Naquele dia acabei de lavar a roupa, me preparei e fui ao centro resolver algumas coisas, lá me encontrei com o filho da mulher. Na lotérica tinha um valor estipulado pra saque, tivemos que ir no banco, e deu tudo certo. Ele me deu o recibo e ficou tudo lindo - pelo menos achei que ficou. Cheguei em casa mais de duas da tarde.
Depois das 5 Janjão chegou com uma cara de cavalo, foi pro quarto, colocou umas roupas na mochila, e foi saindo. Eu fiquei preocupado achando que alguém tinha morrido, que ele estava com algum problema, e perguntei:
- Janjão... o que houve?
Ele continuou de cara fechada, deu partida e foi embora.
Como vocês já devem imaginar, eu surtei por dentro. Eu fiquei sem entender e sem saber o que foi, o que estava acontecendo. Pra mim ele teve algum problema. Eu nunca ia imaginar que foi o pagamento da dívida porque isso deixaria qualquer um feliz.
Nisso ele ficou 2 dias fora sem dar nem pedir notícias. Não respondia minhas mensagens. No quarto dia perguntei para seu sobrinho se ele sabia onde Janjão estava.
- Está na casa do meu avô. - Respondeu ele.
E ele perguntou:
- Houve algum problema entre vocês?
Eu:
- Que eu saiba, não.
Fiquei preocupado de eu ter feito algo com ele sem saber, ou se alguém fez alguma fofoca irreal - têm pessoas que fazem isso. Surtei e comecei ligar pra Janjão desenfreado. Não adiantou, não me atendeu. De tardezinha caiu uma mensagem de voz dele - ele não sabe escrever... só assinar o nome e fazer contas. Dizia assim: "deixa minhas coisas ai só por mais uns dias. Já estou procurando uma casa. E seu dinheiro vou te pagando aos poucos".
Isso só fez piorar meu surto. Caiu a ficha que ele não gostou eu ter pago. Aquele dia eu fui trabalhar arrasado, me sentindo péssimo, imbecil ou coisa do tipo. E pensei: "pronto! Perdi. Lá se foi meu único amigo de verdade". Só fui trabalhar mesmo porque eu sempre fiz de tudo pra não perder meu emprego.
Mas dia seguinte eu não me contive. Acordei, fui até o ponto de mototáxi na avenida principal, fui indicando o caminho e fui na casa dos pais de Janjão. Lá me informaram onde ele estava trabalhando. Fui até lá. Encontrei Janjão trabalhando em uma roça de inhame com outros homens. Ele me viu lá adiante, baixou a cabeça e continuou limpando a terra. Então fui até ele e questionei o porquê dele se inflamar com uma coisa boa que fiz pra ele.
Ele respondeu frio e com poucas palavras:
- Você me humilhou.
- Eu te humilhei só porque paguei sua dívida? - Fiquei nervoso e perguntei.
Ele disse:
- Faz um favor? Vai embora. Preciso trabalhar pra pagar sua dívida.
Desabei numa choradeira sem controle e comecei soltar as palavras desenfreadamente:
- Eu só queria fazer uma coisa boa pra você, só queria te fazer feliz... aliviar seus problemas. Mas eu faço tudo errado... eu sou um erro. Essas coisas só acontecem comigo... eu nasci pra perder... pra ser abandonado por todo mundo...
Eu estava dando o maior vexame sem nem me importar. Os trabalhadores começaram se juntar e perguntar o que estava havendo. Eu não consegui me controlar e engolir o choro como eu fazia quando apanhava do meu pai e do meu irmão.
Janjão foi rápido em cima de mim, me puxou pelo ombro pra me tirar dali. Acho que ele ficou morrendo de vergonha, tadinho. E disse:
- Olha, me deixa trabalhar. Mais tarde eu vou lá e a gente conversa. Mas eu preciso trabalhar.
Eu não respondi nada, só queria sair dali. Montei na moto e fomos embora. Me entregando em casa, o motoqueiro até me perguntou se eu estava bem.
Em casa me recolhi, fechei tudo, me enrolei no sofá e fui pra companhia daqueles que dificilmente me abandonariam: meus filmes.
A tardezinha chega Janjão com a mochila nas costas, todo manso. Sentou no sofá em que eu estava deitado e me empurrou pro canto com aquele rabão; entrelaçou os dedos, olhou no meu rosto, ficou calado um tempo, eu mantive meu olhar na TV. Ele falou:
- Foda-se! - Ele se curvou, meteu a mão por trás da minha nuca e me tacou um beijo na boca.
Meu coração disparou, acho que meus neurônios entraram em curto, meu psicológico subiu de zero a 100, acho que minha pressão arterial atravessou a atmosfera. O beijo não durou 5 segundos, mas parecia que ia arrancar meu lábio inferior; estava mais pra uma puxada de lábio com força. E o sabor abstrato daquele beijo não se comparava a nada. Aquele foi o primeiro beijo que eu havia recebido na vida.
Me sentei de frete pra ele com uma perna dobrada no sofá. Ele ficou me olhando com aquele olhar de calma. Perguntei:
- Por que você fez isso?
Ele:
- O tempo todo eu achei que a melhor coisa que veio pra minha vida foram meus filhos. Agora percebo que você também é. Sempre fez tudo por mim, pra eu me sentir bem, me acolheu, tudo que eu peço você faz sem reclamar, sem cara feia. E também eu não estava percebendo que você estava gostando de mim.
Eu encostei minha testa na dele e falei:
- Não é justo! Eu estava lutando contra meus desejos, estava me saindo super bem, e você me fez desabar. E agora, o que eu faço?
Eu não estava apaixonado (eu acho), meu sentimento inicial por ele acho que era só desejo carnal.
Ele respondeu:
- Simples! Não precisa mais lutar. Pode tirar esse fardo das costas.
Eu:
- E como a gente fica agora?
Ele:
- A gente fica, ué!
Eu dei risada, e ele também.
Sem deixar durar muito aquele clima surpreendentemente delicioso, num supetão, ele se levantou e perguntou:
- Tô de rango. Tem o que pra lanchar aqui?
("Tô de rango" é uma gíria, que quer dizer "estou com fome").
Eu não tinha feito nada em casa porque não tinha ânimo nem motivo pra cozinhar, fazer bolo, salgado ou qualquer outra. Só havia comida simples e pão.
Ele pegou a moto, saiu e voltou com uma porção de pastéis. Pareciam os pastéis mais deliciosos que eu já tinha comido, mas na verdade era o sabor da alegria (não digo felicidade porque não acredito na sua existência). E antes de ir pro trabalho eu fiz um bom bolo de massapuba (ou carimã) pra pelo menos ele ter algo que não fosse pão (ou só pão) pra comer pela manhã. Armazeno algumas massas no congelador que aí é só tirar e fazer o que eu quero quando preciso ou me dá vontade - aprendi armazenar coisas na internet. É mais prático.
Naquele dia fui trabalhar numa agonia, uma ansiedade, uma vontade de ficar em casa. Mas trabalhei na maior alegria, com todo gás, e força de vontade. Eu nunca produzi tanto como naquela noite.
Cheguei duas e pouca da manhã, abri a porta do seu quarto pra conferi se ele estava em casa, e meu parrudo grandão estava dormindo que chega roncava. Me deu uma vontade de chegar junto, mas fiquei receoso e também não quis prejudicar seu sono pra não influenciar na produtividade do seu trabalho. Além do mais, eu não sabia o que estava rolando ainda. Eu gosto de ter certeza das coisas. E eu perdi a droga do sono porque o êxtase não me deixou dormir direito. Não parava de passar o filmezinho do beijo na minha cabeça, e vinham pensamentos: "será que é sério? Será que é namoro? Será que ele me quer?" Até coisas negativas eu pensei: "Será que ele me beijou por pena de mim, por tudo o que falei lá no trabalho dele"? Pensamentos ruins ou bons, eu não parava de sentir o gosto dos seus lábios.
E coloquei celular pra despertar cedo. Eu queria ver ele antes do trabalho.
Acordei e ele ainda não havia acordado. Fiz um bom café (empregada - kkkkk), preparei a mesa. Ele demorou de acordar e o café esfriou - kkkkkk - tive que esquentar depois. Também ele acordou e me abriu um sorriso lindo. Na minha cabeça era o sorriso mais lindo que já vi na face dele; e ele foi logo pra mesa, me deu um beijo na cabeça, sentou, começou comer, e disse:
- Olha, desculpa o jeito que agi com você. Mas vou te dar um conselho... não faça isso com ninguém. Quando você paga uma dívida da pessoa ou quando você resolve um problema de alguém, você está impedindo ela de crescer e ser responsável. Além disso, você está diminuindo ela, fazendo ela se sentir incapaz de resolver os próprios problemas. Eu me senti um fracasso quando aquele cara me ligou pra me dar a notícia que a dívida havia sido paga por você. Além do mais, isso é prejudicial porque você pode atrair gente interesseira.
(Janjão é analfabeto, ele é um tosco, mas esse cara tem o dom da palavra. Não é à toa que ele é capricorniano).
Mas eu estava interessado em outra coisa. E perguntei sutilmente pra não afugentar ele:
- Janjão, posso fazer uma pergunta?
Ele:
- Quantas quiser.
Eu:
- E nós, o que está rolando? Ou não está?
Ele se levantou, me puxou da cadeira e me fez ficar em pé, pegou no meu pescoço com as duas mãos e me deu outro beijo na boca, e disse:
- Espero que isso tenha te respondido. - E me deu outro beijo. Bem... com gosto de café, mas estava gostoso assim mesmo.
E antes de ir pro trabalho, me deu outro beijo, me agradeceu dinovo e falou:
- Olha, mesmo com disso que tá rolando aqui, eu vou te pagar a dívida aos poucos. Só não posso todo de vez.
Eu não disse "não". Vai que isso poderia ser bom pro ego dele, mas por mim mesmo deixava lá, eu não estava precisando mesmo.
E para a decepção de alguns leitores, não rolou sexo, só dois dias depois, na minha folga. Mas rolou beijos de manhã, de tarde, de noite, rolou cafuné (só eu fazia nele), e eu estava adorando. Óbvio que pensei em sexo, comecei imaginar muito isso, como seria, o que eu faria, se ia ser bom; imaginei como seria perder o cabaço do cu - kkkkkkk. Não riam, mas eu realmente imaginava que cu tinha cabaço - kkkkk. Ah, gente, eu não tinha amigos pra conversar sobre sexo, cresci sozinho, e pra minha família sexo era tabu (meus irmãos mais velhos já faziam, comentavam um com o outro que comeu buceta de não sei quem, que ia sair aquele dia pra fuder, entre outros comentários - na ausência dos nossos pais, mas comigo nunca falaram, depois que souberam que sou gay, pior). No colégio não ensinava sobre sexo, apenas sobre doenças e o assunto era abordado com um breve resumo. Então eu não sabia nada. Quando eu vim morar aqui que comprei meu primeiro celular que pegava internet, e que tive acesso a internet, eu me limitava mais a ver filmes porno, só isso. Eu imaginava muita coisa sobre sexo que, na verdade, era lenda; assim como segredinhos que também aprendi.
E numa bela quarta-feira (ou foi numa quinta, não lembro bem), eu estava de folga. Ele assistiu a novela das 9 comigo, deitado no sofá, com a cabeça no meu colo - ele não gosta de novelas mas me fez companhia. No meio da novela ele começou coçar muito o pau por cima da bermuda, deu umas apertadas, e eu vi o volume na bermuda crescer. Meu coração disparou, me deu um nervoso por dentro, ansiedade com tesão. Ele se levantou, pegou minha mão e me puxou para o quarto dele.
Continuo.