Na nossa frente há uma torre de 100 metros de altura. Sua estrutura é de aço puro e no topo há uma rede de telecomunicações que utiliza energia solar para funcionar. Pego todos os equipamentos de segurança e mostro a utilidade de cada um para o Cris, que apesar de confuso está confiante com o sucesso da missão.
A torre tem um formato triangular e parece ser uma construção "recente", talvez feita um pouco antes do surto do vírus H. Se obtivermos sucesso na missão, a comunicação em uma área de 400 quilômetros será possível, principalmente, os locais que tiveram os equipamentos da IBDT instalados, como a Vila de São Jorge e o Navio Nova Amsterdam.
Nos preparamos da melhor maneira possível, até encontrarmos água potável, algo de suma importância para o grau de dificuldade que vamos enfrentar. Mesmo com a tensão da missão, arrumo tempo para flertar com o Cristian.
— Você precisa amarrar esse cinto direito. — digo, o trazendo para perto de mim e colocando o cinto de segurança. — Menino descuidado.
— Depois dessa missão, eu quero passar uma semana contigo na cama. Não vou dar folga para você. — ele responde me deixando excitado.
— Pode deixar, amor. Não vou quebrar nada que você vá precisar. — brinco lhe entregando um capacete de segurança.
— Engraçadinho. — soltei, fazendo uma careta e tirando um sorriso do Arthur. — Acho bom mesmo.
Em menos de cinco minutos, faço um curso sobre como escalar uma torre de comunicação. Além do cinto de segurança e dos ganchos, usaríamos luvas feitas para a mão não escorregar. Subimos um pequeno morro para chegarmos à base da torre. O matagal tomou conta de quase tudo, ou seja, mais um motivo de preocupação.
Iniciamos a subida de maneira coordenada, um ao lado do outro. Qualquer escorregão poderia significar a morte. No começo, a gente não conversava. Foram quase 30 minutos no total silêncio. Confesso que não era tão difícil, mas o medo falava mais alto dentro do meu coração. O Cristian estava superando todos os seus limites e não queria que nada de errado acontecesse.
Eu queria respeitar o ritmo do meu namorado. De tempos em tempos, eu dava uma parada com a desculpa de beber água, porém, eu podia ver o cansaço em seu rosto. Depois de quase uma hora de escalada, o sol abriu e o vento afastou as nuvens. Olhamos para cima e percebemos uma estrutura de madeira próximo ao topo da torre.
— Como eles fizeram isso, amor? — o Cris perguntou, dando um gole em sua água e guardando o cantil na bolsa.
— Eles devem ter usado um guindaste mais alto que esse. Talvez, essa estrutura seja do início da pandemia. — chutei, porque não fazia ideia de como construíram aquilo.
Continuamos avançando. Agora, a curiosidade maior era saber o motivo daquelas pontes suspensas. Será que eles usaram como base? Lá em cima, os zumbis não tinham acesso, logo, seria o local perfeito para fugir de qualquer perigo. Por outro lado, o esforço de subir era enorme. Imagina se sujeitar a essa rotina? Ninguém é de ferro.
Fico de olho no Cristian. Ele faz umas caretas engraçadas quando está fazendo esforço. Eu acho fofo, só que a preocupação fala mais alto dentro do meu peito. O vento sopra forte e constante, eu sinto falta do silêncio, porque não escuto meus próprios pensamentos.
Finalmente, chegamos perto das palafitas de madeira. Precisamos contornar pelo lado de dentro da torre. Eu vou na frente e o Cris segue meus movimentos. Graças a Deus que tudo dá certo e subimos tudo em segurança. Sou o primeiro a subir. Desprendo os ganchos de segurança e ajudo o meu namorado, que está tremendo, não sei se é de frio ou medo.
Eu não acredito no lugar que estamos. É uma espécie de quarto nas alturas. A pessoa construiu paredes de madeira para evitar o vento forte. A cama é feita com uma espécie de palha e um edredom grosso cobre tudo. Há uma mesa no canto da parede.
— Esse lugar é insano. — digo, olhando em volta e pegando alguns objetos.
— Quem será que construiu isso? — o Cris pergunta, andando com cuidado, pois tem medo da madeira quebrar.
— Isso é coisa de engenheiro. Eu tenho certeza. — respondo.
No chão encontramos diversos livros de engenharia molecular. As páginas estão grudadas, então, não temos ideia de qual seria o estudo. O Cristian vê um diário em cima da mesa e me entrega. É de um médico chamado Eduardo Schmidt Hoff. Leio o conteúdo em silêncio, enquanto o Cristian investiga os outros livros.
— Puta que pariu! — exclamo ao ler as primeiras passagens do diário.
— O que foi? — o Cris volta sua atenção para mim.
— O Dr. Hoff que criou os novos zumbis. De acordo com as pesquisas, ele encontrou uma célula variante que dava habilidades aos monstros. Isso é muito importante, Cris. — mostro a página em questão e o meu namorado lê.
***
DIA 25 DE ABRIL
Eu fui mordido. Eu não posso morrer desse jeito. A variante está pronta. Eu tenho certeza que ela vai funcionar em mim. Afinal, um filho não pode matar o próprio pai, não é? Se algo der errado, bem, sempre vou ter o pôr do sol deste maravilhoso mirante. Talvez eu fique alguns dias sem aparecer no diário, mas prometo que trarei novidades.
DIA 2 DE MAIO
Consegui. Me transformei e mantive a minha inteligência. O vírus se fundiu com o meu DNA de maneira surpreendente. Eu preciso espalhar para mais pessoas. Quem disse que precisamos nos livrar do vírus L? Ele pode ser a solução para a criação de uma nova raça. Existem alguns acampamentos próximos daqui. Eu posso espalhar o vírus e, finalmente, levantar um exército de pessoas inteligentes e fortes.
A melhor parte? O meu corpo está se transformando também. Por algum motivo, eu ganhei massa muscular. Agora, posso segurar as espadas sem problemas. Eu só preciso levantar o meu exército e encontrar novas cobaias para o meu projeto.
DIA 5 DE MAIO
Uma equipe tentou invadir o meu laboratório. Por sorte, as crianças do orfanato mostraram o seu valor e os expulsaram. Um deles ficou para trás. Ele estava muito ferido, mas tivemos tempo de injetar o Vírus LSH em seu corpo. A reação demorou alguns dias. No início, ele rejeitou o seu dom, porém, aos poucos, o soldado viu a importância de nossa missão. O transformei em meu general, uma vez que preciso de aliados fortes.
Ele seguiu com alguns dos nossos para a sua antiga base e trouxe mais recursos para a operação Nova Amsterdam. Eu preciso daquela embarcação para levar o vírus LSH ao mundo. Porém, no meio do caminho, o general sentiu um cheiro familiar. Ele quase invadiu uma vila, mas a prioridade era o navio. Ainda bem que ele pensou antes de agir e poupou a vida daquelas pessoas. O nosso propósito não se encontra mais nessas terras. Precisamos alçar voos maiores.
***
— Ele, ele pegou o Adam. — soltei. — Ele pegou o meu amigo.
— Calma, amor. Tem certeza que é o Adam? — questionou Cristian pegando em meu ombro.
— Absoluta. De alguma maneira, o Adam seguiu o meu rastro e atacou a vila. Ele deve ter me poupado. — presumi, deixando uma lágrima escorrer. — Eu preciso acha-lo.
— Precisamos concluir a missão, Arthur. Você tem uma responsabilidade! — Cristian falou de maneira áspera e me trouxe de volta à realidade.
— Tudo bem. Precisamos chegar no topo da torre.
A estrutura que o Dr. Hoff criou era impressionante. Com certeza, parte dela foi feita quando ele estava transformado em zumbi. Não existe outra explicação. Porém, o desgraçado quebrou a escada que dava acesso ao sistema de comunicação. Apenas a ponta da escada estava acessível, só que eu não conseguiria pular tão longe.
Na raiva, chutei o metal da ponte e gritei. Estávamos tão perto. Ainda por cima o Adam vivo? O meu amigo continuava vivo. Eu precisava vê-lo. O Cristian me abraçou, pois eu me descontrolei.
— Vai dar tudo certo, ok. A gente vai conseguir. — ele disse no meu ouvido, enquanto me dava o abraço mais caloroso do universo.
— Mas, como? Não dá para alcançar o sistema daqui. — afirmei.
— Bem, — Cristian se afastou e olhou para a escada quebrada. — que tal um impulso. É isso. — olhando para mim com um belo sorriso estampado no rosto. — Você pode me dar um impulso. Eu consigo jogar a corda e você sobe.
— Não. Não. Não. — repeti, andando de um lado para o outro e fazendo as madeiras tremerem. — Eu prometi ao seu pai que o levaria para casa em segurança.
— Arthur! — ele gritou me assustando. — Eu já passei por merdas demais para desistir agora. Eu não provei que sou suficientemente bom para estar ao seu lado?
— A questão não é...
— Não interessa. Eu superei todos os meus limites porque eu quero fazer a diferença neste mundo de 'cão'. Então, se recomponha e me ajude a chegar naquela escada. — o Cris usou um tom autoritário e que me mostrou o quanto eu estava errado.
— Você tem razão, Cris. — respirei fundo. — Você é um cara incrível e que merece respeito. Conseguiu se adaptar à jornada de uma maneira surpreendente. Vamos lá.
Eu não conseguia acreditar na loucura que estávamos prestes a fazer. O Cris determinado é sexy e me causa medo, afinal, ele não vai mais precisar de mim. Ok. Eu posso estar sendo um completo egoísta, mas não posso mandar no meu coração. O meu namorado deixa a mochila no chão e o coldre também. Ele amarra uma corda em seu corpo para que a mesma não caia.
— Eu vou te impulsionar. — digo em voz alta, mais para me tranquilizar do que outra coisa.
— Você vai me impulsionar. — o Cris repete, se afastando e preparando para correr.
A distância não é tão longa, mas vou usar todas as minhas forças para lançá-lo o mais longe possível. O Cris se prepara, faz a contagem regressiva e corre na minha direção. Estou com os dedos entrelaçados e de cócoras para ter impulso para jogá-lo. Ele pula e seu pé direito sobe em minhas mãos e o lanço para frente.
O meu namorado voa e consegue se segurar com apenas uma mão na escada. Ele luta para se manter firme, mas a luva não ajuda tanto assim. O Cris está prestes a cair e não posso fazer nada, além de vê-lo despencar para a morte. As pernas dele balançam no ar, sem qualquer apoio.
Seja forte, Cris. Seja forte, meu amor.
— Cris!!! — a minha garganta solta um grito de preocupação e medo. As minhas pernas fraquejaram e eu fico de joelhos. Coloco a mão no rosto, porque sou um covarde. Eu não consigo. Eu não quero ver.