Continuando:
Sinceramente, eu não tinha a mínima vontade de assistir ao próximo vídeo. Mesmo sendo uma coisa que aconteceu no passado, olhar a minha mulher daquela forma, não era saudável. Eu tinha a mais absoluta certeza de que ela seria fodida por um daqueles homens. Talvez até os três. Para que criar essa imagem na minha cabeça? Clara era solteira e problemática na época, foi honesta ao confessar o seu passado e me deu o direito de escolher. Se existiam pessoas cometendo algo de errado, eram Diana e Alice. E nem isso eu podia afirmar, pois não sabia se elas já estavam comprometidas com César e Mariano naquele momento em que o vídeo foi gravado. Qual o meu direito sobre a intimidade das duas?
Fiquei por cerca de cinco minutos olhando para aquele e-mail e tentando decidir da melhor forma possível o caminho a seguir. Eu seria honesto com Clara? Conseguiria olhar para César e Mariano e esconder aquilo? Eu me conheço e sei que não saberia lidar com essa situação. Talvez se eu sondasse os dois, descobrisse o tempo que os dois casais estavam juntos, se eles já namoravam naquela época do vídeo... Se fosse eu o traído, eu gostaria de saber a verdade, mesmo que o custo fosse a perda da amizade.
Quando estava prestes a me decidir, surgiu uma janela na tela do notebook. Parecia coisa de filme de hacker:
"Oi! Sem coragem de continuar?"
Fiquei olhando assustado para aquelas palavras na tela. Alguns segundos depois, outra linha de texto:
"Sei que está aí, consigo ver você pela câmera."
Decidi responder:
"Savana? Isso é alguma brincadeira?"
Uma outra janela se sobrepôs a anterior, e nela, Savana me encarava, parecendo surpresa e assustada:
- Não sei do que você está falando. Recebi um e-mail com um link, dizendo que você está em perigo. Ao clicar, apareceu você.
Era só o que faltava, jogos mentais de Savana. Por incrível que poderia parecer, ela estava realmente assustada. Ela disse:
- Desliga isso agora. Estão nos rastreando. Mando mensagem quando estiver segura.
Eu não iria cair na armadilha de novo, tentei me impor:
- Para com isso, Savana! Eu já disse o que precisava há duas semanas atrás. Me deixe em paz!
Savana me surpreendeu:
- Eu deixei! Desde o dia que terminamos eu venho me mantendo afastada. Clara é a escolha certa para você. Ao meu lado, sua vida estaria em risco. Adeus Fernando, tenha uma boa vida.
Da mesma forma que apareceu, as duas janelas se fecharam. Eu fiquei ali, com cara de bobo e sem entender nada.
Outra janela se abriu:
"Desculpe fazer você de bobo, mas sei que você só responderia se eu usasse esse artifício."
Mesmo sabendo que não devia, respondi:
"Quem é você? Por que está fazendo isso?"
Demorou alguns minutos, mas a resposta veio:
"Quem eu sou ainda não é relevante. O que você precisa agora é assistir ao último vídeo e depois decidir o que fazer. Boa sorte!"
Novamente, a janela sumiu. Sem opções, confuso e preocupado, só me restava assistir. Abri o vídeo e ele começava com algumas legendas em tela preta:
"Nesse vídeo, eu darei a você dados. Fatos sobre Savana e Clara. O que fazer com eles é uma opção sua."
À partir daquele momento eu respirei fundo e comecei a prestar atenção. O vídeo começava com Savana em uma sala de reuniões e com a data na tela da semana em que ela disse que iria visitar a avó no interior do Rio. A frente dela, dois homens muito mal encarados verificavam o conteúdo de uma maleta. A famosa mala vermelha. Eles conferiam vários maços de dinheiro, uma pequena fortuna. Os três sorriam e brincavam, demonstrando muita intimidade.
De repente, uma saraivada de balas, barulho de tiros e os três se jogaram no chão, buscando proteção. Savana fez um sinal e os dois homens partiram para a ação, derrubando uma das mesas para protegê-los e devolvendo os tiros.
Ela rapidamente recolheu o dinheiro, o colocou na maleta e saiu da sala apressada.
A câmera muda e Savana naquele momento está em um corredor. Ela travou a porta com uma grossa barra de ferro, pegou uma mochila que deveria ter deixado preparada com antecedência e começou a se despir. No seu corpo, é possível notar um tipo de escuta, dessas que a gente vê em filmes. Ela arranca o dispositivo e veste um macacão azul, com o logo de uma empresa de limpeza industrial. Na cabeça, um boné também com o mesmo logo. Ela coloca a maleta dentro da mochila e caminha apressada pelo corredor.
Outra mudança de câmera, agora ela aparece em uma rodoviária, embarcando. O ônibus vem para a minha cidade natal e a data é o dia exato em que ela voltou e fez toda aquela cena na choperia.
Novamente uma legenda:
"Essa é a ladra que enganava você. E que foi embora sem nem olhar para trás."
A imagem volta, com a data de dois dias depois que Savana terminou comigo e foi embora. Ela ainda estava no Brasil, pois todas as placas comerciais da rua estão em português. Dois homens a abordaram. Pela postura parecem ser militares ou policiais. Um deles mostrou a ela uma identidade, um tipo de carteira funcional. Savana se entregou sem resistência, parecendo aliviada pela presença dos dois homens. Os dois abrem a mochila e retiram a maleta vermelha. Na verdade, uma maleta executiva de couro acastanhado, bem forte. Quem olha a primeira vez, pode facilmente se referir a ela como mala vermelha.
Pausei o vídeo. Era muita informação. Tirei um tempo para processar o que vi. Algumas coisas ficaram bem óbvias. Primeiro: Savana talvez não fosse de todo uma criminosa. Aquela escuta é coisa de gente que trabalha ou coopera com as autoridades. Do jeito que os dois homens a protegeram, se fosse criminosa, seria de alto escalão, não uma qualquer. Os dois estavam dispostos a dar a vida para que ela escapasse.
E segundo: por que o tal "amigo misterioso" armou essa situação para juntar eu e Savana? Quem estava mentindo? Será que ele estava me manipulando ou era savana que estava se fazendo de inocente? De qualquer forma, Glauco foi honesto ao dizer que aquilo estava bem acima dele. Aquilo estava parecendo coisa de cinema. Uma conspiração internacional.
Eu precisava parar um pouco, nem vi o tempo passar. Já passava das nove da noite e eu precisava voltar para casa. No meu celular tinha cinco ligações não atendidas de Clara. Minha mãe bateu na porta do quarto:
- Filho, Clara quer saber se você já está indo para casa. Por que não a responde?
Desliguei o notebook e abri a porta. Ela me entregou o telefone. Tentei me justificar:
- Desculpa, amor! Acabei perdendo a noção do tempo. Estou indo para casa.
Clara parecia chateada:
- Poxa, podia ter avisado. Fiquei preocupada. Não faça mais isso, Fernando! Hoje não está sendo um bom dia da gravidez.
Fiquei preocupado:
- O que você está sentindo? Quer ir ao médico?
Ela me acalmou:
- É normal, relaxa! Um pouco de azia e dor de cabeça. Vem pra casa, Miguel também não para de perguntar sobre você. Estamos esperando você para jantar. Te amo!
Desligamos e eu me despedi da minha mãe, peguei as guloseimas que ela havia preparado e não demorei muito no trânsito. Como não sou um bom mentiroso, Clara percebeu que algo não estava certo. Tentei ao máximo mudar o rumo da conversa, fugir do assunto e por fim, disse que eram problemas no trabalho. Jantamos com ela sempre me olhando, tentando tirar alguma coisa das minhas expressões. Vencida pela gravidez e pelo cansaço, ela acabou dormindo.
Mesmo que eu quisesse me desligar de tudo o que eu tinha visto, minha cabeça não pensava em outra coisa. Esperei mais um pouco até ter a certeza que Clara não iria acordar. Peguei o notebook e fui para a sala. Sentei de frente para a porta do corredor, pois assim, se Clara acordasse, eu teria tempo de fechar o vídeo e dizer que estava trabalhando. Coloquei o fone de ouvido e voltei a assistir.
Savana estava em uma espécie de interrogatório, mas sem áudio. Os dois homens pareciam a tratar com respeito, não como uma criminosa. Fui acelerando o vídeo, mas o áudio estava mesmo cortado. Ela parecia dar explicações sobre o dinheiro, na mesa a sua frente. Os três sorriam de vez em quando, como se já fossem conhecidos. Quem sabe até, parceiros de trabalho.
Senti meu celular vibrar e pausei o vídeo. Era um novo número desconhecido. Resolvi ler:
"Fernando, sou eu, Savana. Sei que sou a última pessoa que você gostaria de ver ou falar nesse momento, mas é importante. Eu juro que nunca tentei entrar em contato com você. Sei que eu não tenho direito a sua confiança, mas acredite quando eu digo que eu sempre amei você. Por você, tentei mudar de vida, mas não consegui, ela acabou me perseguindo. Para protegê-lo, resolvi me afastar. Essa é a única vez que falarei com você. Não acredite quando tentarem se passar por mim. Adeus, meu amor! Quem sabe numa próxima vida?"
Aquela mensagem mexeu profundamente comigo. Não me entendam mal, eu realmente amo Clara, gosto dela desde que éramos crianças e acho que sempre vou gostar. Cada dia que passa, mais próximo a ela me sinto. Nossa família está crescendo, Miguel é um ótimo garoto, nossa filha está a caminho… tudo isso é importante para mim.
Por outro lado, saber que Savana poderia estar em perigo, mesmo que eu não a conheça como deveria, mesmo que ela tenha me enganado e mentido, não era uma situação simples para se virar as costas. Descobrir que ela talvez seja a vítima e não a vilã, coisa que eu ainda não tinha certeza, me fazia pensar nela e nos nossos bons momentos com carinho. Eu já disse antes, quando estava comigo, Savana estava por inteiro.
Ficar pensando nela não resolveria nada. Eu ainda tinha uma parte do vídeo para assistir. As legendas falavam sobre as duas. O que será que ainda existia ali? Voltei a assistir e uma nova legenda apareceu:
"Como você percebeu, Savana não é flor que se cheire. A pessoa que você conhece, não existe. Agora vamos ao outro lado da história. Será que Clara é tão diferente? Veja com seus próprios olhos."
Senti uma coisa ruim, um calafrio de mau agouro, uma sensação de tempestade à vista na minha vida. Agora era tarde para voltar atrás, eu precisava ir até o fim. Com Savana eu fui honesto e continuei no escuro, sendo inclusive, abandonado por ela sem motivo. Eu não iria repetir o erro com Clara. Retornei ao vídeo.
Bárbara e Clara discutiam em uma festa, muito alteradas. Bárbara estava furiosa:
- Como você pôde fazer isso comigo? Eu fiz de tudo para ajudá-la. Te dei casa, comida, apoio, amizade e você, na primeira oportunidade, tenta roubar o meu namorado? - Bárbara tenta avançar sobre Clara, mas os amigos a seguraram.
Clara tenta se defender:
- Isso é mentira, amiga! Quem foi que te contou? Isso é para estragar a nossa amizade, você não percebe?
O vídeo é cortado novamente e substituído por uma gravação bem amadora, feita por um celular, onde Clara e Glauco estão aos beijos em um banheiro de balada. A gravação é feita por cima, sem que os dois saibam. Não é a Clara de agora, mas não parece ser tão antigo o vídeo. No máximo, ele tem um ano, da época que eu estava voltando.
Glauco a segura firme pelos cabelos e a coloca sentada na pia. Ele levanta a blusa dela e chupa seus seios enquanto ela o aperta mais forte contra si. Suas falas entram em contradição com suas ações:
- Para, Glauco! Não podemos fazer isso. Bárbara não merece.
Glauco finge não ouvir, já tirando o pau duro de dentro da calça. Clara não oferece resistência. De saia, ela apenas o deixa fazer o que bem entende. Ele afasta a calcinha e começa a penetrar. Ela até tenta resistir, mas sem muita convicção:
- Não faz isso, Glauco! Por favor… aaaaah…
Ele dá uma estocada firme, empurrando tudo de uma vez bem fundo em Clara.
A gravação foi novamente cortada e eu, muito chateado, pausei o vídeo novamente. Clara mentiu para mim. Eu não fui o único com quem ela transou sem camisinha. Mentiu para Bárbara também, traindo uma das melhores amigas.
Me levanto e vou até a cozinha buscar um copo de água. Bebo lentamente, digerindo aquela informação que pode até ser pequena, mas que já diz muito sobre o caráter de alguém. Duas mentiras em um único vídeo curto.
Uma tristeza aguda toma conta de mim. Mesmo que eu não me sinta traído, pois aquilo aconteceu antes do nosso relacionamento, eu me sinto enganado. Se não queria que isso acontecesse, por que estava dentro do banheiro com o namorado da amiga? As más intenções começam antes do ato em si.
Voltei à sala e me sentei em frente ao notebook outra vez. Coloco os fones e deixo o vídeo ser reproduzido.
Sou levado de volta ao quarto branco. A data do vídeo é de poucas semanas antes da festa de inauguração do apartamento, o dia que Clara e eu transamos novamente. A mesma cama, a mesma colcha, os mesmos brinquedos sexuais… ninguém na imagem, apenas a voz que reconheci ser de Diana:
- Pode ir, amiga! Eu estou autorizando. César é gostoso, você vai adorar.
Agora a voz de Clara, que tenta ser firme:
- Não me sinto bem fazendo isso. É o seu namorado.
Diana é honesta e até um pouco maldosa:
- Para com isso! Eu estava lá no dia do Glauco, lembra? Pensa no dinheiro, é para isso que estamos aqui.
Clara não responde mais, parece ter sido convencida. Diana chama:
- Pode vir, amor! Clara topou.
Opa! Uma coisa me chamou atenção. Diana estava lá quando Clara deu para o Glauco no banheiro? Então, aquela gravação…
Continua.