Olá a todos(as).
Antes de mais nada devo avisar que este não é exatamente um conto (muito menos erótico). Meu objetivo é contar um pouco da minha experiência como crossdresser (desde a época em que nem conhecia essa palavra), e os conflitos e angústias decorrentes disso. Este texto seria uma forma de desabafo de alguém que não concorda com a ideia (talvez defendida pela maioria das pessoas aqui) de que devemos fazer sempre aquilo que nos dá prazer, especialmente o sexual, e tudo o mais que se dane; que vale a pena, inclusive, desconstruir sua identidade masculina em nome de um fetiche, sem saber direito o que pode vir depois disso.
Mas claro que o objetivo aqui não é julgar ninguém (estou apenas expondo meu pensamento). Nem quero fazer parecer que eu domino completamente os meus desejos, pois isso está longe de ser a realidade.
Gostaria de ouvir as opiniões/conselhos de outras CDs que não pensem só em sexo (mesmo que discordem de mim). Adoraria ouvir opiniões de mulheres também (será que tem mulheres que leem contos sobre CDs?).
Hoje sou um homem casado, branco, 1,79, de pouco mais de 35 anos de idade.
Sempre fui tímido e tive uma certa tendência ao isolamento, o que me levava a viver muitas coisas na imaginação. Tinha uma imaginação fértil e me imaginava vivendo situações impossíveis. Essas fantasias não estavam sempre ligadas ao universo feminino: havia as fantasias tipicamente de menino, em que o lado feminino não entrava, ao mesmo tempo, a partir de um certo momento (que eu nem lembro mais quando foi), começaram aquelas outras fantasias.
Desde pequeno, tipo uns 5 ou 6 anos de idade, eu já sentia atração pelas garotas, não só as da minha idade como também as mulheres mais velhas (adultas). Acho que esses pensamentos eram um tanto precoces pra idade, mas não posso afirmar com certeza. O fato é que eu imaginava coisas sexuais, pelo menos tanto quanto minha imaginação de criança podia conceber, a partir do que eu via na TV: beijos, amassos, carícias, etc. Mas me chamavam mais atenção aquelas mulheres bem produzidas e maquiadas. Aquilo realmente me fascinava. Acho que aquilo foi o estopim para o crossdressing começar. O que realmente mexia com a minha imaginação era a capacidade da maquiagem e outros itens de beleza de transformar uma pessoa. Nessa época também via aquelas apresentações de transformistas que passavam na TV, e aquilo contribuía para excitar minha imaginação mais ainda, por me fazer ver que até mesmo um homem poderia ficar uma mulher deslumbrante e sexy.
De tanto pensar nessas coisas acabou surgindo o pensamento de me produzir igual a uma dessas mulheres que eu admirava (ou uma das transformistas/travestis que apareciam na TV). Minha imaginação concebia coisas fantasiosas, como uma máquina que me transformasse em garota e me permitisse sair por aí dessa forma e desfrutar alguns como momentos com a identidade feminina. Mas sempre algo temporário, podendo voltar a ser menino depois. Não me imaginava vivendo para sempre como garota.
Ainda lembro da primeira vez em que pude, de alguma forma, colocar isso pra fora. Quando eu tinha uns 6 anos a professora mandou a gente fazer um trabalho na escola, e deveria ter um beijo no desenho. Ela disse que passaria batom nas meninas pra elas beijarem o papel; já os meninos poderiam desenhar com lápis de cor, porém, mesmo assim, se algum menino quisesse ela passaria batom nele também. Diante da possibilidade de passar batom senti o coração disparar e imediatamente fiquei morrendo de vontade. Mas já sabia que um menino não deveria fazer isso. Então pensei assim: ah, eles vão achar que quero apenas caprichar mais no trabalho. Então na minha vez escolhi passar o batom. Ainda lembro do risinho da professora diante da minha escolha e das crianças me olhando curiosas (lembro especialmente da cara da menina que eu gostava me olhando). Adorei a sensação do batom sendo passado em meus lábios, mas infelizmente não pude ver como fiquei no espelho. Depois fiquei com vergonha quando percebi que o único menino a escolher batom tinha sido eu.
As coisas seguiram nessa primeira infância sem mais nada relevante (tirando o que se passava na minha imaginação, claro), apenas coisas bobas como uma vez que uma minha tia correu atrás de mim para colocar uma saia (de brincadeira) e eu fugi mas me deixei ser pego (porque era o que eu queria mesmo).
Foi com 11 anos que eu tive coragem de usar algo feminino por conta própria, sem que tivesse algum pretexto para isso: foi um batom vermelho no banheiro de casa. Ao contrário da maioria das CDs que começam usando uma calcinha, o meu fetiche maior sempre foi com a imagem externa feminina, com a produção caprichada. Eu queria olhar no espelho e ver a imagem de uma mulher bem produzida, por isso a maquiagem fisgava mais a minha atenção. Logicamente a sensação foi maravilhosa, muito excitante, tanto ao passar o batom quanto ao ver meus lábios bem vermelhos e sexys.
Mas isso foi só o começo. Naquele dia não estava sozinho em casa, por isso não podia passar daquilo. Mas ficava sozinho em casa com alguma frequência e nessas horas não resisti mais: comecei a experimentar outros itens de maquiagem e também roupas (todos da minha mãe). Com relação à maquiagem eu me deliciava com tudo aquilo que vivia admirando nas outras mulheres: além do batom – claro – experimentei lápis de olho, rímel, blush, sombra etc. E também as roupinhas: vestidos (curtinhos ou longos), blusinhas, saias, calças legging, meia calça (adorava a sensação delas), sapatos. Não podia faltar o sutiã, sempre com algum enchimento (em geral meias) para fazer de seios. A calcinha, como eu disse antes, não era o mais importante, mas também as usava, porém não sempre: tinha nojo de usar as calcinhas usadas e não achava muito certo usar as calcinhas limpas e colocar de volta na gaveta.
Conforme isso foi se tornando um hábito eu ia evoluindo nas minhas produções. Por exemplo: tinha um brinco em formato de “J” com umas pequenas pérolas coladas ao longo dele. Eu encaixava esse “J” no lóbulo da orelha, fazendo entrar o encaixe do brinco (aquela parte pontiaguda) na concha da orelha (logicamente sem perfurar nada). Esse brinco bem encaixado na orelha daquela forma servia se suporte para qualquer outro brinco que eu quisesse usar, o qual era preso no pequeno espaço entre o brinco em formato de “J” e as pedrinhas que eram coladas nele. Assim podia usar brincos grandes e chamativos, cheios de penduricalhos ou brincos de argola. Usava também outras bijuterias, como colares, pulseiras, anéis, etc.
Cheguei ao ponto de pintar as unhas algumas vezes, quando sabia que ficaria mais tempo sozinho em casa; algo bem arriscado, mas a vontade era mais forte. A excitação ia a mil nessas horas, e muitas vezes acabava me masturbando, depois de desfilar pela casa como garota e admirar aquela imagem feminina no espelho.
Chegou um ponto em que aquilo não me bastava: eu sentia a necessidade de ser vista ou interagir com alguém como mulher. Na época não havia internet ainda, então depois de me produzir toda eu procurava telefones de salões de beleza na lista telefônica e ligava para eles, fazendo a voz mais feminina possível (o que era relativamente fácil naquela época), me passando por mulher e perguntando sobre os preços dos cortes de cabelo, unhas, maquiagem, depilação, etc. Até mesmo dia da noiva eu perguntava rs. Fazia questão, claro, de inventar um nome antes, um daqueles que eu achava mais femininos: Michelly, Sheyla, Cláudia, etc. Teve uma vez que não resisti e marquei de fato um horário,e ainda dei meu telefone real! Realmente não sei porque fiz isso. Só sei que uns dias depois ligaram em casa perguntando pela Cláudia, minha irmã atendeu e disse que tinha sido engano.
Isso durou uma boa parte da adolescência, e foi perdendo força por um conjunto de motivos: eu fui crescendo e desenvolvendo características mais masculinas ; sentia falta de uma maquiagem profissional, peruca, etc. O medo de ser descoberto também pesou.
Mas esse lado feminino apenas havia adormecido. A partir dos 20 e poucos anos, quando passei a ter acesso a internet, acabei descobrindo esse termo “crossdresser” e após ler vários relatos de cdzinhas percebi que havia centenas ou milhares de outras como eu. Meninos que embora não fossem (pelo menos em muitos casos) afeminados externamente, nem gays, tinham essa atração irresistível pelo universo feminino. Aquilo começou a alimentar novamente meu lado mulher, me fazendo fazer perfis femininos na internet (no antigo orkut, facebook, skype etc).Não me passava por mulher mas sim por cdzinha mesmo, e por meio dessa identidade secreta conversava com outras CDs, transformistas, travestis, transexuais e mulheres de verdade (cis como se diz hoje). E esse contato, conhecer as histórias delas, e especialmente poder conversar e agir como garota (pelo menos no mundo virtual), fez o desejo voltar mais forte. Mas não tinha mais coragem de usar as coisas da minha mãe, nem de comprar meus próprios itens femininos.
Depois de reunir muita coragem marquei horário com uma mulher que tinha um estúdio exclusivo para CDzinhas. Fui lá, e pela primeira vez passei por uma transformação completa, com os itens que tanto me faziam falta, especialmente peruca e uma maquiagem mais elaborada, com direito a base, corretivo, pó compacto etc. Claro que foi como um sonho realizada e me senti muito bem fazendo aquilo, apesar da vergonha. Não saí em público montada, apenas tiramos umas fotos (que ela me mandou depois por e-mail). Como eu sentisse falta de uma maquiagem mais profissional, repeti a experiência pouco tempo depois, duas vezes. Destas vezes escolhi duas travestis para fazerem esse trabalho. Gostei bem mais da maquiagem feita por elas, especialmente a última, que por sinal antes de ser travesti tinha sido transformista e vencido o concurso de Miss Brasil Gay (eu a admirava bastante).
Passei então a usar aquelas fotos nos meus perfis na internet (com cuidado claro). Mostrava o rosto para as amigas que tinham ganhado mais a minha confiança. Era um prazer ser finalmente tratada como garota, ter a feminilidade elogiada, etc. Passei a conhecer várias histórias de cdzinhas e percebi que muitas eram parecidas com a minha: eram meninos que não sentiam atração por meninos, não se consideravam gays, mas desenvolveram essa admiração exacerbada pelo universo feminino, a ponto de começarem a usar peças femininas. Percebi também que muitas dessas CDs, mesmo se considerando homens héteros a maior parte da vida, quando decidiam continuar alimentando esses desejos na idade adulta acabavam mergulhando de cabeça nisso, de uma forma que fugia ao seu controle: compravam cada vez mais itens femininos (que tinham que fazer loucuras para esconder caso fossem casadas), formavam o seu círculo de amizades com CDs mais experientes (ou drags, travestis etc) e acabavam saindo em público montadas para curtir a noite etc. A sensação de poder ser mulher em público, ser vista como tal, admirada, elogiada etc, mexia com a cabeça delas, a tal ponto que curtiam as cantadas dos homens e acabavam percebendo que no fundo esse lado mulher precisava se entregar a um macho pra se sentirem fêmeas de verdade. E acabavam, mais dia menos dia, realizando isso. Eu, que me considerava hétero e tinha certeza de nunca ter sentido atração por homens, de certa forma entendia isso que se passava com elas. Esses relatos passaram a me excitar bastante e nas minhas fantasias passei a me ver no lugar delas. O meu lado racional dizia pra mim mesma que esses pensamentos me excitavam apenas na imaginação, e que na vida real nunca faria aquilo de verdade. Mas no fundo eu não tinha certeza (ainda hoje não tenho).
Com as minhas amigas virtuais mulheres passou a ser constante desenvolver um certo "joguinho", digamos assim. Eu iniciava o contato (após uma conversa no bate-papo por exemplo), sempre contando a história real, e enfatizando que eu era hétero, que apesar desse fetiche sempre tive atração apenas por mulheres. Conforme íamos ficando mais íntimas eu fazia questão de ser bem mulherzinha, imitando(ou tentando) imitar em tudo os sentimentos e o modo das mulheres falarem. Era um prazer indescritível quando percebia que elas passavam realmente a me tratar como uma amiga, contando coisas que normalmente elas contam apenas para outras mulheres. Muitas vezes elas diziam que não viam nada de homem em mim, que por dentro eu era uma mulher. E eu amava ouvir isso! Cada vez que sentia que meu lado homem morria para uma dessas amigas, que ela não via qualquer "ameaça" masculina em mim, eu sentia uma satisfação muito grande. Claro que elas falavam de homens para mim, o tipo de homem que elas gostavam, como eram tratadas na cama etc. E sempre ficava implícito que eu não era nenhum desses tipos de homem, pois eu era uma garota como elas (ou quase). E eu adorava sentir isso.
Mas então meu lado racional entrava em cena. Como assim, estou conversando com mulheres lindas e gostosas e eu faço questão que elas me vejam apenas como uma amiga? Que esqueçam completamente que sou homem? O meu lado homem não morria de fato, mas acabava sendo totalmente sobrepujado pela "Sheila" (na verdade era outro nome que usava, aqui eu o troquei). Quando pensava seriamente nisso ficava confuso e decepcionado comigo mesmo. Tudo bem eu ter um fetiche um pouco diferente, mas isso já não era demais?
[CONTINUA...]