Nem sempre fui o filho do pastor, quando eu tinha dez ano era conhecido só como o Samuel ou Sam para os chegados, levamos uma vida razoavelmente boa, isso até minha mãe começar a ter um caso com um primo do meu pai, ele não gostou muito da ideia de ser corno e digamos que a reação dele não foi nada boa, como ressaltado disso tudo, meu pai foi preso e minha mão começou uma nova família com seu amante e claro não tinha espaço para mim, fiquei com minha vó (mãe do meu pai) até meus quinze anos, pouco depois do meu aniversário recebi a notícia de que meu pai havia sido solto e que queria que eu fosse morar com ele, mas o mais surpreendente foi que ele havia se convertido na cadeia e agora era pastor, havia se casado com uma nova mulher enquanto ainda estava preso, aparentemente ela foi responsável pela sua conversão, nos mudamos para uma cidade no interior do estado onde meu pai assumiu um ministério e eu deixei de ser o Sam para me tornar o filho do pastor.
Minha relação com minha madrasta sempre foi terrível desde o primeiro dia, ela era muito fanática, “a mulher exemplar, recatada e do lar”, o foda é que eu não era o filho exemplar, quando fiz dezessete nos mudamos para outra cidade um pouco maior, meu pai já acumulava um numero grande de fies e sua fama na igreja só crescia, o cara que teve a vida mudada da noite para o dia, o cara que tinha uma esposa dedicada e fiel, o único problema era eu obvio, mesmo sendo obrigado a está engajado com as coisas da igreja eu nunca gostei da forma radical de pensar do meu pai e da minha madrasta, eu até gostava da igreja, mas as cobranças de ser perfeito o tempo todo estavam me deixando maluco e a mudança para um ministério ainda maior foi como um pesadelo para mim, mais olhos julgadores em cima de mim, “olhem o filho do pastor não namora”, “vocês já repararam que o filho do pastor não tem amigos na igreja?” e os mais diversos comentários, outro dia uma das irmãs até questionou que eu amarrei minha gravata errado.
Sempre fui muito tímido e virgem, virgem mesmo, virgem do tipo que correu quando uma menina quis me beijar numa festa, minha madrasta era uma das que mais me julgava “não sei como o Samuel pode ser tão bonito e ainda sim solteiro”, não me achava muito bonito, mas tinha meus atributos, tinha um metro e oitenta, preto como meu pai, e nem magro de mais e nem forte demais, tinha um corpo normal, já até quis fazer academia, mas meu pai dizia que não valia a pena gastar dinheiro e tempo com vaidade. Nova cidade, novas oportunidades foi o que meu pai me disse assim que chegamos na casa nova, nossa nova casa ficava próxima da igreja (que maravilha) e a maior parte dos nossos vizinhos eram da congregação nova do meu pai, no meu quarto arrumava tudo sem um pingo de vontade, já havia decidido que iria me inscrever na faculdade mais longe possível do meu pai e das suas pregações sobre moral e bons costumes, terminava de colocar minhas roupas no guarda roupas quando o ouço me chamar, me dirigi até a sala e lá o vi pela primeiro vez o cara que mudaria meu mundo totalmente.
Meu pai me chamou para me apresentar a família do tesoureiro da igreja, além de trabalhar com eu pai eles também eram nossos vizinhos, o homem tinha uma aparência de mais de cinquenta anos enquanto sua esposa não parecia ter mais que trinta e poucos, eles tinham dois filhos uma garota de seis anos e um rapaz da minha idade, seu nome era Ricardo, diferente de mim ele havia nascido na igreja e era o filho perfeito, todas as irmãs o queriam como genro e suas filhas o queriam como marido, era engajado e muito certinho, a ideia de meu pai era que eu deveria virar amigo dele para corrigir meus “maus comportamentos”, fala sério além de julgado eu seria comparado também, não tinha como ficar pior, ele parecia ser o menino de ouro mesmo, pouco mais baixo do que eu, pele clara, cabelos pretos e até usava óculos que lhe dava uma aparência de nerd sabichão, nem o conhecia, mas já o odiava diferente de meu pai que só faltou adotar o cara, ele levou tão a sério essa ideia de boa influência que me matriculou na mesma escola que esse cara.
Eu o evitei o máximo que deu, só que no domingo não teve como tínhamos que preparar as coisas para o culto juntos e foi aí a primeira vez que trocamos uma ideia,
- Depois do culto e meus amigos eu vamos comer uma pizza se quiser pode vir com a gente. - me convidou com sua gentileza que me irritava.
- Não obrigado, meu pai não me deixa sair depois do culto. - menti porque não queria que ele insistisse e funcionou.
O culto aconteceu normalmente como sempre, claro que Ricardo também era da banda, nem fiquei surpreso, a pior parte era que o filho da mãe tocava guitarra e cantava, sendo justo ele era mesmo bom, porém isso não mudava o fato de que eu ainda não queria ser seu amigo, já até ouvia as irmãs comentando porque eu não tocava violão e cantava tão bem quanto ele, não via a hora de acabar o culto e ir para casa, entretanto o infeliz do Ricardo era mais esperto do que eu pensava e no final do culto quando veio se despedir de mim ele aproveitou que meu pai estava perto e me pegou na mentira,
- Uma pena o Pastor não deixar você ir para a pizzaria com a gente Samuel. - Ele disse fingindo um pesar.
- Que pizzaria? - O Pastor perguntou.
- A da praça matriz Pastor, sempre vamos depois do culto. - Maldito seja ele por ser tão perfeito e convicente.
- Tudo bem, você pode ir Sam, só não fique na rua até tarde. - Disse meu pai, deixando bem claro que não era uma permissão e sim uma ordem.
Filho da mãe pensei, meu pai me deu dinheiro e fui obrigado a ir com eles, no caminho segui calado enquanto todos falavam sobre o culto e coisas que eu não fazia ideia, a pizza até que era boa, mas me incomodava estar com toda a mocidade da igreja, me perguntava o que eles falariam de mim pelas minhas costas, minha timidez muitas vezes era enxergada como arrogância e isso já me trouxera muitos problemas, por algumas vezes tentaram puxar assunto comigo, para saber de onde eu tinha vindo ou coisas sobre meu pai, minhas respostas foram todas secas e evasivas e eles desistiram de tentar puxar papo, diferente de mim Ricardo era o centro das atenções, transitava entre as conversas com muita naturalidade, certa hora quando ele se deu conta que eu o observava o desgraçado piscou para mim, nesse momento algo em mim reagiu, aquela piscada foi muito estranha.
Por sermos vizinhos acabamos voltando junto e por azar o meu ninguém morava muito perto da gente então tínhamos uns dois quarteirões para percorrer só nós dois, foi só ficarmos sozinhos que ele mudou sua postura, relaxou mais, tirou a camisa de dentro da calça e abriu um sorriso diferente,
- Porque você não gosta de mim. - Ele me perguntou na lata e eu tremi na hora.
- Não tenho nada contra você. - Respondi de forma seca.
- Não parece, estava pensando no que eu te fiz e nada me veio a cabeça. - Ele parecia mesmo afim de saber o porque eu não me derretia por ele como os outros.
- Não sou puxa saco só isso, sei que você está acostumado a ter todos te idolatrando, mas eu não sou assim. - Foda se a cortesia, disse e continuei andando.
- Uau, justo, - ele disse para si mesmo só que em voz alta. - Mas eu tenho uma duvida, porque você acha que eu quero que você seja um dos meus fieis fãs? - Continuou ele.
- Sei lá você é todo perfeitinho. - Minha raiva estava se diluindo à medida que eu me dava conta que o odiava de graça, então continuei e resolvi abrir o jogo. - Não te odeio, só odeio ser comparado e é questão de tempo até começarem a nos comparar.
- Te entendo, mas não sou perfeitinho. - Ele disse isso com certa malícia.
- Então você tem uma vida dupla só pode. - Respondi com muita ironia em minha voz.
- Tipo isso.
- Tipo isso o que? - Perguntei se entendia o que ele acabara de dizer.
- Tenho uma espécie de vida dupla, quer ver? - Havia um tom de desafio em sua voz.
- Quero! - Temia me arrepender.
- Beleza, vamos para casa e quando o pastor dormir eu vou esta te esperando na esquina.
- Como assim me esperando?
- O que foi tá com medo? - Lá estava o tom de desafio de novo.
- Assim que meu pai dormir eu encontro você sabichão. - Me senti ridículo de não ter coragem de xingá-lo de coisa pior.
Nunca tinha fugido de casa antes e nem nos meus sonhos eu pensaria em fazer algo assim, mas não ia dar para trás, mal sabia eu o que me aguardava.