O outro capítulo 32 A estreia da livraria

Um conto erótico de Arthur Miguel
Categoria: Gay
Contém 7311 palavras
Data: 22/04/2022 21:07:31
Assuntos: Amor, Carinho, Desejo, Gay

Capítulo 32

O sobradinho antigo pintado de branco com as janelas e portas azuis estava erguido a mais de meio século numa rua comercial, sendo um das residências mais antigas do local.

Ainda carregava em si o aspecto de casa de vó, transmitindo o aconchego para quem entrasse. O quintal era adornado de plantas diversas e flores perfumadas. As que mais se destacavam eram as roseiras, que embelezavam toda a fachada da casa, dando ao local o carinhoso apelido de o sobradinho das roseiras.

Essa aparência não era fruto do acaso, ali fora durante muitos anos a casa da avó de Helena Dinis. A escritora tinha belas lembranças da época em que avó ainda habitava neste mundo e abria as portas da sua casa para os netinhos se esbaldarem em brincadeiras, carinhos e deliciosas refeições.

Dona Sílvia falecera há mais de três anos, tempo em que o sobradinho permaneceu vazio de presença humana.

Helena sempre foi uma mulher nómade, não habitava por muito tempo na mesma cidade. Gostava de explorar o mundo em busca de inspiração para a crianção dos seus romances.

Como era muito querida por todos os amigos, Helena decidiu dar uma festa de despedida em sua casa convidando a todos os entes queridos.

Leandro ficou muito feliz pelo convite. Conhecera Helena na faculdade, onde deram início a uma amizade terna, trocando admiração um pelo outro.

Além de amigo, Leandro era fã da escritora, um grande admirador da escrita poética e intrigante de Helena.

Na ocasião especial, Helena, em meio a uma conversa, anunciou que alugaria o sobradinho que fora da sua avó, deixando sob os cuidados da corretora do seu marido.

No mesmo instante, Leandro recordou do local com carinho, sendo transportado para o tempo em que os universitários se encontravam no sobradinho numa daquelas agradáveis reunião de amigos.

A luz de uma boa ideia brilhou em sua mente, pensando em transformar o sobradinho na sua livraria.

Helena aprovou a ideia de imediato, se mostrando empolgada com as explicações de Leandro, de como pretendia decorar o local.

_ Não há mais o que discutir. O sobradinho é seu._ Helena deu o ultimato sorrindo, dando um trago no cigarro._ Mas tem uma condição.

Leandro a olhou interrogativo, mas sorria, sentia que vindo da amiga seria algo bom.

_ Quero que seja na sua livraria o lançamento do meu novo romance.

_ Perfeito! Será uma honra! Você sabe o quanto amo as suas histórias, sou um admirador da sua escrita.

Além da admiração pela amiga, Leandro pensou que esse evento de estreia na sua livraria seria um bom marketing para a sua pequena empresa, já que Helena Dinis era uma escritora consagrada de best sellers.

Leandro quis manter o clima de aconchego no local. Cuidou das plantas para que permanecessem ainda mais lindas e saudáveis, dando vida ao ambiente.

No térreo funcionaria a loja, com estantes simples de madeira parecendo uma biblioteca particular, onde best sellers, clássicos e revistas compartilhavam o mesmo espaço.

A livraria ofereceria aos clientes a opção de comprar livros novos ou usados, além de uma estante exclusiva para vinis, que ficava próxima a uma vitrola dos anos 1920 como decoração. O objeto pertenceu aos antepassados de Leandro que ficou guardado por muitos anos na casa de Angela.

Nas paredes, Leandro pendurou emoldurados os seus desenhos realistas com referências literárias de personagens de clássicos e autores consagrados.

Poltronas vintages e confortáveis foram postas perto das estantes, para aqueles clientes que gostam de curtir uma boa leitura numa livraria.

O espaço infantil não foi negligenciado. Oferecia diversos livros interativos e brinquedos com referências dos livros.

No segundo andar se tornou um escritório e o estoque da livraria.

Como as roseiras eram a referência do sobradinho, Leandro decidiu as homenagear, nomeando a loja de Livraria das roseiras.

Ele ainda não tinha poder aquisitivo o suficiente para contratar muitos funcionários, contava apenas pelos serviços prestados pela ex funcionária e atual amiga Patrícia.

Vanessa estava empolgada com a nova fase do pai. Estava tão feliz que insistiu para que pudesse contribuir de alguma forma.

Leandro a amava tanto que não resistiu a aqueles pedidos carinhosos.

_ Quero ficar responsável pelo marketing da livraria... já tenho ótimas ideias.

_ Sério?! E posso saber o que se passa dentro desta cabecinha linda?_ Leandro perguntou sorrindo, tocando na testa dela com a ponta do dedo indicador.

_ Como o evento de estreia será a tarde de autógrafos da Helena Dinis, penso em convidar alguns booktubers e bookinstagranrs . Eles podem divulgar o evento em seus canais ou perfis. Isso seria um bafo, pai. Muitos leitores conheceriam a livraria.

_ Hum! Até que você não é fraca, moleca._ Valéria exclamou. Presunçosa, Vanessa piscou para ela.

_ A ideia é boa, mas nós não temos dinheiro para pagar essas pessoas.

_ Não se preocupe com isso, pai. Deixe comigo.

_ Nem pensar. Não quero meter o dinheiro do Júlio nisso.

_ Não é o dinheiro do meu pai! É meu. Se ele me deu é meu._ Vanessa respondeu irritada.

_ Mesmo assim. O dinheiro veio dele.

_ Deixe de ser idiota, Leandro! A Vanessa tem razão. Se o demônio transferiu o dinheiro para ela, logo é dela. E não importa se vem dele ou não... aliás você deveria encarar como indenização por todo o mal que ele te fez.

_ Mas...

_ Mas nada, pai. São duas contra um, você perdeu.

_ Então, tá bom... né. Quem sou eu para discutir com esses dois furações?

_ We are powerful women. (Nós somos mulheres poderosas).

Leandro respondeu com um sorriso. Estava tão feliz com a nova fase. Para ele gratificante que estava tendo uma boa relação com o maior da sua vida. Vanessa não acreditava mais nas mentiras que Júlio contava a seu respeito, e estava mais amável com ele.

_ Hoje eu já disse que te amo?

_ Umas dez vezes.

_ Vai a décima primera vez. Eu te amo, princesa.

Ele a abraçou e a encheu de beijos pela face.

....

Era o inegável que Leandro estava feliz. Sentia-se mais leve por perdoar os pais e reatar a relação com eles, a boa convivência com Vanessa e estava empolgado com a estreia da livraria.

Dedicava-se com a afinco ao novo comércio, cuidava de cada detalhe com carinho e dedicação, tendo o auxílio de Valéria, que era experiente em gestão empresarial.

No entanto, a felicidade não conseguia se estender em todas as áreas da sua vida. Algo ainda o incomodava, era as lembranças de Dimitri, homem que nunca existiu. Era só uma grande mentira criada por um homem que ele julgava cruel e sórdido.

Por alguns instantes do seu dia, desejava que Dimitri fosse real, pensava o quão feliz seria se pudesse e viver aquele amor que sonhou.

Lembrava-se dos momentos que viveram, do sorriso ousado do rapaz, do quanto se sentia satisfeito nos momentos de prazer, de como se sentia bem em seus braços.

Em seguida, a raiva surgia com tudo. Junto com as boas lembranças vinham como furacão as ruins, as ligações recebidas como afrontas do ex amante de Júlio. Imaginava o quanto serviu de piada pelo jovem, chegando a imagina-lo gargalhando da sua ingenuidade.

Controla para não chorar. Dimitri, ou Abner, ou seja lá como se chama aquela criatura perversa não merecia as suas lágrimas...homem nenhum merecia.

_ Foque em reconstruir a sua vida e nos cuidados da sua filha. Você merece ser feliz._ Era o que dizia a si mesmo diante do espelho.

Aquela era uma manhã cinzenta. Uma chuva fina caía sobre o Rio de Janeiro. Devido ao frio, vestia-se com um casaco de moletom preto, calça e sapatos de mesma cor.

Entrou na livraria com os cabelos um pouco molhados, aqueles belos fios negros caídos sobre a testa o deixava mais charmoso.

A sua pele estava fresca e cheirosa, demonstrando que acabara de tomar banho.

_ Bom dia, Pati._ a cumprimentou beijando o rosto e abraçando.

Patrícia cheirou com gosto o pescoço do amigo, beijando o local.

_ Huuum! Leandro, além de lindo ainda está cheiroso! Ah, se você fosse hétero, eu não te deixaria escapar.

_ Teria que entrar na fila, e esperar sentada, porque eu estaria no primeiro lugar._ disse Valéria descendo as escadas.

Leandro sorriu envergonhado com os assédios das amigas.

Foi inevitável que seus olhos não mirassem uma cesta de palha, repleta de guloseimas e uma rosa que estava sobre o balcão.

_ O que é isso?

Patrícia e Valéria se entreolharam sorrindo.

_ Parece que o senhorito tem um admirador secreto.

_ Eu?! Do que você está falando, Patrícia?

_ Hoje, assim que cheguei aqui na livraria, um funcionário do café em frente entregou essa cesta. Disse que o patrão mandou te entregar em mãos. Junto a cesta, esse cartãozinho.

Leandro pegou o cartão curioso.

"Convido o homem mais lindo desta a rua a conhecer a nossa confeitaria literária. Será recebido com todas as honras da casa, digno do príncipe que é."

_ Está sem remetente. Quem será?

_ Isso nós vamos descobrir quando formos á confeitaria._ respondeu Valéria.

_ Aí gente, eu adoro esses mistérios românticos. Fico toda empolgada._ Patrícia comentou sorrindo e esfregando as mãos.

_ Eu nem sabia que tinha uma confeitaria por aqui.

_ Nem eu, Bijuzinho. Parece que você teve sorte. A confeitaria é temática de literatura e fica bem em frente a livraria, o que é ótimo para atrair clientes.

_ Uma confeitaria literário! Que legal! Deve ser um ligar incrível!

_ Gente, será que ele é gato?_ Perguntou Patrícia.

_ Na certa deve ser um velho decadente.

_ Deixe de ser pessimista, Leo. Pode ser gato e o futuro amor da sua vida.

_ Com a "sorte" que tenho com homens, com certeza é um velhote.

_ Se for, você casa com ele. "Acidentalmente", ele cai das escadas e você se torna o novo proprietário da confeitaria.

_ Ah, pronto. Começou a Valéria e as suas groselhas. Gente, vamos trabalhar, porque temos muito o que fazer.

_ Trabalhar porra nenhuma, vamos ver o que tem dentro dessa cesta.

Ao terminar de dizer isso, Valéria retirou o plástico florido que cobria a cesta. O que a chamou atenção foi uma caixa cor de rosa estampada com a logo da cafeteria e uma tampa transparente. Dentro dela havia sete doces redendos de cor branca.

_ Gente, eu nunca vi desse aqui. Do que será?_ Valéria se perguntou, olhando curiosa para a caixa.

Leandro pegou da sua mão e distribuiu entre eles. Patrícia foi a primeira a experimentar. Fechou os olhos e gemeu sentindo prazer, com aquele paraíso dissolvendo em sua boca.

_ Huuuum! Que delícia! Muito bom!

Valéria experimentou em seguida, tendo a mesma reação que a amiga.

_ Gente, eu já comi muitas coisas boas na vida. Mas igual a isto aqui nunca...isto tem um sabor...nem sei explicar de tão bom.

Leandro, movido pela curiosidade, mordeu a beirinha do doce. Quando o seu paladar teve contato com aquela maravilha, se sentiu motivado a por tudo na boca de uma vez.

Não sabia descrever o prazer que sentia, era como se as todas as sensações boas possíveis o dominassem naquele momento.

_ É perfeito.

_ Não tem conversa. Hoje mesmo vamos conhecer o nosso vizinho misterioso. Um homem que prepara um doce desses, na certa deve ter mãos de anjo._ Declarou Valéria.

Leandro relutou muito com as amigas para não ir á confeitaria. Dentro dele a curiosidade batalhava com o medo. A primeira foi a vencedora.

Por mais que as mulheres insistissem em ir naquele instante a confeitaria, Leandro se manteve firme em fazer isso depois de terminarem a organização da livraria. Os livros precisavam estar em seus lugares nas estantes, as etiquetas dos preços coladas sobre eles e, além disso, alguns problemas administrativos precisavam ser solucionados.

A confeitaria era um espaço agradável. Ficava localizada quase em frente a livraria. As cores das paredes se alternavam entre brancas e salmão, as janelas eram imensas e largas, o que facilitava para que a luz solar reinasse sobre o local.

As mesas eram de madeiras pintadas de brancas, as cadeiras de mesma cor com o assentos e encostos estofados com desenhos de rosas. O balcão de vidro ocupava quase todo o espaço da divisa entre a cozinha e o salão, dentro dele belos e deliciosos doces e tortas confeitadas chamavam a atenção, despertando desejos nos paladares.

Os lustres eram antigos, as lâmpadas se posicionavam como flores penduradas.

O que chamou a atenção de Leandro foram os menus com formato de livros. Neles os doces e bebidas eram apresentados com os seus nomes, preços ao lado e abaixo de cada um trecho dos livros em esses alimentos eram citados.

Não havia muitos funcionários. Apenas um rapaz e uma moça no balcão, ambos muito jovens, vestidos com calça e blusas rosé com golas e mangas pretas e sobre a cabeça toucas de redes também pretas, que tinha formas de boinas.

Havia também alguns clientes ocupando algumas mesas, que conversavam entre si sem notarem o mundo ao redor.

O que chamou a atenção de Leandro foi uma senhora idosa se aproximando do balcão. Ela trajava roupas de cozinheira e falava algo no ouvido da balconista. Leandro a reconheceu de imediato.

_ Vamos embora!_ Leandro ordenou as amigas, já se preparando para levantar. Ambas a olharam sem entender o que estava acontecendo.

_ Por quê? O que houve?_ perguntou Patrícia, se sentindo confusa.

_ Olhe com discrição, Val, e veja quem está ali.

Valéria ignorou a palavra discrição e só seguiu o conselho de olhar, pondo a mão na boca espantada.

Patrícia era a única que não entendia o que estava acontecendo e tratou de perguntar.

_ Aquela é a mãe do tal do Abner. Na certa, foi ele quem mandou a cesta de doces para Leandro._ Valéria respondeu.

No mesmo instante, Patrícia concordou em ir embora. Não que ela tivesse alguma antipatia por Abner. Para Patricia, Abner era indiferente. O que ela não queria era ver Leandro magoado.

Contudo, já era tarde demais. Abner saiu da cozinha vestindo o uniforme de chef. Avistou Leandro e sorriu por isso. Não era um sorriso comum, era um sorriso de encantamento, o mesmo sorriso dado diante da visão de um ente querido. A saudade morria naquele instante. Fazia tanto tempo que desejava aquela visão, que o seu coração saltava de alegria.

Em Leandro o efeito daquele encontro era o oposto. Sentia um grande incomodo afogado no ressentimento e mágoa. Ele perdoara sim os pais e a filha, mas não conseguia perdoar Abner e Júlio por todo o sofrimento que eles causaram.

A vontade de ir embora foi sufocada pela curiosidade. Não uma curiosidade boa, daquelas que te fazem sentir prazer em tomar conhecimento. Era uma curiosidade estranha e dolorida, de querer despir alma daquele homem que tanto o enganara.

Abner por muito tempo foi o homem sem rosto que dividia com ele o corpo do seu marido, foi a presença perturbadora que o ofendia apenas com sua existência. Viu-se muitas vezes tentando imaginar o aquele homem tinha de tão especial para despertar o interesse do seu marido.

Em muitas brigas, ficava exausto tentando penetrar no coração de Júlio com a intenção de entender o porquê o magoava daquela maneira. Mas Júlio fechava todas as portas que davam acesso ao seu coração. Silenciava diante das perguntas desesperadas de Leandro, aparentava frieza para o seu sofrimento.

Leandro tentava captar algo pelo olhar do marido, mas esse nada revelava, era turvo como um poço profundo. Era desprovido de sentimentos, congelante e, algumas vezes, assustador.

Lembrou-se que passou noites chorando, chegando a conclusão de que o tal do Abner deveria ser melhor do que ele, mais jovem, mais bonito, mais interessante e isso corroía toda a sua autoestima.

Agora o outro tinha um rosto. E como Leandro acreditava, era sim um belo rosto, um olhar meigo e ardente, um sorriso sedutor que o despertou encanto várias vezes.

O outro era o mesmo homem que um dia o fez feliz, que o fez sentir seguro e amado...tudo era uma farsa e ele se sentia um grande otário.

Abner se aproximava ignorando o olhar repreendedor da mãe. Lurdes não aprovava aquela paixão do filho, temia que Abner fosse novamente vítima da violência de Júlio. Mas Abner não se importava. Que fosse para o diabo Júlio e todo o seu ódio! Foda-se os conselhos da mãe! Somente Leandro o importava e estava disposto a tudo para reconquistar o amor da sua vida.

Valéria se armou de palavras grosseiras para atira-las em Abner, mas Leandro a deteve, pedindo para que deixasse que ele tomasse as rédeas da situação. Ela cedeu, não por vontade própria, mas por respeito ao amigo.

Quando Abner se aproximou da mesa, Valéria levantou no mesmo instante. Ela estava disposta a não fazer um barraco, mas ficar perto dele era demais para ela.

Patrícia ficou paralisada por alguns segundos sem saber o que fazer. Decidiu por fim, ir atrás de Valéria e deixar que Leandro pudesse conversar mais a vontade com Abner.

_ Com licença._ Patrícia disse educadamente, antes de retirar.

Abner sentou em frente ao amado, entrelaçando os próprios dedos e o olhando de jeito terno. Domou a vontade de beijá-lo. A boca de Leandro estava mais convidativa que antes. Reparou que Leandro cortou os cabelos, mantendo uma franja discreta, que emoldurava ainda mais o seu belo rosto.

Abner sentiu o tesão aflorar com força, a presença de Leandro era muito desejável.

Há tempos não excercia a prática sexual, Leandro fora o último a tocar no seu corpo e Abner não quis permitir que nenhum outro fizesse isso, para ele, era uma forma de tatua-lo.

_ Fico feliz que veio. Eu senti tanto a sua falta._ as palavras foram ditas por Abner em ritmo de emoção, quase chorosas. Ele queria reprimir as lágrimas, para não parecer mais ridículo do que estava se sentindo.

Leandro o olhou com profundidade, como se quisesse decifrar quem era aquele homem na sua frente.

_ Como tem passado? Eu fiquei feliz quando soube que você abriu uma livraria. Achei a sua cara. O que mais me encantou foi a coincidência de ser em frente a confeitaria. Isso me deixou tão feliz!

O silêncio de Leandro o deixou desconcertado. Preferia até mesmo as palavras agressivas do que aquele silêncio perturbador.

_ Quem é você?

A pergunta foi como uma pedrada na face de Abner.

_ Como assim, meu bem?

_ Vou formular melhor a pergunta. O que é você? Que espécie pertence pessoas que sentem prazer em provocar dores nas outras? Por que eu? O que fiz de errado para que vocês dois me magoassem?

Abner abaixou o olhar.

_ Eu sinto muito por tudo de mal que te causei.

_ Os seus sentimentos não mudam nada. Não apagam porra nenhuma do que aconteceu. Não é nada fácil pra mim ter que reconstruir todos os estragos que você e o Júlio me causaram. Mas eu sou forte. Não sou o lixo que vocês pensam que sou. Eu tenho dignidade e resiliente.

"Confesso que a sua vinda para perto da livraria, me abalou um pouco, mas não vai me derrubar. Você pode até ser ventania, mas eu sou rocha."

_ Eu só soube da livraria quando já estava aqui.

_ Ah, é mesmo? Não me diga._ Leandro perguntou em tom de deboche.

_ E não vou negar que gostei._ Abner sorriu com o canto da boca, um jeito irritantemente sexy.

_ Okay. Tenha um bom dia.

Antes que Leandro se levantasse, Abner o segurou pela mão.

_ Eu não quero ser o seu inimigo.

_ Não será. Não se preocupe, você não tem competência para isso, não tem tanta importância assim._ Leandro soltou a mão num rompante e foi saindo bravo.

Abner correu para a entrada da doceria e gritou:

_ Leandroooo!

Quando ele olhou para trás, Abner disse:

_ Eu te amo! Te amo pra caralho!

Leandro deu as costas e caminhou as pressas. Abner se manteve sorrindo, admirando Leandro se afastar.

Lurdes se aproximou do filho furiosa.

_ Você perdeu o juízo, menino?! Eu já te falei mil vezes para esquecer o Leandro! Ele é casado! Já não cansa toda a confusão que você causou?

_ Ele não é casado. Não ainda...em breve será casado, mas comigo.

_ Você é muito abusado! O Júlio quase te matou uma vez. Aquele homem é um demônio e obcecado pelo marido...marido sim. Eles ainda estão casados no civil. Tome juízo, Abner. Não jogue a sua vida fora por causa de um homem qualquer.

_ Ele não é um homem qualquer...eu sim sou um homem qualquer...ele não. Ele é especial. É maravilhoso. Pena que joguei tudo na lata do lixo. Mas eu vou consertar tudo. Vou lutar pelo homem que amo.

_ Você quer acabar comigo isso sim. Quer me deixar nos nervos de preocupação.

Abner não estava disposto a discutir com a mãe e nem ninguém. Afastou-se, indo para o escritório, que ficava no segundo andar e podia ver melhor a livraria. A fotografia de Leandro estava num porta retrato sobre sua mesa. Acariciou-a beijando a imagem dos lábios.

_ Eu não vou desistir de nós.

....

Pela janela do quarto era possível ouvir o vento brincar com as folhas das árvores. O vento frio do fim de tarde do inverno invadia o quarto, deixando Leandro com frio. Mas ele estava desanimado demais para levantar para fechar a janela, optou por se cobrir com o edredom para se proteger do frio.

Ouviu o barulho da porta do quarto se abrir. Não se espantou porque sabía que era Valéria. Ela havia o ligado alguns segundos atrás para avisar que estava na portaria.

Assim que entrou, ela deitou ao seu lado, se abrigando debaixo do edredom. Leandro a envolveu em seus braços e a beijou na face.

_ Eu te amo.

_ Eu sei.

_ Não vai dizer que me ama também?

_ Você já sabe, meu Bijuzinho.

Leandro sorriu e afastou carinhosamente uma mecha de cabelo do rosto da mulher.

_ Como você está, meu amor? A presença daquele homem detestável mexeu muito contigo?

_ mexeu sim, minha amiga. Eu não vou negar. Fiquei péssimo. Me senti muito ofendido.

_ Você não deveria se sentir assim. É a vítima.

_ Eu sei. Mas mesmo assim me sinto. Sabe, eu amei muito o Júlio...como o amei! Até hoje não consigo entender o porquê ele fez tudo o que fez comigo. Como alguém pode fazer mal ao outro sem motivos? A única coisa que fiz foi amar... será que fiz algo de errado e não percebi? O mesmo foi com o Abner. Eu só me apaixonei por ele e o mesmo zombou de mim com tanta crueldade.

Valéria sentou na cama e apoiou a cabeça de Leandro nas suas pernas. Acariciava os cabelos dele com carinho.

_ Era uma vez um sapo e um escorpião que estavam parados à margem de um rio.

"Você me carrega nas costas para eu poder atravessar o rio? " Perguntou o escorpião ao sapo.

"De jeito nenhum. Você é a mais traiçoeira das criaturas. Se eu te ajudar, você me mata em vez de me agradecer."

"Mas, se eu te picar com meu veneno - respondeu o escorpião com uma voz terna e doce -, morro também. Me dê uma carona. Prometo ser bom, meu amigo sapo."

O sapo concordou.

Durante a travessia do rio, porém, o sapo sentiu a picada mortal do escorpião.

"Por que você fez isso, escorpião? Agora nós dois morreremos afogados! - disse o sapo.

E o escorpião simplesmente respondeu:

"Porque esta é a minha natureza, meu amigo sapo. E eu não posso mudá-la."

É isso, Leandro, você é o sapo e Júlio o escorpião.

_ Você acha que essa é a natureza dele? Ser perverso?

_ Não acho. Tenho certeza. E ficar tentando entender o porquê de ele ser assim e se perguntar onde errou é tortura.

_ Você tem razão.

_ Sobre o Abner, esse é só um merdinha que se acha importante porque estava fodendo com um homem casado. É típico daquelas pessoas burras que sabem que são merdas, mas querem procurar em si alguma importância em cima do sofrimento alheio. "Se ele está comigo é porque sou melhor que o conjugue." É o que gente como ele pensa. Mal sabe que não passa de um otário usado por um adúltero safado. Abner não tem importância nenhuma. Você é muito melhor do que ele.

_ Eu nunca amei ninguém como eu amei o Júlio. Me dói tanto saber que amei a pessoa errada. Ele era impenetrável. Quanto mais eu tentava entrar no seu coração mais me machucava. Eu só queria viver bem com ele, queria ser feliz e cuidar da nossa filha juntos.

_ É complicado...mas você ainda o ama?

_ Não. Daquele amor nada restou. Júlio foi matando aos poucos até não restar nada. Mas eu não queria me sentir mal por isso.

_ Então, vamos mudar de assunto. Animado para a estreia da livraria? É amanhã.

....

Desde menino Leandro adorava passear pelas livrarias. Para ele, era um lugar mágico, onde cada livro nas estantes abrigava um mundo diferente a ser explorado.

Sorria orgulhoso de ver o seu sonho realizado. Estava tão feliz, que o seu coração transbordava esse bom sentimento.

Ali estavam presentes as pessoas mais importantes da sua vida: a filha, Valéria, os pais, os parentes e amigos. Todos vieram prestigiar aquela nova fase de sua vida.

Além dessas pessoas, havia os fãs da escritora Helena Dinis, que palestrava no jardim da livraria. O som da sua voz ecoava pelo local através do som do microfone.

Vanessa cumpriu com a sua promessa, contratou digitais influencers do nicho literário para ajudar na divulgação. Ela estava tão feliz em ver Leandro sorrir de um jeito que não fazia há anos.

_"Querides amigues e leitores, é um prazer imenso estar aqui nesse espaço tão agradável projetado e organizado por uma pessoa tão especial na minha vida, o meu grande amigo Leandro. Vocês não tem noção do quanto essa amizade é importante para mim. Leandro sempre me motivou a escrever, mesmo em momentos difíceis, em que eu achava que ia desabar, ele me estendia a mão, sendo o meu suporte para não cair. Por isso, quero pedir a todos uma salva de palmas para o Leandro por toda garra e coragem para fazer com que essa livraria se tornasse realidade."

Leandro só conseguia sorrir diante dos aplausos.

_ O ofício da escrita em muitas vezes é dolorido, é solitário e exige total dedicação. Mas é gratificante saber que temos em mãos o poder de dar vida a personagens com sentimentos, vivências e desejos, traçar suas histórias! A escrita é o meu refúgio e fortaleza, enobrece a minha alma e me eleva a felicidade. Espero que vocês sintam os mesmos bons sentimentos que sinto, ao lerem O amor que precisamos, meu novo romance que dedico a cada um de vocês com muito carinho. Vocês leitores são muito importantes nesse processo. Tudo isso é por vocês.

Novamente o som das Palmas dominava o ambiente. Helena sentou em seu lugar e as pessoas formaram uma fila, portando o seu exemplar em mãos a espera de receber um autógrafo da escritora.

Genaro se aproximou de Leandro segurando uma taça de vinho, que estava sendo distribuida para os convidados.

_ Parabéns, meu filho. Tudo ficou muito bom.

Leandro não resistiu e o abraçou. Há tantos anos desejava ouvir um elogio do pai. Desde que desistiu de cursar Direito, Genaro nunca mais teve pelo filho nenhum sentimento de admiração, e fazia questão de externalizar a sua decepção em palavras.

_ Fico feliz que o senhor tenha gostado. De verdade, a sua opinião tem muita importância para mim.

Genaro fez um cafuné na cabeça do filho. Ele chegou na festa só. Dias antes, Leandro pediu para que não levasse Lorena ao evento para que Angela não se sentisse ofendida.

Genaro compreendeu a intenção do filho e decidiu respeita-la.

Ao contrário de Lorena que ficou furiosa.

_ Como assim ele não quer que eu vá?! Eu não sou qualquer pessoa! Sou a mãe do irmão dele.

_ Eu sei, meu bem. Leandro não tem nada contra você. Só está preocupado com a mãe.

_ Uma ova! A intenção dele é me ofender, me isolar da família e você está permitindo. E não aceito. Agora sou sua esposa e exijo que o seu filho me respeite.

_ Lorena, Leandro não está te desrespeitando. Só está pensando na mãe.

_ Foda-se! Você como meu marido não deveria admitir isso.

Lorena se trancou no quarto. Genaro foi atrás, batia na porta e tentava se explicar, mas era inútil. Ela não estava disposta a entender.

O motivo da sua raiva não era não poder ir a estreia da livraria. Ela não se importava com isso. Sua raiva era o fracasso do seu plano, era Leandro ter conseguido o que ela lutou há tempos para conseguir. Genaro desistiu do escritório de advocacia, a chance de Lorena crescer na vida, preferiu dar o dinheiro ao filho para que esse investisse na livraria.

Ao contrário de Genaro, Lorena não acreditou que Leandro voltaria para Júlio. Ela sabia que não passava de estratégia do enteado.

_ Deixe de ser ingênuo, Genaro. Leandro não tem intenção nenhuma de voltar para o Júlio. E nem esse faria tal proposta para o Leandro. Eu conheço o Júlio, trabalhei para ele por anos, sei o quanto é controlador com o próprio dinheiro. Ele jamais desperdiçaria com o Leandro. Além do mais, Júlio nunca quis que Leandro fosse independente. Sempre quis manter Leandro sob o seu domínio.

_ Não me importa, Lorena. Ele é o meu filho e o dinheiro é meu. Não se meta nisso.

Lorena fez do silêncio a prisão da sua raiva.

A mulher não estava disposta deixar barato a ofensa que sofrera de Leandro. Quem era ele para ditar aonde ela poderia ir?

Permaneceu calada e sisuda enquanto Genaro se arrumava. Ele tentava acalma-la com palavras carinhosas e muitas promessas de presentes para recompensar aquela chateação.

Mas Lorena não queria presentes naquele momento. Ela estava farta de Leandro.

Assim que o companheiro saiu. Ela correu para o closet elegendo um dos melhores vestidos para comparecer á livraria.

Optou por um vermelho, era a sua cor favorita e que valorizava as suas curvas e sensualidade.

A sua chegada despertou os olhares de todos que a conhecia, fato que ela desejava.

Sorriu para Angela, que sentiu como se o mundo desabasse em sua cabeça. Sentia-se muito ofendida, achando um absurdo ter que compartilhar o mesmo ambiente com aquela mulher que ela julgava a pior de todas.

Aturar a presença de Genaro já era para Angela extremamente desconfortável. Ela não o suportava. Mas ele é pai do seu filho, por Leandro estava disposta ao sacrifício, mas Lorena, isso já era demais.

Nervosa, encostou as mãos geladas sobre o braço de Leandro, pensou em gritar e libertar toda aquela aflição que sentia, mas sabia que precisava manter a calma para não estragar aquele momento tão importante para o filho.

Leandro se compadeceu da situação de sua mãe e a abraçou forte, na tentativa de protege-la.

Genaro ficou surpreendido com a audácia da mulher e se viu com as mãos atadas.

Vanessa não tinha o equilíbrio dos adultos. Era uma adolescente acalorada e sem papas na língua. Ela não morria de amores pela avó, mas mesmo ass tomou para si o sentimento de ofensa que Angela estava sentindo. Seria sororidade? Sim, era.

Sem exitar, foi até Genaro em passos tão apressados que podiam ser comparados a uma corrida.

_ Vô, tire aquela vagabunda daqui agora?_ exigiu Vanessa com o nariz erguido.

_ Minha querida, eu não posso fazer isso. Vai chamar a atenção das pessoas.

_ Eu estou pouco me fodendo para isso. Tire aquela mulher daqui. Aquilo ali é uma Abner de vestido vermelho e vulgar. Ela só está aqui para afrontar a minha avó e isso eu não vou permitir.

_ Querida, fique calma!

_ Calma é uma ova! Tudo isso é culpa sua! Você cometeu o erro de trair a sua esposa com uma mulher mais nova só para alimentar o seu ego, você já fez a minha avó sofrer demais e agora quer que ela ature esse abuso?! Ou você vai lá e tire a piranha daqui ou eu sou capaz de pegar aquele microfone e contar pra todo mundo aqui presente a história imunda de vocês.

Genaro conhecia Vanessa o suficiente para ter certeza que ela teria coragem de cumprir com a promessa. Mesmo contrariado, se afastou da neta, se aproximando de Lorena.

_ Vamos embora._ Genaro sussurrou ao pé do ouvido de Lorena, segurando em seu braço.

_ De jeito nenhum. Eu acabei de chegar e vou ficar.

_ Pelo amor de Deus, Lorena. O que está querendo causar um escândalo?

_ Não. Só quero um autógrafo da Helena Dinis, sou muito fã dela._ disse Lorena em tom irônico.

_ Já chega! Vamos embora agora!

De longe, Leandro percebeu que o pai conversava com a madrasta aparentando insatisfação e a mulher demonstrava resistência. Decidiu ir até eles para verificar o que estava acontecendo, pois temia um escândalo.

_ Boa noite, Lorena.

_ Boa noite, Leo...posso te chamar assim né? Já que é quase o meu filho.

Leandro permaneceu num silêncio desconfortável.

_ Menino, adorei isto aqui. Ficou diferente. Simples, mas de bom gosto. Você leva jeito mesmo para os negócios...aprendeu com o Júlio?

_ Não.

_ Ah, duvido. Vocês foram casados por tanto tempo. Sabe que você surpreendeu a todos? Ninguém dava nada por você, te achavam um zero á esquerda e agora está aí, dono da porra toda. Meus parabéns.

_ Obrigado.

_ Sabe quem vai quebrar a cara com tudo isso? O Abner. Ele vivia dizendo que você não passava de um riquinho inútil... até te chamava de songa monga. Agora você tá aí, vitorioso.

_ Já chega! Vamos agora, Lorena. Tchau, meu filho.

_ Ah, mas por quê? Eu ainda nem comprei o meu livro e peguei o meu autógrafo.

_ Não se preocupe, Lorena, eu te dou um livro autografado de presente e mando entregar no seu apartamento. Pode ir sossegada.

_ Nossa! Quanta gentileza! Ou é vontade de me ver pelas costas?

_ Imagina! Só estou querendo te poupar de todo esse estresse de fila e lugar tulmtuado. Isso deve ser desconfortável para uma gestante.

_ Que cavalheiro o meu enteado. Deve ser por isso que o Abner te detesta, ele não tem nem a metade da sua elegância.

_ Já chega! Desculpe, meu filho. Já estou indo. Boa noite.

Genaro saiu arrastando Lorena pelo braço, despertando os olhares curiosos.

A briga entre Lorena e Genaro se prolongou do carro até na casa do casal. Apesar de Genaro estar muito bravo, quem gritava mais era Lorena.

Ele se manteve mais equilibrado com medo de que a mulher pudesse ter algum problema com a gravidez, devido ao aborrecimento.

_ Lorena, se acalme!

_ Eu não posso ficar calma com a sua família inteira me humilhando. A sua irmã me detesta, vive me comparando com a Angela, dizendo que ela é muito melhor do que eu. O seu filho e a sua neta querem me excluir da família, como se eu não tivesse direitos e você permite.

_ Você precisa entender que as coisas demandam tempo. Angela é a mãe dele!

_ E eu sou a mãe do seu filho! Filho esse que todo mundo duvida que seja seu. Se duvidar até mesmo o Leandro. Ele não diz nada porque é um sonso.

_ Pare de atacar o Leandro! O que você tem contra ele? Até mesmo no nome do desgraçado do seu irmão você tocou só para magoa-lo.

_ Eu não quis magoar ninguém! Você está sendo injusto comigo. Eu só fiz um elogio, dizendo que ele era o contrário do que o Abner dizia. Eu não aguento mais tanta injustiça.

Lorena se trancou do quarto batendo a porta.

_ O que foi que eu fiz para merecer mais essa?_ Genaro se perguntou, enchendo o copo com whiskyRubens entrou na sala do chefe sem bater. Estava radiante de felicidade, ao contrário de Júlio, que respirava mau humor.

_ Bixaaaa! Está confirmadooooo. Rogério Marcone vai fechar negócio conosco.

_ Credo, Rubens! Pare de gritar!

Rubens sentou em frente ao patrão, cruzando as pernas e falando gesticulando com as mãos.

_ Onde você reservou o restaurante para o jantar de negócios? Ah, não esqueça de ir com aquele seu terno Armani preto maravilhoso! Você fica uma delícia nele. Se esse senhor Marcone for do vale também será presa fácil para seduzir e você arrancar muito dinheiro do velho.

_ Caralho! Eu me esqueci completamente do Marcone. Nem reservei nada.

Júlio estendeu a mão até o telefone.

_ Luciano, dê um pulo aqui na minha sala. Traga café.

_ Para mim também.

_ Para duas pessoas._ Júlio desligou em seguida._ Vou pedir para que o Luciano providencie uma reserva em algum restaurante. É para quando mesmo?

_ você está mesmo desligado, hein veado! Eu já até sei o nome da sua distração: Le-an-dro.

"Olha, Júlio, que Leandro é lindo isso é inegável, mas daí você ficar tão obcecado ao ponto de perder a concentração para o trabalho está ficando um pouco demais. Há tantos homens por aí."

_ Não há homem nenhum como ele!_ gritou Júlio, socando a mesa.

_ Calma! Não precisa ficar irritado!

_ Leandro é o meu marido. É o homem da minha vida. Sabe o que é subir pelas paredes pensando nele e nada? Eu estou desesperado.

_ Júlio, você pode comer o homem que quiser.

_ Não posso não. O homem que quero comer é o Leandro e nada de ele ceder pra mim. Você tem a noção do quão horrível é o fato de que não posso comer o meu próprio marido?

Rubens percebeu que Júlio estava alterado e não gostou nada. Sabia que o mau humor do patrão nunca era um bom sinal.

_ Pelo que fiquei sabendo, Leo vai abrir uma livraria. Eu vi que ele criou um perfil no Instagram e que o evento de estreia será o lançamento do novo livro da Helena Dinis. Uma coisa que não entendo é que, no outro dia mesmo, Leandro não tinha onde cair morto e agora tem uma livraria! Como, meu deus?

_ Foi o idiota do Genaro que bancou toda essa palhaçada! O energúmeno quer se vingar de mim, por isso está bancando as idiotices do Leandro para que ele conquiste a independência. Eles estão fazendo essa palhaçada para me atingir.

_ Ou talvez não tenha nada a ver com você. Talvez Leandro só quer seguir a vida. Aliás, como você ficou sabendo que foi o Genaro? A Vanessa te contou?

_ Não. A minha filha não me conta mais nada. Sempre desconversa quando toco no nome do Leandro. Eu não sou idiota, Rubens. Quem mais bancaria uma livraria para o Leandro? Só pode ter sido aquele velho desgraçado.

"Mas deixa estar. Isso vai dar merda com certeza. Leandro não entende nada de negócios. É um incompetente, um eterno play boy. Tudo que teve na vida veio de alguém. Passou anos sendo bancado por mim, depois pela Valéria, que só o empregou por caridade. Agora o papaizinho resolveu abrir a carteira para o filhinho brincar de lojinha. Aquilo lá não dura muito. Vai falir com certeza. Aí o velho enfarta de vez por ver que jogou dinheiro fora."

_ Mas se o Leandro nos surpreender e a livraria dar certo?

_ Eu tenho certeza que não dará. Leandro não sabe fazer nada. A única coisa que ele faz com excelência é sexo. De resto é inútil.

_ Quanta amargura!

Luciano interrompeu a conversa batendo na porta, pedindo autorização para entrar, que foi aprovada por Júlio. O secretário entrou empurrando um carrinho, contendo um bule de porcelana, um açucareiro e duas xícaras.

_ Obrigado, gracinha._ Rubens agradeceu, piscando um dos olhos para Luciano, que sorriu timadamente.

O jovem serviu aos dois, em silêncio, enquanto a eles falavam como se a sua presença fosse inexistente.

_ Voltando ao assunto principal, precisamos fechar negócios com esse tal de Marcone. A empresa dele está toda encralacrada com a justiça. E está recebendo uma enxurrada de processos dos ex funcionários. Como ele sabe dos seus contatos com o Juíz Antônio Martins, isso o atraiu até ti, Júlio.

_ Não é o Martins que vai julgar o processo do Marcone?

_ Exato._ Rubens afirmou erguendo uma das sobrancelhas.

_ Então, já temos meio caminho andado. Só vamos precisar apresentar uma defesa plausível para disfarçar.

_ Você vai se sair muito bem nisso. É um gênio, mesmo a causa já sendo praticamente ganha.

Júlio olhou para Luciano.

_ Querido, marque um jantar para sexta-feira às vinte horas no melhor restaurante que conseguir. Peça uma reserva para quatro pessoas.

_ Sim, senhor.

Rubens o olhou com estranhamento.

_ Como assim 4 pessoas?! Nós somos 3! Euzinha, a senhora e o Marcone.

_ O Luciano vai conosco._ Júlio disse sorrindo para Luciano, piscando um dos olhos. _ Ele vai fazer as anotações necessárias, assim como aquela vadia da Lorena fazia. E de lá, vamos até o meu apartamento, ele vai fazer hora extra.

Por debaixo da mesa, Júlio acariciou uma das coxas de Luciano, que apesar de gostar da situação se manteve sério, com receio que Rubens percebesse.

_ Entendi._ Rubens percebeu.

....

Luciano chegou em casa diferente do habitual naquele fim de tarde. Estava mais sério e silencioso.

Como de costume, deu um beijo da testa da mãe, que assistia TV sentada na poltrona da sala. Ele sentou ao seu lado, percebendo que Irene aparentava cansaço.

Irene explicou que trabalhou muito durante o dia e que não tinha mais ânimo para dar conta das faxinas semanais na casa da família de um jornalista.

_ Se ao menos você conseguisse tirar dinheiro daquele crápula! Isso já resolveria os nossos problemas financeiros.

_Mas eu preciso conquistar a confiança do Júlio. Se eu pedir dinheiro, ele pode suspeitar.

_ Ah, papo furado. Eu na sua idade sempre dava um jeito de arrancar alguma grana dos homens que me deitava. O que você conseguiu bancando o bom samaritano? Ele te deu algum sinal de confiança?

_ Sim. Júlio me convidou para acompanhá-lo num jantar de negócios.

_ Como empregadinho né?

_ Sim, mamãe. Mas não é qualquer jantar. É um jantar e reunião com um grande empresário. Parece que esse homem vai contratar os serviços do Júlio, porque esse é amigo do juiz que vai julgar a causa dele. Com isso, o Júlio vai cobrar um valor absurdo pelos honorários e o homem vai pagar sem resistência, porque sabe que com o Júlio é causa ganha.

Irene estalou os dedos e bateu palmas em seguida, gargalhando. Luciano a olhava sem entender o motivo da felicidade da mãe.

_ Meu amor, finalmente temos a chance de nos vingarmos do Júlio! Temos a faca e o queijo nas mãos.

_ Como assim, mamãe?

_ Deixa de ser lerdo, Luciano! Esse tipo de negócios que o Júlio vai fazer é ilegal. Pense bem, eu trabalho para o jornalista Roberto Costa, do telejornal Diário Carioca. Então, você vai a esse reunião com um gravador e nós vamos vender essa gravação para o seu Roberto. A imprensa vai pôr a boca no mundo, o que vai ferrar o Júlio de uma vez por todas. Além de ter os negócios prejudicados, corre o risco de perder a carteira da OAB. E ainda podemos ganhar um bom dinheiro com a venda dessas gravações.

Irene pulava comemorando. Luciano permaneceu calado, olhando para a mãe com a boca entre aberta.

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Comentários

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Muito legal ver o sucesso do Leandro. Já Abner parece tão obsessivo quanto o Júlio. E o Luciano, meu Deus, parece outro paspalho que cai na lábia do Julio! Ele não sente nem um pouco de revolta em ser usado como putinho por um homem casado que também é o chefe dele? A falta de reação e passividade dele me faz detestar o personagem. Eu queria ver o Júlio se fuder na mão de alguém ardiloso, que fosse mais esperto do que ele, que usasse a arrogância dele contra ele. Mas não, só um desfile de viadinhos passivos, fazendo as vontades dele, um após o outro...

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Que delícia de conto, li cada capítulo torcendo para não acabar, amei cada detalhe, que Leandro tenha um final feliz em paz.

Parabéns pela riqueza do conto e que conhecimento impecável 👏

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Esse plano de Irene tem muita falhas, n acho que funciona. Mas seria legal ver Júlio perder tudo, ficar pobre e depender da ajuda financeira de Leandro e de Vanessa. Assim quem sabe eles voltem a ser uma família feliz

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Ainda torço para que Júlio mude e fique com Leandro, eles têm uma filha juntos é justo que a família continue junta.

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amo sua escrita. sem saber o que vem. sera que julio vai se redimir e virar o trisal? ou o julio vai morrer? abner morrer e o leo ficar sozinho? ai ai quero logo mais

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Quando vc soltou o spoiler do Júlio puto da vida desabafando com o Genaro eu pensei que era eles dois chegando na livraria sem serem convidados e o advogado falando todo o desdém hahahahahahahahaha.

E o presente que o Leandro recebeu da confeitaria pensei que poderia ser de um personagem novo que o viu de longe e se encantou. Levei um balde de água fria por ser o Abner 😒 kkkkkkkk

E essa Irene é bem engenhosa mesmo. Gostei disso, continue hahahaha

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