favor. Calma filha, já ele irá conversar.
— Meus bebês, cadê meus Bebês, o que vocês fizeram com eles. Gritava minha mãe, a outra enfermeira que chegara logo após a primeira, regulou um dos tantos tubos espetados em mamãe e logo ela foi acalmando, mas ainda acordada.
Desta vez deve ter demorado uns 20 minutos e chegada do médico.
— Bom dia, qual é o quadro enfermeira. E assim rapidamente foi passado as últimas 4 horas para ele e aí ele falou.
— Vanessa, bom dia, eu sou o médico que lhe operou, acalme-se. Seus filhos estão bem, estão na UTI pediátrica, são dois meninos fortes, lindos e vencedores, devido a prematuridade do parto e das condições a que ele foi feito, foi um milagre o airbag não ter funcionado completamente o que permitiu suavizar a pressão e mantê-los com a bolsa intacta, mas você perdeu muito sangue e com todos os ferimentos, teríamos que retirá-los para poder dar continuidade as cirurgias emergenciais que você precisava, as medicações, ressonâncias e tantas outras coisas que poderiam afetar drasticamente a saúde de seus filhos.
Nisso minha mãe falou e o Augusto, como ele está.
— Infelizmente ele não resistiu, mas graças a ele você está viva, numa última manobra, ele desviou o seu lado de bater um uma pedra, mas com isso o lado dele foi totalmente destruído, infelizmente, lamento, mas teve morte instantânea.
Só deu tempo de mamãe começar a chorar e logo o efeito mais forte da medicação a fez adormecer.
Dois meses foram os meses entre cirurgias e reconstituição de ossos de mamãe, 2 meses que ela e vovó foram tomadas por uma fé, pelos milagres que a família foi exposta, milagres estes que as fizeram fazer algumas promessas.
Ainda estávamos no hospital, nossa recuperação foi mais lenta, praticamente ficamos mais 2 meses fora os tempos previsto como gestacional na incubadora, entre sair da UTI pediatria e sermos liberados para casa.
Vovó foi a responsável por desembaraçar tudo em relação a Papai, bens, herança, seguros etc. Papai era muito precavido, seguro em seu controle financeiro e na fábrica de cosméticos que tinha com mamãe, ambos eram ele bioquímico e mamãe formada em Farmácia com ênfase em Bioquímica. Até então, ambos tinham foco na empresa, a vinda nossa era uma benção, aguardada com cuidados e afeto.
No revelion iriam abrir os envelopes com os diagnósticos do sexo dos bebês, éramos gêmeos, ambos tinham tudo preparado, toda a família estaria lá, alguns amigos e os casais já escolhidos para padrinhos. Em casa, pela ansiedade, mamãe fez tudo em tons de verde claro, afinal seria uma cor neutra e ela não queria ter que em 2 meses comprar e preparar tudo, tinha medo de algo não estar pronto então decidiram pelo verde e assim todo o enxoval estava pronto.
Iriamos nascer no carnaval de 2000, próximo ao dia 7 ou 8. Se não fosse até o dia 07, a Cesária já estava marcada para quarta-feira de cinzas, assim era pra ser. Mamãe e Papai, haviam pensado em tudo, da época de engravidar, a época de nascermos. Papai queria 2 meninas, para fazerem companhia a mamãe e no futuro serem as garotas propaganda dos produtos da indústria. Mamãe preferia um casal, para que cada um tivesse seu companheiro.
NO dia das mães, na verdade um dia antes, recebemos alta, este seria o presente que mamãe iria receber de mais importante em sua vida, ela ia todo dia no hospital nos ver e ficar dia sim dia não conosco, no hospital, mas aquele domingo iria ser extremamente especial. Teria seus filhos com ela, uma irmã mais nova de papai, que tinha seus 14 anos, ficou com mamãe para poder ajudar nas tarefas em casa, junto com uma babá em tempo parcial, para que mamãe pudesse retomar a fábrica, os projetos e tocar a vida.
Com estes fatos tínhamos 3 datas de nascimento na cabeça de mamãe, o primeiro o do incidente, que viemos ao mundo, que coincidia infelizmente com a perda de papai em 30 de dezembro, o dia oficializado como 7 de março como dia de nascimento e o dia 14 de maio como o dia que ela teve oficialmente nós em seus braços em casa.
Com isso mamãe, teve um bloqueio em alguns aspectos, pois para minimizar a perda de papai, querendo honra-lo a primeira promessa foi que até os 15 anos nosso, ela sempre faria uma festa no dia da morte de papai, visto que os Mexicanos vêm de forma diferente a Morte, dos que os brasileiros, e a cultura religiosa tem grande peso na Espanha e no México. Ela decidiu, que neste dia, eu e meu irmão teríamos uma festa de meninas, simbolizando os desejos de papai, e assim com os 15 anos a passagem e daí a promessa seria cumprida, pois como estávamos entre a vida e a morte ela e vovó prometeram assim.
Dia 7 de março, teríamos nossa festa natural como meninos e no dia das mães ela acaba por escolher sempre motivos femininos, mas não necessariamente era uma festa, misturava dia das mães e outras coisas conforme o calendário.
E assim foram os11 primeiros anos, a primeira festa era bem restrita, mesmo por que a maioria do povo já estava em seus preparativos de Revelion, distante, longe ou atarefado que os impediam de vir, fora que para alguns era incomodo uma festa coincidindo com a morte de alguém, não estava em suas raízes.
A segunda era com os parentes em março, bem alegre algumas vezes coincidia com o carnaval, com festas a fantasia, ou era esticado para comemorar no Carnaval.
A última era apenas nos dois e mamãe, quase nunca aparecia ninguém. Quando tínhamos 5 anos, vovó se foi naquele inverno. Agora éramos apenas nos três, a prima ficara até completarmos três anos.
Até aquele aniversário de dezembro de 2011, pouca coisa havia mudado nas rotinas de casa e assim seguíamos como 2 gêmeos sempre usando roupas neutras, não éramos tão expostos ao público, muito menos éramos fechados, mamãe sempre nos deu de tudo e nos permitiu em casa termos inúmeras regalias e facilidades da vida moderna e de crianças bem resolvidas financeiramente.
Mas lembro que acabamos por brigar com mamãe pois não queríamos colocar aquelas roupas, eram vestidos lindos, mas já sabíamos serem de meninas, então mamãe sentou-se ao nosso lado e contou toda a história do acidente, o antes, os sonhos de papai, as promessas e assim pediu que respeitássemos que em 2015 tudo isto terminaria e teríamos apenas a festa de março como comemorativa.
Ainda teimamos, então ela nos mostrou 6 álbuns, dos anos de 2001,até 2011 aonde estávamos sempre de meninas, felizes. Mostrou outros 6 dos mesmos anos que estes estavas disponíveis para todos verem, aonde estávamos de meninos e o álbum de dia de mãe, sempre com um casal de crianças e ela nos contou que nos anos impares um era menina e nos pares o outro e assim ela achou uma forma de não favorecer a ninguém nas escolhas.
Nossos nomes Eduardo que é um prenome derivado da forma anglo-saxã Eadweard, composta dos elementos ead, "riqueza, fortuna, prosperidade", e weard, "guardião, protetor" e Rafael (Eu), Rafael é um nome próprio masculino de origem hebraica (רפאל, transl. Rafa'el, de rafá, "ele curou", curado por Deus. Vem exatamente do Milagre pelo qual passamos e pela riqueza e prosperidade que mamãe via como uma bênção.
Desta forma nos álbuns secretos, havia a menção a Eduarda e Rafaela. Já nos álbuns de Casal, a forma feminina era sempre ou Duda ou Rafa, e a Masculina sempre o nome Eduardo e Rafael, assim tínhamos Eduardo e Rafa e Rafael e Duda. Eram estes os mencionados Bloqueios que mamãe tinha e que na semana que antecedia o primeiro e o terceiro aniversário, geralmente nos isolávamos em alguma pousada ou em cidades distantes, algumas até fora do país para que mamãe pudesse ter seu momento conosco.
Bom, esse é o conto que dá início as memórias, como disse muito daqui vem dos relatos passados por mamãe, com os álbuns como fonte e registro de que desde 2000, sistematicamente tínhamos estas comemorações. Daqui para frente, teremos alguns relatos destes 8 novos aniversários, algumas lembranças também de que não só nestes dias haviam estas transformações, mas isto é matéria para episódios específicos.
Obrigada, no feminino pois já é 2021, tenho, portanto, 21 anos e quem os escreve é Rafaela, Rafa para quem se interessar, ou para quem ela permitir ser descoberta.
... continua ...